A soja é uma planta da família das leguminosas que produz um grão muito rico em proteína e sais minerais como o potássio, cálcio, magnésio, fósforo, cobre e zinco. A espécie foi criada há cerca de 5 mil anos atrás na China a partir do cruzamento de duas espécies selvagens. A soja é, desde a antiguidade, empregada na alimentação humana na forma de óleos, molhos, leites, proteínas e “queijo” do tipo tofu, além de ser largamente utilizada na produção de ração para animais.
Cultivada tradicionalmente em países do Extremo Oriente e Sudeste Asiático, a soja foi trazida para os Estados Unidos no século XIX, se adaptando perfeitamente bem ao clima local. As primeiras experiências de plantio da soja por agricultores no Brasil foram feitas na década de 1920 na região Noroeste do Rio Grande do Sul. Albert Lehenbauer, um missionário luterano norte-americano, distribuíu sementes da espécie que trouxe do seu país para os agricultores pobres da região, imaginando que as plantas se adaptariam ao clima local que é bem semelhante ao de algumas regiões dos Estados Unidos.
Rapidamente, os pequenos agricultores gaúchos perceberam o enorme potencial da soja para a alimentação e engorda de animais, especialmente os porcos, e a cultura começou a se espalhar rapidamente na região de entorno do município de Santa Rosa, berço da cultura. A produção em larga escala só começaria na década de 1940 e o grão começaria a ganhar cada vez mais espaços nas terras de clima subtropical da região Sul do Brasil.
O grande salto na cultura da soja veio em meados da década de 1970, quando a EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias, conseguiu desenvolver sementes adaptadas aos solos e ao clima do Cerrado brasileiro. Ocupando quase 2 milhões de km², os solos do bioma Cerrado eram considerados de baixíssima fertilidade e totalmente inadequados para uma produção agrícola em larga escala. As novas variedades de soja, e depois de milho, promoveram uma verdadeira revolução agrícola nessa região, que foi transformada no “celeiro do Brasil”.
Dentro da estratégia de ocupação de todo o território brasileiro que vinha sendo desenvolvida por sucessivos Governos desde o início do século XX, milhares de famílias de agricultores sem-terra, principalmente da Região Sul, receberam inúmeros estímulos para migrarem para as terras de fronteira do Centro-Oeste brasileiro e da Amazônia. Inúmeras estradas passaram a ser abertas, destacando-se as rodovias Cuiabá-Porto Velho, a Cuiabá-Santarém, a Porto Velho-Manaus, a Belém-Brasília, além da icônica Rodovia Transamazônica.
Um dos slogans mais usados nas campanhas governamentais de estímulo à migração era “Amazônia: uma terra sem homens para homens sem-terra“. Muitos dos brasileiros que passaram a ocupar largas extensões da Região Centro-Oeste acreditavam inicialmente que tinham se mudado para a Amazônia, quando na verdade estavam ocupando áreas de Cerrado.
A origem dessa confusão, que ainda hoje vem causando inúmeros problemas para o Brasil, tem a ver com um conceito criado em meados da década de 1950. Em 1953, o Governo Getúlio Vargas criou a SPVEA – Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia. Além de abranger todos os territórios do bioma Amazônico e que eram efetivamente cobertos pela Floresta Amazônica, essa política criou o conceito da Amazônia Legal.
Para estender uma série benefícios fiscais a muitos dos aliados políticos do Governo e que foram criados especificamente para a região da SPVEA , os limites da Amazônia foram estendidos, passando a compreender todo o território dos atuais Estados de Mato Grosso e Tocantins, e também o Maranhão. Somadas, as áreas desses três Estados totalizam cerca de 1,5 milhão de km², porém, bem menos de 500 mil km² correspondem as áreas localizadas dentro do bioma Amazônico – a maior dessas terras pertencem ao bioma Cerrado.
As terras de domínio do bioma Cerrado se transformaram na grande fronteira agrícola do Brasil. A ocupação começou por áreas do bioma nos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul (que antes fazia parte de Mato Grosso), se estendendo depois para o Tocantins (que formava o Norte do Estado de Goiás) e Mato Grosso. Atualmente, o avanço da fronteira agrícola está concentrado na região conhecida como MATOPIBA, que abrange terras do Cerrado no Maranhão, Tocantins, Piauí e Oeste da Bahia.
Esse conceito da Amazônia Legal está na raiz de grande parte das notícias que circulam nos meios de comunicação internacionais sobre as queimadas e ocupação de áreas da “Amazônia”. O que para nós brasileiros são áreas do bioma Cerrado, para os estrangeiros são trechos da Floresta Amazônica que foram completamente desmatados e transformados em campos agrícolas e em pastagens para gado. Falta muita informação e sobra má fé entre muitos Governos estrangeiros que tem suas próprias ideias sobre o “futuro da Amazônia“.
O Cerrado é um importantíssimo bioma, conhecido como “berço das águas” do Brasil. Algumas das principais bacias hidrográficas brasileiras como as dos rios Paraná, Tocantins-Araguaia, São Francisco e Paraguai, tem as suas principais nascentes ou parte delas em áreas do Cerrado. Pela sua enorme importância, os recursos naturais do bioma precisam ser protegidos da melhor maneira possível ante o avanço das frentes agrícolas. Entretanto, é preciso informar ao mundo que Cerrado e Floresta Amazônica são dois biomas distintos.
De acordo com informações do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a produção brasileira de grãos em 2020 foi estimada em 240 milhões de toneladas – metade dessa produção ficou por conta da soja. As áreas do Cerrado foram responsáveis por 51% da produção de soja do país, uma participação que deverá crescer substancialmente nos próximos anos. Ou seja, além de ser o país do samba e do carnaval, do jeitinho (capacidade de impovisação dos brasileiros) e das jabuticadas, o Brasil se transformou na terra da soja.
Segundo a ABIOVE – Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais, a área ocupada pela soja no Cerrado passou de 7,5 milhões de hectares em 2000/2001 para 18,2 milhões de hectares nos anos 2018/2019, com um aumento de produtividade de 30%. Estimativas indicam que será possível dobrar a área plantada de soja no Cerrado nos próximos 10 anos apenas com o reaproveitamento de áreas de pastagens subutilizadas no bioma, ou seja, será possível plantar mais sem desmatar.
A CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento, está muito otimista e projeta um aumento de até 8% na produção brasileira de grãos nessa safra 2020/2021, o que é um número surpreendente em meio a todos os problemas criados pela pandemia da Covid-19. O país deverá colher perto de 278 milhões de toneladas de grãos.
Além da soja, transformada na rainha dos campos brasileiros e que poderá alcançar uma produção de mais de 133 milhões de toneladas, existem ótimas expectativas para a produção de milho, arroz, feijão e algodão. O milho deverá atingir a marca de 113 milhões de toneladas, o arroz 12 milhões de toneladas e o feijão 3 milhões de toneladas. Grande parte da produção desses outros grãos vem do Cerrado.
A colheita da soja, que já deveria ter sido finalizada em janeiro, foi bastante prejudicada por chuvas acima da média em Mato Grosso, o maior produtor brasileiro do grão. De acordo com informações do canal de informações agrícolas Rural Business, existe uma enorme fila de navios cargueiros estrangeiros aguardando a chegada dessa soja em vários portos brasileiros. Até o último dia 15, eram 208 embarcações já atracadas e/ou a caminho do Brasil. O destino da maior parte dessa soja é a China.
Entre os anos de 1975 e 2019, o consumo de soja pela China aumentou cerca de 1.400%, passando de 7 milhões de toneladas para um fabuloso montante de mais de 105 milhões de toneladas. Os chineses compram mais de 80% da produção brasileira de soja e dos seus derivados. Se a situação econômica do Brasil foi muito ruim em 2020 por causa da pandemia da Covid-19, ela teria sido infinitamente pior sem a heroica produção de nossos agricultores, principalmente daqueles que produzem a soja.
Continuaremos na próxima postagem.
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