
Ocupando uma área total de 857 mil quilômetros quadrados, Madagascar é a maior ilha do continente africano e a quarta maior ilha do mundo. A origem da ilha remonta ao antigo Supercontinente de Gondwana, do qual também faziam parte a África, a América do Sul, a Antártica, a Índia, a Austrália, a Nova Zelândia, a Nova Guiné, a Nova Caledônia, entre outras ilhas menores. Com o início da fragmentação de Gondwana há cerca de 160 milhões de anos atrás, Madagascar e a Índia formavam um único bloco de terras, que começou sua deriva rumo ao Leste. Há cerca de 88 milhões de anos, a Índia se separou de Madagascar e seguiu sua deriva até colidir com o Sul da Ásia.
Ficando totalmente isoladas de outros territórios, a fauna e a flora de Madagascar evoluíram de forma independente, criando uma biodiversidade das mais exclusivas do mundo. Cerca de 90% de todas as plantas e animais da ilha não são encontrados em outros locais do mundo. Dois exemplos das formas animais únicas de Madagascar são os lêmures, uma classe de primatas autóctones da Ilha, e as fossas, um mamífero carnívoro que se assemelha fisicamente aos grandes felinos, mas que, na realidade, é aparentado com as fuinhas europeias. Outro exemplo são os baobás (vide foto), árvore símbolo de Madagascar com seis espécies exclusivas da ilha.
Madagascar é considerado um hotspot de biodiversidade e colocado sempre em posição prioritária quando o assunto é conservação ambiental. Infelizmente, a realidade de Madagascar é outra – a ilha é um dos países com a biodiversidade mais ameaçada do mundo. A lista de problemas é tão grande que usei a expressão “tempestade perfeita” para resumir tudo o que vem acontecendo com o país. Vamos começar falando da intensa perda de cobertura florestal na ilha.
Originalmente, 90% do território malgaxe era coberto por florestas tropicais – atualmente, restam entre 10 e 15% das florestas nativas. Segundo estimativas de Alexandre Georget, Ministro do Meio Ambiente do país, “caso a destruição continue nesse ritmo, daqui a 40 anos Madagascar terá o seu território completamente desmatado“.
Com uma população na casa dos 24 milhões de habitantes, Madagascar é um dos países mais pobres do mundo (não por acaso, é uma das ex-colônias da França na África). A pressão econômica da população contra as florestas está na raiz da devastação ambiental da Ilha. As queimadas para a abertura de campos para agricultura de subsistência, a extração de madeiras para exportação e a produção de carvão vegetal são as atividades que lideram os desmatamentos.
Um dos principais produtos agrícolas de Madagascar é o arroz, que é plantado em pequenos lotes com menos de 2 hectares. Esses lotes têm sua cobertura vegetal derrubada e queimada, numa prática conhecida pelos malgaxes como “tavy”, muito parecida com a nossa coivara. Esses lotes produzem no máximo por um período de 2 anos, quando então são abandonados para um período de “descanso” entre 4 e 6 anos. Passado esse período, o lote volta a ser plantado. Esse ciclo de uso da terra dos lotes pode ser repetido de 2 a 3 vezes, quando então a terra é abandonada por absoluta falta de fertilidade e novos trechos de matas nativas serão transformados em lotes agrícolas.
Além do arroz, o país tem uma importante produção de café, item que responde pela maior fatia das exportações da Ilha. Também são destaques a produção de cana-de-açúcar, mandioca e de frutas como bananas, laranjas, maçãs e abacaxis. Também são comuns as criações de ovelhas, cabras, galinhas e porcos. No campo da mineração, uma atividade que costuma ser devastadora para o meio ambiente, Madagascar só dispõe de algumas reservas de tungstênio.
Outra fonte importante de desmatamentos em Madagascar é a exploração madeireira, que muitas vezes é feita dentro das poucas áreas de florestas protegidas. Algumas das madeiras nativas de Madagascar como o ébano e o rosewood possuem um altíssimo valor no mercado internacional, com preços chegando à casa do US$ 2 mil por tonelada. Contando com uma legislação ambiental fraca e com uma rede de autoridades facilmente corrompíveis, o contrabando de madeiras “corre solto” na Ilha.
Por fim, e não menos devastadora, a produção de carvão vegetal e lenha avança sobre as árvores que não têm um grande valor comercial, especialmente as árvores das chamadas “florestas espinhentas” formadas por árvores da espécie Allauadia. A lenha e o carvão são vendidos livremente na beira das estradas e são usados como fonte de energia para se cozinhar pelas famílias das vilas e aldeias do país.
Outro problema ambiental histórico importante vem sendo a introdução maciça de espécies exóticas na ilha ao longo dos séculos. Estudos arqueológicos indicam que os primeiros povos a desembarcar em Madagascar foram austronésios vindos da Ilha de Bornéu entre 350 a.C. e 550 d.C. Por volta do ano 1000, grupos bantos atravessaram o Canal de Moçambique e se estabeleceram na ilha. Depois, a ilha assistiu diversas ondas de colonizadores malaio-indonésios. Os primeiros europeus a desembarcar na ilha foram os portugueses, que descobriram Madagascar em 1500. Cada um desses grupos acabou introduzindo na ilhas seus animais domésticos e suas plantas comestíveis.
Na extensa lista de animais introduzidos, podemos citar vacas, bois, porcos, galinhas, cavalos, burros, gatos, cachorros, ratos, carneiros, cabritos, entre muitos outros. Recentemente, sapos-cururus foram encontrados na ilha – em postagens recentes, falamos dos enormes problemas ambientais que essa espécie criou no Havaí e na Austrália. Entre as plantas, vamos destacar a cana-de-açúcar e o café, entre outras espécies já citadas. Espécies exóticas, conforme já tratamos em postagens anteriores, concorrem com as espécies nativas, muitas vezes com grande vantagem e podem causar a redução de populações ou mesmo a extinção de espécies locais.
O problema ambiental mais recente da ilha de Madagascar é uma forte seca que está sendo provocada por mudanças ambientais no Oceano Índico. De todos os grandes oceanos do planeta, o Índico é o que, proporcionalmente, mais sofre com o aquecimento global e com as interferências das mudanças climáticas na Antártida. O derretimento de grandes massas de gelo no Polo Sul tem provocado alterações nas correntes marinhas do Oceano Índico que, combinadas com o aumento da temperatura das águas, tem reflexos diretos na formação e no deslocamento das massas de umidade que atingem a África e a Ásia – algumas áreas estão sofrendo com chuvas abaixo da média e outras com volumes muito acima da média histórica.
As medições sistemáticas da temperatura das águas do Oceano Índico começaram em 1880. Nos últimos anos, estas medições têm encontrado aumentos sucessivos nas temperaturas das águas: em 2010, foi observado um aumento de 0,70° C em relação à média histórica; em 2011, a temperatura média caiu um pouco e mostrou um aumento de 0,58° C; em 2012, o aumento foi de 0,62° C e em 2013, o aumento foi de 0,67° C. Nos anos seguintes, foram registrados recordes sucessivos de aumento da temperatura: 0,74° C em 2014, 0,90° C em 2015 e 0,94° C em 2016.
O conjunto de problemas que tem se abatido sobre o Oceano Índico se reflete diretamente em Madagascar – todo o Sul da ilha vem enfrentando um seca sem precedentes e está ameaçando a sobrevivência de mais de 400 mil pessoas. Vamos falar mais sobre isso em nossa próxima postagem.
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