AQUECIMENTO GLOBAL, CÚPULA DO CLIMA E OS RISCOS PARA AS GELEIRAS DAS GRANDES CADEIAS MONTANHOSAS

Uma notícia que vem ocupando espaços nas manchetes de jornais e de portais de notícias em todo o mundo há várias semanas é a realização da Cúpula do Clima 2021, que será feita de forma virtual a partir do dia 22 de abril. Mais de 40 líderes mundiais participarão do evento e, como muitos de vocês já devem ter observado, o Brasil chega com um enorme “telhado de vidro”. 

De acordo com o discurso que, já há muito tempo é repetido por muitos líderes mundiais, o Brasil é o grande vilão do clima planetário devido aos grandes desmatamentos e queimadas na Amazônia. De acordo com o “texto ensaiado e repetido à exaustão”, as queimadas na Amazônia são as responsáveis pela maior parte das emissões de gases de efeito estufa, os principais responsáveis pelo aquecimento global, além da destruição do “pulmão do mundo”.  

Os gases de efeito estufa, onde se destacam o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4), são liberados pela queima de florestas, como nas alegadas queimadas da Floresta Amazônica, mas também por uma infinidade de outras atividades humanas: indústrias, transportes, queima de combustíveis fósseis como o carvão e os derivados de petróleo, agricultura e pecuária, entre muitas outras. Um exemplo: os processos digestivos de animais domésticos como vacas, bois e carneiros liberam imensas quantidades desses gases (através de arrotos e “pums”)Aliás, cerca de 18% das emissões totais de gases de efeito estufa são geradas por rebanhos bovinos e ovinos de todo o mundo.

Quando pessoas honestas e bem intencionadas fazem os devidos cálculos sobre os volumes e os principais emissores desses gases, conclui-se que o Brasil, o dito “vilão do clima global”, responde apenas por 3% das emissões globais de gases de efeito estufa – menos da metade desse total está ligado à queima de florestas e a agricultura

Os gases de efeito estufa têm um importante papel na regulação da temperatura de nosso planeta. Esses gases formam uma espécie de “escudo” na atmosfera, que absorve parte da radiação infravermelha refletida pela superfície terrestre. Esse mecanismo natural, que impede que a temperatura do planeta apresente grandes oscilações de temperatura entre os dias e as noites, foi fundamental para a consolidação da vida na Terra.

Com o aumento das emissões desses gases por atividades humanas, principalmente a partir da Revolução Industrial iniciada em meados do século XVIII, esse mecanismo começou a ser alterado. O volume de gases de efeito estufa na atmosfera aumentou muito, se refletindo em um aumento das temperaturas no planeta. Um efeito já bastante visível do aquecimento global é o derretimento de grandes quantidades de gelo na Antártida, no Ártico e, especialmente, de geleiras (ou glaciares) no alto de grandes montanhas. 

Um exemplo bem próximo de nós brasileiros está acontecendo na Cordilheira dos Andes, grande cadeia montanhosa que se estende desde a Terra do Fogo, no Sul do Continente, até o Norte da Venezuela e da Colômbia. Geleiras localizadas no alto de montanhas andinas estão perdendo grandes volumes de suas massas de gelo, um problema que afeta a disponibilidade de água nesses países. Grandes e importantes rios da região têm suas nascentes formadas a partir do derretimento do gelo dessas montanhas. 

Um caso de destaque são os riscos criados pelo aquecimento global para as grandes geleiras da Cordilheira do Himalaia, a mais alta cadeia montanhosa do mundo. Alguns dos mais importantes rios da Ásia têm suas nascentes alimentadas pelas águas de degelo desses glaciares. Entre esses rios destacam-se o Indus, o Ganges e o Brahmaputra, os três mais importantes do Subcontinente Indiano. O rio Ganges, citando um exemplo, responde pelo abastecimento de mais de 500 milhões de pessoas na Índia e em Bangladesh

Também entram nessa lista o rio Irauádi, que corta Myanmar no sentido Norte/Sul, e o rio Mekong, o maior e mais importante rio do Sudeste Asiático com mais de 4.350 km de extensão. Dois dos maiores rios da China, o YangTsé (rio Azul) e o Huang-Ho (rio Amarelo) também tem suas nascentes em geleiras nas montanhas Himalaias. Os chineses, inclusive, têm feito grandes obras de engenharia para desviar outros rios, principalmente da região do Tibete, na direção do seu território, uma prática que está incomodando países vizinhos. 

Os dois principais rios da Ásia Central, o Amu Daria e o Syr Daria, também têm suas nascentes alimentadas por geleiras nas Montanhas Himalaias. As águas desses rios vêm sendo utilizadas há várias décadas para irrigação de grandes áreas agrícolas com solos áridos e semiáridos em países como o Quirguistão, Turcomenistão e Tadjiquistão. Conforme comentamos em outras postagens, o uso indiscriminado dessas águas pela irrigação levou o Mar de Aral ao colapso. 

Sem precisar fazer grandes esforços matemáticos, é bem fácil chegar à conclusão que as águas desses e de outros importantes rios com nascentes nas montanhas da Cordilheira do Himalaia atendem as necessidades de abastecimento e de produção agrícola de uma população próxima de 2 bilhões de pessoas na Ásia. A simples menção da possibilidade do derretimento de parte das geleiras dessas montanhas e, consequentemente, a diminuição dos caudais desses rios, tira o sono de muita gente. 

Infelizmente, essa possibilidade é real e já tem até uma data marcada para começar. De acordo com estudos realizados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU – Organização das Nações Unidas, cerca de 1/3 das geleiras das Himalaias, onde se encontram as nascentes dos maiores rios da Ásia, podem começar a desaparecer a partir do ano de 2.035 devido ao aquecimento global e as mudanças climáticas

Para que todos tenham uma rápida ideia dos impactos de uma catástrofe ambiental dessas proporções – se consultarmos a imagem de um mapa (o Google Maps, por exemplo) que mostre o entorno Leste e Noroeste da Cordilheira do Himalaia, vamos encontrar uma extensa região com solos áridos e semiáridos, onde se inclui desde o Rajastão, Estado do Noroeste da Índia, o Paquistão, o Afeganistão, além de partes do Irã e da Ásia Central. Essa região possui mais de 350 milhões de habitantes 

As regiões na cor verde mostradas nesse mapa, onde existem florestas e plantações, estão concentradas nos vales das encostas das montanhas Himalaias e ao longo dos vales de grandes rios como o Indus, no Paquistão, e os rios Amu Daria e Syr Daria, na Ásia Central. A maior parte dos solos ao longo desse grande arco será representada por cores em tons areia, a mais adequada para mostrar a aridez desses solos. 

Sem as águas do degelo dos glaciares das montanhas da Cordilheira do Himalaia, toda a agricultura nessa extensa região, que hoje já enfrenta problemas que vão desde a redução da disponibilidade de recursos hídricos à desertificação de solos, ficará quase que totalmente inviabilizada. 

O aquecimento global e todo um conjunto de mudanças climáticas que já estão sendo observadas em diversas partes do mundo são eventos extremamente graves e urgentes, que exigem a busca de soluções em escala global e não podem ser tratados apenas com a linguagem demagógica que muitos líderes globais vêm adotando. 

Querer jogar toda a culpa desses eventos graves nas costas do Brasil, sob a suposta alegação que a destruição da Floresta Amazônica é a principal causa de tudo isso é, no mínimo, uma grande brincadeira. 

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