
Um levantamento feito pelo canal de notícias GloboNews, com base na Execução Orçamentária disponibilizada pela Secretaria Estadual da Fazenda e Planejamento, revelou um dos mais conhecidos segredos de polichinello – há 12 anos o Governo do Estado de São Paulo não vem utilizando integralmente as verbas orçamentárias aprovadas para ações de combate às enchentes.
No ano fiscal de 2022, citando um exemplo, o orçamento estadual para a área de Infraestrutura Hídrica e Combate a Enchentes contou com uma verba aprovada de R$ 1,99 bilhão, um valor modesto para o tamanho da população de São Paulo.
Até dezembro foram gastos R$ 1,72 bilhão, um investimento considerado recorde, porém, o órgão deixou de gastar R$ 271 milhões do orçamento. Ou seja – apesar de todos os problemas enfrentados pelas cidades paulistas no período das chuvas, apenas 86% do orçamento para esse fim foi efetivamente utilizado.
A única exceção dentro de um período de 13 anos analisado foi o ano de 2010, que bem por acaso foi um ano eleitoral. Naquele ano, a Assembleia Legislativa havia aprovado uma verba de R$ 200,6 milhões e o valor gasto chegou aos R$ 282,5 milhões. Em todos os demais anos da série histórica analisada os gastos ficaram abaixo da verba orçamentária.
E o descaso com esse problema não se limita apenas ao Governo do Estado de São Paulo – pesquisando sobre esse mesmo tema é bem fácil encontrar outras reportagens falando da subutilização de verbas públicas para obras de combate às enchentes em outros Estados e importantes cidades do país.
Um exemplo – em uma reportagem publicada no início do mês de dezembro de 2012, encontramos a notícia que a Prefeitura de São Paulo só havia gasto 43% das verbas do orçamento dessa área para aquele ano. Não custa lembrar que a temporada de chuvas na Região Centro Sul do país começa justamente em dezembro.
Essa falta de prioridade, ou simplesmente descaso do Poder Público, ajuda a explicar a sucessão de tragédias que assistimos, anos após ano, nas cidades brasileiras. Desde que criamos o blog em 2016, publicamos dezenas de postagens falando dos graves problemas criados por enchentes, alagamentos e desmoronamentos de encostas de morro no período do verão.
As causas das enchentes são diversas. A principal delas decorre da ocupação desordenada de áreas de várzea e margens de rios e córregos. Nas áreas urbanas, esses terrenos, por razões óbvias, costumam ser baratos ou, por se tratarem de áreas públicas, acabam sendo invadidos e ocupados por populações pobres.
Dentro de sistemas naturais, esses terrenos funcionam como áreas para o amortecimento em eventos de cheias dos rios e, por puro bom senso, deveriam ser mantidos desocupados. O exemplo mais clássico da ocupação desse tipo de área foi o que aconteceu na cidade de São Paulo, onde importantes áreas de várzea dos grandes rios que cortam a cidade foram aterradas para a expansão imobiliária.
O caso mais dramático foi o da ocupação da enorme várzea do rio Tamanduateí, que corta toda a Zona Leste e a área Central da cidade. Até meados do século XIX, as águas do rio Tamanduateí eram utilizadas para o abastecimento da população. Com o rápido crescimento de São Paulo a partir da década de 1860, áreas dessa várzea passaram a ser aterradas e usadas para a construção de casas, lojas e galpões de fábrica.
Esse processo se intensificou muito no início do século XX, levando a ocupação total da antiga várzea já na década de 1930. Na esteira dessa ocupação irracional, grandes fragmentos de mata que ainda existiam ao redor foram destruídos e ocupados por construções. Não por acaso, toda a região dessa antiga várzea apresenta gigantescas enchentes na atualidade.
O crescimento da mancha urbana das cidades cria um outro problema – a impermeabilização dos solos com construções, concreto e asfalto. Num meio natural, onde seres humanos não criaram nenhum tipo de interferência, uma parte importante dos volumes de água das chuvas é absorvido pelo solo.
Em regiões de clima tropical e subtropical como é o caso de grande parte do Brasil, o verão costuma ser acompanhado por uma forte e consistente temporada de chuvas. Nesses momentos, é fundamental a presença da vegetação e de solos permeáveis para absorver grandes volumes de chuva.
Quando uma grande cidade impermeabiliza seus solos, a parte das chuvas que seria absorvida passa a correr na superfície e corre, com grande velocidade, na direção dos canais de drenagem – córregos, riachos e rios. Apenas isso já geraria enormes enchentes e transbordamentos.
Mas o problema não para por aí – como as margens dos rios, córregos e riachos foram ocupadas com construções e avenidas, deixou de existir a área de amortecimento das antigas várzeas, o que leva a enchentes cada vez mais catastróficas.
É aqui que as ações de Prefeitura e dos Governos Estaduais fazem diferença na forma de obras para o combate às enchentes. Falamos aqui da construção de piscinões (estruturas que armazenam grandes volumes de água), bacias de detenção abertas, aprofundamento e alargamento de canais de córregos e rios, construção de muros de arrimo, permeabilização de solos, criação de áreas verdes, entre muitas outras ações.
Em grandes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, citando como exemplo, onde os problemas com as enchentes já são enormes, essa tarefa já seria hercúlea mesmo com a disponibilização de grandes volumes financeiros.
O que assistimos, ao contrário, são orçamentos públicos cada vez mais exíguos diante do tamanho dos problemas, e, ainda assim, as “otoridades” não conseguem executar integralmente tudo o que foi proposto pelos governos. Como nós caipiras aqui do meu bairro costumamos falar, “isso é o fim da picada”.
Além dos grandes prejuízos financeiros que as enchentes provocam nas cidades e, principalmente, na vida dos cidadãos, frequentemente testemunhamos a morte de pessoas por afogamento ou por soterramento de encostas de morros durante fortes chuvas.
Será que não estarei na hora de começar a prender esses “gestores” públicos incompetentes sob a acusação de assassinato?
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