Na nossa última postagem falamos rapidamente do gravíssimo problema de erosão dos solos e usamos como exemplo o processo de destruição da grossa camada dos solos de massapê na faixa litorânea da Região Nordeste. Conforme apresentamos no texto, a derrubada da Mata Atlântica para a implantação dos grandes canaviais, pouco a pouco foi resultando no carreamento de grandes volumes dos solos de massapê na direção dos corpos d’água – a região perdeu a mata, a maior parte dos férteis solos de massapê e também teve sua antiga e espetacular rede de cursos d’água assoreada e fortemente reduzida. Os impactos ambientais da indústria canavieira na Região Nordeste foi uma espécie de “pacote completo”.
Os diversos tipos de solos férteis existentes no mundo não surgiram de uma hora para outra – eles são o resultado de um longo conjunto de processos físicos, químicos e biológicos. Podemos definir solo como uma camada fina sobre uma camada rochosa, sendo constituído por diversos tipos de minerais. Esses minerais se formaram a partir dos intemperismos, que são as alterações físicas e químicas a que as rochas foram expostas desde a sua origem na superfície da terra. Os principais compostos do solo são minerais como a areia e a argila, que garantem as características estruturais do solo, a matéria orgânica, responsável pela fertilidade, a água, elemento responsável pela dissolução dos nutrientes e o ar.
Para você entender a formação dos solos é interessante começarmos falando da formação das rochas – e um lugar onde grandes formações rochosas estão surgindo nesse exato momento é o Estado americano do Havaí, onde o vulcão Kilauea está ativo e expelindo grandes quantidades de lava, que nada mais é que rocha em estado líquido. A lava escorre por força da gravidade e vai se acumulando sobre os solos já existentes ou corre na direção do mar, formando “novos” solos. Se você fizer uma pesquisa na internet, poderá encontrar imagens fantásticas mostrando as ondas de lava incandescente do Kilauea atingindo o oceano e se solidificando.
Pois bem – quando as lavas esfriam, o que resta é uma paisagem árida e completamente sem vida, uma vez que a grande maioria das plantas não sobrevive sobre essas rochas ígneas: uma das únicas exceções são os líquens (vide foto). Os líquens são organismos simbióticos, formados por um fungo associado a uma alga verde ou azul, com grande capacidade de sobrevivência em locais inóspitos. Os líquens gradativamente começam a “colonizar” esse novo ambiente e, pouco a pouco, começam a criar uma finíssima cada de material orgânico sobre a superfície rochosa.
As rochas também passam a sofrer desgastes – as alterações da temperatura provocam expansão e contração das camadas superficiais, provocado trincas e desfolhamentos de finas placas de rocha. Com a exposição às chuvas e ao vento, essas camadas de rocha vão se fragmentando e se juntando aos pequenos depósitos de matéria orgânica criados pelas colônias de líquens. Conforme essa camada de solo fértil vai aumentando, sementes de outras plantas que chegam arrastadas pelo vento conseguem germinar e há uma aceleração no processo de formação de matéria orgânica É esse processo lento e gradativo, chamado de gênese dos solos, o responsável pela formação das terras férteis dos solos das florestas, matas e outras formações vegetais, que algum dia serão usadas pela agricultura. Cada centímetro na espessura desse solo pode levar séculos para se consolidar, mas basta uma chuva forte sobre um solo desnudo para todo esse trabalho acabar arrastado pelas águas.
Existem cinco fatores principais para a formação dos solos: o clima, onde temos a radiação solar, a pluviosidade e a pressão atmosférica; os organismos vivos que se desenvolverão e criarão camadas de matéria orgânica; o relevo; o material de origem, que está associado aos tipos de rocha que formam a superfície da região e serão determinantes do tipo de solo que será formado e, não menos importante, o tempo – muito tempo. Regiões de clima quente e de alta pluviosidade, como os Trópicos, tendem a formar camadas de solo em menor tempo do que regiões mais frias ou de baixa umidade. Quanto maior a quantidade de água, mais completo e rápido é o processo de intemperismo – aqui está o segredo de grandes florestas como a Amazônica e a Mata Atlântica.
Um ponto fundamental e que não pode faltar nessa exposição é a capacidade que os solos têm de reter e regular os fluxos de água, garantindo assim o fornecimento de água para todas as formas vivas, animais e vegetais, e controlando a quantidade e a velocidade que os excedentes de água das chuvas vão chegar aos cursos d’água. Essa é uma capacidade que é desenvolvida ao longo do desenvolvimento dos solos e da vegetação de uma floresta, atingindo um ponto de equilíbrio – a súbita remoção da cobertura vegetal, para criação de um campo agrícola por exemplo, pode romper rapidamente esse frágil equilíbrio e grandes volumes de solo passarão a ser carreados pelas águas das chuvas.
A busca por um ponto de equilíbrio para os solos das terras onde se pratica agricultura é um novo paradigma que se coloca para os produtores – a Terra é finita e as atividades humanas ao longo dos séculos já nos custaram grandes volumes de solos férteis. Precisamos administrar muito bem os “estoques” que restaram.