
O Governo da Nova Zelândia anunciou há cinco anos atrás a ousada meta de livrar todo o seu território de algumas espécies invasoras – principalmente os ratos, até o ano de 2050. O programa recebeu o nome de Predator Free 2050. Essa medida drástica tem como principal objetivo proteger as delicadas e exclusivas espécies dos biomas locais da competição com as espécies invasoras.
As ilhas que formam o arquipélago da Nova Zelândia estão separadas de outras áreas continentais há, pelo menos, 19 milhões de anos. Devido a esse isolamento, as únicas espécies de mamíferos nativos das ilhas são os morcegos, que chegaram voando. A fauna local é formada essencialmente por aves, peixes e insetos. Algumas espécies de mamíferos marinhos como baleias e focas visitam as ilhas frequentemente, porém sem causar impactos.
A invasão do território neozelandês por espécies exóticas começou por volta do ano 1300, quando desembarcaram nas ilhas as primeiras expedições de maoris, grupo polinésio originário do Sudeste Asiático. Em suas grandes canoas, os maoris transportavam porcos, galinhas, cães e gatos, entre outros animais domésticos. Ao longo dos últimos 700 anos, essas espécies invasoras vêm competindo com as espécies nativas, que, em muitos casos, levam grande desvantagem.
Uma das primeiras espécies da fauna da Nova Zelândia a ser extinta após a chegada dos maoris às ilhas foram as moas, um grupo de aves que era formado por nove espécies de seis gêneros. Essas aves não voavam e as duas maiores espécies, a Dinornis robustus e a Dinornis novaezelandiae podiam atingir uma altura de 3,6 metros com o pescoço estendido e um peso de 230 kg. Quando os polinésios desembarcaram nas ilhas por volta do ano 1280, estima-se que existiam cerca de 58 mil moas – no ano 1440, todas as moas já haviam desaparecido devido à caça excessiva.
Outra emblemática espécie local que também foi levada à extinção foram as huias (Heteralocha acutirostris), aves que foram caçadas a exaustão para aproveitamento das longas penas de sua cauda em chapéus. Uma outra razão importante para o declínio da espécie foram os desmatamentos para abertura de campos agrícolas e pastagens – as aves não conseguiram se adaptar a outros biomas das ilhas. O último avistamento registrado de uma huia foi feito em 1907.
Uma das principais espécies invasoras e grande causadora de problemas no país são os ratos, que chegaram como clandestinos nos navios que trouxeram os primeiros colonizadores ingleses para a Nova Zelândia ainda no século XVIII. Posteriormente, começaram a chegar animais domésticos como ovelhas, cabras, bois, cavalos e porcos. Também foram introduzidos coelhos, raposas e veados, destinados à caça recreativa de saudosos britânicos.
Os neozelandeses começaram a perceber os problemas criados pelas espécies invasoras ainda no século XIX, quando as populações de coelhos começaram a fugir do controle. Para combater os coelhos, os arminhos foram introduzidas nas ilhas e acabaram se tornando em um problema ainda maior.
As aves terrestres estão entre as espécies mais impactadas pelas espécies invasoras. Isoladas do resto do mundo, diversas aves da fauna neozelandesa acabaram perdendo a capacidade de voar e se especializaram numa vida essencialmente terrestre. Aqui podemos destacar o kiwi, a ave símbolo da Nova Zelândia. Os ratos são atraídos para os ninhos pelo cheiro dos kiwis, onde predam ovos e filhotes, o que vem reduzindo sistematicamente as populações dessas aves.
Outra espécie seriamente ameaçada, principalmente pela predação por ratos, gatos e arminhos, é o kakapo (vide foto), uma espécie de papagaio que não voa e que chega a pesar até 4 kg. Essa ave tinha como único predador natural a águia-de-haast, uma espécie local que também foi levada à extinção pelos maoris por volta do ano 1400. Durante muito tempo, a maior ameaça aos papagaios foi a caça para aproveitamento das penas – depois vieram as espécies invasoras. Um censo feito em 2017, encontrou pouco mais de 150 kakapos vivendo livres na natureza, o que colocou a conservação da espécie como prioridade absoluta do país.
Além dos ameaçados kakapos, estudos indicam que ¼ de todas as espécies de aves do país e um número com aproximadamente 400 espécies animais e vegetais nativas do território neozelandês correm risco iminente de extinção por causa de espécies invasoras. Considerando o tamanho do seu território, que é pouca coisa maior que o Estado de São Paulo, a Nova Zelândia aparece como um dos países do mundo com o maior número de espécies ameaçadas.
Para viabilizar as operações de erradicação das espécies invasoras foi criada em 2016, a Nova Zelândia Sem Predadores, empresa que recebeu um investimento inicial de R$ 68 milhões. Esse volume de recursos vem se somar a outros R$ 115 milhões que já são investidos todos os anos em iscas, armadilhas, venenos e pesticidas que são lançados, inclusive por helicópteros, para combater as espécies invasoras.
Como sempre ocorre nesse tipo de investida, especialistas temem pelas espécies da fauna local, que podem morrer ou ser contaminadas. As autoridades locais afirmam que os riscos criados pelas espécies invasoras são muito maiores e que o risco vale a pena.
As principais espécies invasoras do território neozelandês são os ratos, os possums – uma espécie de marsupial arborícola originária da Austrália, que lembra muito os gambás americanos e que foi introduzida na Nova Zelândia visando o comércio de pele, e também os já citados arminhos. Juntas, essas três espécies respondem pela morte de 25 milhões de aves da fauna neozelandesa a cada ano.
Os gatos domésticos também poderiam ser incluídos nessa lista. Os simpáticos bichanos que vivem nas casas de grande parte da população entram na lista das maiores ameaças as aves. Em seus passeios noturnos pelas vizinhanças dos seus lares, os gatos caçam aves e outros pequenos animais, que muitas vezes são levados como “presentes” para seus donos. Somente nos Estados Unidos, conforme indicam alguns estudos, os gatos matam 3,7 bilhões de aves e 20,7 bilhões de mamíferos a cada ano, o que nos dá uma ideia do impacto desses animais em um bioma.
Normalmente, os gatos possuem uma boa disponibilidade de alimentos em suas casas, porém, segundo os especialistas, essa caça é uma resposta aos antigos instintos selvagens que esses animais ainda carregam. Incluir os gatos domésticos no rol de alvos dos caçadores de espécies invasoras não seria politicamente correto – os donos dos “gatinhos fofos” não aceitariam algo desse tipo.
Os neozelandeses já possuem uma grande experiência na erradicação de espécies invasoras – cerca de 100 pequenas ilhas do arquipélago já foram “limpas”, restando agora o desafio de erradicar os invasores das duas principais ilhas que formam o país – as Ilhas Norte e Sul.
Pessoalmente, eu acho que essa iniciativa do Governo da Nova Zelândia tem poucas chances de vingar dentro do prazo estabelecido. Porém, é preciso reconhecer que é uma grande iniciativa, que merece a torcida de todos.
[…] NOVA ZELÂNDIA PRETENDE ERRADICAR VÁRIAS ESPÉCIES INVASORAS ATÉ O ANO DE 2050 […]
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[…] extinções ocorreu em ambientes de ilhas, onde um dos mais significativos exemplos foram as moas que existiam na Nova Zelândia. Segundo a pesquisa, 68% das espécies de aves que não voam conhecidas pela ciência, como era o […]
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[…] desaparecido devido à caça excessiva. Esses animais não conseguiram se adaptar rapidamente às mudanças ambientais criadas pela chegada dos seres […]
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[…] sentido empenhar grandes esforços científicos para o seu renascimento. Podemos citar o caso das moas da Nova Zelândia, espécies de aves gigantes que foram levadas à extinção menos de dois séculos depois da […]
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