INSETOS QUE VIVEM EM MONTANHAS ESTÃO BUSCANDO HABITATS EM ALTITUDES CADA VEZ MAIS ALTAS. E ADIVINHEM QUAL É A CAUSA? 

Uma questão intrigante – cientistas de todo o mundo passaram a observar que insetos de diversas espécies que vivem em regiões montanhosas passaram a migrar para regiões mais altas em busca de habitats mais frios e frescos. De acordo com especialistas, essa migração é mais uma consequência do aquecimento global. 

Entre os inúmeros casos já documentados pela ciência estão os zangões dos Pirineus, uma cadeia de montanhas que fica entre a França e a Espanha. Também existe o caso de diversas espécies de mariposas que vivem no Monte Kinabalu, em Bornéu.  

Outro caso bastante evidente é o da borboleta montanhesa Erebia epiphron, uma espécie que era bastante comum em todo o Reino Unido e que agora tem suas populações concentradas nas montanhas mais altas da Escócia e no Norte da Inglaterra. 

Todas essas espécies e muitas outras estão abandonando seus antigos habitats e migrando para ambientes mais frios e frescos, mais adequados à sua fisiologia. Segundo entomologistas, que são os especialistas da área, essa é uma tendência que deverá se acelerar caso as temperaturas médias do planeta continuem a aumentar. 

E os especialistas ainda fazem um alerta – espécies com capacidades mais restritas de adaptabilidade e que por algum motivo não consigam migrar para regiões com clima mais compatível com sua fisiologia estarão seriamente ameaçadas. 

As mudanças climáticas e o aumento das temperaturas não são as únicas ameaças aos insetos. De acordo com o depoimento de David Roy, pesquisador do Centro de Ecologia e Hidrologia do Reino Unido, a reportagem do jornal The Gardian: 

Espécies de terras altas na Inglaterra normalmente estão em habitats como charnecas ou pântanos, que estão sendo cada vez mais ocupados por casas, plantações, ou outro tipo de uso intensivo. Então muitas espécies podem ser perdidas de qualquer maneira. Mas há evidência de que o clima está aumentando essa pressão”

Um exemplo desse tipo de ocupação pode ser encontrado bem próximo de nós aqui no Brasil – regiões do Altiplano Andino na Bolívia e no Peru que estão sendo ocupadas de forma acelerada e desordenada por plantações de quinoa (Chenopodium quinoa). Esse é um grão nativo desse bioma e de consumo tradicional dos povos dessas regiões, que virou a comida da moda dos amantes de uma “vida saudável” em todo o mundo. 

O Altiplano é formado por terrenos com altitudes acima de 3 mil metros, onde predominam as punas, vegetação formada por pastagens e matagais de montanha. Algumas punas são mais úmidas enquanto outras são mais secas. Esses biomas abrigam inúmeras espécies de plantas e animais altamente adaptados, inclusive espécies de insetos. 

Os terrenos do Altiplano têm características entre o árido e o semiárido, com baixa disponibilidade de água e temperaturas médias entre 3º C e 12º C. Dependendo da época do ano, as temperaturas máximas podem oscilar desde 24° C durante o dia até -20° C durante a noite.  Em várias regiões já se observam um aumento nas temperaturas médias. 

Todas as espécies animais e vegetais desses biomas são o resultado de um longo processo evolutivo, o que levou ao surgimento de espécies altamente adaptadas tanto para a altitude quanto para as temperaturas. Mudanças ambientais provocadas pelo cultivo em grande escala da quinoa, somadas ao aumento das temperaturas impactam fortemente as espécies nativas. 

As diferentes espécies de insetos formam o grupo de animais mais diversificado e mais largamente distribuído do nosso planeta – os artrópodes. Só para esclarecer: artrópodes (filo Arthropodasão animais dotados de patas articuladas e que possuem esqueleto externo (exoesqueleto) nitidamente segmentado. Entre eles se incluem insetos como besouros, borboletas, aranhas, centopeias, baratas, mosquitos entre muitos outros, além de animais como camarões e caranguejos.  

Estimativas afirmam que algo ao redor de 70% de todos os seres vivos já descritos pela ciência são insetos. Calcula-se que já foram descritos aproximadamente 1 milhão de espécies de insetos, faltando algo entre 5 e 30 milhões de espécies a serem descritas. Esses números nos dão uma vaga ideia de importância ecológica dessas pequenas criaturas.  

De acordo com estudos recentes, os primeiros insetos surgiram há cerca de 480 milhões de anos, mais ou menos na mesma época em que as primeiras plantas terrestres começaram a aparecer. Ao longo de sua longa história evolutiva, os insetos foram se diversificando e se adaptando para uma vida em todos os ecossistemas terrestres do planeta – algumas espécies, inclusive, se adaptaram para a vida no meio aquático. 

Insetos são animais ectotérmicos, ou seja – eles não produzem calor suficiente para a termorregulação do organismo e ajustam suas temperaturas corporais por meio de mecanismos comportamentais.  

É justamente essa incapacidade de autorregulação das temperaturas corporais que poderá ser fatal para inúmeras espécies de insetos que vivem em regiões onde as temperaturas aumentarão nas próximas décadas. Estudos indicam que as temperaturas poderão aumentar de 2° até 5° C em muitas regiões até o ano 2100.   

Devido a ampla distribuição geográfica e também à enormidade de espécies, serão necessários ainda muitos estudos para que os especialistas possam entender corretamente quais serão os impactos das mudanças climáticas nas populações de insetos, o que já está bastante evidente em espécies de montanha. 

Para quem acha que esse tipo de notícia não merece muita atenção: insetos são importantes polinizadores de plantas. Somente após a polinização é que as plantas podem produzir frutos e grãos, alimentos fundamentais para os seres humanos. 

Imagine o que seria de nós sem a ajuda dessas pequenas criaturas? 

PS: Água, Vida & Cia atingiu ontem a marca de 500 mil visualizações desde o início de suas publicações em 2016. Isso pode parecer pouco para muita gente, mas para um pequeno blog de opinião como o nosso é muita coisa. Obrigado aos leitores!

FOGÕES A GÁS ESTÃO SENDO COLOCADOS EM XEQUE NOS ESTADOS UNIDOS 

A matriz energética apresenta as fontes de geração de energia que são utilizadas pela população de um país. No caso do Brasil, 34,4% da energia vem da queima de derivados de petróleo, 16,4% da cana-de-açúcar, 11% de fontes hidráulicas, 13,3% do gás natural, 5,6% do carvão mineral, 1,3% da energia nuclear, 8,7% de fontes renováveis e 0,6% de outras fontes não renováveis. 

Um destaque da nossa matriz energética é a grande dependência no uso de carvão de origem vegetal e de lenha, o que representa 8,7% do total. Em regiões pobres do país – em especial no interior da Região Nordeste, há uma grande dependência dessa fonte de energia, sobretudo para as famílias cozinharem. 

De acordo com dados do PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, realizada em 2019, pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, cerca de 20% das famílias brasileiras depende do uso de lenha ou carvão vegetal para cozinhar. Esse número costuma crescer em momentos de grande aumento no preço do gás de cozinha. 

Enquanto milhões de famílias aqui no Brasil sonham com todas as comodidades e praticidades de um bom fogão, especialmente a gás, está se desenrolando uma verdadeira guerra nos Estados Unidos pela proibição do uso do gás em sistemas de aquecimento e em fogões

Essa disputa, que já é antiga, ganhou fôlego renovado com a divulgação de um relatório da CPSC – Comissão de Segurança de Produtos de Consumo, na sigla em inglês. Esse relatório mostra os “danos à saúde” que podem ser desencadeados pela liberação de dióxido de nitrogênio (NO2) e monóxido de carbono (CO) a partir da queima do gás. 

Aqui é preciso fazer uma ressalva: no Brasil é utilizado, predominantemente, o GLP – Gás Liquefeito de Petróleo, em fogões e em sistemas de aquecimento. Esse gás é uma mistura de propano e butano, sendo bem menos poluente. Nos Estados Unidos é mais comum o uso do metano (CH4), que é um dos mais importantes gases de efeito estufa, sendo bem mais tóxico e poluente. 

De acordo com inúmeros relatórios, que passaram a ser divulgados por uma grande campanha para a proibição do uso do gás, passou a ser destacado um estudo do Jornal Internacional de Pesquisa Ambiental e Saúde Pública  que aponta que os fogões e os sistemas de aquecimento que utilizam esse tipo de combustível são responsáveis por 12,7% dos casos de asma em crianças nos Estados Unidos. 

Também passaram a ser divulgadas notícias que associam a poluição criada no interior das casas a graves problemas e irritações nos pulmões, além de aumentar os riscos de doenças cardíacas e de vários tipos de câncer. 

Por fim, os críticos passaram a afirmar que o grande volume de equipamentos que queimam gás nas residências gera grandes quantidades de gases de efeito estufa como o metano (CH4) e o dióxido de carbono (CO2), responsáveis principais pelo efeito estufa e pelo aumento das temperaturas globais. 

Os críticos, como sempre, mostram os números – cerca de 38% dos lares norte-americanos possuem e utilizam fogões a gás. Em números absolutos isso corresponde a 40 milhões de fogões, isso sem falar nos populares sistemas de aquecimento de água e de ambientes. 

Do outro lado da disputa estão as grandes empresas que produzem e distribuem gás para residências de todo o país. Toda essa imensa base de fogões e sistemas de aquecimento precisam ser abastecidas com o combustível, o que essas empresas fazem em troca do pagamento de uma generosa conta mensal. São centenas de bilhões de dólares em faturamento. 

Essas empresas ressaltam as centenas de milhares de empregos que são gerados pelas atividades de produção, distribuição, instalação e manutenção de tubulações, fabricação de equipamentos, entre muitas outras. O setor também paga enormes volumes de impostos para os diversos níveis de Governo. 

Também insistem em lembrar dos “velhos tempos”, quando a população dos Estados Unidos dependia da derrubada de árvores para a produção de lenha para a queima em fogões e lareiras, entre outras coisas do tipo. 

De acordo com o setor, esses problemas poderiam ser facilmente resolvidos com a simples adoção de sistemas de ventilação melhores nas cozinhas e locais onde funcionam os aquecedores. Isso poderia ser feito com a instalação de janelas maiores para facilitar a circulação do ar ou com a instalação de exaustores elétricos. 

No contra-ataque, os críticos ao uso do gás insistem que já estão disponíveis do mercado inúmeros sistemas de aquecimento e fogões que se valem de dispositivos de indução de eletricidade, equipamentos esses que não são poluentes (pelo menos dentro das residências). 

Só para lembrar – grande parte da energia elétrica utilizada nos Estados Unidos é gerada em centrais termelétricas movidas a carvão e/ou a gás, unidades tradicionalmente bastante poluentes. Mesmo sendo “limpa”, a energia elétrica vem de uma fonte “suja”. 

Essa é uma guerra que vai longe e que só será efetivamente resolvida quando fontes de energia renováveis e limpas estiverem disponíveis e ao alcance de todos. 

METADE DOS LAGOS DO MUNDO ESTÁ APRESENTANDO REDUÇÃO NOS NÍVEIS DE ÁGUA

Desde 2016, ano em que iniciamos os trabalhos aqui do blog, publicamos diversas postagens falando da redução do nível de importantes lagos em todo o mundo. Um dos casos mais dramáticos, que foi apresentado na forma de uma série de postagens, foi o do Mar de Aral, na Ásia Central 

O Mar de Aral fica localizado numa extensa planície semiárida entre o Cazaquistão e o Uzbequistão, onde já chegou a ocupar uma área com 68 mil km². Seus principais formadores são os rios Amu Daria e Syr Daria. Durante a época do regime comunista na antiga URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, as águas desses rios passaram a ser intensamente exploradas em projetos de irrigação, o que provocou uma redução de 90% na área ocupada pelo Mar de Aral. 

Outro caso famoso, também ligado à superexploração das águas, é o do Lago Chade, no Centro-Norte da África, que até algumas décadas atrás ocupava uma área de 25 mil km². Essa área se estende por terras no Chade, Camarões, Niger e Nigéria, onde vive uma população de 30 milhões de pessoas. Projetos desastrados de irrigação reduziram o espelho d’água para pouco mais de 1 mil km². 

Esse tipo de problema não acontece apenas em países distantes da Ásia e da África – o Lago Mead (vide foto), nos Estados Unidos, que o diga. Esse reservatório artificial surgiu na década de 1930 com a construção de uma grande usina hidrelétrica no rio Colorado e suas águas passaram a ser essenciais para o abastecimento de cerca de 25 milhões de pessoas em todo o Sudoeste dos Estados Unidos. O nível de água desse lago vem diminuindo sistematicamente desde o ano 2000. 

A sensação que tínhamos de que o problema era generalizado em todo o mundo acaba de ser confirmada por um estudo recém-publicado na revista científica Science. Esse estudo foi liderado pelo pesquisador Fangfang Yao do CIRES – Instituto Cooperativo de Pesquisa em Ciências Ambientais, na sigla em inglês. 

Lagos naturais e reservatórios artificiais respondem por 87% de toda a água doce líquida do planeta e cobrem uma área equivalente a 3% da superfície da Terra. De acordo com esse estudo, que se baseou em análises de fotografias de satélite captadas entre os anos de 1992 e 2020, 53% dessas fontes apresentaram redução nos níveis de água. 

Os pesquisadores criaram inicialmente um banco de dados global onde foram armazenadas informações de mapeamento dos níveis de armazenamento de água de 1.972 grandes massas de água, sendo 1.051 lagos naturais, com áreas entre 100 km² e 377 mil km², e 921 reservatórios artificiais, com áreas entre 4 km² e 67 mil km². Esse arquivo foi formado por 250 mil imagens. 

Esses dados foram comparados com imagens captadas pelo satélite ICESat-2 da NASA – Administração de Aeronáutica e Espaço dos Estados Unidos, entre os anos de 2018 e 2020, que faziam parte de um estudo sobre os níveis de armazenamento de 227.386 massas de água globais. Também foram utilizadas medições de elevação da superfície das águas de altímetros de satélites como o CryoSat-2, ENVISAT, ICESat, série Jason 1-3, SARAL e Sentinel 3. 

A comparação entre as diferentes bases de dados revelou que 53% dos lagos e reservatórios do mundo sofreram um declínio no armazenamento de água. Essas perdas somadas correspondem a 17 vezes o volume total de água dos velhos tempos do Lago Mead, o maior reservatório dos Estados Unidos. 

As perdas de água mais significativas foram observadas na Ásia Central, Oriente Médio, oeste da Índia, leste da China, Norte e Leste da Europa, Oceania, Estados Unidos, Norte do Canadá, Sul da África e a maior parte da América do Sul. 

O estudo também mostrou que aproximadamente 24% dos grandes lagos apresentaram um ganho significativo do volume de água armazenado. Esses ganhos estão ligados à construção de grandes reservatórios artificiais de água em regiões remotas ou subpovoadas, como o planalto tibetano interno e as grandes planícies do Norte da América do Norte. 

457 lagos naturais (cerca de 43% da amostragem) tiveram perdas no seu volume de água. Em 234 lagos naturais (cerca de 22% da amostragem), os pesquisadores observaram que houve um aumento no volume de armazenamento de água. Os 360 lagos restantes (ou 35% da amostra) não mostraram variações significativas. 

O corpo d’água que mais se destacou individualmente no estudo foi Mar Cáspio, na Ásia Central. Também entram na lista o Mar de Aral, também na Ásia Central, o lago Mar Chiquitita, na Argentina, o Mar Morto, no Oriente Médio, o Lago Salton, na Califórnia, entre muitos outros.  

O Mar Cáspio é considerado o maior corpo de água interior do mundo, ocupando uma área total com mais de 370 mil km². Esse grande lago ocupa uma extensa depressão na Ásia Central, que forma uma bacia hidrográfica endorreica (sem saída para o mar) entre a Rússia, Azerbaijão, Irã, Turcomenistão e Cazaquistão. 

O principal tributário do Mar Cáspio é o rio Volga, o maior rio da Europa com quase 3.700 km de extensão e também o dono da maior bacia hidrográfica e também o curso com o maior volume de água do continente. Essas águas são intensamente utilizadas em sistemas de irrigação na Rússia, o que vem se refletindo em reduções sistemáticas no volume de águas que desaguam no Mar Cáspio. 

Estudos feitos entre 1979 e 1995 indicaram que o nível do Mar Cáspio estava sofrendo uma redução anual média de 13,09 cm. Desde então, essa redução vem se mantendo numa média de 6,72 cm por ano. Com o aumento das temperaturas globais, os especialistas acreditam que haverá um aumento das perdas de água por evaporação ao longo das próximas décadas. 

O aumento das temperaturas globais também está afetando os lagos que são alimentados pelas águas de degelo de glaciares localizados no alto de cadeias montanhosas. Um exemplo disso é o Lago Titicaca, localizado entre o Peru e a Bolívia. 

O Lago Titicaca é maior corpo de água doce natural da América do Sul, ocupando uma área de mais de 8,3 mil km² de superfície a uma altitude de 3.812 metros acima do nível do mar. Nessa região de chuvas escassas, a alimentação do Lago Titicaca depende de um sem números de pequenos rios com nascentes formadas pelas águas de degelo de glaciares localizados nas grandes altitudes da Cordilheira dos Andes. Essas geleiras estão apresentando reduções sucessivas em suas massas ano após ano. 

De acordo com informações da Universidad Nacional del Altiplano, localizada na cidade de Puno no Peru, o nível do Lago Titicaca está atualmente na cota de 3.808 metros acima do nível do mar, cerca de 4 metros abaixo do nível médio histórico. Além da redução dos caudais dos rios tributários, a universidade também destaca o uso abusivo das águas do Lago Titicaca em sistemas de agricultura irrigada. 

Em resumo – as famigeradas mudanças climáticas globais estão reduzindo os volumes de chuvas em muitas bacias hidrográficas de todo o mundo, o que está reduzindo os volumes de água que correm na direção de lagos e reservatórios de água. O aumento das temperaturas em muitas regiões também está provocando um aumento das perdas de água desses corpos por evaporação. 

Entretanto, não há como negar que o uso abusivo dessas águas por atividades humanas, especialmente por sistemas de irrigação agrícola altamente ineficientes, também está dando uma enorme contribuição para a redução dos níveis de lagos e reservatórios em todo o mundo. 

POEIRA DOS DESERTOS AJUDA A GARANTIR O CRESCIMENTO DO FITOPLÂNCTON DOS OCEANOS 

De acordo com um estudo de 2019, feito pelo Goddard Space Flight Center, instituição ligada à NASA – Administração de Aeronáutica e Espaço dos Estados Unidos, na sigla em inglês, o Deserto do Saara, que fica localizado no Norte da África, dá uma importante contribuição para a fertilidade da Floresta Amazônica, localizada a milhares de quilômetros de distância. 

Os fortes ventos alísios que sopram no sentido Leste-Oeste carregam grandes quantidades de areia e sedimentos finos através do Oceano Atlântico e parte acaba caindo sobre a Floresta Amazônica. São cerca de 27 milhões de toneladas de areia a cada ano. Essa areia transporta um volume com cerca de 22 mil toneladas de fósforo, um dos elementos essenciais para o crescimento das plantas. 

Um novo estudo de pesquisadores da Oregon State University e da University of Maryland, também com apoio da NASA, demonstrou que a poeira dos desertos também contribui para a fertilização e o crescimento do fitoplâncton, conjunto de algas microscópicas fotossintetizantes e unicelulares que habitam os ecossistemas aquáticos, principalmente os oceanos. 

O fitoplâncton forma a base da cadeia alimentar do oceano, que vai do zooplâncton, formas animais microscópicas, até chegar aos peixes e animais gigantescos como as baleias. Assim como acontece com as plantas terrestres, o fitoplâncton contém clorofila e depende da energia da luz solar para fazer a fotossíntese. Ele absorve o dióxido de carbono (CO2) da atmosfera e libera oxigênio. 

Como acontece com toda planta, o fitoplâncton depende de nutrientes para crescer e se desenvolver. As correntes marítimas e as águas dos rios que são despejadas nos oceanos carregam grandes quantidades de nutrientes, especialmente minerais como fosfatos e potássio. 

O que o novo estudo confirmou é que as areias carregadas dos desertos pelos fortes ventos e que chegam até os oceanos também são importantes dentro desse ciclo de nutrientes. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores se valeram de imagens de satélites e também de modelos matemáticos processados em poderosos computadores. 

As imagens foram captadas a uma altitude de cerca de 650 km acima da superfície dos oceanos pelo satélite MODIS Aqua da Nasa. Oceanógrafos especializados em sensoriamento remoto da Oregon State University analisaram medições da cor dos oceanos coletadas entre os anos de 2003 e 2016 

De acordo com os modelos computacionais, a poeira dos desertos contribui com 4,5% da produção mundial de carbono dos oceanos. Isso corresponde ao total do carbono retirado da atmosfera pelo fitoplâncton durante a fotossíntese. Em regiões oceânicas localizadas em latitudes médias e altas, essa contribuição pode ficar entre 20% e 40%. 

Essa poeira pode ser levada a milhares de quilômetros de distância pelas correntes de ventos. No estudo publicado em 2019, os pesquisadores haviam calculado que o volume total de poeira carregado do Deserto do Saara em direção às Américas era de aproximadamente 182 mil toneladas – a maior parte dessa poeira acaba ficando pelo caminho. 

Analisando as imagens do satélite, os pesquisadores conseguiram acompanhar os rastros verdes da clorofila na superfície do oceano, determinando quando e onde ocorriam as florescências e também como estava a saúde e a abundâncias do fitoplâncton. A concentração da clorofila foi a base desse estudo. 

O passo seguinte foi determinar como o fitoplâncton respondia às poeiras do deserto. Para isso, os investigadores compararam a cor do oceano com os dados do modelo GEOS – Goddard Earth Observing System, da Nasa, sobre os eventos da deposição de poeiras dos desertos durante o mesmo período. 

Ao mesmo tempo em aponta diferentes caminhos para o entendimento de como funciona o complexo sistema de cadeias de alimentos nos oceanos, a pesquisa acende alertas sobre os riscos que esse mecanismo poderá sofrer devido ao aquecimento global e as mudanças climáticas. 

Entre outros problemas, o aumento das temperaturas globais poderá interferir na intensidade e na direção das grandes correntes de ventos da atmosfera. Essas mudanças poderão mudar os caminhos seguidos pela poeira dos desertos, afetando assim a nutrição e o crescimento do fitoplâncton. 

Outra questão importante que poderia ser incluída nas discussões: qual a interferência dos resíduos de fertilizantes utilizados na agricultura e que são carreados pelos rios na direção dos oceanos? Cito como exemplo a bacia hidrográfica do rio da Prata, que é a segunda maior da América do Sul e se espalha pelo Brasil, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai. 

Dentro dessa bacia hidrográfica se encontram algumas das áreas de maior produção agrícola do mundo, onde são usados enormes volumes de fertilizantes. As chuvas lavam os solos e carregam os resíduos para a calha dos rios, que vão se juntando até formar o fabuloso rio da Prata entre a Argentina e o Uruguai. 

Esses resíduos são ou não benéficos para a produção do fitoplâncton? Melhor ainda: é possível lançar “poeira” de forma artificial nos oceanos para estimular o desenvolvimento do fitoplâncton e assim aumentar a produtividade pesqueira? 

Sempre que um novo conhecimento surge, ele automaticamente abre caminho para novas perguntas e buscas por outros conhecimentos. Nesse caso específico, que envolve diretamente a produtividade pesqueira, que é cada vez mais essencial para um mundo onde a população não para de crescer, quanto mais rápidas as novas respostas, melhor.  

GOVERNO DA FRANÇA PROIBE VOOS DE CURTA DURAÇÃO

Entrou em vigor na última terça-feira, dia 23 de maio, um decreto do Governo da França que proíbe a realização de voos domésticos de curta duração no país. A medida tem como objetivo combater as emissões de gases de efeito estufa, principais causadores das mudanças climáticas globais. 

Essa proposta vinha sendo discutida pela Assembleia Nacional desde 2021, um assunto que inclusive tratamos em uma postagem da época. Naquele momento, quando o mundo estava enfrentando todos os problemas criados pela pandemia da Covid-19 e proibição da circulação de pessoas, empresas aéreas estavam com suas frotas de aviões em solo e sem saber como arcar com suas despesas operacionais. 

Mesmo com seus aviões parados, as empresas aéreas precisavam bancar custos como salários, locação de hangares, pagamentos de leasing (grande parte dos aviões das frotas é alugado), entre outros compromissos. E, em meio a todos esses problemas, deputados franceses estavam discutindo a proibição desses voos. Na época, a ideia pegou muito mal. 

Um outro ponto complicado dessas discussões em 2021, foram algumas brechas que estavam sendo incluídas no decreto para prejudicar o mínimo possível a Air France, a grande empresa de aviação da França. Os críticos queriam saber a diferença entre a poluição gerada por aeronaves estrangeiras e as francesas.   

O projeto acabou sendo aprovado naquele mesmo ano, mas não entrou em vigor. A proposta teve de ser apresentada para a União Europeia a pedido das companhias aéreas que suspeitavam da legalidade do ato. A proposta que entrou em vigor focou inicialmente em voos de cerca de uma hora a partir de Paris. As principais cidades afetadas são Bordeaux, Nantes e Lyon. Conexões aéreas entre voos não serão afetadas. 

Para esses casos, os passageiros precisarão se valer de outros meios de transporte, especialmente dos sistemas de trens. A França possui uma excelente infraestrutura ferroviária, inclusive com linhas de trens de alta velocidade, conhecidos popularmente no país como TGV – Train à Grande Vitesse

As viagens de trem nesses trechos podem ser feitas entre 2h30 e 3h00, o que acabou sendo um dos principais argumentos de políticos franceses para aprovar o decreto. Segundo o que foi divulgado, as emissões per capita de uma viagem de trem chega a ser até 40 vezes menor do que a de um voo. 

Os críticos do novo decreto argumentam, e com muita razão, que os trechos com proibição dos voos representam menos de 3% das emissões globais de gases de efeito estufa das empresas aéreas do país. Segundo esses críticos, é muito mais propaganda do que uma ação efetiva no combate ao aquecimento global. 

Um outro argumento forte dos críticos é que já estão disponíveis no mercado os chamados SAF – Combustíveis de Aviação Sustentáveis, na sigla em inglês. O SAF é uma mistura de combustível de aviação convencional com agentes de mistura não convencionais e mais sustentáveis, que reduzem as emissões de CO2 em até 75%.

O SAF é bem mais caro que a querosene de aviação convencional, o que aumentaria significativamente os custos das passagens. Porém, está aqui a principal crítica à medida: os clientes teriam a opção de escolha entre o avião e os trens, seja por questões de consciência ambiental seja por razões econômicas..

Por mais incrível que pareça, até mesmo grupos ambientalistas criticaram a medida por causa de sua baixíssima efetividade no combate às mudanças climáticas. Para esses grupos, a medida tem um caráter muito mais simbólico do que prático. 

Uma forma muito mais eficaz de se combater as emissões de gases poluentes dentro do território francês, porém que teria repercussões políticas imensas, seria a efetiva proibição da circulação de automóveis com motores a diesel em grandes cidades como Paris. 

De acordo com um levantamento feito ainda em 2018, pela Transporte e Meio Ambiente, uma organização não governamental, circulavam a época 43 milhões de automóveis com motores a diesel dentro dos países da União Europeia. Na França, essa frota correspondia a mais de 8,7 milhões de veículos. 

A maioria desses carros são antigos e soltam verdadeiras nuvens de fumaça preta pelos seus escapamentos, algo muito parecido com caminhões e ônibus velhos que costumamos ver em ruas e estradas aqui do Brasil. Eu nunca esqueço da primeira vez que estive em Paris e que me deparei com esse tipo de problema nas ruas da cidade.  

Estudos feitos por países europeus demonstram claramente que a poluição gerada pelos motores diesel é muito maior que a emitida por motores a gasolina – em alguns casos chega a ser 18 vezes maior. Os diferentes governos europeus vêm criando uma série de medidas para proibir a venda de automóveis com esse tipo de motor, porém, a frota que circula nas ruas e estradas do continente ainda é imensa. 

Um exemplo dos estragos que essa frota de carros antigos e poluentes pode causar é o que se vê na região metropolitana de Paris, uma mancha urbana que tem 12,5 milhões de habitantes, a mesma população da cidade de São Paulo. 

Durante os meses de inverno, época do ano em que não há ventos para dispersar os gases atmosféricos, os níveis de poluição em Paris chegam a superar a marca de 100 microgramas por metro cúbico de ar. Esse valor é 4 vezes maior que os limites máximos recomendados pela OMS -Organização Mundial da Saúde.   

Para efeito de comparação, minha cidade – São Paulo, que tem fama de ter uma atmosfera bastante poluída, apresenta uma poluição média com níveis de poluentes da ordem de 38 microgramas para cada metro cúbico de ar.  Esses dados constam de estudos da própria OMS compilados entre 2009 e 2010.  

Entre os muitos “segredos de Polichinelo” que São Paulo possui para ter um ar tão melhor que o de Paris está justamente uma restrição considerável à circulação de veículos com motores diesel dentro de sua mancha urbana. Existem restrições de horários para a passagem de grandes caminhões pelas grandes avenidas da cidade, além da obrigatoriedade do uso de diesel com menores teores de enxofre e outros poluentes. 

Outro desses segredos é a grande utilização de veículos com motores a etanol, o famoso álcool da cana-de-açúcar, um combustível que polui bem menos que a gasolina e o óleo diesel. Outra vantagem do etanol é que ele é um combustível renovável. 

Na minha humilde opinião, que bem por acaso está bem próxima da de muitos ambientalistas franceses, os ganhos ambientais seriam muito mais efetivos para a França se fossem criadas medidas urgentes para a retirada de toda essa frota de automóveis com motores diesel das ruas e que se estimulasse o uso de veículos elétricos ou com combustíveis alternativos como o etanol

O problema é que esse tipo de medida desagradaria alguns milhões de proprietários de veículos e forçaria o Governo a desembolsar algumas centenas de bilhões de Euros em incentivos fiscais para a fabricação e venda de veículos novos, além de forçar a criação de toda uma infraestrutura de produção e distribuição de combustíveis alternativos. 

Para um Governo que não goza de popularidade (vejam os recentes protestos que foram criados devido às mudanças no sistema de previdência social na França) e que não tem dinheiro em caixa, essa solução é impossível de ser implementada. 

Então, para agradar os “euroambientalistas” mais radicais, tomam-se medidas paliativas como essa. Vamos ver por quanto tempo vão conseguir manter o “showzinho”… 

TEMPERATURAS OCEÂNICAS BATERAM RECORDES SUCESSIVOS AO LONGO DE 60 DIAS 

Em nossa postagem anterior apresentamos os dados de um estudo onde foram contabilizadas todas as mortes e os prejuízos econômicos causados por catástrofes climáticas e hídricas entre os anos de 1970 e 2021. Foram 2 milhões de mortes e US$ 4,3 trilhões em prejuízos econômicos. 

Mudanças climáticas globais, uma questão que só começou a ficar bem clara de alguns anos para cá, provavelmente estão na raiz de grande parte dessas tragédias. Se, entretanto, existem dúvidas quanto ao que aconteceu num passado recente, temos certeza que o futuro está nos reservando catástrofes desse tipo ainda maiores. 

Uma prova disso são os resultados de medições sistemáticas das temperaturas das águas dos oceanos: elas atingiram os valores mais altos dos últimos 42 anos. Aliás, medições recentes mostraram uma sequência ininterrupta de 60 dias com recordes sucessivos nas temperaturas oceânicas

No início do último mês de abril, cerca de 55 dias atrás, a temperatura média dos oceanos atingiu a marca de 21,1º C, superando o recorde anterior de 21º C estabelecido durante o forte El Niño de 2016. Essa média de temperatura exclui as águas frias das regiões polares. 

Só para relembrar, o El Niño é um fenômeno climático caracterizado por um aquecimento anormal das águas superficiais de uma extensa região do Oceano Pacífico. Nos anos em que o fenômeno El Niño é detectado são registradas uma série de alterações climáticas em todo o mundo. Em 2015, o surgimento de um forte El Niño prejudicou lavouras de cacau, chá e café em toda a Ásia e África.  

Também provocou uma forte seca no Sudeste Asiático, favorecendo o surgimento de vários incêndios florestais. Naquele ano também se observou o inverno mais quente já registrado nos Estados Unidos. Na América do Sul, o surgimento do El Niño pode resultar em períodos de seca na região Centro-Norte e de maior umidade na região Sul. Na Argentina o fenômeno tende a provocar chuvas mais intensas.   

Pois bem: as temperaturas oceânicas na Espanha atingiram neste mês os valores que seriam esperados para o período do verão, ou seja, as águas estão até 3º C mais quentes do que seria esperado para esse período de primavera no Hemisfério Norte. 

Citando dois exemplos no país: na Praia de Costa da Luz (vide foto), que fica bem próxima da cidade de Cádiz na Andaluzia, e na praia de Canarias, no arquipélago homônimo, as temperaturas médias das águas estão na faixa de 20º C, um valor que normalmente só é atingido entre os meses de setembro e outubro, auge do verão europeu. 

Em 2016, diferentemente de hoje, o recorde das temperaturas oceânicas foi quebrado sob a forte influência do El Niño. Hoje, ao contrário, o mundo vive dentro de uma “normalidade climática”, ou seja, essas temperaturas recordes das águas estão associadas diretamente às mudanças climáticas globais. 

E aqui existe um ponto de imensa preocupação para os cientistas do clima: as previsões meteorológicas indicam que existe 60% de chance de ocorrer um novo episódio de El Niño entre os meses de maio e julho deste ano. Essa probabilidade aumenta para 80% para o período entre julho e setembro. 

Ou seja, se as temperaturas oceânicas já estão com valores acima da média, existe uma grande possibilidade de elas aumentarem ainda mais nos próximos meses por causa da chegada de El Niño

Os oceanos ocupam cerca de 2/3 da superfície do planeta, absorvendo a maior parte da radiação solar que atinge a superfície da Terra, exercendo um papel crucial na regulação do clima em todo o planeta. 

Um dos aspectos mais elementares do nível da temperatura das águas dos oceanos se vê na formação de grandes massas de vapor de água, as famosas nuvens de chuva, que são responsáveis pela maior parte das chuvas que caem sobre os continentes e que garantem o suprimento de água doce para plantas e animais, incluindo-se aqui a espécie humana. 

O volume de água que evapora dos oceanos a cada ano não é nada desprezível – ele é calculado em 383 mil km³ (conforme a fonte pesquisada, esse valor poderá variar). Isso equivale a uma camada de 1,06 metro de água de todos os oceanos do mundo a cada ano. Cerca de 75% dessa água evaporada se precipita na forma de chuvas diretamente sobre os oceanos. Os 25% restantes se precipitam sobre os continentes principalmente na forma de chuva, neve e granizo, que são as fontes primárias da nossa água potável. 

Todo esse fabuloso volume de vapor de água é espalhado por todos os cantos graças às fortes correntes de ventos que circundam o nosso planeta. Aqui há um detalhe importante – a temperatura dos oceanos é um dos principais “motores” de geração desses ventos. Mudanças nas temperaturas superficiais das águas dos oceanos alteram tanto a formação do vapor de água quanto a velocidade e direção dos ventos. 

Um exemplo do que poderá acontecer em escala global nos próximos anos é o que está acontecendo neste momento no Oceano Índico. Conforme já exemplificamos em diversas postagens aqui do blog, o Oceano Índico é o que, proporcionalmente, mais sofre com as interferências das mudanças climáticas na Antártida. De acordo com medições sistemáticas feitas desde 1880, as águas desse oceano já tiveram um aumento de 0,7º C na sua temperatura.   

Esse aumento das temperaturas está causando uma série de mudanças nas grandes massas de nuvens de chuva que se formam sobre o Oceano Índico e que são levadas pelos ventos na direção da África, do Sul e do Sudeste Asiático. Na África estão sendo observadas grandes secas como a que está se abatendo sobre o Chifre da África

No Sul e no Sudeste da Ásia, esse aquecimento das águas do Oceano Índico tem afetado a frequência e a intensidade das importantes Chuvas da Monção, uma forte temporada de chuvas que regula a vida e agricultura de centenas de milhões de pessoas. 

No Golfo de Bengala, citando um exemplo, está sendo observado um aumento contínuo das águas do oceano, o que inclusive levou ao desaparecimento da Ilha New Moore em 2018. Essa região, especialmente na área entre Bangladesh e Mianmar, está sofrendo nesse momento sob a fúria do ciclone Mocha

As temperaturas recordes dos oceanos nesse momento devem ser vistas como um sinal de alerta – poderemos ter uma sucessão de tragédias ambientais nos próximos meses! Como diz aquele velho ditado, é bom já irmos deixando as barbas de molho… 

NOS ÚLTIMOS 50 ANOS, DESASTRES CLIMÁTICOS E HÍDRICOS MATARAM 2 MILHÕES DE PESSOAS E CAUSARAM US$ 4,3 TRILHÕES EM PERDAS ECONÔMICAS 

Os números assustadores mostrados no título desta postagem foram apresentados ontem, dia 22 de maio, na abertura do Congresso Meteorológico Mundial. Esse evento ocorre a cada quatro anos e a atual edição começou ontem em Genebra na Suíça. 

Em seu discurso de abertura, o secretário-geral da OMM – Organização Meteorológica Mundial, uma organização ligada a ONU – Organização das Nações Unidas, Petteri Taalas apresentou um completo estudo climático realizado entre os anos de 1970 e 2021, onde esses números impressionantes foram encontrados. 

De acordo com o estudo, ocorreram 11.778 desastres climáticos e hídricos no período, resultando em 2 milhões de mortes e cerca de US$ 4,3 trilhões em perdas econômicas. Para efeito de comparação, esse número de mortes supera a população de uma cidade como Curitiba e essa perda econômica equivale a mais de dois anos do PIB – Produto Interno Bruto, do Brasil. 

Os dados do estudo mostram detalhadamente que 90% das mortes causadas por desastres climáticos e hídricos ocorrem em países em desenvolvimento. Com falta de recursos para a realização de investimentos em infraestrutura e na implantação de sistemas de alerta antecipado, esses países podem fazer muito pouco para evitar que essas tragédias ocorram. 

Aqui na América Latina, 61% das tragédias envolvem as inundações, um problema que mostramos sistematicamente em nossas postagens. Já na África, a imensa maioria dos eventos estão ligados às secas e respondem por 95% das mortes associadas a essas tragédias no continente. 

Um dos países mais impactados economicamente foram os Estados Unidos, onde os prejuízos no período chegaram a US$ 1,7 trilhão, valor que corresponde a 39% das perdas totais. A maior parte dessas perdas foi ressarcida com o pagamento de prêmios de seguro. 

Outra vantagem dos norte-americanos dentro desse trágico ranking é a ótima infraestrutura do país, o que reduziu consideravelmente o número de mortes quando comparado aos demais países. No total, os países da América do Norte, América Central e Caribe somaram 77.454 mortes. 

Na América do Sul, o estudo contabilizou 943 tragédias climáticas e hídricas no mesmo período, com predominância das inundações. No total foram registradas 58.484 mortes e perdas econômicas da ordem de US$ 115,2 bilhões. Na África, onde os grandes problemas estão ligados predominantemente as secas, o total de mortes foi de 733.585 e os prejuízos econômicos de US$ 43 bilhões. 

A Ásia foi o continente que teve o maior número de mortes – foram 984.263, o que corresponde a 47% do total. A maioria das tragédias e das mortes está ligada aos frequente ciclones que se abatem sobre a região. Na Europa, a maioria das mortes foi resultado dos extremos climáticos e somaram 166.492 vítimas. Fechando as estatísticas, a região do Sudoeste do Pacífico teve 66.951 mortes ligadas principalmente a ciclones e furacões. 

Durante a sua apresentação, o secretário-geral da OMM citou o caso do ciclone Mocha (vide foto), que está causando uma devastação generalizada em Mianmar e em Bangladesh, países extremamente pobres do Sul da Ásia. Ele usou esse exemplo para afirmar que são sempre as comunidades mais pobres as que terminam em situação mais vulnerável durante essas tragédias climáticas. 

O ciclone ainda continua ativo sobre as águas do Golfo de Bengala e poderá ganhar energia caso entre na área continental numa faixa de terras entre Cox’s Bazar, em Bangladesh, e Kyaukpyu, em Mianmar. A OMM está monitorando o ciclone em seu centro meteorológico regional em Nova Délhi, na Índia. A organização espera ventos máximos da ordem de 180 a 190 km/h, o que coloca o ciclone na categoria 3 segundo a escala de furacões Saffir-Simpson

Bangladesh, conforme já apresentamos em inúmeras postagens aqui do blog, é um dos países mais pobres do mundo e foi criado em 1971, em decorrência do longo processo de reestruturação do antigo Vice-reino britânico da Índia. Com a independência da Índia em 1947, surgiram inicialmente a Índia, o Paquistão (que incluía Bangladesh) e a Birmânia, de depois passou a ser chamada de Mianmar. 

A situação de Mianmar não é muito melhor, porém, é importante citar que o país passou por um sangrento golpe militar em 2021, e a população está vivendo um enorme processo de repressão política. Os dois países são vizinhos e sofrem sistematicamente com os ciclones que se formam no Golfo de Bengala. 

Apesar de ser bastante esclarecedor, o estudo está criando uma série de preocupações relativas ao crescimento desses eventos nos próximos anos por causa dos efeitos das mudanças climáticas globais. 

Uma das regiões do mundo onde os efeitos das mudanças climáticas são mais evidentes é justamente o Golfo de Bengala. De todo os oceanos do mundo, o Índico é o que, proporcionalmente, mais sofre com as interferências das mudanças climáticas na Antártida. De acordo com medições sistemáticas feitas desde 1880, as águas desse oceano já tiveram um aumento de 0,7º C na sua temperatura.   

Esse aumento das temperaturas está causando uma série de mudanças nas grandes massas de nuvens de chuva que formam sobre o Oceano Índico e que são levadas pelos ventos na direção da África, do Sul e do Sudeste Asiático. Na região do Golfo de Bengala estão sendo observadas variações bruscas no volume e na frequência das Chuvas da Monção

As mudanças também estão provocando um gradual aumento do nível das águas do Golfo de Bengala. Um exemplo foi o desaparecimento da Ilha New Moore em 2018. Essa ilha tinha cerca de 10 km² e vinha sendo disputada pela Índia e por Bangladesh. O aumento do nível das águas varreu completamente a ilha do mapa. 

O aumento do nível das águas do Golfo de Bengala também poderá ser fatal nos próximos anos para as terras baixas de Bangladesh e do Norte da Índia. Os vales dos rios Ganges e Brahmaputra, os principais da região, ficam poucos metros acima do nível do mar e abrigam uma população de mais de 500 milhões de pessoas. 

Problemas semelhantes estão se multiplicando por todo o mundo e sinalizam que as tragédias associadas a enchentes deverão aumentar, e muito, ao longo dos próximos anos. Em outras regiões, como é o caso da África, se espera um aumento nos problemas ligadas às secas. 

Um exemplo é a grande seca que está assolando toda a região do Chifre da África. Essa região compreende uma área de 1,88 milhão de km² no Nordeste do continente africano, onde se incluem territórios da Somália, Etiópia, Eritréia e Djibuti. Essa é uma região de transição entre o clima árido do Deserto do Saara e das savanas, que também inclui uma faixa no Norte do Quênia.    

De acordo com informações da ACNUR – Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados, a região convive atualmente com 3,3 milhões de refugiados e deslocados internos, populações que foram obrigadas a abandonar suas casas e terras ancestrais em busca de condições mínimas para a sobrevivência. 

De acordo com os cientistas, uma das principais causas dessa fortíssima seca no Chifre da África são as mesmas mudanças climáticas que estão se abatendo sobre o Oceano Índico e que também estão afetando fortemente o Golfo de Bengala. 

A interligação de todos esses problemas mostra o quão grave é a situação climática do planeta e sinalizam que catástrofes hídricas e climáticas poderão aumentar muito nos próximos anos. 

SANTIAGO DO CHILE: A CIDADE COM O AR MAIS POLUÍDO DO MUNDO NA ÚLTIMA SEMANA 

A poluição do ar nas grandes cidades do mundo coloca em risco a saúde de dezenas de milhões de pessoas e entra na lista dos grandes problemas ambientais de nossos dias. Nas postagens aqui do blog já falamos desse enorme problema em cidades da China, da Índia, de Bangladesh, do Paquistão e até mesmo em Paris, a sofisticada capital da França

No último dia 11 de maio entretanto, uma das mais importantes capitais da América do Sul conseguiu entrar para o nada seleto grupo das cidades mais poluídas do mundo – Santiago, a capital do Chile. A metrópole, de 5,6 milhões de habitantes e que já tem problemas de poluição no ar, enfrentou condições adversas na circulação dos ventos, o que agravou, e muito, o problema e colocou a cidade no topo do ranking

A localização de Santiago do Chile, para os que não conhecem, é bastante incomum. A metrópole se espreme em uma faixa de terras entre o Oceano Pacífico e a Cordilheira dos Andes. Mais ao Norte, encontramos a região árida do Deserto do Atacama. Essa geografia costuma resultar em problemas de circulação dos ventos na cidade em algumas épocas do ano. 

No dia em questão, o ar da cidade apresentou uma alta concentração de partículas de poluição devido aos problemas de ventilação. O IQA – Índice de Qualidade do Ar, um parâmetro de análise da qualidade do ar que foi criado pela empresa de tecnologia suíça IQAir, atingiu um nível altíssimo. Esse índice vem sendo utilizado já há alguns anos para classificar as cidades com o ar mais poluído do mundo. 

De acordo com análises feitas por meteorologistas do país, o problema foi em parte criado por uma inversão térmica, um fenômeno típico dos meses de outono e inverno. Esse fenômeno ocorre com a chegada de uma camada de vento quente sobre a cidade, o que cria uma espécie de “tampa” que impede a circulação do ar. 

Também foi citada a influência da depressão costeira, das altas pressões e de uma crista quente em altitude, uma combinação não muito comum de fenômenos atmosféricos que ajudou a transformar o ar de Santiago num dos piores do mundo por alguns dias. 

Apesar de ter sido “premiada” com o título de cidade com o ar mais poluído do mundo da semana, Santiago vem enfrentando o problema há muito tempo. Como é normal em grandes cidades do mundo, a capital chilena possui uma enorme frota de automóveis, ônibus e caminhões circulando por suas ruas.  

A fumaça resultante da queima de combustíveis fósseis se junta a outras fontes de poluição, como a fortíssima mineração no Norte do país, resultando em uma atmosfera extremamente ruim para a sua população. Também é importante citar que cerca de 2/3 de toda a energia elétrica gerada no país vem de centrais termelétricas a carvão, derivados de petróleo e gás. 

Nos meses mais frios do ano a situação costuma ficar ainda mais complicada. Devido ao clima temperado do país, a população precisa se valer de sistemas de aquecimento em suas casas. É muito comum a queima de lenha nas lareiras, prática que ajuda a piorar ainda mais a qualidade do ar nas cidades, especialmente em Santiago. 

O Chile e o Peru, surpreendentemente, registram as maiores taxas de mortalidade prematura por causa da poluição atmosférica na América do Sul. O Chile lidera o ranking com 240 mortes por milhão de habitantes. 

Como sempre costuma acontecer nessas situações de alerta ambiental, o Ministério do Meio Ambiente do Chile implementou uma série de medidas preventivas. Entre as medidas destacam-se a proibição da queima de lenha em lareiras residenciais e a implementação de diversos tipos de restrições ao uso de automóveis em toda a Região Metropolitana. 

Eu lembro perfeitamente dos velhos tempos nas décadas de 1970 e 1980, quando minha cidade – São Paulo, figurava entre as que tinham o ar mais poluído do mundo. Entre os anos de 1978 e 1979, quando eu comecei a trabalhar como office-boy em um escritório, sofri muito com a poluição do ar na área central da cidade. 

Na década de 1980, inclusive, o Governo do Estado criou um sistema de rodízio de carros, onde em função do número final da placa do veículo havia a proibição da circulação em certo dia da semana. Essa medida começou com o objetivo de ajudar a controlar a poluição do ar da cidade, mas, com o tempo, passou a ser usada como forma de diminuir o número de veículos em circulação e reduzir os engarrafamentos. 

Desses anos complicados para cá, a qualidade do ar na cidade melhorou bastante. Surgiram os carros com motores movidos a etanol (o famoso álcool da cana-de-açúcar). Os carros passaram a sair de fábrica com catalisadores nos escapamentos (o que ajuda a reduzir a poluição) e também passou a ser usado um óleo diesel bem menos poluentes na frota de ônibus e caminhões. 

Outro fator positivo foi a mudança do perfil da cidade, que antes era fortemente industrial e atualmente tem uma participação maior do setor de serviços. Com menos fábricas e mais escritórios a atmosfera melhora muito. 

Um fato bem menos comentado é que houve um grande aumento das áreas verdes da cidade. Segundo alguns estudos, essa área mais que dobrou nos últimos 40 anos. Esse aumento se deu principalmente graças às áreas verdes que passaram a ser uma demanda dos compradores de apartamentos em prédios residenciais, além de projetos de arborização como o Projeto Pomar nas margens do rio Pinheiros. 

Uma trágica lembrança para nós paulistas do que é a poluição do ar de uma cidade e que, felizmente, se transformou num case de sucesso foi Cubatão, cidade industrial do litoral de São Paulo que chegou a ser conhecida internacionalmente como o “Vale da Morte” e cidade mais poluída do mundo até o início da década de 1980. 

Graças a sua excepcional localização a meio caminho entre o Porto de Santos e a Região Metropolitana de São Paulo, Cubatão foi escolhida como sede de um grande complexo petroquímico em meados da década de 1950. Em tempos em que o desenvolvimento a qualquer custo era um mantra no mundo, todo esse projeto acabou sendo implantado sem a mínima responsabilidade ambiental. 

Essa situação só mudaria em meados da década de 1980, quando o novo Governo do Estado de São Paulo assumiu e resolveu dar um basta naquela situação caótica. Estudos feitos na época sobre a poluição do ar indicaram o lançamento de cerca de 1.300 toneladas de poluentes particulados e gasosos na atmosfera a cada dia, emitidos pelas empresas instaladas em Cubatão. Foram identificadas no total 230 fontes primárias de poluição do ar. 

Além de esforços para melhorar a qualidade do ar, foram identificadas todas as fontes de poluição das águas – em especial do rio Cubatão, além de determinados os pontos de despejo de resíduos sólidos, inclusive terrenos onde resíduos químicos perigosos estavam sendo enterrados de forma clandestina. 

Depois de vários anos de esforços combinados, a poluição em Cubatão já foi reduzida em cerca de 95%, o que mostra que é possível resolver grande parte dos problemas. A cidade virou um símbolo de sustentabilidade e cuidado com o meio ambiente.

Como é impossível mudar a geografia e o clima de Santiago, os esforços precisarão ser concentrados na redução do uso de combustíveis fósseis como gasolina, óleo diesel e carvão, estimular ao máximo o uso de fontes renováveis como a solar, eólica e o gás natural. Essa formula, aliás, é a mesma que precisa ser usada por outras grandes cidades do mundo que sofrem do mesmo mal. 

Infelizmente, esse é um caminho difícil e que demandará enormes esforços tanto da população quanto do Governo do país. 

O PROMISSOR HIDROGÊNIO VERDE

Em duas postagens recentes falamos sobre a futura aplicação do hidrogênio como uma fonte de energia renovável e limpa para uso em sistemas propulsores de aeronaves. As empresas aeronáuticas vivem uma verdadeira corrida em busca de novos modelos de aeronaves mais sustentáveis. As principais apostas são os motores elétricos e o hidrogênio verde. 

A eletrificação de aviões esbarra na atual tecnologia de baterias, que são muito pesadas e não podem armazenar energia suficiente para garantir voos mais longos. No caso do hidrogênio, o principal problema ainda é a segurança – trata-se de um gás extremamente explosivo e complicado de se armazenar dentro de uma aeronave. 

Apesar das atuais dificuldades técnicas, a tecnologia vai avançando a cada dia que passa. A cada dia surgem notícias de novos protótipos de aviões e Evtol (veículos de decolagem e pouso vertical) com sistemas de propulsão revolucionários, mostrando que estamos chegando cada vez mais próximos de voos ambientalmente sustentáveis – a questão é apenas de tempo.

Vamos falar um pouco do hidrogênio, especialmente da sua versão “verde” 

O hidrogênio é um dos elementos químicos mais abundantes do universo, formando cerca de 75% de toda a massa elementar do cosmos. Estrelas, citando um exemplo, são compostas basicamente por hidrogênio no estado de plasma. O hidrogênio também é o elemento químico mais leve do universo – ele é o primeiro elemento da tabela periódica.  

Entre suas “1.001 utilidades”, o hidrogênio é uma importante fonte de energia limpa e vem sendo alvo de inúmeras pesquisas tecnológicas nos últimos anos. Carros movidos a célula de hidrogênio são uma das grandes apostas para um futuro não muito distante. Esse tipo de tecnologia, entretanto, ainda esbarra nos altos custos energéticos para a produção do hidrogênio.  

Uma das formas clássicas para se obter hidrogênio é através da eletrólise da água – muitos dos leitores devem ter feito este experimento em suas antigas aulas de química. Nesse tipo de processo é usada a eletricidade de uma pilha ou de uma fonte eletrônica usada para o carregamento de telefones celulares para quebrar a molécula da água (a famosa H20), liberando tanto o hidrogênio quanto o oxigênio na forma de gás. 

Para a produção de grandes volumes de hidrogênio para usos industriais e outros fins a tecnologia mais utilizada é a reforma do gás natural. Essa tecnologia se vale de diferentes processos – em comum, todos eles demandam grandes volumes de energia e liberam grandes volumes de resíduos.  

Além das dificuldades técnicas para a obtenção do hidrogênio puro e dos altos custos energéticos envolvidos, armazenar o elemento também não é nada simples. Em estado gasoso, o hidrogênio precisa ser armazenado em pesados tanques de alta pressão. No estado líquido, o hidrogênio precisa ser resfriado a temperaturas inferiores a –252° C para poder ser armazenado em segurança.  

Em qualquer um desses casos, basta uma falha no armazenamento ou no manuseio do hidrogênio para que se desencadeie uma violenta explosão. Um caso fatídico que sempre é lembrado é o do dirigível Hindenburg, uma gigantesca aeronave fabricada na Alemanha na década de 1930. Esse dirigível flutuava no ar graças ao uso de grandes volumes de hidrogênio (cerca de 200 mil m3).

A aeronave foi consumida por um grande incêndio em 6 de maio de 1937 ao tentar pousar em um aeroporto no Estado de Nova Jersey, nos Estados Unidos. Dos 97 passageiros e tripulantes a bordo, 35 morreram, além de um trabalhador do aeroporto que estava no solo. 

A combustão do hidrogênio é bastante conhecida e tem inúmeras aplicações em nosso dia a dia. É muito comum, por exemplo, encontrarmos cilindros de hidrogênio em oficinas mecânicas – o cilindro é acoplado a um maçarico através de uma mangueira e a chama criada é usada na soldagem de peças metálicas.  

Em anos mais recentes, o uso do hidrogênio como um combustível verde vem atraindo a atenção de empresas e de pesquisadores. O hidrogênio poder ser queimado diretamente em um motor sem liberar resíduos ou pode ser usado em uma célula de combustível para gerar eletricidade. Já existem inúmeros projetos de carros que utilizam células de hidrogênio. 

Uma das principais apostas em desenvolvimento em várias partes do mundo é a utilização de energia elétrica gerada em fontes renováveis como a fotovoltaica e a eólica para a produção do hidrogênio verde. 

Uma região com um enorme potencial eólico a ser explorado é a faixa costeira do Nordeste, onde torres do tipo offshore (instaladas sobre o leito oceânico e longa da costa) suportariam as turbinas eólicas. Segundo informações preliminares, esse potencial seria equivalente a 50 usinas hidrelétricas do tamanho de Itaipu.   

Segundo os entusiastas dessa ideia, a energia elétrica gerada nas turbinas eólicas seria usada para produzir hidrogênio verde, que seria armazenado em navios tanques especiais e exportado para todo o mundo. Isso criaria um ciclo virtuoso onde tanto a geração quanto o consumo final da energia do hidrogênio seriam limpos.   

Ainda existem inúmeras dúvidas sobre como todo esse conjunto de “engrenagens” funcionaria na prática, mas a ideia como um todo é bem interessante. Existe abundância de hidrogênio em nosso mundo, enormes fontes de geração de energia renovável a serem exploradas e um mercado consumidor sedento para usar toda essa energia. 

Dentro de poucos anos estaremos vendo veículos de todos os tipos, aviões e embarcações com sistemas de propulsão com células de hidrogênio. Essa mesma energia poderá ser utilizada em residências, indústrias, hospitais, lojas e outros tipos de estabelecimentos – as possibilidades são ilimitadas. 

Existem inúmeras barreiras tecnológicas e de infraestrutura a serem vencidas, mas tudo é uma questão de planejamento e alocação de recursos a longo prazo. Coisas que hoje são cotidianas em nossas vidas como carros, aviões, computadores, telefones celulares, transplantes de órgãos, entre muitos outros, um dia foram sonhos que pareciam inatingíveis. Tudo isso acabou virando realidade. 

O hidrogênio verde é um desses casos – um sonho que dentro de poucos anos poderá se tornar uma espetacular realidade. 

800 MILHÕES DE PÁSSAROS DESAPARECERAM NA EUROPA NOS ÚLTIMOS 40 ANOS 

De acordo com um amplo estudo publicado na revista científica PNAS – Anais da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos da América, na sigla em inglês, na última segunda-feira, dia 15 de maio, cerca de 25% da população de pássaros da Europa desapareceu dos céus nos últimos 40 anos.  

Para desespero de “euroambientalistas” como Emmanuel Macron e Greta Thunberg, que adoram jogar todos os males ambientais do mundo na questão das queimadas e dos desmatamentos da Amazônia, essa gravíssima tragédia é culpa única e exclusiva dos europeus. 

Para início de conversa, existe muita confusão entre o que é ave e o que é pássaro. Todo pássaro é uma ave, mas nem toda ave é pássaro O termo pássaro se refere a aves que pertencem a ordem Passeiforme. Essa grande ordem inclui quase 6 mil espécies, mais da metade do total das espécies de aves existentes. Geralmente, os pássaros são aves de tamanho de pequeno a médio, são canoras e voam.  

Esse estudo se desenrolou ao longo de 37 anos, envolvendo cinquenta pesquisadores e 20 mil locais de monitoramento em 28 países europeus. Foram monitoradas 170 espécies de pássaros em diferentes ecossistemas do continente. De acordo com os diretores do projeto, esse foi um esforço coletivo sem precedentes. 

Depois dessas inúmeras observações os pesquisadores fizeram as contas e perceberam que estavam faltando cerca de 800 milhões de pássaros nesses habitats. Nas áreas rurais onde a agricultura é o carro chefe da economia foi onde a situação se mostrou mais alarmante – nessas áreas a redução das populações de pássaros chegou a 60%. 

Não foi muito difícil estabelecer uma relação direta entre a agricultura e o desaparecimento dos animais – as plantações recebem um verdadeiro coquetel de produtos químicos representados por fertilizantes e pesticidas. As aves insetívoras, ou seja, que se alimentam principalmente de insetos, foram atingidas diretamente. As demais espécies foram afetadas de maneira indireta. 

Dados que reforçam essa percepção estão ligados a pássaros que vivem em outros ecossistemas. No caso dos pássaros que vivem dentro das áreas urbanas, a diminuição das populações foi de 28%. Já para as espécies que vivem dentro de áreas florestais, a redução populacional foi ainda menor – 18%. 

Entre as espécies que mais sofreram reduções em suas populações se destacam as andorinhas, espécie que tem uma preferência por áreas agrícolas, e o papagaio-do-milho, com percentuais de 57% e 77%, respectivamente. 

Outra espécie que foi bastante estudada foram os pardais domésticos (Passer domesticus), cuja população apresentou um declínio de 64%. Uma curiosidade sobre essa ave é que ela foi introduzida aqui no Brasil em 1903 com o objetivo de conter uma grande epidemia de febre amarela que assolava a cidade do Rio de Janeiro. Algum especialista contou ao então Prefeito Pereira Passos que os pardais eram grandes comedores de mosquitos… 

Um outro fator que parece estar afetando os pássaros é o aumento global das temperaturas do planeta, as famosas mudanças climáticas. De acordo com os estudos, espécies que vivem em ecossistemas frios apresentaram uma queda populacional de 40%. enquanto espécies mais adaptadas a ecossistemas mais quentes sofreram um declínio de 18%. 

Segundo o cálculo feito pelos pesquisadores, as populações de pássaros na Europa vêm sofrendo uma redução média de 20 milhões de indivíduos sistematicamente a cada ano ao longo dos últimos 40 anos. A situação é simplesmente catastrófica. 

A redução das populações de pássaros vinha sendo observada já há vários anos e uma das explicações correntes jogava toda a culpa nos gatos domésticos. Os gatos ocupam o segundo lugar entre os bichos de estimação mais populares entre os humanos (em alguns países já estão na primeira posição) e, em virtude da urbanização cada vez maior, eles vêm ocupando cada vez mais o espaço dos cachorros. 

Estudos feitos nos Estados Unidos concluíram que os gatos “yankees” matam cerca de 3,7 bilhões de aves e 20,7 bilhões de mamíferos a cada ano, sem que se inclua na conta as mortes de répteis e anfíbios. Um outro estudo feito na Ilha Marion, na África do Sul, na década de 1970, indicou que os gatos matavam cerca de 455 mil aves marinhas a cada ano. Um estudo semelhante, feito na ilha francesa de Kerguelen na mesma época, mostrou que 1,2 milhão de aves marinhas eram mortas a cada ano por gatos.   

Na Austrália, um grupo de cientistas acompanhou um grupo de 13 gatos “selvagens” por um período de 50 dias em uma área recém queimada no Sudeste do país. Em 101 eventos de caça observados, esses gatos tiveram uma taxa de sucesso média de mais de 32% – nas áreas abertas das savanas, esses gatos obtiveram as melhores taxa de êxito, onde conseguiram abater as vítimas em 70% dos ataques. Os gatos abateram uma média de 7,2 vítimas a cada 24 horas. Em 25% dos casos documentados, os gatos sequer comeram as presas abatidas – ou seja: eles caçam por prazer.

Os estudos comprovaram que os “bichanos” europeus podem até ter dado alguma contribuição para o declínio de algumas populações de pássaros, mas estão longe de serem os grandes vilões da história. A grande maioria das espécies que mais foram afetadas vivem bem longe dos gatos. 

A parte trágica desse problema é que os pássaros realizam importantes “trabalhos ambientais”. Além de controlar as populações de insetos, os pássaros ajudam na polinização das plantas e são grandes dispersores de sementes. Essa brutal redução nas populações desses animais certamente já está tendo repercussões nos respectivos biomas. 

O Brasil, que até o final da década de 1980, ainda dependia da importação de alguns alimentos, se transformou num dos maiores produtores mundiais, especialmente de grãos como soja e milho. Sistematicamente, nossa agricultura é acusada por concorrentes europeus de ser uma grande destruidora do meio ambiente. É comum muitos afirmarem que o excepcional crescimento de nossa produção se deu às custas da destruição de extensas áreas da Floresta Amazônica. 

Até existe alguma verdade nessas afirmações, mas há muito trabalho sério e dedicado de inúmeros produtores rurais para todo esse sucesso. A conclusão desse estudo mostra a responsabilidade da agricultura da Europa na diminuição das populações de pássaros e é um verdadeiro tapa com uma luva de penas na cara de muita gente por lá… 

Já passou da hora de se parar com acusações infundadas e todos nos concentrarmos no que é mais importante – a preservação do meio ambiente como um todo e em todos os continentes.