Uma questão intrigante – cientistas de todo o mundo passaram a observar que insetos de diversas espécies que vivem em regiões montanhosas passaram a migrar para regiões mais altas em busca de habitats mais frios e frescos. De acordo com especialistas, essa migração é mais uma consequência do aquecimento global.
Entre os inúmeros casos já documentados pela ciência estão os zangões dos Pirineus, uma cadeia de montanhas que fica entre a França e a Espanha. Também existe o caso de diversas espécies de mariposas que vivem no Monte Kinabalu, em Bornéu.
Outro caso bastante evidente é o da borboleta montanhesa Erebia epiphron, uma espécie que era bastante comum em todo o Reino Unido e que agora tem suas populações concentradas nas montanhas mais altas da Escócia e no Norte da Inglaterra.
Todas essas espécies e muitas outras estão abandonando seus antigos habitats e migrando para ambientes mais frios e frescos, mais adequados à sua fisiologia. Segundo entomologistas, que são os especialistas da área, essa é uma tendência que deverá se acelerar caso as temperaturas médias do planeta continuem a aumentar.
E os especialistas ainda fazem um alerta – espécies com capacidades mais restritas de adaptabilidade e que por algum motivo não consigam migrar para regiões com clima mais compatível com sua fisiologia estarão seriamente ameaçadas.
As mudanças climáticas e o aumento das temperaturas não são as únicas ameaças aos insetos. De acordo com o depoimento de David Roy, pesquisador do Centro de Ecologia e Hidrologia do Reino Unido, a reportagem do jornal The Gardian:
“Espécies de terras altas na Inglaterra normalmente estão em habitats como charnecas ou pântanos, que estão sendo cada vez mais ocupados por casas, plantações, ou outro tipo de uso intensivo. Então muitas espécies podem ser perdidas de qualquer maneira. Mas há evidência de que o clima está aumentando essa pressão”.
Um exemplo desse tipo de ocupação pode ser encontrado bem próximo de nós aqui no Brasil – regiões do Altiplano Andino na Bolívia e no Peru que estão sendo ocupadas de forma acelerada e desordenada por plantações de quinoa (Chenopodium quinoa). Esse é um grão nativo desse bioma e de consumo tradicional dos povos dessas regiões, que virou a comida da moda dos amantes de uma “vida saudável” em todo o mundo.
O Altiplano é formado por terrenos com altitudes acima de 3 mil metros, onde predominam as punas, vegetação formada por pastagens e matagais de montanha. Algumas punas são mais úmidas enquanto outras são mais secas. Esses biomas abrigam inúmeras espécies de plantas e animais altamente adaptados, inclusive espécies de insetos.
Os terrenos do Altiplano têm características entre o árido e o semiárido, com baixa disponibilidade de água e temperaturas médias entre 3º C e 12º C. Dependendo da época do ano, as temperaturas máximas podem oscilar desde 24° C durante o dia até -20° C durante a noite. Em várias regiões já se observam um aumento nas temperaturas médias.
Todas as espécies animais e vegetais desses biomas são o resultado de um longo processo evolutivo, o que levou ao surgimento de espécies altamente adaptadas tanto para a altitude quanto para as temperaturas. Mudanças ambientais provocadas pelo cultivo em grande escala da quinoa, somadas ao aumento das temperaturas impactam fortemente as espécies nativas.
As diferentes espécies de insetos formam o grupo de animais mais diversificado e mais largamente distribuído do nosso planeta – os artrópodes. Só para esclarecer: artrópodes (filo Arthropoda) são animais dotados de patas articuladas e que possuem esqueleto externo (exoesqueleto) nitidamente segmentado. Entre eles se incluem insetos como besouros, borboletas, aranhas, centopeias, baratas, mosquitos entre muitos outros, além de animais como camarões e caranguejos.
Estimativas afirmam que algo ao redor de 70% de todos os seres vivos já descritos pela ciência são insetos. Calcula-se que já foram descritos aproximadamente 1 milhão de espécies de insetos, faltando algo entre 5 e 30 milhões de espécies a serem descritas. Esses números nos dão uma vaga ideia de importância ecológica dessas pequenas criaturas.
De acordo com estudos recentes, os primeiros insetos surgiram há cerca de 480 milhões de anos, mais ou menos na mesma época em que as primeiras plantas terrestres começaram a aparecer. Ao longo de sua longa história evolutiva, os insetos foram se diversificando e se adaptando para uma vida em todos os ecossistemas terrestres do planeta – algumas espécies, inclusive, se adaptaram para a vida no meio aquático.
Insetos são animais ectotérmicos, ou seja – eles não produzem calor suficiente para a termorregulação do organismo e ajustam suas temperaturas corporais por meio de mecanismos comportamentais.
É justamente essa incapacidade de autorregulação das temperaturas corporais que poderá ser fatal para inúmeras espécies de insetos que vivem em regiões onde as temperaturas aumentarão nas próximas décadas. Estudos indicam que as temperaturas poderão aumentar de 2° até 5° C em muitas regiões até o ano 2100.
Devido a ampla distribuição geográfica e também à enormidade de espécies, serão necessários ainda muitos estudos para que os especialistas possam entender corretamente quais serão os impactos das mudanças climáticas nas populações de insetos, o que já está bastante evidente em espécies de montanha.
Para quem acha que esse tipo de notícia não merece muita atenção: insetos são importantes polinizadores de plantas. Somente após a polinização é que as plantas podem produzir frutos e grãos, alimentos fundamentais para os seres humanos.
Imagine o que seria de nós sem a ajuda dessas pequenas criaturas?
PS: Água, Vida & Cia atingiu ontem a marca de 500 mil visualizações desde o início de suas publicações em 2016. Isso pode parecer pouco para muita gente, mas para um pequeno blog de opinião como o nosso é muita coisa. Obrigado aos leitores!