2021, FINALMENTE, ESTÁ CHEGANDO AO FIM 

Todos vivemos mais um ano complicado. A pandemia da Covid-19 se mostrou mais resiliente do que se imaginava e até ganhou um folego extra com a chegada da variante ômicron. A economia da maior parte dos países do mundo continuou patinando e os efeitos do fechamento geral feito ao longo de 2020 já começaram a aparecer – alta na inflação, falta de produtos e matérias primas, combustíveis caros, desemprego, entre muitos outros problemas. 

Durante um bom tempo, enquanto se imaginava superado o ponto mais grave da pandemia, países começaram a flexibilizar as normas sanitárias e a vida parecia que iria voltar ao normal. Ledo engano – o avanço da doença voltou a ganhar força e os países voltaram a impor restrições à livre circulação das pessoas. Populações de muitos países, inclusive, devem passar as festas de fim de ano sob lockdown

Com a economia mundial em marcha lenta e com as restrições à livre circulação das pessoas, seria de se esperar alguma redução nas agressões ao meio ambiente. Infelizmente, não foi exatamente o que aconteceu. Em muitos países e regiões mais pobres, como foi o caso citado numa das postagens sobre a Floresta Amazônica no Peru, muitos desempregados voltaram às suas cidades de origem e passaram a derrubar e queimar matas para a prática de uma agricultura de subsistência. 

Aqui no Brasil, e em grande parte do mundo, vimos mais do mesmo – derrubada de florestas, avanço da mineração, destruição de fontes de água, grandes queimadas – não só na Floresta Amazônica, só para citar o básico. O arquivo das postagens do blog está repleto de exemplos dessas agressões ambientais.

A alta no preço dos combustíveis – especialmente do gás natural, que foi uma consequência direta da desestruturação dos sistemas produtivos por causa da pandemia da Covid-19, levou muitos países a reativarem antigas centrais de geração termelétrica a carvão para conseguirem manter a produção de energia elétrica. Conclusão – a Covid-19 provocou uma alta nas emissões de gases de efeito estufa. 

A vida, apesar de tudo, precisa continuar a seguir seu caminho e as esperanças de um futuro melhor devem ser renovadas. Que venham tempos melhores! 

Boas Festas a todos e uma grande torcida para que o Ano Novo seja “feliz”. 

PS: Vamos dar uma pausa nas postagens por alguns dias e voltaremos em breve com as “baterias recarregadas” para um novo ciclo de publicações.

OS ESTRAGOS CAUSADOS PELO TUFÃO RAI NAS FILIPINAS

A população das Filipinas ainda está se recuperando dos estragos causados pelo tufão Rai (também chamado de Odete) que atingiu o país no último dia 16 com ventos acima dos 195 km/h. Os maiores estragos foram nas ilhas de Siargao, Dinagat e Mundanao. De acordo com os levantamentos mais recentes do Governo local, foram confirmadas cerca de 375 mortes, 500 feridos e 56 pessoas estão desaparecidas. 

O tufão Rai está sendo considerado como a mais forte tempestade a atingir o país nos últimos anos. Ele foi classificado como o quinto super tufão da temporada no Oceano Pacífico em 2021, sendo considerado o mais mortal até o momento. De acordo com informações da PAGASA – Phillipine Atmospheric Geophysical anda Astonomical Services Administration, a classificação super tufão é dada a tempestades com uma velocidade superior aos 220 km/h

De acordo com a classificação meteorológica, furacões, ciclones e tufões são os mesmos fenômenos. A diferença na nomenclatura depende da região onde eles ocorrem. No Oceano Atlântico e no Norte do Oceano Pacífico essas tempestades são chamadas de furacões ou hurricane em inglês, palavra derivada do nome Hurrican, deus do mal para muitos povos do Mar do Caribe. 

No Noroeste do Oceano Pacífico essas tempestades são chamadas de tufões. No Sudeste do Oceano Pacífico e do Oceano Índico, essas mesmas tempestades recebem o nome de ciclones tropicais severos. 

A República das Filipinas é um grande país insular do Sudeste Asiático. É formada por mais de 7 mil ilhas, com um território de aproximadamente 300 mil km² e onde vive uma população de pouco mais de 100 milhões de habitantes. As ilhas ficam localizadas entre o Oceano Pacífico e o Oceano Índico, sendo devastadas frequentemente por tempestades e furacões. 

Conforme já tratamos em uma postagem anterior, as Filipinas já se encontram em um altíssimo grau de degradação ambiental – muitos cientistas chegam a afirmar que o país é uma “causa perdida” em termos ambientais. Mais de três quartos das matas nativas das ilhas já foram derrubadas por causa da exploração madeireira e também para a abertura de campos agrícolas. Alguns autores afirmam que resta algo entre 6 e 8% da vegetação nativa original

Sem a proteção das matas e sujeita a fortíssimas e frequentes tempestades, as ilhas Filipinas e sua grande população ficam sujeitas a enchentes, desmoronamentos de encostas, desabamento de casas, destruição de infraestruturas, entre outros problemas. Com o aquecimento global e com as mudanças climáticas em andamento, há uma tendência de um aumento cada vez maior na intensidade e na frequência dessas tempestades. 

Os males, infelizmente, não ficam restritos apenas aos ecossistemas terrestres – as águas marítimas do país também estão cheias de problemas. De acordo com estudos oceanográficos já concluídos, apenas 5% dos recifes de coral das Filipinas mantém entre 75 e 100% de sua cobertura viva. As razões para esta destruição maciça dos corais locais são muitas – pesca predatória com redes de arrasto, uso de dinamite e veneno na pesca, poluição, choque de embarcações contra as formações, entre outras agressões.    

Segundo declarações de autoridades das áreas mais gravemente atingidas pelo tufão Rai, o rastro de destruição lembra muito ao deixado pelo super tufão Haiyan de 2013, a maior tragédia já registrada no país e que deixou um saldo de 7,3 mil mortos. 

Equipes seguem nos trabalhos de busca e resgate de vítimas, principalmente em regiões isoladas. Também estão sendo feitos grandes esforços para a desobstrução de estradas, que foram bloqueadas com árvores caídas e por desmoronamento de encostas. Infelizmente, esse final de ano não será um dos mais felizes para muitos milhões de filipinos… 

ESTUDO MOSTRA QUE A EDUCAÇÃO AMBIENTAL DEVE COMEÇAR NA PRÉ-ESCOLA 

A britânica Pearson, a maior empresa de educação do mundo, realizou uma pesquisa em cinco países com o objetivo de identificar as expectativas e percepções da sociedade sobre a educação ambiental, com destaque para as mudanças climáticas. Foram ouvidas mais de 5 mil pessoas com idades entre 16 e 70 anos no Brasil, China, Estados Unidos, México e Reino Unido. 

Um dado surpreendente dessa pesquisa: mais da metade dos entrevistados entende que as crianças devem começar a aprender sobre educação ambiental já na escola primária ou até mesmo antes. Brasileiros e mexicanos, 48% e 51% respectivamente, acreditam que as crianças precisam ter esse tipo de formação já a partir da fase pré-escolar

Os dados coletados também indicam que mais da metade dos entrevistados – 58%, acredita que temas ligados ao meio ambiente como aquecimento global, desmatamentos, poluição e problemas ligados aos resíduos sólidos, citando alguns exemplos, não são abordados de maneira adequada nas escolas. Na percepção dos entrevistados brasileiros, esse índice ficou abaixo da média – apenas 44% acham que a abordagem desses temas foi inadequada. 

61% dos entrevistados acredita que estão sendo feitos esforços importantes em educação sobre as questões climáticas. Foram identificadas como as principais fontes de informação sobre esses temas a imprensa – 58%, as redes sociais – 43% e os filmes – 42%. 

As redes sociais, curiosamente, foram classificadas como uma das fontes de informação menos confiáveis para 51% dos pesquisados. As fontes mais confiáveis na percepção dos entrevistados são as experiências pessoais – 77%, os livros – 76% e os filmes – 72%. 

O relato de experiências pessoais se destaca como uma das fontes mais confiáveis de informações. Para 84% dos entrevistados, esses relatos os ajudaram a aprender mais sobre as mudanças climáticas, mudando seus comportamentos e atitudes com o objetivo de reduzir seus impactos pessoais. 

Com relação aos impactos das mudanças climáticas, os entrevistados ficaram divididos. Brasileiros e mexicanos se mostraram mais otimistas – para 64% dos entrevistados nesses países os efeitos mais graves das mudanças climáticas ainda podem ser evitados. A maioria dos entrevistados do Brasil – 71%, estão tentando se informar melhor sobre as questões climáticas. Nesse quesito, os chineses são os menos interessados – 48% mostram interesse em aprender mais. 

Outras informações interessantes levantadas nesse estudo: 

  • 77% dos entrevistados afirmaram que estão tentando aprender mais sobre as questões climáticas e afirmam que as informações que receberam em suas respectivas escolas sobre esses temas foram insuficientes; 
  • 88% afirmam que as escolas devem ser responsáveis pelo ensino de questões climáticas e ambientais; 
  • 89% dos entrevistados, a imensa maioria, acredita que os sistemas educacionais de seus respectivos países precisam desenvolver habilidades em seus alunos para o trabalho em futuros “empregos verdes”; 
  • 72% dos pesquisados acreditam num aumento das oportunidades de carreira em empregos verdes nos próximos 10 anos. 

Em primeiro lugar, é interessante notar o crescimento das preocupações globais em relação às questões ambientais. Um dos marcos iniciais do ambientalismo foi o lançamento do livro “Primavera Silenciosa”, por Rachel Carson em 1962, o que em termos históricos é um fato relativamente recente. O movimento começou a ganhar força a partir da década de 1970. 

A educação ambiental foi institucionalizada no Brasil em 1973, quando foi criada a SEMA – Secretaria Especial do Meio Ambiente, órgão vinculado à Presidência da República. Foi em 1999, entretanto, com a aprovação da Política Nacional de Educação Ambiental, que o tema começou a ganhar força entre os educadores. 

Outro fato marcante que merece ser destacado foi a grande evolução dos sistemas de telecomunicações nas últimas décadas, especialmente a internet. Com a divulgação descentralizada e distribuída de informações, as questões ambientais começaram a atingir um público cada vez maior, despertando assim preocupações cada vez mais globais. 

Mesmo em países com grande controle estatal sobre os meios de comunicação – citando a China e a Coreia do Norte como exemplos, sempre tem sido possível se burlar o sistema, com um ou outro cidadão postando informações sobre problemas ambientais “secretos”. Com isso, as questões ambientais passaram a desconhecer barreiras políticas. 

Como entusiasta que somos da educação ambiental como uma ferramenta para a mudança do comportamento dos indivíduos, vemos com bastante otimismo e esperança esse crescimento do interesse mundial pelo ensino e divulgação desses temas. Quanto mais gente envolvida nesse debate, melhor para a saúde do nosso planeta.

UMA NOTÍCIA: “BANCADA DA AMAZÔNIA DESTINOU APENAS 0,03% DAS EMENDAS PARA O MEIO AMBIENTE; DO AM SÓ UM DEPUTADO”

Ao longo de todo esse ano de 2021, publicamos diversas postagens mostrando muitos dos problemas ambientais da Região Amazônica. Falamos de queimadas, desmatamentos, avanço da agricultura e da pecuária, garimpos ilegais, entre muitos outros – no caso de países amazônicos vizinhos, esses problemas incluem também o plantio de coca e o refino da cocaína.

Ocupando metade do território brasileiro e abrigando uma população da ordem de 25 milhões de pessoas, seria de se esperar que, ao menos, os deputados federais e senadores que representam os Estados da região se empenhassem o suficiente para garantir verbas públicas para projetos de conservação da Floresta Amazônica. Infelizmente, isso não vem acontecendo. Leiam essa notícia publicada pelo portal Dia a Dia Notícia de Manaus:

*Da Redação – Dia a Dia Notícia 

Em 2021, a bancada da Amazônia, composta por deputados e senadores dos nove estados da Amazônia Legal, aprovou apenas seis emendas para serem executadas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). No total, foram cerca de R$ 1,8 milhão que representa 0,03% das emendas aprovadas, porém nenhuma foi executada. Dos parlamentares que representam o estado Amazonas no Senado Federal e Câmara dos Deputados, apenas o deputado federal José Ricardo (PT) obteve emenda destinada ao Ministério do Meio Ambiente. 

A bancada da Amazônia é composta por 91 deputados e 27 senadores, que representam os nove estados que fazem parte da Amazônia Legal, sendo eles os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

Apenas o deputado federal José Ricardo (PT) destinou uma emenda para o Ministério do Meio Ambiente no valor de R$ 200.000,00, porém não foi executada. Das 647 emendas realizadas entre os meses de janeiro a dezembro, que totalizam mais de R$ 2 bilhões, nenhum valor foi aplicado pelo MMA, onde estão concentradas as principais ações de preservação e fiscalização através do Ibama e ICMBio.

Os senadores Omar Aziz (PSD), Eduardo Braga (MDB) e Plínio Valério (PSDB), que representam o Amazonas no Senado Federal, destinaram emendas para a Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), Recursos Sob Supervisão do ME, Ministério da Defesa, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Fundo Nacional de Saúde, Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Fundo Nacional de Assistência Social, entre outros. As emendas totalizam o valor de R$ 48.839.958,00.

Já os deputados do AM Átila Lins (PP), Bosco Saraiva (SD), Capitão Alberto Neto (PRB), Delegado Pablo (PSL), José Ricardo (PT), Marcelo Ramos, Sidney Leite (PSD) e Silas Câmara (PRB) destinaram emendas para Ministério dos Direitos Humanos, Ministério do Desenvolvimento Regional, Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ministério da Defesa, Ministério da Cidadania, Fundo Nacional de Saúde, entre outros. O valor total foi de R$ 133.668.874,00.

Os deputados que compõem a bancada da Amazônia aprovaram para o orçamento de 2021 o valor de R$ 4,8 bilhões, onde quase metade deste valor (43%) foi destinado a pasta da saúde em decorrência da pandemia de Covid-19. Infraestrutura representa 12% do orçamento, já o setor agropecuário obteve grande quantidade emendas com 57 propostas e orçamento no valor de R$ 155 milhões.

Segundo levantamento da Sociedade Brasileira para Progresso da Ciência (SBPC), o orçamento executado pelo Ministério do Meio Ambiente no ano de 2021 é considerado o pior em 20 anos. Neste ano também, os índices de desmatamento bateram recordes históricos, a área de floresta derrubada é a maior em 15 anos.

Fazer discursos no Plenário do Congresso Nacional falando da necessidade da preservação da Amazônia é muito bom. Se esses discursos fossem seguidos pela dotação e liberação de verbas para a execução de projetos de preservação e recuperação ambiental do bioma seria melhor ainda.

Infelizmente, só vemos demagogia e muito jogo de cena…

PORTUGAL JÁ TEM UM “SERTÃO” PARA CHAMAR DE SEU 

Uma postagem rápida. 

Reservatórios de água e açudes secos, dificuldades para o abastecimento de cidades, agricultores e pecuaristas penando para conseguir água para irrigar suas plantações e dessedentar seus animais. Essas imagens, que lembram muito as temporadas de estiagem mais forte no nosso Sertão Nordestino, são das secas que vem assolando muitas regiões de Portugal com uma frequência cada vez maior. 

A imagem que ilustra essa postagem é bastante didática. Ela mostra o solo esturricado do antigo fundo de um reservatório seco – a ponte de pedra em arcos no fundo não deixa dúvida que a cena é em Portugal. 

De acordo com informações relativas ao último mês de outubro do IPMA – Instituto Português de Mar e Atmosfera, o serviço nacional meteorológico, sísmico e oceanográfico do país, cerca de 40% do território continental de Portugal apresentou chuvas fracas, 31,8% chuvas normais, 13.6% com seca fraca, 11,6% com seca moderada e 3% com seca severa

Entre as regiões classificadas com seca severa encontram-se áreas do Baixo Alentejo e do Algarve. Além da baixíssima precipitação, a temperatura média em Portugal foi 2,46% acima do normal, se situando em 23,6° C – em Mora, na região de Évora, a temperatura chegou a 34,2° C no dia 7 de outubro. 

Para nós brasileiros, tão acostumados que estamos com notícias de seca – especialmente no Semiárido Nordestino, esses números soam como triviais. Para Portugal, entretanto, eles são uma novidade preocupante. Mais preocupante ainda é o fato de as áreas com problemas de seca estarem aumentando ano após ano no país. 

Portugal não está sozinha nessa questão – diversas regiões da Europa vêm enfrentando temperaturas de verão acima da média, com ocorrências e secas, além de fortes ondas de calor. Em uma postagem publicada em agosto falamos do fenômeno atmosférico Lúcifer, que provocou dias com altíssimas temperaturas em vários países e também grandes incêndios florestais

Um estudo realizado pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e publicado pela prestigiada Revista Nature, mostrou que as secas que vem assolando a Europa, especialmente a partir de 2014, são as mais intensas dos últimos 2 mil anos. Os pesquisadores analisaram as concentrações de isótopos de carbono e de oxigênio armazenados nos anéis de crescimento de 147 carvalhos que remontam dos tempos do Império Romano. 

As conclusões desse estudo indicam que o aquecimento global está por trás dessas mudanças climáticas na Europa. Também entram na “equação” fortes correntes de jato, intenso escoamento do ar, além de ventos excepcionalmente fortes a cerca de 11 km de altitude. O Deserto do Saara, que ocupa uma área de mais de 9,2 milhões de km2 no Norte da África, é um grande influenciador dessas ondas de calor e de seca que vem assolando a Europa. 

Portugueses e cidadãos de muitos países da Europa vão precisar se adaptar a esses novos e complicados tempos, inclusive tendo de aprender muitas das técnicas de sobrevivência com pequenos volumes de água. Num curtíssimo prazo, os Governos precisarão ampliar a capacidade de armazenamento de reservatórios de água, investir em projetos contra o desperdício de água, incentivar o reuso da água, entre outras medidas de economia. 

No médio e longo prazo, será necessária a realização de grandes obras de infraestrutura para o transporte de água entre regiões – o Projeto de Transposição das Águas do Rio São Francisco, poderá ser um exemplo (inclusive nos seus pontos negativos). Outro caminho, que já é bastante utilizado na Espanha e em Malta, é a construção de usinas para a dessalinização da água do mar

Conforme já tratamos em outras postagens aqui no blog, o aquecimento global e todas as mudanças climáticas que ele traz são irreversíveis. Resta a essas populações aceitar os problemas e passar a fazer mudanças nos seus hábitos de vida. São novos e cada vez mais complicados os tempos atuais. 

A RECONSTRUÇÃO DA CATEDRAL DE NOTRE-DAME, OU FALANDO DA HIPOCRISIA DE MUITOS FRANCESES 

No início da noite do dia 15 de abril de 2019, a famosa Catedral de Notre-Dame, em Paris, foi tomada por um incêndio de grandes proporções. Telejornais e sites de notícias apresentaram essa tragédia ao vivo para todo o mundo. Eu lembro claramente das cenas de voluntários e bombeiros correndo desesperadamente para salvar obras de arte e outras peças religiosas, enquanto outras equipes tentavam dominar as fortes labaredas (vide foto). 

Uma das partes mais danificadas da catedral foi o telhado, que teve todo o seu antigo madeiramento completamente destruído. Felizmente, a maior parte da estrutura desse belíssimo exemplar da arquitetura gótica, que teve a sua construção iniciada em 1193, não foi afetada por essa grande tragédia. 

Desde então, a reconstrução da Catedral se transformou em uma questão de honra para o Governo da França. Nos primeiros dias após o incêndio, doadores de todo o mundo começaram a enviar contribuições para a reconstrução de Notre-Dame. De acordo com informações do órgão responsável pela administração da Catedral, já foram arrecadados cerca de 833 milhões de Euros provenientes de 340 mil doadores

Uma decisão tomada pelo Governo francês, que desagradou muitos ambientalistas, diz respeito à reconstrução da Catedral de Notre-Dame seguindo o projeto de restauração feito em 1843 pelo arquiteto Eugène Viollet-le-Duc. O grande ponto de atrito nesse projeto é a estrutura de madeira do telhado – segundo alguns cálculos, poderá ser necessário derrubar até 2 mil carvalhos para fornecer a madeira a ser usada na obra. 

O carvalho é uma árvore do gênero Quercus, da família Fagus, da qual existem aproximadamente 600 espécies. Essas árvores são nativas do Hemisfério Norte, sendo encontradas em latitudes temperadas e tropicais da Europa, América do Norte, Ásia e Norte da África.  

Desde a mais remota antiguidade, a madeira dos carvalhos vem sendo largamente usada para a construção civil, construção naval, móveis e, em especial, na construção de barris para o armazenamento de bebidas como o vinho e o conhaque. 

Esse uso intensivo dessas madeiras levou à derrubada de grandes extensões de matas nativas, especialmente na Europa. Um exemplo citado aqui nas postagens do blog é o da famosa Floresta de Sherwood, na Inglaterra, que já foi o esconderijo do lendário Robin Hood. Atualmente, o que restou da antiga floresta é uma mancha verde do tamanho de um parque urbano. 

De acordo com as informações divulgadas pelos órgãos governamentais da França, serão derrubadas cerca de mil árvores nesse ano de 2021, sendo que metade das árvores virá de Florestas Nacionais e a outra metade de florestas particulares. As árvores consideradas ideais para o corte devem ter, no mínimo, tronco com 1 metro de diâmetro e altura útil de 20 metros. 

Segundo essas fontes, esse volume corresponde a apenas 0,1% do corte anual de madeira na França, estimado em cerca de 2 milhões de metros cúbicos. Segundo os ambientalistas, esses percentuais são muito relativos – são necessários de 200 a 300 anos para um carvalho atingir esse tamanho. 

De acordo com o plano de manejo, os troncos cortados deverão ficar por cerca de 6 meses no chão da floresta secando naturalmente. Durante esse período, especialistas vão avaliar as deformações nos troncos, que muitas vezes se curvam conforme vão perdendo umidade. Caso essa curvatura seja muito acentuada, o tronco será descartado para uso na reconstrução da Catedral e outras árvores precisarão ser derrubadas. 

Numa segunda fase, os troncos serão transportados até um deposito coberto, onde prosseguirão no processo de secagem por um período entre 12 e 18 meses, para só depois serem trabalhados nas carpintarias. O nível ideal de umidade para se trabalhar com madeira deve ficar numa faixa entre 34% e 42%. Madeira com excesso de umidade fica sujeita ao ataque de fungos, mofo e insetos; quando a madeira fica muito seca existe a perda de celulose, um polímero natural que mantém as fibras unidas. 

Segundo a crítica dos ambientalistas e de muitos especialistas em construção civil, a estrutura do telhado poderia ser feita com elementos metálicos, um material muito mais adequado que a madeira e bem mais resistente no caso de um novo incêndio. Nos dias atuais existe uma infinidade de ligas metálicas disponíveis para esse tipo de uso, o que evitaria a derrubada de tantos carvalhos centenários. 

Outra crítica pertinente diz respeito ao uso de elementos de chumbo para a fixação das peças de madeira, uma das premissas do projeto arquitetônico original. Durante o incêndio da Catedral em 2019, essas peças de chumbo derreteram com as altas temperaturas (o ponto de fusão do chumbo é 327,5° C) e grandes volumes do metal (na forma de vapor metálico) foram liberados na atmosfera. Medições feitas nas cercanias da Catedral logo após o incêndio identificaram altos níveis de chumbo na atmosfera e nos solos. 

O chumbo, só para lembrar, é um metal pesado muito usado na fabricação de tintas e baterias automotivas, entre inúmeras outras aplicações, com um longo histórico de intoxicação de seres humanos. Conforme a dosagem e a exposição, o chumbo pode causar uma série de doenças no sistema nervoso central.  

Durante muitos séculos, redes de abastecimento de água foram fabricadas usando tubulações de chumbo. Um caso clássico foi o da antiga cidade de Roma – muita gente suspeita que as loucuras de muitos imperadores romanos (Nero, por exemplo) foram provocadas pela intoxicação com esse metal. 

Um caso histórico brasileiro foi o de Candido Portinari (1903-1962), que na minha modesta opinião foi um dos maiores pintores de todos os tempos. Ele morreu vítima de intoxicação pelo chumbo presente nas tintas usadas em seus trabalhos. 

Agora, uma provocação: como muitos de vocês devem recordar, houve um grande incêndio no Museu Nacional do Rio de Janeiro em 2018 – grande parte do acervo histórico foi perdido naquela ocasião e a maior parte da construção terminou seriamente danificada.  

Vamos imaginar que, para fins de restauração do telhado do prédio, fosse necessário derrubar mil árvores da Floresta Amazônica a fim de obter o mesmo tipo de madeira que foi usada na construção original. Fico imaginando o tamanho dos pulos que muitos “ambientalistas” franceses estariam dando em protesto. 

Pessoalmente, eu sou obrigado a concordar com os (verdadeiros) ambientalistas franceses nessa questão. Com todo o respeito ao patrimônio histórico do país e à sua preservação, na construção original da Catedral de Notre-Dame e na restauração de 1843, as pesadas vigas de carvalho foram usadas por que esse era o melhor material disponível para esse fim há época. 

Na era das ligas metálicas de titânio e nióbio, ou ainda de materiais compósitos a base de fibra de carbono, nada justifica o sacrifício de tantas árvores centenárias para a construção da estrutura de um telhado. Que Notre-Dame (Nossa Senhora) perdoe minha heresia… 

CICLONE EXTRATROPICAL PROVOCA FORTES CHUVAS NO SUL DA BAHIA E NO NORTE DE MINAS GERAIS 

Fortes chuvas estão castigando o Sul da Bahia e o Norte de Minas Gerais nesses últimos dias. Segundo o último balanço divulgado pela Defesa Civil da Bahia nesta segunda-feira, dia 13 de dezembro, já são mais de 220 mil pessoas afetadas, sendo mais de 15 mil desalojados e mais de 6 mil desalojados. Ao menos 10 pessoas morreram no Estado por causa das fortes chuvas. 

Os municípios mais fortemente atingidos pelas chuvas ficam no extremo Sul da Bahia. A lista inclui Eunápolis, Guaratinga, Itabela, Itanhém, Mucuri, Porto Seguro, Santa Cruz Cabrália, Teixeira de Freitas, Vereda, Jucuruçú, Medeiros Neto, Prado e Itamaraju. Com menores estragos estão as cidades de Mascote, Itacaré, Itabuna, Ilhéus, Canavieiras, Camacan e Belmonte. O Governo da Bahia já declarou situação de emergência em, pelo menos, 51 municípios e o Governo Federal já reconheceu a mesma situação em 24 municípios baianos. 

No Norte de Minas Gerais os municípios em situação mais complicada ficam nas regiões dos vales dos rios Jequitinhonha, Mucuri e Doce. De acordo com meteorologistas, essa região não registrava um volume de chuvas tão grande há mais de quarenta anos. O índice pluviométrico registrado neste último domingo, dia 12 de dezembro, atingiu a marca de 186 milímetros, um volume 47% superior à média histórica

O último balanço da Defesa Civil de Minas Gerais indica que mais de 11.500 pessoas já foram atingidas, sendo mais de 9.500 desalojados e quase 2 mil desabrigados. Ao menos 5 pessoas morreram em consequência dos fortes temporais em território mineiro. O Governo de Minas Gerais já reconheceu a situação de emergência em 31 municípios. 

As cidades mineiras mais fortemente atingidas pelas chuvas são Monte Azul, Serranópolis de Minas, Salinas e Fruta de Leite. Além de impactar o nível dos rios Jequitinhonha, Mucuri e Doce, as águas das chuvas provocaram uma forte elevação no nível do rio São Francisco, porém, sem maiores consequências. Na região de Pedras de Maria Cruz, o nível do rio subiu mais de 4 metros

Fortes chuvas de verão, conforme já comentamos em inúmeras postagens aqui no blog, não deveriam representar nenhuma novidade para um país de clima essencialmente tropical e equatorial. Ano após ano, grande parte do território do país entra na temporada das chuvas e, pressupõe-se, que as nossas cidades apresentassem as mínimas infraestruturas para o escoamento das águas pluviais. 

Infelizmente, não é isso o que acontece: entra ano e sai ano com suas fortes e previsíveis chuvas, com Prefeitos e Governadores apelando por ajuda do Governo Federal para o socorro às vítimas das enchentes e dos desmoronamentos de casas e encostas de morros, além de recursos para a reconstrução de infraestruturas danificadas como ruas, avenidas e pontes. 

Aqui existe um mecanismo que não sei se a maioria dos leitores conhecem: sempre que se declara situação de emergência e/ou de calamidade pública, os Governos locais ficam liberados para usar as verbas públicas emergenciais sem a necessidade de processos com concorrência pública para a prestação de serviços e realização de obras. É uma verdadeira festa com dinheiro público… 

O responsável por essas fortes chuvas está bem distante do Sul da Bahia e do Norte de Minas Gerais – trata-se de um ciclone extratropical que está estacionado no litoral de Santa Catarina. Esse ciclone começou a formar no início da última semana ao longo da costa do Estado do Rio de Janeiro, onde surgiu uma área de baixa pressão. 

Conforme esse ciclone foi se deslocando para o Sul, ele foi se aprofundando em mar aberto e começou a organizar as típicas nuvens de formação ciclônica em espiral. O fenômeno trouxe ar mais frio do mar para o Sul do Brasil, provocando geadas no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, além de provocar um clima típico de inverno na cidade de São Paulo. 

O Norte do Espírito Santo e de Minas Gerais, além do Sul da Bahia, foram atingidos por um sistema frontal induzido por um centro de baixa pressão no Oceano Atlântico, o que vem provocando volumes de chuva “absurdamente altos” nessas regiões. De acordo com medições pluviométricas feitas pelo CEMADEN – Centro Nacional de Prevenção de Desastres, o volume das chuvas atingiu a marca de 450 mm em Itamaraju e 171 mm em Porto Seguro. Ambos os municípios ficam na Bahia

Apesar da forte polarização política entre as autoridades do Governo estadual da Bahia e do Governo Federal, o que já rendeu uma longa lista de acusações e divulgação de informações conflitantes, as populações estão recebendo ajuda. Cestas básicas, roupas e itens de uso pessoal, muitos deles doados por organizações sociais civis, já foram distribuídos. 

O Ministério do Desenvolvimento Regional já anunciou a liberação de R$ 5,8 milhões para os municípios de Eunápolis, Itamaraju, Jucuruçu, Ibicuí, Ruy Barbosa, Maragogipe e Itaberaba. Uma portaria desse Ministério liberou outros R$ 1,2 milhão para ações de emergência em Eunápolis. O Governo Federal também anunciou a liberação de recursos do FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, para as vítimas dos municípios com decretação de situação de emergência.  

Nas regiões afetadas no Norte de Minas Gerais, onde a polarização política é bem menor do que na Bahia, a população também está recebendo ajuda dos Governos Estadual e Federal. Tropas das Forças Armadas também foram autorizadas a atuar no resgate e na realocação de pessoas desabrigadas pelas fortes chuvas. 

Também é fundamental destacar o incansável trabalho das Polícias Militares e Corpo de Bombeiros desses Estados, da Polícia Rodoviária Federal, das equipes da Defesa Civil, além de voluntários e de organizações da sociedade civil. 

De acordo com os meteorologistas, esse ciclone deverá se afastar cada vez mais do litoral e se dissipar em alto mar. Esse afastamento gradual do ciclone deverá resultar em problemas cada vez menores com fortes chuvas na Bahia e em Minas Gerais. 

O verão, época das fortes chuvas nas regiões Centro-Sul e Leste do Brasil, só vai começar oficialmente no dia 22 de dezembro. Isso é sinal que ainda enfrentaremos muitos problemas com fortes chuvas ao longo dos próximos meses. Infelizmente, muitas das tragédias humanas que vimos até agora são apenas referentes ao começo dessa temporada de chuvas. 

PEIXE-LEÃO: UMA ESPÉCIE INVASORA QUE ESTÁ DOMINANDO O MAR DO CARIBE

Na última postagem falamos da Zona Morta do Golfo do México, um verdadeiro “deserto de biodiversidade” que ocupa uma área de mais de 22 mil km2 ao redor do delta do rio Mississipi. Recebendo grandes volumes de resíduos de fertilizantes e de outros produtos químicos, essas águas “férteis” estimulam o crescimento de algas e micro algas. Todo esse ciclo vegetal, incluindo a fase de decomposição das plantas mortas., consome a maior parte do oxigênio dissolvido na água, o que impede ou reduz bastante as condições para a sobrevivência de inúmeras espécies nessa área

A bacia hidrográfica do rio Mississipi, onde encontramos outros grandes rios como o Missouri e o Ohio, é a maior da América do Norte e a terceira maior do mundo, abrigando uma intensa atividade agropecuária, além de ser o lar de dezenas de milhões de norte-americanos e canadenses. As autoridades ambientais lutam para controlar o tamanho dessa Zona Morta. 

Além dessa contaminação química das suas águas, o Mar do Caribe também sofre com a poluição e com o carreamento de resíduos sólidos – veja a postagem sobre a ilha de resíduos plásticos, com vazamentos de petróleo, com a destruição de áreas florestais e de mangues, entre muitos outros problemas ambientais. Um drama recente e que vem ganhando proporções cada vez maiores é a invasão dessas águas por espécies exóticas. Um dos casos mais graves é o dos peixes-leão

Peixe-leão é o nome genérico dado a uma grande variedade de peixes marinhos belos e venenosos dos gêneros Pterois, Parapterois, Crachypterois, Ebosia e Dem dhrochirus, todas pertencentes à família Scorpaenidae. Esses peixes são muito apreciados por aquaristas de todo o mundo, uma característica que está na origem do problema da invasão do Mar do Caribe por essas espécies. 

Extremamente agressivo e voraz, o peixe-leão costuma atacar outras espécies menores que vivem no mesmo aquário. Aquaristas iniciantes, que não conhecem bem o peixe, muitas vezes acabam se decepcionando com esse comportamento e descartam esses animais em rios e praias. Essa foi, muito provavelmente, a história da invasão dos peixes-leão na costa Leste dos Estados Unidos e no Mar do Caribe. Os primeiros exemplares em águas norte-americanas foram avistados em 1985, na costa da Flórida

As diferentes espécies de peixe-leão são originárias da região do Indo-Pacífico, onde são encontrados ao largo dos bancos de corais entre a Austrália e o Leste e Sul da África. Nessas águas, esses peixes possuem diversos predadores naturais como tubarões e garoupas, o que mantém suas populações sob controle. 

A retirada de espécies animais e vegetais do habitat original e a sua introdução em outros ambientes altera substancialmente seu ciclo de vida. Em grande parte dos casos, os novos ambientes não possuem espécies predadoras, o que causa enormes desequilíbrios ambientais, a começar pela concorrência com as espécies nativas.  

Um exemplo que podemos citar é o caso dos eucaliptos, espécie de árvore típica da Austrália que foi introduzida no Brasil no início do século XX. Os coalas (Phascolarctos cinereus), que são mamíferos marsupiais arbóreos australianos, vivem nessas árvores e se alimentam de suas folhas. Aqui no Brasil, os eucaliptos crescem e prosperam praticamente sem qualquer tipo de predador natural. 

Sem enfrentar maiores ameaças, os peixes-leão iniciaram um rápido processo de colonização de toda a costa Leste dos Estados Unidos e, por volta do ano de 2005, os primeiros exemplares passaram a ser encontrados nas águas do Mar do Caribe, primeiro nas praias continentais do Golfo do México e depois nas diversas ilhas oceânicas. A espécie repetiu um feito anterior datado da segunda metade do século XIX, quando os animais atravessaram (por conta própria e sem interferência humana) o Mar Vermelho e o recém aberto Canal de Suez, invadindo as águas do Mar Mediterrâneo.  

Em 2012, circularam as primeiras notícias da chegada da espécie nas ilhas de Trindad e Tobago e, não muito tempo depois, dois exemplares de peixe-leão foram capturados no litoral do Amapá. Aqui é importante citar que existe uma formação natural, uma longa cadeia de recifes de corais que se estende por mais de mil quilômetros entre a Guiana Francesa e a cidade de São Luiz no Maranhão, que pode funcionar como uma trilha para a migração dos peixes. 

Esses corais se situam em profundidades entre 70 e 220 metros, ficando abaixo da pluma de águas doces do rio Amazonas. Essa surpreendente formação, que ocupa uma área estimada em 56 mil km2, só foi identificada em 2016 e os estudos sobre a sua biodiversidade ainda estão em estágio inicial. 

Em dezembro de 2020, um peixe-leão foi capturado por mergulhadores em Fernando de Noronha, arquipélago que fica a mais de 350 km do litoral de Pernambuco. Três outros exemplares foram capturados em agosto de 2021. Segundo os especialistas, é provável que ovas fecundadas da espécie tenham sido arrastadas até o arquipélago pelas correntes marítimas

Um caso intrigante foi relatado por pesquisadores da UFF – Universidade Federal Fluminense, que em maio de 2014, capturou um exemplar de 25 cm numa área rochosa da Prainha, em Arraial do Cabo, Região dos Lagos no Estado do Rio de Janeiro. Em fevereiro de 2016, um outro exemplar foi capturado na mesma região. Os pesquisadores acreditam que a introdução desses animais na região se deve ao descarte feito por algum aquarista – é muito pouco provável que os peixes tenham migrado do Mar do Caribe para o litoral fluminense, um trajeto de mais de 6 mil km. 

Os peixes-leão são considerados mesopredadores, ou seja, comem peixes de pequeno a médio porte. As espécies nativas não o reconhecem como uma ameaça e não fogem instintivamente como fazem ao avistarem seus predadores naturais. Com essa fartura de alimentos e sem ameaças naturais, a espécie cresce descontroladamente, conquistando novos territórios a cada dia. 

Áreas ao redor de ilhas oceânicas costumam abrigar espécies endêmicas, ou seja, que só vivem nessas águas. A chegada de uma espécie exótica e voraz como o peixe-leão poderá resultar numa redução drástica das populações dessas espécies locais, ou mesmo, na extinção desses animais. As regiões mais vulneráveis no litoral brasileiro são as áreas oceânicas ao redor de Fernando de Noronha, do Atol das Rocas, de Martin Vaz e Trindade, além dos penedos ou rochedos de São Pedro e São Paulo. 

A invasão de biomas por espécies exóticas, um tema que já tratamos em uma série de postagens aqui no blog, é um dos maiores problemas ambientais de nossos tempos. O peixe-leão é apenas mais uma espécie invasora em meio a tantas outras em biomas aqui do nosso lado do mundo. 

A “ZONA MORTA” DO GOLFO DO MÉXICO 

Ao longo da costa dos Estados norte-americanos do Texas, Luisiana e Mississipi, na região do Mar do Caribe, existe uma faixa de águas que apresentam níveis extremamente baixos de oxigênio, onde peixes e outros organismos marinhos não conseguem sobreviver. Essa região é conhecida como a Zona Morta do Golfo do México. 

De acordo com estimativas feitas pela NOAA – Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos, na sigla em inglês, essa Zona Morta ocupa uma área de mais de 16 mil km2. A NOAA monitora o problema desde de 1985 – em 2017, essa área superou a marca dos 22,7 mil km2

De acordo com os cientistas, existem Zonas Mortas em áreas oceânicas de todo o mundo – a do Golfo do México é a segunda maior em área. Os baixos níveis de oxigênio dissolvido nesses locais decorrem dos altos níveis de resíduos químicos – especialmente os resíduos de fertilizantes usados na agricultura, que são carreados para o oceano pelas águas do rio Mississipi.

Fertilizantes são fundamentais para a agricultura de alta produtividade moderna. Compostos químicos a base de NPK – nitrogênio, fósforo e potássio, entre outros, fornecem os nutrientes fundamentais para o desenvolvimento das culturas. Entretanto, parte desses fertilizantes acaba sendo arrastada para o curso de riachos e rios pelas águas das chuvas. 

Na água, esses nutrientes estimulam o crescimento de algas e microalgas que, como qualquer planta, consomem oxigênio – nesse caso, falamos do oxigênio dissolvido na alga. Bactérias que se alimentam dos restos dessas plantas também consomem o oxigênio, deixando peixes, moluscos, vermes e outras criaturas aquáticas com baixos níveis de oxigênio para sobreviver. 

Outra fonte importante de nutrientes nas águas são os esgotos, principalmente os esgotos domésticos. A matéria orgânica presente nos esgotos – principalmente as fezes e os restos de alimento, também atuam como nutrientes e contribuem para a proliferação dessas plantas aquáticas e a consequente hipóxia, que é o baixo nível de oxigênio dissolvido nas águas. 

Quando olhamos num mapa a localização da Zona Morta do Golfo do México (vide a imagem fornecida pela NOAA), percebemos claramente a sua localização ao redor do delta do rio Mississipi. Junto com os rios Missouri e Ohio. O Mississipi forma a maior bacia hidrográfica da América do Norte e a terceira maior do mundo, que só fica atrás da bacia Amazônica e a do rio Congo. Ocupando uma área de mais de 3,2 milhões de km2, essa bacia hidrográfica incorpora, total ou parcialmente, 31 Estados norte-americanos e 2 províncias canadenses.  

A bacia hidrográfica dos rios Mississipi/Missouri e Ohio abriga algumas das mais importantes regiões agrícolas do mundo. Um exemplo é o chamado Corn Belt ou o Cinturão do Milhos dos Estados Unidos. Essa região é formada por 12 Estados do Centro, Norte e Nordeste dos Estados Unidos, respondendo por mais de 40% da produção mundial de milho

Além da agricultura intensiva, onde milhões de toneladas de fertilizantes são utilizadas a cada ano, as águas dessa bacia hidrográfica também recebem os efluentes de esgotos de milhares de cidades. Os Estados Unidos possuem uma excelente infraestrutura de saneamento básico em suas cidades, onde praticamente 100% dos esgotos são coletados e tratados. 

Dependendo do tipo de tecnologia utilizada nas ETEs – Estações de Tratamento de Esgotos, o nível do tratamento pode deixar uma pequena parcela dos efluentes – algo entre 2 e 5%, com resíduos. A isso se juntam ligações clandestinas de esgotos, resíduos de fazendas de criação de animais e até mesmo eflúvios (chamado popularmente de chorume) de aterros sanitários.  

Considerando-se apenas o tamanho da população dos Estados Unidos – mais de 330 milhões de habitantes, e da enorme quantidade de propriedades rurais no país, esse “pequeno” volume de resíduos sem tratamento é bastante significativo. O caudal médio no delta do rio Mississipi, que fica no Sul do Estado da Luisiana, é de 12.700 m3/s, volume de água que transporta quantidades fabulosas de nutrientes. 

Segundo informações da NOAA, os maiores problemas são causados pelos nitratos e pelo fósforo. Além do consumo de oxigênio pelas algas e micro algas vivas, a decomposição das plantas mortas também gera um grande consumo de oxigênio – as bactérias que decompõem as plantas também precisam do gás para “respirar”. Com baixos níveis de oxigênio dissolvido nas águas, a região se transforma em um verdadeiro deserto biológico

A grande preocupação das autoridades norte-americanas é o crescimento dessa Zona Morta – nos últimos 5 anos a área tem ficado com um tamanho 2,8 vezes maior que a meta estabelecida, onde a área máxima ficaria dentro de uma faixa de águas com 5 mil km2

Durante a maior parte do ano, essa Zona Morta se mantém inalterada. As águas doces do rio Mississipi demoram a se misturar com as águas salgadas do Mar do Caribe. Esse fenômeno é bastante conhecido e se deve à diferença de temperatura e composição química das águas. Um exemplo é o famoso Encontro das Águas dos rios Amazonas e Negro. No outono, quando a região do Mar do Caribe é tomada por fortes ventos, a agitação das águas ajuda a reduzir o tamanho da área com hipóxia. 

Esse “fenômeno”, conforme já comentamos, não é exclusivo da região do delta do rio Mississipi. Ele se repete em regiões de foz de grandes rios em todo o mundo. Exemplos são as áreas ao redor da foz de rios como o Tamisa, o Reno e o Danúbio, na Europa; o delta do rio Nilo, no Egito, e do rio Volga na Rússia. Também entram nessa lista outros importantes rios da Ásia como o Indo, o Ganges, o Mekong e o Yangtzé

Aqui na América do Sul temos o exemplo do rio da Prata, na divisa entre a Argentina e o Uruguai. Apesar de ainda estar muito longe do tamanho do problema no Golfo do México, o volume de nutrientes que tem chegado nesse rio vem aumentando progressivamente ao longo das últimas décadas. 

O rio da Prata é o trecho final da segunda maior bacia hidrográfica da América do Sul. Entre os seus grandes rios formadores temos os rios Paraná, Paraguai, Negro, UruguaiPilcomayoBermejo Salado, entre muitos outros. Essa bacia hidrográfica ocupa uma área superior a 4,3 milhões de km2 no Brasil, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai

Aqui no Brasil, somente para exemplificar, essa bacia hidrográfica está inserida em uma grande extensão do Cerrado, bioma onde as atividades agropecuárias mais cresceram no país nas últimas décadas. Outro bioma importante é a Pampa Argentina e Uruguaia, e sua extensão em território brasileiro – os Pampas Sulinos

Além dos volumes crescentes de resíduos de fertilizantes agrícolas, essas águas recebem grandes quantidades de resíduos orgânicos presentes nos esgotos domésticos de uma infinidade de cidades (aqui na América do Sul, ao contrário dos Estados Unidos, as cidades não tem maiores preocupações com a coleta e tratamento de esgotos), além de imensos volumes de resíduos gerados por fazendas de criação de animais. 

Dentro de muito pouco tempo, desgraçadamente, o rio da Prata poderá se transformar em um sério “concorrente” ao Mar do Caribe no quesito Zona Morta… 

A SURPREENDENTE BIODIVERSIDADE ENCONTRADA EM UMA DAS ILHAS DE RESÍDUOS PLÁSTICOS DO OCEANO PACÍFICO

Além dos imensos problemas ambientais que se desenrolam nas grandes florestas do mundo, onde o grande destaque é a Floresta Amazônica, nossos oceanos e mares não estão em uma situação nada melhor. Aqui é importante lembrar que, ao contrário dos discursos de muitos famosos, políticos e ambientalistas internacionais, o verdadeiro pulmão do mundo são as algas e o fito plâncton que vivem nas águas salgadas dos mares e oceanos. 

Os problemas são muitos, a começar pelas grandes mudanças que o aquecimento global vem provocando. Com temperaturas mais altas, o gelo das regiões polares e das grandes cadeias de montanhas está derretendo, despejando fabulosos volumes de água doce nos oceanos. Isso está provocando mudanças em importantes correntes marítimas, o que prejudica a fauna e a flora oceânica, além de provocar mudanças nas grandes massas de nuvens e nas chuvas em muitas regiões

Também não são pequenos os problemas provocados por derramamentos de petróleo, acidentes cada vez mais frequentes. Um outro problema que não é novo, mas que vem crescendo cada vez mais são as chamadas “zonas mortas” – grandes extensões de água sem vida marítima, um fenômeno que vem sendo provocado pelo despejo de águas altamente poluídas de rios, principalmente com resíduos de fertilizantes e pesticidas usados na agricultura. 

Hoje gostaria de focar no problema da poluição dos mares e oceanos por resíduos plásticos. Em postagens anteriores já tratamos desse assunto, onde mostramos as grandes ilhas formadas por resíduos de plástico flutuante no Oceano Pacífico e no Mar do Caribe

A palavra plástico vem do grego plassein, o que significa moldável e exprime as características de mudança da forma física dos materiais. Os primeiros experimentos com o material datam da década de 1860, quando o inventor inglês Alexander Parkes iniciou seus estudos com o nitrato de celulosa, um material sólido bastante flexível, resistente a água, de cor opaca e com boa aderência para a pintura com tinta – esse material ganhou o nome de parquesine e é considerada a primeira matéria plástica a ser criada. 

Na década de 1870, após sucessivos aperfeiçoamentos, surgiu a celuloide, a primeira versão comercial do plástico, utilizado inicialmente pelos dentistas na fabricação de próteses dentárias e pelos fabricantes de bolas de bilhar, que buscavam uma alternativa ao caro marfim animal. O celuloide ganhou fama mundial com o surgimento do cinema, quando os rolos dos filmes eram fabricados com esse material. 

Em 1909 surgiu a baquelite, o primeiro polímero sintético com alto grau de dureza, resistência ao calor e ótimo isolamento elétrico, com larga aplicação na confecção de produtos elétricos e de telefonia, discos, e mais tarde na fabricação das caixas dos rádios, popularizados a partir da década de 1920. 

Na década de 1930 surgiu a poliamida, conhecida comercialmente como nylon, usada intensamente durante a II Guerra Mundial (1939-1945) na fabricação de paraquedas, equipamento novo e decisivo em muitas batalhas. O esforço industrial mundial durante esse conflito levou à criação de toda uma gama de polímeros como o drácon, o isopor, o vinil, o polietileno e o poliestireno. Após o término da Guerra em 1945, os diferentes tipos de plásticos passaram a fazer parte do cotidiano do homem moderno, utilizado na fabricação de todos os tipos de produtos, utensílios e, especialmente, nas embalagens.  

Entre a grande lista de qualidades desses materiais, existe uma que raramente é citada: o plástico comum é, virtualmente, indestrutível, o que cria todo o tipo de problemas com os resíduos a base de polímeros plásticos. Um exemplo: uma garrafa PET (Polietilenotereflalato) pode levar até 200 anos para se decompor na natureza. Descartados sem maiores cuidados, os resíduos plásticos causam enormes problemas para o meio ambiente, especialmente quando são arrastados para as águas dos oceanos e mares. 

Os oceanos e mares cobrem 71% da superfície do planeta Terra, o que corresponde a cerca de 362 milhões de km², onde encontramos aproximadamente 1,3 bilhão de km³ de água. Nesse mundo de águas encontramos a maior “floresta” do mundo, formada pelas mais diferentes espécies de algas, microalgas e fito plâncton. Essas plantas geram perto de 54% do oxigênio liberado na atmosfera do planeta

De acordo com estudos da organização ambientalista WWF – World Wildlife Fundcerca de 10 milhões de toneladas de resíduos de plástico chegam aos oceanos todos os anos. Esse volume corresponde a 1/10 de toda a produção de plástico do mundo.   

Estudos do PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, indicam que existem atualmente 18 mil fragmentos visíveis de plásticos flutuando em cada quilômetro quadrado de mar – é indeterminada a quantidade de resíduos que está submersa nos oceanos. As sacolas plásticas, como as de supermercados tão presentes em nosso dia a dia, representam até 27% desse lixo flutuante dos oceanos, segundo algumas medições já feitas

Grandes ilhas flutuantes formadas por resíduos plásticos passaram a ser encontradas nos oceanos, especialmente a partir da década de 1980. Um exemplo é uma grande ilha de resíduos plásticos que foi descoberta no Oceano Pacífico em 1997. Segundo cálculos de oceanógrafos, essa “ilha” chega a ocupar uma área de 1,2 milhão de km2, o que equivale a soma das áreas dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás. O volume dos resíduos plásticos é estimado em 4 milhões de toneladas

Pesquisadores dos Estados Unidos e do Canadá descobriram recentemente que uma dessas ilhas de resíduos plásticos no Norte do Oceano Pacífico está sendo “colonizada” por plantas e animais marinhos de áreas costeiras do Oeste desses países. Essa biodiversidade inclui, entre outras espécies, anêmonas, moluscos, caranguejos e insetos marinhos. Os espécimes foram encontrados em 90% dos resíduos plásticos flutuantes. 

Um conceito chave na biologia é o que diz que os espécimes mais aptos, ou seja, os indivíduos que melhor se adaptam às condições de um determinado ambiente, são os que sobrevivem. Um animal que consegue se alimentar, por exemplo, de uma planta que outros animais desprezam, terá uma grande vantagem competitiva e poderá gerar toda uma linhagem de animais que, ao longo do tempo, poderão se constituir em uma nova espécie. 

O que está acontecendo nessa ilha de resíduos flutuantes, e que pode estar se repetindo em outras dessas ilhas, é que diversas espécies de plantas e de animais conseguiram identificar uma oportunidade de sobrevivência nesses locais e estão se adaptando para a vida num meio ambiente “hostil”. Plantas e insetos formam a base da cadeia alimentar, atraindo espécies maiores de predadores, formando assim novos ecossistemas. 

Ao mesmo tempo em que esses eventos são um triunfo da evolução dessas espécies, não deixa de ser um fato lamentável. Com a destruição de seus antigos habitats por ações humanas, essas espécies, ironicamente, encontraram um novo nicho ecológico justamente em um “produto” de outra tragédia ambiental. 

Se não acontecer uma mudança drástica no gerenciamento e um descarte adequado dos resíduos plásticos gerados pela humanidade, surgirão cada vez mais “ilhas flutuantes“ nos oceanos prontas para serem colonizadas por plantas e animais marinhos.