EL NIÑO E LA NIÑA: “LOS CHICOS MALOS” (AS CRIANÇAS MALVADAS)

Inundação no Metrô

A chegada da primavera na Região Centro-Sul do Brasil marca o início da esperada estação das chuvas, um período fundamental para todas as populações. Nas áreas rurais, onde as atividades agropecuárias são a base da economia, as chuvas são fundamentais para a época do plantio de uma nova safra. Nas cidades, que dependem das águas das chuvas para recompor os estoques dos reservatórios e fontes de abastecimento, esse período de águas é sempre bem-vindo, apesar dos muitos transtornos provocados pelas enchentes e alagamentos. Para a vida silvestre, a temporada de chuvas é uma fase de renascimento da vida. 

Apesar da previsibilidade da chegada das chuvas com o início da primavera, as populações sempre observaram que ocorriam variações nos volumes de chuvas – em alguns anos, as chuvas caíam em excesso; já em outros, as chuvas rarearam e extensas áreas sofriam muito com a seca. Foi somente em décadas recentes, após intensos estudos climáticos e meteorológicos em todo o planeta, que parte do mecanismo que provoca essa variação nos padrões das chuvas começou a ser desvendado: os pesquisadores perceberam um aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico em alguns anos; em outros anos, o que se observou foi um resfriamento anormal dessas águas. Esses fenômenos foram batizados de El Niño (o menino) e La Niña (a menina). 

Nos anos em que o fenômeno El Niño é detectado nas águas do Oceano Pacífico, são registradas uma série de alterações climáticas em todo o mundo. Em 2015, o surgimento de um forte El Niño prejudicou lavouras de cacau, chá e café em toda a Ásia e África. Também provocou uma forte seca no Sudeste Asiático, favorecendo o surgimento de vários incêndios florestais. Naquele ano também se observou o inverno mais quente já registrado nos Estados Unidos. Na América do Sul, o surgimento do El Niño pode resultar em períodos de seca na região Centro-Norte e de maior umidade na região Sul, Na Argentina, o fenômeno tende a provocar chuvas mais intensas. 

Quando o fenômeno La Niña é observado no Oceano Pacífico, as águas superficiais de uma extensa região apresentam uma redução média entre 2 e 3° C na sua temperatura. Nesses anos de ocorrência de La Niña, costuma se observar, entre os meses de dezembro e fevereiro, um aumento das chuvas na região Nordeste e temperaturas abaixo do normal na região Sudeste. O fenômeno também provoca um aumento do frio na costa Oeste dos Estados Unidos e no Japão, além de aumento das chuvas na costa Oeste da Ásia. 

Entre os meses de junho e agosto, a presença de La Niña costuma produzir um inverno mais seco nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. Também pode interferir na temperatura da costa Oeste da América do Sul, reduzindo as temperaturas. Na região do Caribe, La Niña provoca uma redução na temperatura e um aumento das chuvas. No Leste da Austrália e no Leste da Ásia se observa um aumento das temperaturas. 

A ocorrência do fenômeno La Niña varia muito. Sua frequência ocorre em intervalos de 2 a 7 anos, com uma duração de 9 a 12 meses – em alguns casos, pode ter uma duração de até 2 anos. O El Niño têm uma frequência tão irregular quanto a da La Niña, ocorrendo também em intervalos de 2 a 7 anos, porém, com uma duração de 10 a 18 meses. 

No seu último relatório divulgado, a NOAA – Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, na sigla em inglês, órgão do Governo dos Estados Unidos, elevou de 70 para 75% as chances de ocorrência de um El Niño nos próximos meses. Em seus estudos e análises dos padrões climáticos, a NOAA utiliza um sofisticado conjunto de satélites meteorológicos e também de sensores instalados em bóias espalhadas por oceanos e estações meteorológicas em diferentes pontos dos continentes de todo o mundo. Os dados observados são processados em supercomputadores, que geram modelos matemáticos com as projeções climáticas para todo o mundo. Até o início deste ano, a NOAA trabalhava com uma expectativa neutra para a ocorrência do fenômeno El Niño, porém, com o passar dos meses, os dados disponíveis passaram a indicar a ocorrência de um fenômeno “fraco” no período 2018/2019. 

Apesar dessa “fraca” intensidade, o fenômeno poderá causar uma série de alterações no clima de diferentes partes do mundo. Aqui no Brasil, a provável chegada dos efeitos do El Niño coincidirá com a época do início do plantio de importantes culturas como a soja, milho, arroz e feijão. A possibilidade de ocorrências de chuvas acima da média, que costumam estar associadas ao El Niño, poderá criar sérios problemas para os agricultores. No período entre 2015 e 2016, um forte El Niño causou vários transtornos climáticos em diferentes regiões do Brasil, entre eles uma intensificação da seca que já assolava o Semiárido Nordestino, estiagem prolongada em regiões de Minas Gerais, Goiás e Distrito Federal, além de fortes chuvas e inundações na região Sul. 

Nesse começo de primavera, já estamos observando a ocorrência de fortes chuvas em várias regiões do Sul e Sudeste. Exemplos foram as intensas chuvas que causaram grandes inundações no Rio Grande do Sul e as fortes tempestades que já caíram na Região Metropolitana de São Paulo. Inclusive, no dia de ontem (17/10/2018), a Zona Sul da cidade de São Paulo sofreu fortemente com as chuvas. Além dos transtornos de sempre como enchentes, alagamentos localizados (que sempre ocorrem nos mesmos lugares e não há qualquer providência do poder público em eliminá-los), quedas de árvores e falta de energia elétrica, duas estações recém inauguradas da Linha Lilás do Metrô paulistano tiveram suas plataformas “inundadas” (vide foto), algo inédito na história desse sistema de transportes. Além das prováveis falhas no projeto e execução dessas estações do Metrô, o incidente mostra como os efeitos de mudanças nos padrões climáticos podem ser danosos para muita gente.

Como as consequências do humor muito particular dessas duas “crianças” são bem imprevisíveis, nós precisamos ficar de olho em tudo o que acontece, na expectativa que os estragos sejam bem menores do que em anos anteriores e que resultem também em  algumas notícias positivas para muitas regiões. 

21 Comments

  1. […] A situação de El Salvador, que já é complicada, poderá ficar ainda pior – projeções indicam que a América Central será uma das regiões mais vulneráveis a eventos climáticos extremos nos próximos anos. Formada por uma faixa estreita de terra seca entre o Oceano Pacífico e o Mar do Caribe, a América Central já é frequentemente assolada por fortes tempestades e furacões. Como resultado das mudanças climáticas que estão em andamento em todo o mundo, a região também poderá ficar sujeita a reduções do volume de chuvas, especialmente por conta de fenômenos como o El Niño.  […]

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  2. Eu o felicito por transmitir conhecimentos de forma didática, sua maneira de escrever, instiga a querer ler cada vez mais artigos de vossa autoria. Parabéns.

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