OS PERIGOSOS CACOS DE VIDRO

cacos-de-vidro

Tirando alguns dias de folga na praia, mas de olho nos acontecimentos.

Recebi esta imagem na minha conta da rede social e, como falei muito dos problemas associados aos resíduos sólidos nas minhas últimas postagens, não poderia deixar de compartilhar aqui no blog e fazer alguns comentários.

Os acidentes com objetos perfurocortantes são frequentes entre os coletores de resíduos, muito mais frequentes do que você pode imaginar. Nesse período de festas de fim de ano, quando cresce muito o consumo de bebidas engarrafadas, é fácil observar que há um aumento considerável do volume de vidros descartados tanto nas residências quanto nos bares e restaurantes – além das garrafas inteiras, aumenta também a quantidade dos cacos de vidro – depois da segunda ou da terceira dose de bebida, muita gente fica com os reflexos prejudicados e sempre há o risco de quebrar um copo ou uma garrafa de vidro.

Um detalhe importante que você poderá observar na imagem é que o coletor está segurando as luvas (com a mesma mão que segura o saco plástico) – esse EPI (Equipamento de Proteção Individual) é indispensável para qualquer profissional que manipule materiais perfurocortantes – cacos de vidro, entulhos, aparas e limalhas de metal, lixo hospitalar (onde encontramos as perigosas agulhas das injeções), podas de árvores e arbustos etc. Se você prestar um pouco mais de atenção verá que o ferimento aconteceu no antebraço, que está exposto. Aliás, se formos seguir a risca as regras de segurança, o profissional deveria estar usando uma camisa de tecido grosso e com mangas compridas e calças – mas vamos e convenhamos: sair correndo atrás de um caminhão de coleta usando roupas grossas não é nada fácil.

Cacos de vidro e outros resíduos perfurocortantes devem ser embrulhados com jornal ou papelão ou acondicionados em uma embalagem fechada (caixa de leite longa vida, garrafa PET, lata com tampa etc.) de forma a não representarem riscos para os profissionais da coleta. Melhor ainda será você separar os resíduos seguindo a classificação da reciclagem: vidro, papel, plástico e metais; se não existe coleta seletiva na sua cidade, verifique se existe algum ponto de coleta de resíduos recicláveis ou entregue o material separado para um coletor de materiais recicláveis (também conhecidos como carroceiros ou catadores). Você evitará os acidentes e ainda estará ajudando na preservação do meio ambiente.

Um bom final de ano a todos!

Publicidade

CHEGOU O VERÃO: UMA ESTAÇÃO DE ALTOS E BAIXOS

represa-jaguari

Fim de ano chegando. Vamos deixar de lado por enquanto a questão dos resíduos sólidos e falar novamente de um tema fundamental: a água.

Às 8h44 da manhã deste dia 21 de dezembro começa oficialmente o Verão aqui na minha região – onde não existe horário de Verão ou o fuso horário não é o de Brasília, deve-se fazer a respectiva correção do horário. Época de férias para muita gente e estação ansiosamente esperada pelos amantes do calor, das praias, dos banhos de rio e de muita bebida gelada.

Para quem vive na Região Metropolitana de São Paulo o Verão chega com, pelo menos, uma boa notícia: o Sistema Cantareira, nosso principal manancial de abastecimento de água, está próximo do nível de 46% – há exatamente um ano atrás este índice era de – 2,7%, ou seja, estávamos começando o Verão com o Sistema no volume morto e com as autoridades e população fazendo todo o tipo de esforço para economizar água. Felizmente, este período de calor se inicia com um volume de água bem mais confortável, porém com a recomendação de muita cautela e moderação no consumo.

Enquanto alguns respiram aliviados, muitos vivem dias angustiantes – a Região Nordeste passa pelo pior período de estiagem em muitas décadas. Iniciada em 2012, a seca já dura quase cinco anos, afetando 34 milhões de pessoas, tendo causado prejuízos econômicos de mais de R$ 100 bilhões.

No Estado do Ceará, os dados oficiais (20/12/2016) indicam que o volume total de água armazenada nos 153 reservatórios está com um índice de 6,9%; no Alto Sertão Pernambucano, os reservatórios de Entremontes, Saco II e Boa Vista possuem, respectivamente, os volumes armazenados de 1,4%, 4,4% e 0,9% (20/12/2016). O maior reservatório de água da Região Nordeste, a represa de Sobradinho na Bahia, poderá chegar ao final deste ano em um nível próximo de 0% caso as chuvas na bacia hidrográfica do Rio São Francisco não se intensifiquem.

Nosso país, com dimensões continentais, tem uma distribuição de água bastante irregular de uma região para outra: na Amazônia, onde vive 10% da população brasileira, encontramos 70% das reservas superficiais de água do país; já na Região Nordeste e no Estado de São Paulo, onde vivem mais de 1/3 da população brasileira, as reservas de água superficiais correspondem, respectivamente, a 3% e 1,6% do total – mesmo em condições climáticas normais, o abastecimento da população já é crítico: em períodos de estiagem a situação fica caótica. Com as mudanças climáticas que são já perceptíveis em todo o planeta e com a tendência do consumo de água apontar para uma alta contínua, a situação tende a piorar ainda mais.

Como sempre, continuaremos a esperar que o bom senso e a competência técnica prevaleçam e deixemos de depender única e exclusivamente da vontade dos céus (em todos os sentidos) para nos fornecer a tão preciosa água.

Um país minimamente sério não poderá prosperar em meio a tantos altos e baixos.

barragem-do-jua

RESÍDUOS SÓLIDOS DO COMÉRCIO, OU A LOGÍSTICA REVERSA COLOCADA EM PRÁTICA

logistica-reversa

Existe uma região de comércio popular da cidade de São Paulo que, nessa semana que antecede o período das festas de fim de ano, chega a receber mais de 1 milhão de visitantes a cada dia: a Rua 25 de Março. Considerada o maior centro comercial da América Latina, a região concentra uma infinidade de empresas varejistas e atacadistas, especialmente dos ramos de tecidos, confecções e acessórios, papelaria e armarinhos; em ruas próximas existem pólos especializados em plásticos, equipamentos para cozinha, metal-mecânica, confecções para noivas, sem contar com o Famoso Mercado Municipal da Cantareira – o Mercadão.

Além de um comércio regular altamente organizado, a região atrai uma multidão de comerciantes irregulares, os conhecidos camelôs ou, no dito popular, marreteiros, que comercializam de tudo, desde alimentos até os produtos “genéricos” importados via Paraguai.

A maior parte dos resíduos sólidos do comércio é formada por embalagens: caixas de papelão, plásticos e isopor, espumas (usadas na proteção de produtos frágeis), sacarias, paletes e caixas de madeira; em menor escala, são descartados produtos defeituosos ou quebrados e resíduos de escritório como papeis, plásticos e itens descartáveis em geral. Centros comerciais como a Rua 25 de Março normalmente são muito organizados, com empresas e comerciantes participando de associações comerciais próprias, com boas estruturas de coleta e destinação dos resíduos gerados diariamente – ruas limpas e acessíveis são fundamentais para o acesso da clientela e bom funcionamento das atividades das lojas.

Na Rua 25 de Março e em outros centros comerciais da cidade de São Paulo os maiores problemas são os resíduos gerados pelo comércio irregular, que abandona montanhas de lixo nas ruas e calçadas dia após dia. Com alguma frequência, batalhas campais entre camelôs e autoridades do poder público, incluindo-se fiscais, Policiais Militares e Guardas Civis Metropolitanos da cidade de São Paulo, se desenrolam nessas ruas para coibir esse comércio irregular – bastam poucos dias para as ruas e calçadas voltarem a ser tomadas por vendedores ambulantes.

Além dos resíduos sólidos tradicionais, as empresas comerciais terão, mais cedo ou mais tarde, de se preocupar com um novo problema: a logística reversa que obriga os estabelecimentos comerciais a receberem de volta produtos em ciclo final de vida e embalagens, procedimento já comum em países desenvolvidos. Um exemplo são os pneus usados, que já são recolhidos pelos revendedores e encaminhados para os fabricantes, responsáveis pela destinação final dos resíduos – fragmentos de pneus são adicionados na massa asfáltica usada na pavimentação de ruas, avenidas e rodovias; outra parte dos fragmentos são queimados para geração de energia em fábricas de cimento.

Um dos grandes problemas a ser enfrentado pelo comércio, que é também um dos maiores desafios da atualidade, são os resíduos tecnológicos – computadores, celulares, monitores, televisores, pilhas e baterias, lâmpadas eletrônicas entre outros, que crescem exponencialmente e, de acordo com a legislação vigente, devem ser entregues aos revendedores, que são obrigados a dar uma destinação ambiental correta. A maioria das empresas comerciais não está estruturada para atender essa demanda e a maioria dos consumidores não sabe dessa obrigatoriedade – no vácuo existente, milhões de aparelhos eletro-eletrônicos são descartados junto com o lixo comum e encaminhados para os lixões e aterros sanitários – só para lembrar, esses resíduos possuem grandes quantidades de produtos tóxicos e metais pesados como o mercúrio das baterias, elemento altamente nocivo. Outro problema: quem vai pagar esta conta? Acreditar que o comércio vai arcar sozinho com este custo é ingenuidade.

Enquanto isso, alguns fatos curiosos acontecem: um incidente ocorrido na região da Rua 25 de Março resume bem o clima de animosidade que deverá tomar conta do comércio dentro em breve: um caminhão com 15.000 lâmpadas fluorescentes queimadas estacionou na frente de uma loja de 100 metros quadrados, pronto para realizar a logística reversa – a loja não tinha a menor condição de receber os resíduos e foi necessária muita conversa para chegar-se a um acordo entre as partes.

Imaginem a confusão que acontecerá no comércio no momento em que todos os consumidores passarem a fazer a logística reversa e abarrotarem as lojas com celulares, computadores, monitores, televisores, pilhas, baterias e tudo mais?

OS RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL

entulho-construcao-civil

O “cenário” mostrado na imagem que ilustra essa postagem se tornou frequente em alguns bairros aqui da cidade de São Paulo (imagino que em muitas outras cidades também) – proprietários de caminhões do tipo caçamba são contratados para transportar resíduos da construção civil (a cidade possui dezenas de Ecopontos oficiais aptos a receber esses resíduos), porém descarregam os materiais criminosamente em calçadas de ruas de pouco movimento; raramente as autoridades conseguem flagrar essas ações ou identificar as placas dos caminhões.

Os resíduos da construção civil são há muito tempo um grande problema das áreas urbanas do nosso país. A falta de planejamento urbano e de fiscalização, aliada às sucessivas crises econômicas, resultaram em gigantescas áreas urbanas em construção contínua – as casas das periferias sempre recebem um “puxadinho” a mais, uma complementação de acabamento ou a construção de mais um andar para acomodar melhor a família em crescimento (o que reflete a falta de uma política séria para construção de habitações populares). O resultado é a produção contínua e o descarte irregular de entulhos por todos os cantos das cidades – esse tipo de resíduo chega a representar 70% de todos os resíduos sólidos gerados por uma cidade.

Para tentar colocar um pouco de ordem nesse cenário caótico, o CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente, publicou em 2002 a Resolução 307 que estabeleceu as normas, diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil.

Os resíduos da construção civil passaram a ser divididos em 4 Classes:

I – Classe A – são os resíduos reutilizáveis ou recicláveis como agregados, tais como:

  • a) de construção, demolição, reformas e reparos de pavimentação e de outras obras de infraestrutura, inclusive solos provenientes de terraplanagem;
  • b) de construção, demolição, reformas e reparos de edificações: componentes cerâmicos (tijolos, blocos, telhas, placas de revestimento etc.), argamassa e concreto;
  • c) de processo de fabricação e/ou demolição de peças pré-moldadas em concreto (blocos, tubos, meios-fios etc.) produzidas nos canteiros de obras;

Esses resíduos devem ser encaminhados diretamente para as empresas que realizam a reciclagem dos materiais ou encaminhados para os locais para armazenamento e uso futuro;

II – Classe B – são os resíduos recicláveis para outras destinações, tais como: plásticos, papel, papelão, metais, vidros, madeiras e gesso. Os resíduos devem ser separados nos canteiros de obra e encaminhados para cooperativas de reciclagem ou diretamente para empresas que utilizam e reciclam esses materiais;

III – Classe C – são os resíduos para os quais não foram desenvolvidas tecnologias ou aplicações economicamente viáveis que permitam a sua reciclagem ou recuperação. Esses resíduos devem ser separados nos canteiros e destinados conforme a orientação da norma específica;

IV – Classe D – são resíduos perigosos oriundos do processo de construção, tais como tintas, solventes, óleos e outros ou aqueles contaminados ou prejudiciais à saúde oriundos de demolições, reformas e reparos de clínicas radiológicas (o que nos faz recordar o grave acidente com o Césio-137 em Goiânia em 1987) , instalações industriais e outros, bem como telhas e demais objetos e materiais que contenham amianto ou outros produtos nocivos à saúde. Esses resíduos devem ser separados nos canteiros e destinados conforme a orientação da norma específica.

Porém (sempre existe um, porém), passados catorze anos desde a publicação desta Resolução, testemunhamos diariamente que falta fiscalização e punições para quem desrespeita a Legislação vigente. Montanhas de entulhos ocupam calçadas, terrenos baldios, margens de corpos d’água e matas ciliares; em épocas de chuvas, como já testemunhamos neste início de Verão, vemos mais uma vez as enchentes e os problemas associados. Entulhos também são o ambiente ideal para a procriação de vetores como as baratas e escorpiões (que adoram comer baratas).

Algum dia, nós ainda veremos as Leis “pegarem” neste país…

FALANDO UM POUCO SOBRE OS VETORES

mosquito

Verão chegando, chuvas frequentes, resíduos sólidos (especialmente os orgânicos), enchentes e descaso do poder público – a somatória de tudo isso nos força a acender uma luz amarela de atenção para um problema sanitário dos mais sérios: o controle dos vetores.

Qualquer ação antrópica, ou seja – realizada pelos seres humanos, no meio ambiente vai causar algum tipo de perturbação no meio natural. O delicado equilíbrio entre plantas, animais, insetos, fungos, bactérias, vírus e meio natural, conquistado ao longo de milhões de anos, é subitamente alterado e algumas populações de seres vivos tem sua população subitamente aumentada, com grande potencial de causar danos sobre as populações humanas.

Entre esses seres vivos existem alguns grupos que são chamados animais sinantrópicos – são animais e insetos que se adaptaram a uma vida próxima aos seres humanos independentemente da vontade desses, ao contrário dos animais que foram domesticados propositadamente. O maior exemplo são os ratos (chamados também de ratazanas e gabirus, conforme a região). Originário das estepes da Ásia Central, os ratos se aproximaram das antigas populações humanas em busca de alimentos. Acompanharam as longas migrações destas populações por extensos territórios e se instalaram nos subterrâneos das cidades que foram sendo criadas ao longo dos séculos. Embarcando como clandestinos em navios, se espalharam por todos os continentes, com exceção da Antártida. Restos de comida descartados no lixo doméstico são os principais responsáveis pelo sustento e manutenção das populações dos ratos urbanos que, por isso, merecem todo o nosso cuidado no descarte e no acompanhamento da sua destinação pelos serviços públicos de coleta. Só para relembrar, esses animais são transmissores da peste bubônica (transmitida por pulgas que morderam o rato) e da leptospirose, que é transmitida pela urina do rato especialmente através das enchentes.

Além dos ratos, a lista dos animais sinantrópicos inclui: abelhas, aranhas, baratas, carrapatos, escorpiões, formigas, lacraias ou centopeias, morcegos, moscas, mosquitos, pombos, pulgas, taturanas, vespas entre outros. Esses animais e insetos podem transmitir doenças e causar problemas à saúde do homem e dos outros animais – por isso, merecem especial atenção das autoridades da área de saneamento ambiental e da saúde, que devem desenvolver ações de controle e erradicação dessas verdadeiras pragas urbanas. Neste link do Centro de Controle de Zoonoses da Cidade de São Paulo você terá acesso a uma lista completa das doenças e problemas de saúde que podem ser provocados por esses insetos e animais.

Quero destacar um grupo de insetos em particular, que ao longo dos últimos anos vem causando sérios problemas de saúde à grande parte da nossa população e que estão totalmente associados ao saneamento ambiental: os mosquitos.

No seu ciclo de vida, um mosquito passa por uma metamorfose completa, passando pelas fases de ovo, larva, pupa e, finalmente, chegando à fase adulta. As três primeiras fases da vida de um mosquito dependem da presença de água parada – resíduos descartados de forma irregular acumulam as águas das chuvas e se transformam em verdadeiros berçários para as diversas espécies de mosquitos, com destaque para as espécies Aedes aegypti e Anopheles.

O famoso e temido mosquito Aedes aegypti é um dos vetores mais disseminados no território brasileiro e causador das epidemias de dengue há várias décadas e, mais recentemente, passou a transmitir também a Zika e a febre Chikungunya. O mosquito Anopheles, representado por dezenas de espécies no Brasil, é o principal transmissor da malária, especialmente na região amazônica. De acordo com a Revista Veja, até o dia 11 de junho de 2016 foram registrados no Brasil 165.932 casos suspeitos de zika, dos quais 66.180 já foram confirmados, 1.345.286 casos prováveis de dengue e 137.808 casos prováveis da febre Chikungunya, dos quais 32.679 foram confirmados. A mesma publicação informa que foram confirmadas este ano 318 mortes por dengue, 3 mortes por Zika e 17 mortes por febre Chikungunya.

A principal forma de combater todas essas doenças é eliminar os criadouros dos mosquitos – os recipientes que acumulam as águas das chuvas (destaque para os resíduos sólidos e da construção civil descartados irregularmente) e também os reservatórios domésticos de água (caixas d’água, tambores, baldes e latas). Todos nós precisamos arregaçar as mangas e fazer a nossa parte, eliminando qualquer tipo de reservatório que possa acumular água das chuvas e tampando corretamente os reservatórios domésticos de água, sem ficar esperando as providências das “otoridades”.

Sem esse esforço de todos, o “bicho” vai pegar nesse Verão.

RESÍDUOS SÓLIDOS, CHUVAS E ENCHENTES, OU RELEMBRAR É VIVER

alagamento

Estamos a poucos dias do início oficial do Verão, mas as típicas chuvas do período já chegaram com força – somente no Estado de Minas Gerais 7 pessoas morreram nas últimas 24 horas em decorrência das enchentes, deslizamentos e da falta de prevenção e de planejamento na execução de obras contra os efeitos da chuva. Infelizmente, entra ano e sai ano e as coisas não mudam.

Uma imagem dos telejornais que me chamou a atenção mostrava um rapaz com água acima dos joelhos tentando desobstruir um dreno que estava tomado por sacos de lixo em uma rua de Belo Horizonte  – ao redor, dezenas de pessoas se esforçando para vencer o alagamento ou buscando refúgio e locais mais altos. Como costumo citar com “irritante” frequência nas minhas postagens, os resíduos sólidos têm grande responsabilidade na formação de pontos de alagamentos localizados. Moradores das cidades, preocupados em descartar rapidamente os resíduos sólidos gerados em suas casas, colocam os sacos plásticos na rua em horários que antecedem em muito a passagem das equipes de coleta – expostos, esses sacos plásticos acabam rasgados e revirados por animais que procuram alimentos, por catadores de sucata em busca de latas de alumínio e outros materiais recicláveis, caem dos suportes ou dos muros por força do vento – em períodos de fortes chuvas esses resíduos são arrastados pelas enxurradas e acabam bloqueando as bocas de lobo e as grelhas que drenam as águas pluviais: os resultados são conhecidos por todos – os pontos de enchentes se multiplicam pelas cidades.

Também entram nessa conta os resíduos que são jogados nas ruas despreocupadamente por muitos moradores: são as embalagens de alimentos, os palitos de sorvete, as garrafas PET de sucos e refrigerantes, restos de feira entre outros. Esses resíduos podem parecer pouca coisa, mas uns poucos quilogramas têm potencial para obstruir uma boca de lobo e causar um estrago enorme num momento de chuva forte.

Mas não são apenas resíduos pequenos que são lançados irresponsavelmente nas ruas e logradouros públicos da cidade: móveis, eletrodomésticos (inclusive geladeiras), restos de materiais de construção e entulhos: minutos atrás, voltando da padaria, encontrei um velho sofá de dois lugares que alguém largou na calçada de uma das avenidas mais importantes do bairro – basta uma chuva forte para arrastar esses resíduos de grande porte para o meio das vias de tráfego, expondo motoristas e passageiros dos veículos a riscos sérios de acidentes, além de provocar o entulhamento dos sistemas de drenagem das águas pluviais.

Até alguns anos atrás, pneus velhos representavam uma parte expressiva dos resíduos jogados aleatoriamente nas ruas e terrenos baldios das cidades. Após alteração na legislação, foi introduzido o processo de Logística Reversa nas indústrias de pneumáticos – quando um proprietário de veículo faz a troca dos pneus, o revendedor fica obrigado a devolver os pneus velhos para o fabricante, que tem a responsabilidade de realizar o descarte correto dos resíduos: hoje em dia grande parte desses pneus velhos são triturados e adicionados na massa asfáltica usada na pavimentação de ruas, avenidas e rodovias – outra parte dos resíduos é queimada, gerando a energia usada nos fornos de  produção de cimento. Seria de um excepcional ganho para o meio ambiente a introdução efetiva do mecanismo de Logística Reversa nas lojas e fabricantes de móveis e de eletrodomésticos, estimulando os consumidores a descartarem corretamente os produtos antigos. Algumas lojas até fazem esse trabalho por conta própria, mas o ideal é que todos os envolvidos nessa cadeia de produção e de comercialização o fizessem.

Enquanto muitas dessas ideias ficam apenas no campo das “boas intenções”, cabe a cada cidadão fazer a sua parte: colocar os resíduos nos horários programados para passagem do caminhão da coleta, buscar os Ecopontos estabelecidos pelas Prefeituras para o descarte de resíduos de grande porte e de entulhos da construção civil (que em algumas cidades representam 70% do total dos resíduos produzidos), não jogar lixo na rua e, principalmente, denunciar os infratores ao poder público.

Isso tudo pode parecer clichê – é tão clichê quanto as enchentes, prejuízos e mortes anuais de todos os Verões…

O TEMIDO CHORUME

baia-de-sepetiba

Matéria mostrada no Jornal da Band no dia 12 de dezembro tem tudo a ver com o tema de hoje: o chorume. A reportagem mostrou a contaminação da Baia de Sepetiba, no Estado do Rio de Janeiro (mostrada na imagem deste post) por chorume, que é lançado intencionalmente em um rio pelo aterro sanitário da cidade de Seropédica. O aterro instalou uma tubulação com extensão total de 5 quilômetros, que lança os resíduos no Rio da Guarda e este deságua na Baia. Ambientalistas informaram que mais de cem pescadores já foram afetados e que até 100 mil litros de chorume podem ter infiltrado no solo e contaminado o aquífero Piranema, responsável pelo abastecimento de 600 mil pessoas. A operadora responsável pelo aterro informou que “recebeu autorização do IBAMA para fazer o descarte desse chorume no rio”. Desculpa difícil de engolir.

O chorume é um líquido poluente, de cheiro nauseante e de cor escura, resultante dos processos de decomposição biológicos, químicos e físicos dos resíduos orgânicos. Com a ação das águas das chuvas, esse líquido se mistura a todo o tipo de materiais e produtos químicos presentes nos resíduos de um aterro sanitário ou de um lixão, possuindo um alto poder de contaminação do meio ambiente. É preciso ressaltar que esse chorume tóxico é diferente do biochorume, que é o líquido resultante do processo de compostagem dos resíduos orgânicos puros e que pode ser usado como fertilizante líquido.

As águas superficiais e subterrâneas são as principais vítimas da contaminação por chorume, podendo acarretar em sérios riscos de intoxicação para as populações que consomem essas águas. Entre outros elementos químicos, metais pesados tóxicos são encontrados no chorume: cádmio, arsênico, cromo, cobalto, cobre, mercúrio e chumbo – esses metais pesados são acumulados pelo organismo e provocam diversas doenças nos seres humanos. Entre as enfermidades mais comuns associadas à contaminação por metais pesados destacam-se as diarreias, tumores no fígado e tireoide, dermatoses, problemas pulmonares, rinite alérgica, alterações gastrointestinais e neurológicas.

O descarte de resíduos sólidos urbanos em lixões tem como consequência a lixiviação de chorume sem nenhum tipo de contenção, podendo infiltrar no solo e contaminar as águas subterrâneas, como ocorre no aterro em Seropédica, ou escorrer sobre o solo e atingir as fontes superficiais de água, com destaque preocupante dos reservatórios de água para fins de abastecimento. Já na construção dos aterros sanitários existe todo um cuidado com a impermeabilização do solo com argila e manta plástica, além da criação de condutos que receberão e direcionarão os fluxos de chorume na direção de tanques de contenção, onde o líquido ficará armazenado.

O chorume precisa passar por um processo de tratamento similar ao usado para o tratamento dos esgotos, podendo ser transportado através de caminhão pipa até uma ETE – Estação de Tratamento de Esgotos, onde receberá o mesmo tratamento dado aos esgotos sanitários da cidade; em aterros sanitários onde existe uma produção muito grande de chorume é mais viável a construção de uma estação de tratamento dedicada, onde são utilizados tratamentos aeróbios e/ou anaeróbios em reator fechado.

A composição química do chorume nunca é fixa e varia ao longo do tempo. Conforme aumentam as quantidades de resíduos, de água que infiltra no aterro e também quando tipos de resíduos diferentes passam a ser depositados no aterro, novos elementos químicos entram na composição do chorume, sendo necessário um acompanhamento frequente através de testes em amostras coletadas nos tanques de contenção. Dependendo da composição química identificada, os processos de tratamento em uso podem se mostrar inadequados e poderá ser necessária a implantação de outras tecnologias para o tratamento do chorume como o uso de tecnologias bioquímicas, enzimas especiais e eletrólise assistida por fotocatálise.

Os problemas com os resíduos sólidos não terminam no momento em que você coloca os sacos de lixo na rua para a coleta – eles persistem ao longo do tempo e o cuidado com o chorume deve ser constante. Fique sempre de olho!

USINAS DE COMPOSTAGEM, OU TRANSFORMANDO RESÍDUOS ORGÂNICOS EM ADUBO

compostagem

No dia 31 de agosto de 2004, a população do bairro da Vila Leopoldina, na Zona Oeste da cidade de São Paulo, teve motivos de sobra para realizar um “carnaval fora de época”: depois de 30 anos de intensas reclamações e de inúmeros abaixo-assinados, a Secretaria de Serviços e Obras da cidade desativou a Usina de Compostagem que funcionava no bairro. Ocupando uma área total de 54 mil metros quadrados, a Usina de Compostagem da Vila Leopoldina recebia uma média de 800 toneladas diárias de resíduos orgânicos para tratamento – o cheiro exalado era simplesmente insuportável. O local foi transformado em uma área verde aberta ao público – o contaminado solo do local continua liberando gases com mal cheiro até hoje.

A compostagem, em resumo, consiste em todo um conjunto de técnicas que possibilitam acelerar a decomposição biológica dos resíduos orgânicos, transformando-os num adubo de excelente qualidade conhecido como terra preta ou húmus. É considerada a melhor destinação para os resíduos orgânicos e deve ser incentivada ao máximo como forma de se reduzir a quantidade de resíduos que chegam diariamente aos lixões e aterros sanitários, muitos deles próximos do limite de saturação. Agora, o que não pode acontecer é algum genial administrador público resolver instalar uma usina de compostagem num bairro residencial bem no meio da cidade como aconteceu na Vila Leopoldina.

Desde os primórdios tempos do início da agricultura, os seres humanos intuitivamente perceberam que as plantas cultivadas necessitavam de “alimentos” para crescer e dar frutos. Os antigos egípcios entenderam a importância da adubação dos solos e esperavam o fim das cheias do Rio Nilo para plantar nos solos recobertos naturalmente por matéria orgânica trazida pelas águas; os chineses já faziam a compostagem na agricultura há mais de 5.000 anos. Aqui no Brasil existem e são utilizadas até hoje imensas áreas da Floresta Amazônica conhecidas como terra preta de índio – são manchas de terra que foram enriquecidas com todo o tipo de resíduos orgânicos e cinzas,  usadas pelas antigas tribos indígenas amazônicas para a produção de alimentos como o milho e a mandioca.

A compostagem começa com a correta separação dos resíduos orgânicos ainda nas residências, evitando a contaminação com outros tipos de resíduos. Estudo realizado pela Usina de Compostagem de Irajá, no Rio de Janeiro, demonstrou o resultado dessa contaminação – metais pesados estão presentes em até 5% do volume de adubo produzido. Como comentado no post anterior, os resíduos orgânicos devem ser separados e colocados em um saco plástico ou recipiente exclusivo, que deve ser mantido fechado. As equipes que realizam os serviços públicos de coleta devem lançar os resíduos no compartimento próprio do caminhão, evitando a mistura com os demais resíduos segregados e agrupados como papel, vidro, plástico e metais (considerando-se que está sendo feita a coleta seletiva de resíduos). Os resíduos recicláveis devem ser transportados até uma área de transbordo, onde será feita uma separação mais refinada e os resíduos orgânicos devem seguir para a usina ou área de produção de compostagem.

A forma mais simples de se realizar a compostagem é a formação de montes piramidais de resíduos conhecidos por leiras, com uma altura máxima de 1,5 metros. Com temperatura e umidade constantes, colônias de micro-organismos realizarão a transformação dos resíduos em adubos. Outra técnica, de resultado mais lento, consiste em enterrar os resíduos em uma vala, que será coberta com uma fina camada de terra. O tempo de decomposição vai variar de 3 meses até 2 anos. Em ambos os casos será necessário revolver os resíduos frequentemente para aerar o material. As composteiras são estruturas mais elaboradas, onde os resíduos ocupam compartimentos com fundo formado por telas – o húmus produzido escorre para um recipiente inferior (a tela funciona como uma peneira), facilitando a separação e a coleta. As composteiras também possuem um recipiente para a coleta e armazenamento do chorume, líquido que devidamente diluído em água se transforma em um excelente adubo líquido. Existem atualmente diversos modelos de composteiras residenciais (que utilizam minhocas californianas) para a produção caseira de húmus – recomendo que vocês pesquisem isso na internet.

Até o nosso  próximo post.

OS RESÍDUOS ORGÂNICOS

cachorro

Eu trabalhei por 16 anos (como funcionário e depois como prestador de serviços) para uma grande multinacional holandesa. Frequentemente, funcionários eram enviados para treinamento na matriz na cidade de Eindhoven ou outras cidades holandesas onde a empresa possuía fábricas ou centros de pesquisa. Alguns destes treinamentos eram bastante longos e muitos funcionários acabavam levando toda a família. Entre outros problemas culturais, essas famílias se deparavam com uma regra referente à coleta dos resíduos orgânicos: cada família tinha direito a uma cota semanal entre 1 e 2 kg de resíduos por semana, o que era desesperador para os brasileiros que não conseguiam cumprir essa cota e pagavam multas. Um colega pernambucano, muito “arretado” em suas próprias palavras, não teve dúvidas – sabendo que as famílias holandesas em geral nunca atingiam a cota semanal de resíduos, fez questão de fazer amizade com todos os vizinhos logo que se mudou para uma dessas cidades e depois, valendo-se dessa “amizade”, saía distribuindo seu lixo excedente na cota da vizinhança. 

Aqui no Brasil, nossos problemas são bem maiores e ainda estamos engatinhando na gestão dos resíduos orgânicos:

Os resíduos orgânicos representam, em média, 50% do volume de resíduos gerados pelas famílias brasileiras. São definidos biologicamente como as matérias de origem animal ou vegetal e geologicamente como compostos de origem orgânica que são encontrados na superfície do solo. Esses resíduos incluem restos de alimentos preparados e ingredientes estragados; talos, cascas e sementes de frutas e vegetais; folhas e galhos de plantas e afins. Os papéis, que são feitos a partir de fibras vegetais, também entram nessa classificação, porém como já tratado em um post anterior, devem ser segregados e encaminhados para reprocessamento nas indústrias produtoras de papel.

Como se trata de matéria orgânica, são resíduos passíveis de decomposição e merecem cuidados especiais, preferencialmente sem muita demora. A decomposição dos resíduos orgânicos envolve processos físicos e químicos. Os processos físicos são realizados por insetos e vermes como formigas, besouros, minhocas, lesmas e caracóis que se alimentam dos resíduos e os transformam em partículas pequenas. Os processos químicos são realizados por micro-organismos de todos os tipos, incluindo bactérias, protozoários e fungos, que degradam os resíduos em partículas microscópicas, liberando gases como dióxido de carbono e água.

Uma regra geral da biologia diz que se existe alguma coisa para ser comida sempre aparecerá algum ser vivo para comer – logo, sacos e latas de lixo, e também os lixões e aterros sanitários, serão vistos com verdadeiros espaços gourmet por todo o tipo de criaturas: gatos, cães, urubus, ratos, baratas, formigas e outros insetos e vermes – incluindo-se aqui também seres humanos menos abastados. Algumas dessas criaturas são classificadas como “vetores” e conhecidas por transmitirem todos tipos de patologias – os ratos, só para citar, são transmissores da leptospirose (transmitida pela urina do animal especialmente em momentos de enchentes). Dependendo da forma como nós descartamos os resíduos orgânicos, poderemos estar alimentando os vetores que trarão doenças para as nossas vidas – ou seja, estaremos sustentando e cuidando dos nossos “inimigos” biológicos.

Os cuidados com o descarte dos resíduos orgânicos devem começar em nossas casas – os recipientes que recebem esses resíduos devem ser tampados ou fechados, evitando-se a atração de insetos e animais – inclusive nossos animais domésticos. Como são materiais que entram em decomposição rapidamente, deve-se evitar que fiquem muito tempo dentro de nossas casas – a decomposição por micro-organismos libera gases como o metano, que tem um cheiro bastante desagradável. A colocação dos sacos plásticos ou recipientes para a coleta nas ruas deve ser sincronizada com a estimativa de chegada dos caminhões de coleta – se colocados em horários inadequados, esses resíduos ficarão expostos a ação de cães, gatos e outras criaturas em busca de alimentos. Também é importante lembrar que em dias de chuva, sacos e recipientes com resíduos podem ser arrastados pela enxurrada,  resultando em pontos de alagamento.

Nos locais de destinação final dos resíduos orgânicos como os aterros sanitários e lixões, os responsáveis devem ser ágeis na disposição e cobertura dos resíduos com terra, controlando a quantidade dos inevitáveis “predadores”, o mal cheiro exalado pela decomposição dos resíduos, além do controle do chorume liberado.

Vamos continuar no próximo post. Até!