BOAS PERSPECTIVAS PARA A PRODUÇÃO DE SOJA, PORÉM, COM GRANDES PREOCUPAÇÕES COM O CLIMA 

Eu conheci a soja quando garoto em meados da década de 1970, através de um plantio experimental (salvo falha da minha memória, era coordenado pela Casa da Lavoura, um órgão do governo estadual) que foi feito no sítio de um dos meus tios em Lutécia, cidadezinha minúscula no Oeste Paulista. Eu, meu irmão e minhas irmãs costumávamos passar as férias escolares por lá. 

O grão estava perto da época da colheita, com as plantas quase secas, o que dava um aspecto horrível para a plantação. Lembro que minha tia chegou a preparar o grão cozido como se fosse feijão (meus o chamavam de “feijão de soja”) – além de duro, tinha um gosto rançoso e horrível. Já uma espécie de assado de soja que foi feito com o grão batido tinha um sabor um pouco melhor. 

Apesar da péssima impressão inicial que tive do grão, a soja foi ganhando espaço nos campos paulistas e de outras regiões do país, tornando o Brasil um dos maiores produtores mundiais, numa disputa palmo a palmo com os Estados Unidos. A safra brasileira 2022/2023 superou a marca de 150 milhões de toneladas. 

O produto mais famoso, acho eu, feito a partir da soja é o molho shoyu, que é muito utilizado na culinária do Extremo Oriente. Mas a soja vai muito além disso. 

A soja é o que podemos chamar de grão “coringa” com 1001 utilidades. Apenas 5% da soja produzida no país, o que não difere do resto do mundo, é usada diretamente na alimentação humana. A maior parte da produção é destinada a produção de ração para bovinos, suínos, aves e peixes, e também para a produção de óleo vegetal, entre outros usos industriais. 

A maior parte do óleo, algo entre 85% e 90%, é usado na produção de biodiesel, um combustível sustentável que vem tendo um uso cada vez maior. O restante do óleo é destinado ao consumo humano como óleo de cozinha, gordura vegetal e molhos tipo maionese. 

O óleo de soja também é a matéria prima da lecitina, um emulsificante muito utilizado na produção de frios como salsichas, linguiças e salames; maioneses, sorvetes, achocolatados, barras de cereais, entre inúmeros outros alimentos industrializados. 

A soja também é matéria prima de uma série de insumos usados por indústrias de cosméticos, farmacêuticas, veterinária, químicas especializadas em tintas e vernizes, de plástico, entre outras. Subprodutos da soja também são usados na fabricação de adesivos, nutrientes, adubos, espumas, fibras, papéis, entre outros. 

Além do Brasil e dos Estados Unidos, China, Argentina e Índia figuram entre os maiores produtores mundiais. De acordo com estimativas da APROSOJA – Associação Brasileira dos Produtores de Soja, a cadeia de produção envolve 243 mil produtores em todo o Brasil e gera 1,4 milhão de empregos. Cerca de 70% da produção é exportada na forma de grãos, farelo e óleo. 

Falando de forma bastante objetiva, grande parte da humanidade depende da soja, direta ou indiretamente, para a sua alimentação no dia a dia. É difícil imaginar qualquer tipo de alimento de origem animal como carnes, leite e seus derivados, além de ovos, onde a soja e seus derivados não tenham entrado na cadeia de produção. O óleo de soja também entra na composição de inúmeros produtos alimentícios.

Vou citar um único exemplo de um grande consumidor de soja – a China, o maior consumidor mundial e também um dos países com maior população. Em 2022, o país consumiu 116 milhões de toneladas, um volume que não é coberto por sua produção interna, precisando depender de importações. O Brasil é o maior exportador de soja para a China. 

Esse breve resumo ajuda a mostrar a importância do grão e de sua cadeia de produção. Quando a produção em qualquer uma das regiões produtoras pega uma “gripe”, falando de forma figurada, o final da cadeia de consumo pode pegar uma pneumonia. 

As perspectivas para este ano de 2023 são boas de acordo com os últimos relatórios do USDA – Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, na sigla em inglês. A produção global do grão é estimada em 383,01 milhões de toneladas, com estoques revistos para 102,03 milhões de toneladas. 

A previsão de produção anterior era de 388,01 milhões de toneladas, porém, foi reduzida em função da forte seca que vem assolando a Argentina. A previsão de produção no país hermano era de 45,5 milhões de toneladas e passou a ser considerada como 41 milhões de toneladas.  

A América do Sul está sofrendo, pelo terceiro ano consecutivo, os efeitos do fenômeno climático La Niña, tratado em inúmeras postagens aqui do blog. La Niña provoca excesso de chuvas em algumas regiões e secas rigorosas em outras. No ano passado, a “menina malvada” provocou uma forte seca na Região Sul do País e em Mato Grosso do Sul, com grandes prejuízos para a agricultura. 

Neste ano, La Niña deve atingir em cheio a Pampa Argentina, o grande celeiro agrícola do país, aumentando ainda mais o calvário econômico vivido pelo país vizinho, onde a soja é um dos seus principais produtos. 

Apesar da contabilidade agrícola mundial já estar considerando as perdas na produção da soja argentina para este ano, o mercado está com a “pulga atrás da orelha”. Os mesmos efeitos de La Niña poderão atingir em cheio o Brasil, um dos maiores produtores mundiais do grão. 

Dando uma olhada em qualquer mapa da América do Sul é bem fácil observar que a Pampa Argentina está nas mesmas latitudes da Região Sul do Brasil, a segunda maior produtora de soja do País. Também está muito próxima da Região Centro Oeste, o coração da nossa sojicultura. 

Na última safra brasileira a seca provocou importantes perdas na produção de soja da Região Sul e em Mato Grosso, porém, essas perdas foram compensadas com folga pela grande produção de outras regiões. A dúvida do resto do mundo é justamente essa: será que La Niña não poderá criar riscos graves para a safra brasileira deste ano? 

Conforme estamos apresentando nessa série de postagens, existem problemas generalizados na produção de alimentos em todo o mundo, o que pode colocar a segurança alimentar de centenas de milhões de pessoas em risco. Dentro desse contexto, a situação “estável” da soja é muito preocupante. 

VEJA NOSSO CANAL NO YOUTUBE – CLIQUE AQUI

A REDUÇÃO DA PRODUÇÃO DE MILHO EM 2023 

O milho é o grão de maior produção no mundo, ocupando a quarta posição entre os alimentos mais consumidos pelas populações humanas do planeta. A maior parte da produção de milho é usada para a produção de rações para animais, além de ser a matéria prima de amidos, azeites, proteínas, bebidas alcoólicas, edulcorantes alimentícios e também de combustíveis. 

Estudos arqueológicos indicam que os primeiros cultivos de milho datam de mais de 7 mil anos e foram encontrados em ilhas do México no Mar do Caribe. A palavra milho tem origem em línguas indígenas da América Central e significa “sustento da vida”. A cultura do milho foi essencial para o surgimento das grandes civilizações da América Central como os Olmecas, os Maias e os Astecas. O milho foi introduzido na América do Sul há cerca de 4 mil anos.  

A partir do final do século XV e começo do século XVI, exploradores europeus levaram o grão para a Europa, de onde a cultura se espalhou para o resto do mundo. De acordo com informações da AMIS – Sistema de Informação do Mercado Agrícola, órgão vinculado ao G20, a produção mundial de milho para a safra 2022/2023 é estimada em 1,167 bilhão de toneladas

Apesar de impressionante, o volume é menor que a safra anterior que foi de 1,212 bilhão de toneladas. Entre os maiores produtores mundiais se destacam os Estados Unidos, com produção de 383 milhões de toneladas; a China, com 272 milhões de toneladas; o Brasil com 115 milhões de toneladas, e a União Europeia, com 69 milhões de toneladas. 

Uma das principais fontes de problemas de produção de milho são os Estados Unidos, justamente o maior produtor mundial. De acordo com informações do USDA – Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, na sigla em inglês, cerca de 30% das terras utilizadas para o cultivo de milho no país apresentaram condições climáticas ruins ou péssimas, indo de secas prolongadas a nevascas, o que causou uma grande quebra na produção. 

Outro grande produtor mundial que está enfrentando graves problemas é a Argentina. O país vem enfrentando uma forte seca desde o segundo semestre de 2022 e corre o risco de perder 25% de sua safra, estimada em 54 milhões de toneladas. 

A Ucrânia, país que já ocupou a 6ª posição entre os maiores produtores mundiais do grão com uma produção de 42 milhões de toneladas, também tem seus problemas. Relembrando, o país vive um conflito com a Rússia há mais de um ano e deixa sérias dúvidas sobre a sua capacidade de produção e de exportação dos grãos. 

Com a oferta em baixa, os preços do produto sobem e encarecem os custos de produção de outros produtos, especialmente de carnes e ovos. Aqui no Brasil, cerca de 65% da produção de milho é destinada a produção de rações para suínos, bovinos, aves e peixes, situação que não é muito diferente de outros países. 

Além de sua importância como fonte de alimentação para seres humanos e animais, o milho tem diversas aplicações industriais. Uma delas é seu uso para a produção de etanol, um biocombustível altamente sustentável e com demanda crescente. 

De acordo com informações da CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento, a produção brasileira de etanol de milho atingiu a marca de 3,36 bilhões de litros em 2022. Isso representou um aumento de quase 30% em relação ao ano anterior. 

Em tempos de crise energética mundial, onde o petróleo e seus derivados estão enfrentando uma forte oscilação nos preços, a demanda por etanol não para de crescer, o que resulta em um aumento dos volumes de milho destinados a essa produção, em prejuízo ao seu uso como fonte de alimento. 

Uma outra utilização do milho que é pouco conhecida dos brasileiros é seu uso para a produção de bebidas alcoólicas. O grande destaque aqui é o bourbon, o tradicional uísque (ou whisky) de milho norte-americano. A “receita” tradicional tem, pelo menos, 51% de malte de milho em sua composição. 

Uma versão mais popular do bourbon é o moonshine, um whisky de milho incolor que chega a ter um teor alcoólico de incríveis 80%. Essa bebida foi considerada ilegal por muito tempo nos Estados Unidos, sendo produzida de forma clandestina nos rincões do país. O nome moonshine significa, literalmente, “luz do luar” e remete a uma produção feita a noite nas fazendas. 

O grão também é usado na fabricação do malte usado em muitas marcas de cervejas populares encontradas em todo o Brasil. Essa prática surgiu ainda no século XIX, época em que os custos de importação de malte europeu eram muito altos. O uso do milho como opção “tupiniquim” surgiu para baratear o produto e caiu no gosto popular. 

Produtos e subprodutos feitos a partir do milho também são utilizados na produção de cosméticos, shampoos, cremes hidratantes, corantes, óleos, adesivos, entre outras aplicações. Existem estimativas que falam de mais de 3.500 aplicações diferentes para derivados do milho, o que mostra o tamanho do impacto de uma redução na produção e de um aumento dos preços. 

Os usos voltados para alimentação humana e animal, entretanto, são os prioritários e os que causam maiores preocupações em um cenário mundial de escassez de alimentos. Qualquer uso como cosmético ou em indústria não tem a mesma prioridade que a alimentação, uma necessidade inadiável. 

Ao milho se juntam produtos como a soja, as carnes, o açúcar, o café, entre outros alimentos que vem apresentando uma forte demanda ao mesmo tempo em que apresentam dificuldades de produção e de exportação em muitos países. O cenário internacional é bastante preocupante. 

VEJA NOSSO CANAL NO YOUTUBE – CLIQUE AQUI

ESPECIAL: GUARAPIRANGA – A CONSTRUÇÃO

Um breve resumo do processo de construção da Represa Guarapiranga na cidade de São Paulo entre os anos de 1906 e 1909.

A represa foi projetada para funcionar como um reservatório virtual da Usina Hidrelétrica de Santana de Parnahyba, empreendimento que apresentava uma forte queda na geração de energia durante o período da seca. A Represa Guarapiranga tinha como função acumular água durante a temporada das chuvas, águas que seriam liberadas gradativamente durante os meses de seca.

A represa cumpriu esse objetivo até 1928, ano em que teve sua função alterada para manacial de abastecimento da cidade de São Paulo.

A ALTA NO PREÇO DO TRIGO

O trigo é o segundo cereal mais consumido no mundo, só perdendo para o polivalente milho e ficando um pouco à frente do arroz. A planta selvagem começou a ser domesticada e melhorada pela humanidade há cerca de 10 mil anos bem no início da agricultura.  

Os mais antigos centros de produção ficavam na Mesopotâmia e no Subcontinente Indiano. Depois a cultura chegou ao Norte da África e na Europa, se espalhando depois para os quatro cantos do mundo. Um dos principais alimentos produzidos a partir do trigo é o pão, um dos maiores símbolos da civilização humana. 

Existem evidencias arqueológicas da produção desse alimento pelo Homo sapiens há cerca de 30 mil anos. Nossos antepassados moíam raízes de plantas até obter um extrato de amido que era assado sobre uma pedra plana. Uma espécie de padaria com cerca de 14,5 mil anos foi encontrada na Jordânia e há 10 mil anos usamos grãos de cereais para produzir pão. Qualquer povo de respeito tem sua própria receita e sua técnica para a produção de pão.   

Nos últimos anos a produção e os preços do cereal sofreram fortes oscilações, problema que foi agravado com o início do conflito entre a Rússia e a Ucrânia em 2022. Os dois países respondiam juntos por cerca de 30% da produção mundial de trigo no início do conflito há pouco mais de um ano. O conflito prejudicou tanto a produção quanto o escoamento do produto, causando uma brutal redução da oferta e um aumento dos preços. 

De acordo com dados da CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento, a produção da Rússia era de cerca de cerca de 74 milhões de toneladas de trigo a cada ano. A Ucrânia produz cerca de 33 milhões de toneladas ano. O maior produtor mundial é a União Europeia, com uma produção de mais de 150 milhões de toneladas. Apesar da grande produção, os países europeus dependiam de importações tanto da Rússia quanto da Ucrânia para equilibrar a oferta. 

A produção mundial de trigo não vinha andando nada bem nos últimos anos, principalmente na União Europeia. Com o início da epidemia da Covid-19 em 2020, muitos dos trabalhadores da agricultura foram obrigados a voltar para seus países de origem por causa das políticas de restrição à circulação de pessoas. A maior parte desses trabalhadores vem de países do Leste Europeu como a Polônia, Bulgária e Geórgia.   

Com a redução da oferta de trigo no mercado internacional, os preços começaram a subir fortemente – essa é a famosa lei da oferta e da procura. Num mercado que já vive com escassez, a perspectiva de uma redução ainda maior na oferta por causa do conflito na Ucrânia produziu mais nervosismo e mais aumentos de preços. 

A situação ficou ainda mais complicada quando a China a Índia, que entram na lista dos maiores produtores mundiais, resolveram proibir as suas exportações de trigo. Juntos, os dois países concentram uma população que supera a marca de 2,7 bilhões de habitantes e colocaram a segurança alimentar de suas gentes em primeiro lugar. 

O Brasil, que não é autossuficiente na produção de trigo, precisa importar cerca de metade das suas necessidades de consumo. Todos sentimos no bolso o aumento dos preços de alimentos que tem trigo em sua composição. O nosso tradicional pãozinho de cada dia sofreu um aumento da ordem de 15% ao longo de 2022. 

Em grande parte do Brasil o chamado “pão francês”, é quase uma unanimidade. Apesar do nome, esse tipo de pão vem de uma receita 100% carioca. Antes da vinda da Família Real Portuguesa, a farinha de trigo consumida aqui no Brasil era escura e de péssima qualidade. Após a chegada da nobreza ao Rio de Janeiro, passou a ser utilizada a farinha de trigo francesa, de melhor qualidade e branca.   

As padarias da Corte começaram a fazer pães macios e crocantes com essa farinha e a população batizou a iguaria de “pão francês”. Apesar da receita ser praticamente a mesma em todo o país, o nome do pão muda conforme a região. No Maranhão é chamado de pão massa grossa; no Paraná é pão careca; na Paraíba é pão aguado e no Ceará pão carioquinha. Já no Rio Grande do Sul e na Bahia é mais conhecido como cacetinho. 

Apesar de ser um dos maiores produtores mundiais de alimentos, o Brasil tem dificuldades na produção de trigo. Conversando recentemente com um amigo agrônomo, fiquei sabendo que o grande problema para a produção do cereal aqui no país são as chuvas na época da colheita – em contato com a água, as sementes começam a germinar, o que prejudica a qualidade final do produto. 

Desde 2012, pesquisadores da EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias, vem trabalhando na tropicalização do trigo, cultura que se adaptou muito bem ao clima subtropical do Sul do Brasil. Cerca de 90% da produção brasileira de trigo, estimada em 7,7 milhões de toneladas, está concentrada em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul.  

Os esforços dos pesquisadores levaram à criação das variedades de trigo BRS 264, BRS 394 e BRS 404, todas adaptadas para o cultivo no Cerrado. Plantios experimentais dessas variedades começaram a ser feitos em Goiás, no Distrito Federal e em Minas Gerais, onde se obteve uma produtividade acima da média brasileira. Em 2021, um produtor de Cristalina, em Goiás, obteve uma produtividade de 9,6 toneladas por hectare, mais de três vezes a média obtida no Sul do Brasil.  

No final de 2020, a EMBRAPA conseguiu outro feito impressionante – em parceria com a iniciativa privada foi realizada a primeira colheita de trigo no quente e seco Ceará. A produtividade ficou em 5,5 toneladas por hectare, menos que a obtida na região do Cerrado, porém, mais alta do que a dos Estados do Sul do país. Experimentos também estão sendo feitos no Piauí e no Maranhão.  

A mais nova frente de pesquisas são os Campos Amazônicos de Roraima, que são muito parecidos com os do Cerrado. O plantio experimental foi feito no final de 2021 e os resultados da primeira colheita foram promissores. As variedades utilizadas foram as mesmas desenvolvidas para o Cerrado.  

A produtividade obtida mais uma vez foi superior à do Sul do Brasil, com um período de desenvolvimento das plantas na faixa de 75 dias, enquanto na Região Sul esse período pode chegar aos 180 dias. As perspectivas para a cultura nessa região da Amazônia são extremamente promissoras. 

Apesar das boas expectativas de produção para o Brasil, ainda vamos precisar comer o “pão que o Diabo amassou” por muito tempo ainda e pagar preços cada vez mais salgados na compra de trigo. 

VEJA NOSSO CANAL NO YOUTUBE – CLIQUE AQUI

OS RISCOS DE UMA CRISE MUNDIAL DE ALIMENTOS

Na última terça-feira, dia 7 de fevereiro, a cidade de São Paulo e boa parte da Região Metropolitana enfrentaram uma chuva recorde – em 3 horas choveu o volume esperado para 10 dias.  

Bem por acaso, eu estou trabalhando numa obra de reparo da piscina de uma cobertura na Região dos Jardins. Meu pessoal havia esvaziado completamente a piscina um pouco antes da chuva e, no dia seguinte, havia uma lâmina de água de 10 cm. Ou seja, o volume de chuva naquele ponto foi de 100 mm, um valor elevadíssimo. 

Sempre que uma chuva com essa intensidade atinge a Região Metropolitana, existe um aumento quase que generalizado nos preços das verduras e de muitos legumes consumidos pela população. Essa produção fica localizada no Cinturão Verde, uma região de produção agrícola em municípios vizinhos. A chuva destrói as plantas, o que faz com que os preços disparem. 

Além de chuva em excesso, plantações sofrem pesadas perdas com secas e ondas de calor, com geadas e frio fora de época, com ataques de pragas como gafanhotos, entre outros eventos associados a problemas climáticos e ambientais. 

Não é segredo para qualquer leitor bem informado a imensa quantidade de problemas climáticos que estão pipocando por todos os cantos do planeta. Ondas de calor extremo em regiões da América do Norte, da Europa e da Ásia. Outras regiões estão sofrendo com secas severas ou com ondas de frio extremo. 

Grande parte desses problemas decorrem do aumento das temperaturas do planeta, mais conhecido genericamente como as mudanças climáticas globais. Entre outros problemas, essas mudanças climáticas estão afetando a produção de alimentos em várias partes do mundo. 

Um outro problema importante que também está afetando a produção de alimentos é a crise energética. Um exemplo fácil – tratores e máquinas agrícolas, além dos caminhões usados para o transporte da produção, utilizam, majoritariamente, motores diesel. Se o preço desse combustível sobe, há um impacto direto nos custos e no volume de produção dos campos. 

O aumento dos custos energéticos também tem impacto nos custos de produção de insumos importantes para a agricultura – fertilizantes, calcário, pesticidas, maquinários e implementos agrícolas, entre outros. Isso também vai encarecer e até mesmo desestimular a produção. 

Falando de fertilizantes, precisamos falar do imbróglio criado após a invasão da Ucrânia pela Rússia, esta última uma importante produtora de diversos tipos de fertilizantes. Muitos países impuseram pesadas sanções contra a Rússia, o que, entre outras coisas, fechou o acesso de boa parte do mundo aos fertilizantes fabricados no país. 

Essa invasão também comprometeu um importante celeiro agrícola do mundo – a Ucrânia. Grande parte dos países da Europa dependia das exportações de alimentos da Ucrânia para equilibrar a demanda de suas populações, a começar pelo trigo. Não custa lembrar que Rússia e Ucrânia respondiam por quase 1/3 da produção mundial de trigo até um ano atrás. 

Completando o “pacote” de problemas, precisamos lembrar da pandemia da Covid-19, que paralisou a economia mundial por mais de um ano e que, ainda hoje, está causando problemas em todo o mundo. Muitos países ficaram sem mão de obra no campo e a produção de importantes culturas sofreu uma forte retração. 

O somatório de todos esses problemas pode estar levando o mundo a uma grande crise alimentar já a partir desse ano de 2023. De acordo com informações da FAO – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, o preço real dos alimentos sofreu um aumento de 28% entre os anos de 2020 e 2021, e de, pelo memos, 20% em 2022. Aliás, os preços atingiram o nível mais alto desde 1960. 

Segundo a FAO, a parcela da população mundial em situação de insegurança alimentar aguda saltou de 135 milhões em 2019, para 345 milhões atualmente. Além disso, 845 milhões de pessoas carece de uma alimentação adequada. A situação é mais crítica na África e na Ásia. 

Entre as regiões com maiores problemas destacam-se o Chifre da África, onde se incluem territórios da Somália, Etiópia, Eritréia e Djibuti, região que sofre os efeitos de uma seca avassaladora, o Afeganistão e o Paquistão, onde grandes áreas foram devastadas por enchentes, além de zonas em guerra como a Síria.  

Mesmo em países com grande produção de alimentos como o Brasil, Argentina e Estados Unidos, há grandes problemas. Na Argentina, por exemplo, mais de metade da população foi colocada numa condição de pobreza absoluta por problemas de gestão econômica do país e não consegue comprar alimentos em quantidade suficiente. 

Aqui no Brasil a população vê os preços dos alimentos aumentarem por causa da forte demanda internacional por carnes, soja e milho, o que reduziu o poder de compra. Já nos Estados Unidos há uma série de quebras de safras por causa do clima e também problemas generalizados na logística – os norte-americanos até tem dinheiro em mãos, mas estão encontrando supermercados com muitas prateleiras vazias. 

Trocando em miúdos – a coisa está ficando feia e todos nós teremos dificuldades pontuais ou até mesmo críticas no acesso a diversos tipos de alimentos. E, de acordo com as leis de mercado, se a oferta de algum produto cai os preços sobem. 

Ao longo das próximas postagens vamos apresentar alguns dos diversos problemas que estão sendo enfrentados pelos produtores de importantes alimentos e tentar avaliar os impactos que isso gerará para os consumidores a médio e longo prazo. 

Até lá! 

VEJA NOSSO CANAL NO YOUTUBE – CLIQUE AQUI

UMA TEMPESTADE SOBRE O RIO DE JANEIRO 

Na nossa última postagem sobre a chuva recorde do ano na cidade de São Paulo e de suas consequências no trânsito. Foram cerca de 3 horas de chuva forte, o despejou um volume de chuvas equivalente ao que era esperado para 10 dias. 

O dia também foi bastante complicado no Rio de Janeiro, a segunda maior cidade do país. Em 4 horas de chuva intensa caiu um volume de água equivalente a 70% do que era esperado para todo o mês. Em alguns bairros da Zona Norte o volume de chuvas ultrapassou todo o volume esperado para o mês de fevereiro. 

Ambas as cidades, conforme já tratamos em inúmeras postagens aqui do blog, não estão preparadas para conviver com grandes episódios de chuva intensa. No Rio de Janeiro, entretanto, a topografia acidentada intensifica ainda mais os problemas. 

De acordo com informações do CEMADEN – Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastre Naturais, a cidade recebeu um volume de chuvas da ordem de 130 mm – na região de Vicente de Carvalho, a precipitação foi de 140 mm. São Paulo recebeu no mesmo período cerca de 100 mm de chuva (de acordo com uma medição que eu mesmo fiz na região dos Jardins). 

Até o final da madrugada dessa quarta-feira, dia 8 de fevereiro, o Centro de Operações Rio registrava 117 bolsões de água acumulada nas vias da cidade, 20 pontos críticos de alagamento, 113 sirenes de alerta acionadas nas comunidades (de um total de 162) e também 4 quedas de árvores. Uma menina de 2 anos morreu após o desabamento de uma casa na Tijuca. 

Como sempre costuma ocorrer nessas situações, o sistema de transporte da cidade entrou em colapso, prejudicando a volta para a casa de centenas de milhares de cariocas. Entre as principais ocorrências: 

  • A circulação do VLT – Veículo Leve sobre Trilhos, foi interrompida nas linhas 1,2 e 3; 
  • Também foram interrompidas a circulação de trens nos ramais Belford Roxo, Saracuruna, Santa Cruz e Japeri; 
  • A linha 42 do BRT, sistema de transporte coletivo da cidade, que faz a rota Madureira-Galeão, teve parte do seu roteiro reduzido e só chegava até a Penha. Os serviços nas linhas 46, Alvorada-Penha, e do serviço eventual 6, Alvorada-Penha, ficaram irregulares; 
  • Importantes vias da cidade como a Avenida Niemayer, Estrada de Furnas e Avenida Edson Passos ficaram interditadas. 

Em diversos bairros da cidade como Saúde, Méier, Tijuca, Catete, Penha, Jardim Botânico e Gávea, entre outros, as fortes chuvas provocaram enchentes localizadas, o que obrigou motoristas a estacionar sobre as calçadas ou procurar locais mais elevados até as águas baixarem. 

Assim como ocorre em São Paulo e outras grandes cidades brasileiras, o Rio de Janeiro não possui um sistema de drenagem de águas pluviais adequado às suas necessidades. A topografia acidentada da cidade, com muitos morros e montanhas, amplifica o tamanho do problema – a água das chuvas ganha força e velocidade ao descer as encostas, fazendo com que canais recebam enormes volumes de água em muito pouco e transbordem. 

A ocupação desordenada das encostas de morros na cidade ganhou força no final do século XIX, quando grandes contingentes de escravos libertos buscaram essas áreas para morar. Com a ocupação vieram os desmatamentos e a impermeabilização gradual dos solos. Qualquer chuva mais forte cria enxurradas violentas morro abaixo e enchentes as áreas mais baixas da cidade. 

Um exemplo desse tipo de degradação é a que encontramos na região do Canal do Mangue, no bairro da Tijuca. O local sofreu com a forte ocupação urbana a partir da década de 1950, especialmente nas áreas de encostas. De acordo com a Prefeitura existem 17 “comunidades” na região, que é campeã no quesito enchentes. 

De acordo com o Censo do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, de 2010, perto de 22% da população da cidade do Rio de Janeiro vive em “comunidades”. São 763 “comunidades” no total, onde vivem cerca de 1,4 milhão de pessoas, o que nos dá uma ideia dos problemas de ocupação de áreas inadequadas e sujeitas a alagamentos. 

Além da ocupação de encostas de morros, muitas dessas “comunidades” ocuparam terrenos baixos em antigas regiões de mangues e de margens de rios e canais. Entre outros problemas, esse tipo de ocupação bloqueia o fluxo das águas nos momentos de chuva forte, causando enchentes localizadas por toda a cidade. 

Essas ocupações também dificultam o acesso aos canais nas operações de limpeza e desassoreamento que deveriam ser realizadas com periodicidade pela Prefeitura. Para complicar ainda mais a situação, esses canais costumam receber grandes volumes de resíduos sólidos lançados pela população, indo desde de entulho e resíduos da construção civil até lixo doméstico. 

Sem encontrar caminhos para seguir na direção da Baía da Guanabara, as águas das chuvas vão se acumulando por todos os cantos da cidade e causando enormes transtornos na vida de centenas de milhares de pessoas. 

Além de necessitar de fabulosos volumes de recursos financeiros para resolver seus problemas de drenagem de águas pluviais, a cidade do Rio de Janeiro também precisará investir paralelamente na construção de moradias populares para a remoção dessas “comunidades” localizadas em áreas críticas em encostas de morros e em baixadas. 

Num segundo momento, será preciso investir pesado no reflorestamento das encostas de morros e em outras áreas que foram ocupadas de maneira irregular ao longo de, pelo menos, um século. São problemas demais a serem resolvidos para recursos financeiros de menos. 

Enquanto isso não acontecer – o que todos sabemos que é bastante improvável, continuaremos a ver a repetição das catástrofes geradas pelas chuvas em terras cariocas e fluminenses verão após verão… 

VEJA NOSSO CANAL NO YOUTUBE – CLIQUE AQUI

RECORDE DE CHUVA E DE TRÂNSITO NA CIDADE DE SÃO PAULO 

Hoje foi mais que uma tarde típica de verão na cidade de São Paulo. 

Em pouco mais de três horas a cidade recebeu um volume de chuvas equivalente a dez dias. As consequências não tardaram a aparecer – de acordo com informações da CET – Companhia de Engenharia de Tráfego, autarquia que tenta colocar um pouco de ordem no trânsito caótico dessas horas, foi batido o recorde de engarrafamentos do ano. 

Foram 431 km de vias paradas às 17h30 desta terça-feira, dia 07 de fevereiro. De acordo com o boletim da CET divulgado às 16h30, foram contabilizados 34 pontos de alagamentos nas ruas e avenidas da cidade, sendo 22 intransitáveis e 12 transitáveis. Haja paciência. 

Um site de notícias comparou o tamanho do caos de hoje ao que foi vivido pelos paulistanos em 9 de dezembro do ano passado, quando a nossa Seleção enfrentou a Croácia nas quartas de final da Copa do Mundo de 2022. Naquele dia foram 485 km de engarrafamento devido ao excesso de carros na rua. 

Na hora da chuva eu estava trabalhando na Região dos Jardins, um conjunto de bairros de alto nível aqui da cidade. Eu terminei meu trabalho por volta das 16 horas, momento em que ainda chovia, porém, já com uma intensidade reduzida. 

Para quem não conhece essa região, 8 em cada 10 milionários da cidade mora por lá. O preço do metro quadrado construído dos imóveis supera fácil o valor de R$ 20 mil, um dos mais caros do Brasil. Morar por lá não fica muito distante do padrão de uma 5ª Avenue em Nova York ou de uma Champs Élysées de Paris. 

Pois bem – eu fiquei assustado com a quantidade de água acumulada nas calçadas, sendo que passei em alguns pontos onde a lâmina chegava perto dos 20 cm. No meu bairro, que é paupérrimo quando comparado aos Jardins e fica perto da periferia (ou subúrbio) da cidade, as ruas não empoçam desse jeito. 

O “conjunto da obra”, que afeta tanto os milionários quanto as camadas mais pobres da população paulistana e da maioria das cidades brasileiras, é resultado da falta de preparo de nossas cidades para os momentos de chuva forte. Nunca é demais repetir que vivemos em um país de climas predominantemente tropical e equatorial. Temporadas de chuvas fortes sempre fizeram parte de nossas paisagens. 

E, nessas horas, sempre temos a certeza que a nossa infraestrutura urbana não está preparada para suportar grandes volumes de água caindo do céu em um curto espaço de tempo. Também é importante lembrar que falta uma manutenção mais frequente naquilo que já existe. 

Em minha aventura de pouco mais de 15 minutos de caminhada até a estação do trem (que, aliás, estava trafegando em velocidade bastante reduzida), pude perceber claramente que a maioria das “bocas-de-lobo” (nome que nós paulistanos damos aos pontos de drenagem de águas pluviais que ficam no meio-fio ou sarjeta das ruas) estavam entupidas. 

Para quem nunca viu um desses dispositivos abertos, ele possui uma caixa de desarenação que serve para acumular areia, pedras e lixo arrastados pelas enxurradas. Essa caixa precisa ser limpa regularmente, especialmente antes da chegada do período de chuva, de modo a estar totalmente funcional na hora dos temporais. 

Se está faltando uma limpeza adequada das bocas-de-lobo dos Jardins, pensei cá com “meus botões”, fico imaginando a situação do resto da “matilha” nos bairros mais pobres da cidade. Conforme falei em uma das primeiras postagens aqui do blog em 2016, esses dispositivos são o “bê-á-bá” dos sistemas de drenagem de águas pluviais – se o básico não funciona, o que esperar de dispositivos mais complexos? 

A Rede de Drenagem de Águas Pluviais, o nome técnico dado ao conjunto desses dispositivos, utiliza toda a “infraestrutura natural” do relevo de uma região para escoar os excedentes de água que são precipitados nos dias de chuva. Falo aqui dos canais de córregos, ribeirões, rios e lagoas.  

Além dos meios naturais, as cidades precisam investir em canais artificiais de drenagem – sarjetas nas ruas, bueiros, grelhas, tubulações subterrâneas de grande porte, piscinões, bacias de detenção abertas, solos permeáveis, áreas verdes, entre outros dispositivos. Quando uma cidade teve seus canais naturais destruídos devido ao crescimento da mancha urbana ou não investiu na construção de sistemas artificiais, temos as enchentes

Quando assistimos um telejornal na TV e ouvimos o apresentador/apresentadora falar que choveu o equivalente a 20 mm, por exemplo, isso quer dizer que o volume de chuva que caiu sobre uma área com um metro quadrado formou uma lâmina de água com 20 mm de altura (ao longo do tempo de duração da chuva). Trocando em miúdos, isso indica que caiu um volume de 200 litros de água a cada metro quadrado da cidade. 

Se o terreno da sua casa possui 250 metros quadrados, por exemplo, ele recebeu um volume de água de 50 mil litros nessa chuva. Essa mesma chuva caiu sobre os imóveis dos seus vizinhos, sobre as ruas e avenidas, prédios públicos, praças e demais logradouros da sua cidade. Somando-se tudo, chega-se bem fácil a dezenas de milhões de litros de água em poucas horas. 

Caso a drenagem das águas pluviais da sua cidade não estiver devidamente dimensionada ou seus dispositivos não estão funcionando corretamente, com certeza a população sofrerá as consequências na forma de enchentes, alagamentos, deslizamentos de encostas, entre outras tragédias. 

Desgraçadamente, o descaso com a drenagem das águas pluviais é uma espécie de regra aqui em nosso país. Raras são as cidades que estão preparadas para suportar de maneira adequada um grande volume de chuva sem apresentar maiores problemas. 

Além de danos materiais, que bem ou mal sempre podem ser resolvidos com o tempo, esses temporais costumam matar pessoas. Até onde eu pude ver nos noticiários, a forte enxurrada formada pela chuva dessa tarde arrastou um morador em Osasco, cidade vizinha a São Paulo. Com certeza, teremos notícias de outras vítimas fatais nas próximas horas. 

Entra verão, sai verão e as coisas não mudam… 

VEJA NOSSO CANAL NO YOUTUBE – CLIQUE AQUI

UMA PASTILHA QUE EVITA A EMISSÃO DE GÁS METANO POR BOVINOS

Os seres humanos são, por definição biológica, onívoros. Trocando em miúdos, somos animais – altamente racionais, é claro, que comem de tudo: frutas, verduras, legumes, cereais e, especialmente, carnes e outros tipos de alimentos de origem animal. 

De acordo com um estudo publicado na revista científica Nature em 2016, o consumo de carne foi decisivo na evolução humana. A ingestão frequente de proteínas dos diferentes tipos de carnes foi fundamental para o desenvolvimento de nossos cérebros.  

A captura e a caça organizada dos animais, pratica que começou há pelo menos 2,6 milhões de anos, motivaram uma organização cada vez maior dos grupos humanos, influenciando diretamente sua forma de vida. Também forçou o desenvolvimento de armas cada vez mais sofisticadas para a caça, além de estimular a criação de ferramentas adequadas para o corte e a desossa dos animais abatidos. 

O uso do fogo para o cozimento, iniciado há cerca de 500 mil anos, também contribuiu para mudanças em nossa anatomia, levando ao desenvolvimento de dentes menores e a uma necessidade de músculos faciais menos desenvolvidos para a mastigação. 

A análise de fezes fossilizadas do homem de Neandertal, nosso parente extinto mais próximo, encontradas em cavernas da Espanha e datadas em mais de 40 mil anos, mostrou que sua dieta era composta por mais de 80% de carne. Entre os da nossa espécie, o Homo Sapiens, esse consumo não era muito diferente à mesma época. 

Com o desenvolvimento da agricultura há pelos menos 10 mil anos, as populações se tornaram sedentárias e teve início um longo processo de domesticação de animais como galinhas, porcos, vacas, cabras e carneiros, entre muitos outros. Além de garantir o suprimento de carne, a criação desses animais permitiu o acesso a leite e ovos, além de outros produtos como a lã das ovelhas. 

Existem cerca de 1,5 bilhão de bovinos criados para o abate pastando em algum lugar do mundo nesse momento. Essa lista deve incluir outras centenas de milhões criados para a produção de leite e também grandes quantidades de porcos, galinhas, cabras, ovelhas, entre outras espécies. Grande parte dos cerca de 8 bilhões de habitantes de nosso planeta costumam consumir alguma quantidade de carne e outros produtos de origem animal ao longo do dia. 

Uma discussão que vem crescendo ao longo dos últimos anos são as emissões de metano, um gás que é gerado naturalmente durante o processo de digestão de animais como bovinos e ovinos. O metano é um dos principais GEE – Gases de Efeito Estufa, que são os grandes responsáveis pelo aumento das temperaturas do planeta. 

Muitos ecologistas defendem a redução do consumo de carne – alguns, mais radicais, pedem o fim desse consumo, como forma de frear o aquecimento global. Muitos Governos, inclusive, vêm estimulando o uso de proteínas alternativas como insetos para consumo humano.   

Existem muitos movimentos e iniciativas internacionais que lutam contra o consumo da carne. Um deles é o “Segunda Sem Carne“, uma iniciativa existente em 35 países do mundo e apoiada por inúmeros líderes internacionais. Um dos grandes líderes do movimento é o ex-Beatle Paul Mccartney, que pede que os consumidores deixem de comer carne as segundas-feiras, reduzindo assim a demanda pelo alimento. Esse grupo alega que grande parte da produção de cereais do mundo como a soja e o milho é usada para a produção de carne para exportação. 

Na contramão do que querem esses grupos, o consumo de carnes vem aumentando progressivamente nas últimas décadas. Países com gigantescas populações como a China e a Índia estão puxando esse consumo devido a uma série de medidas econômicas – um número cada vez maior de suas populações estão saindo da miséria e assumindo posições sociais melhores. 

Essa mudança no perfil social resulta, entre outras coisas, num melhor acesso a alimentos, especialmente alimentos de melhor qualidade como carnes, ovos, leite e seus derivados. Isso resulta, falando a grosso modo, em pessoas mais saudáveis e menos sujeitas a doenças. 

Um exemplo interessante é a Índia, país sempre esteve associado a uma alimentação vegetariana, onde o consumo de carne bovina está crescendo de forma surpreendente. Cerca de 80% da população do país, que conta atualmente com 1,17 bilhão de habitantes, segue o Hinduísmo, uma religião que combate o consumo da carne há vários séculos.  

Com o forte crescimento econômico que a Índia vem experimentando nos últimos anos e com a ascensão de uma forte classe média, comer carne vermelha deixou de ser um tabu e se transformou num símbolo de status social.   

Muitos criadores de gado da Austrália vinham adicionando algas marinhas da família das Asparagopsis na ração servida aos animais como forma de reduzir as emissões de gás metano. Segundo estudos, a ingestão dessas algas ajuda a reduzir a produção de metano nos processos digestivos dos animais em até 98%. 

Apesar de comprovadamente eficiente, esse método não era nada barato, uma vez que o cultivo das algas feito em mar aberto é bastante dispendioso. Para desespero dos ambientalistas, uma empresa sediada na cidade de Perth – a Rumin8, conseguiu sintetizar em laboratório o princípio ativo dessas algas – o bromofórmio. 

A empresa está colocando no mercado uma série de produtos veterinários que contém o princípio ativo, onde se incluem pastilhas de liberação lenta, suplementos minerais em pó, líquido à base de óleo para ser misturado à ração e também um produto solúvel para ser misturado na água servida aos animais. 

Para a felicidade dos apreciadores de um bom churrasco, que poderão comer carne à vontade sem sentir peso na consciência por causa de problemas ambientais, a empresa garante que seus produtos reduzem a liberação de gás metano nos rebanhos em até 95%.  

São soluções inteligentes e eficientes como essa que o nosso mundo precisa!

ESPECIAL: GUARAPIRANGA – A GÊNESE

Nas últimas décadas do século XIX, a cidade de São Paulo experimentou um surto de desenvolvimento econômico e social nunca visto na história do Brasil. Esse desenvolvimento foi resultado direto da cultura do café que, desde meados daquele século, mudaça radicalmente as paisagens do interiro paulista.

As mudanças na cidade começaram na década de 1860, quando foi concluída a Ferrovia Santos-Jundiaí, importante meio para o escoamento da produção do café. Localizada no meio do caminho, a pequena cidade de São Paulo, que então tinha apenas 30 mil habitantes, foi transformada em um importante centro comercial e logístico do Estado.

O susrto de desenvolvimento culminou com a chegada da energia elétrica nos últimos anos do século XIX, primeiro com geração descentralizada em máquinas movidas a vapor e depois com uma geração de maior potência na Usina Hidrelétrica de Santana de Paranahyba, empreendimento localizado na calha do rio Tietê e inaugurado em 1901.

Problemas no funcionamento dessa hidrelétrica levariam à construção de uma grande represa na cidade de São Paulo – a Guarapiranga.

Ver também: ESPECIAL: GUARAPIRANGA – A CONSTRUÇÃO

GOVERNO DE SÃO PAULO NÃO UTILIZA INTEGRALMENTE AS VERBAS APROVADAS PARA O COMBATE AS ENCHENTES 

Um levantamento feito pelo canal de notícias GloboNews, com base na Execução Orçamentária disponibilizada pela Secretaria Estadual da Fazenda e Planejamento, revelou um dos mais conhecidos segredos de polichinello – há 12 anos o Governo do Estado de São Paulo não vem utilizando integralmente as verbas orçamentárias aprovadas para ações de combate às enchentes

No ano fiscal de 2022, citando um exemplo, o orçamento estadual para a área de Infraestrutura Hídrica e Combate a Enchentes contou com uma verba aprovada de R$ 1,99 bilhão, um valor modesto para o tamanho da população de São Paulo. 

Até dezembro foram gastos R$ 1,72 bilhão, um investimento considerado recorde, porém, o órgão deixou de gastar R$ 271 milhões do orçamento. Ou seja – apesar de todos os problemas enfrentados pelas cidades paulistas no período das chuvas, apenas 86% do orçamento para esse fim foi efetivamente utilizado. 

A única exceção dentro de um período de 13 anos analisado foi o ano de 2010, que bem por acaso foi um ano eleitoral. Naquele ano, a Assembleia Legislativa havia aprovado uma verba de R$ 200,6 milhões e o valor gasto chegou aos R$ 282,5 milhões. Em todos os demais anos da série histórica analisada os gastos ficaram abaixo da verba orçamentária. 

E o descaso com esse problema não se limita apenas ao Governo do Estado de São Paulo – pesquisando sobre esse mesmo tema é bem fácil encontrar outras reportagens falando da subutilização de verbas públicas para obras de combate às enchentes em outros Estados e importantes cidades do país. 

Um exemplo – em uma reportagem publicada no início do mês de dezembro de 2012, encontramos a notícia que a Prefeitura de São Paulo só havia gasto 43% das verbas do orçamento dessa área para aquele ano. Não custa lembrar que a temporada de chuvas na Região Centro Sul do país começa justamente em dezembro. 

Essa falta de prioridade, ou simplesmente descaso do Poder Público, ajuda a explicar a sucessão de tragédias que assistimos, anos após ano, nas cidades brasileiras. Desde que criamos o blog em 2016, publicamos dezenas de postagens falando dos graves problemas criados por enchentes, alagamentos e desmoronamentos de encostas de morro no período do verão. 

As causas das enchentes são diversas. A principal delas decorre da ocupação desordenada de áreas de várzea e margens de rios e córregos. Nas áreas urbanas, esses terrenos, por razões óbvias, costumam ser baratos ou, por se tratarem de áreas públicas, acabam sendo invadidos e ocupados por populações pobres. 

Dentro de sistemas naturais, esses terrenos funcionam como áreas para o amortecimento em eventos de cheias dos rios e, por puro bom senso, deveriam ser mantidos desocupados. O exemplo mais clássico da ocupação desse tipo de área foi o que aconteceu na cidade de São Paulo, onde importantes áreas de várzea dos grandes rios que cortam a cidade foram aterradas para a expansão imobiliária. 

O caso mais dramático foi o da ocupação da enorme várzea do rio Tamanduateí, que corta toda a Zona Leste e a área Central da cidade. Até meados do século XIX, as águas do rio Tamanduateí eram utilizadas para o abastecimento da população. Com o rápido crescimento de São Paulo a partir da década de 1860, áreas dessa várzea passaram a ser aterradas e usadas para a construção de casas, lojas e galpões de fábrica. 

Esse processo se intensificou muito no início do século XX, levando a ocupação total da antiga várzea já na década de 1930. Na esteira dessa ocupação irracional, grandes fragmentos de mata que ainda existiam ao redor foram destruídos e ocupados por construções. Não por acaso, toda a região dessa antiga várzea apresenta gigantescas enchentes na atualidade. 

O crescimento da mancha urbana das cidades cria um outro problema – a impermeabilização dos solos com construções, concreto e asfalto. Num meio natural, onde seres humanos não criaram nenhum tipo de interferência, uma parte importante dos volumes de água das chuvas é absorvido pelo solo. 

Em regiões de clima tropical e subtropical como é o caso de grande parte do Brasil, o verão costuma ser acompanhado por uma forte e consistente temporada de chuvas. Nesses momentos, é fundamental a presença da vegetação e de solos permeáveis para absorver grandes volumes de chuva. 

Quando uma grande cidade impermeabiliza seus solos, a parte das chuvas que seria absorvida passa a correr na superfície e corre, com grande velocidade, na direção dos canais de drenagem – córregos, riachos e rios. Apenas isso já geraria enormes enchentes e transbordamentos. 

Mas o problema não para por aí – como as margens dos rios, córregos e riachos foram ocupadas com construções e avenidas, deixou de existir a área de amortecimento das antigas várzeas, o que leva a enchentes cada vez mais catastróficas. 

É aqui que as ações de Prefeitura e dos Governos Estaduais fazem diferença na forma de obras para o combate às enchentes. Falamos aqui da construção de piscinões (estruturas que armazenam grandes volumes de água), bacias de detenção abertas, aprofundamento e alargamento de canais de córregos e rios, construção de muros de arrimo, permeabilização de solos, criação de áreas verdes, entre muitas outras ações. 

Em grandes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, citando como exemplo, onde os problemas com as enchentes já são enormes, essa tarefa já seria hercúlea mesmo com a disponibilização de grandes volumes financeiros. 

O que assistimos, ao contrário, são orçamentos públicos cada vez mais exíguos diante do tamanho dos problemas, e, ainda assim, as “otoridades” não conseguem executar integralmente tudo o que foi proposto pelos governos. Como nós caipiras aqui do meu bairro costumamos falar, “isso é o fim da picada”. 

Além dos grandes prejuízos financeiros que as enchentes provocam nas cidades e, principalmente, na vida dos cidadãos, frequentemente testemunhamos a morte de pessoas por afogamento ou por soterramento de encostas de morros durante fortes chuvas. 

Será que não estarei na hora de começar a prender esses “gestores” públicos incompetentes sob a acusação de assassinato? 

VEJA NOSSO CANAL NO YOUTUBE – CLIQUE AQUI