Em postagens recentes, tratamos dos gravíssimos problemas de poluição do ar e da água na China. A necessidade de grandes volumes de energia elétrica para alimentar fábricas e empresas de todos os setores está na raiz da poluição do ar nas médias e grandes cidades da China – perto de 80% dessa geração é feita pelas poluentes usinas termelétricas a carvão, Já a poluição das águas, essa está ligada aos lançamentos irregulares de esgotos domésticos e industriais, despejos de resíduos de cidades e fazendas, além do carreamento de resíduos de fertilizantes e pesticidas usados na agricultura do país.
Felizmente, as coisas estão começando a mudar no país, ainda que muito lentamente. Em 2018, o Governo Central da China introduziu uma série de mudanças na legislação ambiental do país, buscando com isso uma reversão da caótica situação das cidades e rios do país. Um exemplo dessas mudanças foi a proibição das importações de resíduos plásticos para reciclagem na China, uma medida que provocou a migração de muitas dessas importações para países da região como Vietnã, Malásia, Filipinas, Indonésia, Índia e Bangladesh.
Essa mudança na política ambiental chinesa está provocando uma verdadeira guinada na mentalidade empresarial do país, acostumada até então com o mais selvagem dos capitalismos do mundo. Grandes e médias empresas estão implantando seus programas de gestão ambiental e, muito lentamente, já se percebem melhoras na qualidade do ar e da água em muitas regiões. A China é hoje o país líder na emissão de Certificações Ambientais da Série ISO 14001.
É claro que não se consegue “fazer a cabeça” de todos os capitalistas selvagens da China ao mesmo tempo – muitos dos que estão fazendo dinheiro com suas empresas sujas optaram por continuar a trabalhar do mesmo, jeito transferindo as atividades mais poluentes para países vizinhos do Sudeste Asiático, onde as frágeis leis ambientais estão cheias de brechas.
A guerra comercial que vem sendo travada entre os Estados Unidos e a China também vem dando a sua contribuição para a migração, ao menos parcial, de algumas atividades de empresas chinesas para os países vizinhos. Essa mudança de “domicílio” visa burlar as cotas de importação estabelecidas pelos norte-americanos para vários produtos chineses e também para fugir do pagamento de taxas extras de importação.
Nos primeiros meses de 2019, citando um exemplo, as exportações do Vietnã para os Estados Unidos cresceram 40% enquanto as exportações da China diminuíram 14%, conforme apontou a alfândega norte-americana. As autoridades dos Estados Unidos estão atentas a esse inesperado aumento de exportações dos países do Sudeste Asiático para o país e a todas as possíveis fraudes fiscais envolvidas.
Um outro fator importante para a migração de indústrias chinesas para as “vizinhanças” são os crescentes aumentos dos custos de produção na China. Durante décadas a fio, os baixíssimos salários pagos aos operários chineses estimularam a produção de todos os tipos de produtos no país. Com o crescimento econômico e tecnológico que adveio dessa fase dos trabalhos mais braçais, houve um aumento substancial na qualificação da mão de obra na China e também uma mudança no perfil da produção.
Atualmente, parte importante da produção do país agrega um grande conteúdo tecnológico local, o que, entre outras coisas, implica no pagamento de salários mais altos para os trabalhadores mais qualificados. Esses aumentos de custos estão tornando a mão de obra chinesa cara demais para atividades mais manuais como a produção de roupas, calçados, brinquedos e outras “quinquilharias” Made in China.
Muitas das empresas desses setores estão partindo em busca de mão de obra mais barata (quando não escrava e/ou infantil) e legislações ambientais mais “brandas” em países vizinhos como a Tailândia, Filipinas, Vietnã, Indonésia, Laos, Camboja e Mianmar. Os tradicionais métodos de produção selvagem e a intensa poluição gerada nas linhas de produção estão chegando a esses países nas bagagens dos empresários chineses.
Aqui vale um parêntese: a partir da década de 1960, com o surgimento do movimento ambientalista, empresas poluídoras da Europa e dos Estados Unidos foram obrigadas a se refugiar em países do chamado Terceiro Mundo, onde se incluem nações como a China, a Índia e o Brasil. Surgiram assim grandes centros industriais poluídos como Cubatão, no litoral do Estado de São Paulo, e Bhopal, na Índia. Também foram desencadeadas grandes tragédias ambientais e sociais nesses locais.
Um grande exemplo desses novos tempos são os famigerados tênis da empresa norte-americana Nike, que ficaram famosos em todo o mundo décadas atrás por empregarem intensivamente mão de obra infantil nas linhas de produção em países pobres da Ásia. No ano 2000, 40% dos tênis vendidos pela Nike foram produzidos na China e 13% no Vietnã. Atualmente, 41% da produção da empresa vem do Vietnã e 32% continuam sendo fabricados na China. Essa mesma tendência é verificada em inúmeras outras empresas internacionais de produtos de consumo.
Agora, vamos mostrar o lado ruim desse brusco crescimento industrial nos países do Sudeste Asiático. Poucos meses atrás, a polícia ambiental vietnamita foi deslocada para as cercanias da cidade de Ho Chi Minh, no Sul do país, para investigar as causas da intensa poluição em um trecho de 15 km do rio Vai Thi. A polícia identificou uma série de empresas que lançavam despejos industriais no rio através de tubulações clandestinas. Entre essas empresas havia um curtume, atividade famosa pelo uso de produtos compostos por metais pesados como os sais de cromo, mercúrio e cianureto. Também foram fechadas empresas do ramo alimentício e de produtos químicos.
Uma dessas empresas recebeu uma multa de US$ 16 mil e foi condenada a pagar uma indenização por danos ambientais no valor de US$ 7.65 milhões. Devido a uma série de recursos existentes na legislação ambiental local, a empresa recorreu das multas e continua funcionando normalmente. Os policiais também ordenaram o fechamento do curtume, que recorreu aos órgãos competentes e continua funcionando e poluindo o rio com toda a naturalidade de sempre. Esse “jeitinho” Asiático se repete em todos os países da região, o que está transformando essa parte do mundo numa espécie de paraíso para as empresas poluidoras, principalmente as de origem chinesa.
O rio Mekong, que é o principal corpo d’agua do Sudeste Asiático, está recebendo grandes quantidades de poluentes e resíduos gerados por todas essas atividades industriais e está pagando um alto preço pela degradação de suas águas. Essa contaminação está prejudicando a pesca, o abastecimento de populações e, principalmente, a produção agrícola. Conforme comentamos na última postagem, o arroz é o principal alimento consumidos pelas populações da Ásia e a bacia hidrográfica do rio Mekong é um dos grandes celeiros dessa cultura agrícola.
Apesar de todos nós aqui no Ocidente estarmos bem longe de todo esse caos ambiental, social e econômico, nós damos a nossa contribuição para a sua existência quando compramos os produtos feitos pelas empresas locais – nossos tênis incrementados, roupas, brinquedos, produtos eletrônicos “bem balatinhos”, entre outros supérfluos comprados em barracas de camelôs.
Essa selvageria industrial pós-contemporânea está matando e vai matar muita gente, seja em acidentes de trabalho seja através do envenenamento das águas, ares e terras. E nós, direta e indiretamente, estamos sendo cúmplices de tudo isso.
[…] A EXPANSÃO INDUSTRIAL DA CHINA EM PAÍSES DO SUDESTE ASIÁTICO […]
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[…] Essa destruição massiva de recursos florestais e hídricos se junta aos enormes problemas sociais das populações desses países, transformando essas regiões nas mais insustentáveis do mundo. O moderno conceito de Sustentabilidade é formado pelo equilíbrio das áreas Social, Econômica e Ambiental. Infelizmente, o que mais se vê é uma busca frenética e selvagem apenas pelos ganhos econômicos de curto prazo. […]
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[…] Exemplos dessas agressões ambientais existem por todos os cantos do mundo. O subcontinente indiano, especialmente a Índia e Bangladesh (o Paquistão se especializou em tecelagem), além da China, Malásia, Tailândia, Indonésia e Vietnã, entre outros, se mostraram altamente promissores, oferecendo farta mão de obra barata e leis trabalhistas altamente permissivas. Esses países foram transformados numa espécie de paraíso na terra para as confecções. […]
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[…] se produzem fibras como o algodão, passem pelas indústrias de fiação e tecelagem, depois pela intensa exploração da mão de obra em países subdesenvolvidos, chegando enfim ao descarte cada vez maior de roupas usadas nos […]
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[…] trabalhistas altamente permissivas. Esses países foram transformados numa espécie de paraíso na terra para as confecções. […]
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