
De acordo com um estudo de 2019, feito pelo Goddard Space Flight Center, instituição ligada à NASA – Administração de Aeronáutica e Espaço dos Estados Unidos, na sigla em inglês, o Deserto do Saara, que fica localizado no Norte da África, dá uma importante contribuição para a fertilidade da Floresta Amazônica, localizada a milhares de quilômetros de distância.
Os fortes ventos alísios que sopram no sentido Leste-Oeste carregam grandes quantidades de areia e sedimentos finos através do Oceano Atlântico e parte acaba caindo sobre a Floresta Amazônica. São cerca de 27 milhões de toneladas de areia a cada ano. Essa areia transporta um volume com cerca de 22 mil toneladas de fósforo, um dos elementos essenciais para o crescimento das plantas.
Um novo estudo de pesquisadores da Oregon State University e da University of Maryland, também com apoio da NASA, demonstrou que a poeira dos desertos também contribui para a fertilização e o crescimento do fitoplâncton, conjunto de algas microscópicas fotossintetizantes e unicelulares que habitam os ecossistemas aquáticos, principalmente os oceanos.
O fitoplâncton forma a base da cadeia alimentar do oceano, que vai do zooplâncton, formas animais microscópicas, até chegar aos peixes e animais gigantescos como as baleias. Assim como acontece com as plantas terrestres, o fitoplâncton contém clorofila e depende da energia da luz solar para fazer a fotossíntese. Ele absorve o dióxido de carbono (CO2) da atmosfera e libera oxigênio.
Como acontece com toda planta, o fitoplâncton depende de nutrientes para crescer e se desenvolver. As correntes marítimas e as águas dos rios que são despejadas nos oceanos carregam grandes quantidades de nutrientes, especialmente minerais como fosfatos e potássio.
O que o novo estudo confirmou é que as areias carregadas dos desertos pelos fortes ventos e que chegam até os oceanos também são importantes dentro desse ciclo de nutrientes. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores se valeram de imagens de satélites e também de modelos matemáticos processados em poderosos computadores.
As imagens foram captadas a uma altitude de cerca de 650 km acima da superfície dos oceanos pelo satélite MODIS Aqua da Nasa. Oceanógrafos especializados em sensoriamento remoto da Oregon State University analisaram medições da cor dos oceanos coletadas entre os anos de 2003 e 2016
De acordo com os modelos computacionais, a poeira dos desertos contribui com 4,5% da produção mundial de carbono dos oceanos. Isso corresponde ao total do carbono retirado da atmosfera pelo fitoplâncton durante a fotossíntese. Em regiões oceânicas localizadas em latitudes médias e altas, essa contribuição pode ficar entre 20% e 40%.
Essa poeira pode ser levada a milhares de quilômetros de distância pelas correntes de ventos. No estudo publicado em 2019, os pesquisadores haviam calculado que o volume total de poeira carregado do Deserto do Saara em direção às Américas era de aproximadamente 182 mil toneladas – a maior parte dessa poeira acaba ficando pelo caminho.
Analisando as imagens do satélite, os pesquisadores conseguiram acompanhar os rastros verdes da clorofila na superfície do oceano, determinando quando e onde ocorriam as florescências e também como estava a saúde e a abundâncias do fitoplâncton. A concentração da clorofila foi a base desse estudo.
O passo seguinte foi determinar como o fitoplâncton respondia às poeiras do deserto. Para isso, os investigadores compararam a cor do oceano com os dados do modelo GEOS – Goddard Earth Observing System, da Nasa, sobre os eventos da deposição de poeiras dos desertos durante o mesmo período.
Ao mesmo tempo em aponta diferentes caminhos para o entendimento de como funciona o complexo sistema de cadeias de alimentos nos oceanos, a pesquisa acende alertas sobre os riscos que esse mecanismo poderá sofrer devido ao aquecimento global e as mudanças climáticas.
Entre outros problemas, o aumento das temperaturas globais poderá interferir na intensidade e na direção das grandes correntes de ventos da atmosfera. Essas mudanças poderão mudar os caminhos seguidos pela poeira dos desertos, afetando assim a nutrição e o crescimento do fitoplâncton.
Outra questão importante que poderia ser incluída nas discussões: qual a interferência dos resíduos de fertilizantes utilizados na agricultura e que são carreados pelos rios na direção dos oceanos? Cito como exemplo a bacia hidrográfica do rio da Prata, que é a segunda maior da América do Sul e se espalha pelo Brasil, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai.
Dentro dessa bacia hidrográfica se encontram algumas das áreas de maior produção agrícola do mundo, onde são usados enormes volumes de fertilizantes. As chuvas lavam os solos e carregam os resíduos para a calha dos rios, que vão se juntando até formar o fabuloso rio da Prata entre a Argentina e o Uruguai.
Esses resíduos são ou não benéficos para a produção do fitoplâncton? Melhor ainda: é possível lançar “poeira” de forma artificial nos oceanos para estimular o desenvolvimento do fitoplâncton e assim aumentar a produtividade pesqueira?
Sempre que um novo conhecimento surge, ele automaticamente abre caminho para novas perguntas e buscas por outros conhecimentos. Nesse caso específico, que envolve diretamente a produtividade pesqueira, que é cada vez mais essencial para um mundo onde a população não para de crescer, quanto mais rápidas as novas respostas, melhor.