OS IMIGRANTES E A CAFEICULTURA PAULISTA

A cafeicultura na Província de São Paulo inicia a década de 1870 em meio a uma profunda crise. De um lado, as excelentes terras roxas do Oeste Paulista ofereciam uma oportunidade única para a formação de grandes cafezais e para a produção de café em uma escala nunca vista antes em terras brasileiras. A construção de ferrovias e expansão dos ramais ferroviárias resolvia, paulatinamente, a questão do transporte das safras até o Porto de Santos, vencendo com os trilhos a imponente Serra do Mar e seu desnível de quase mil metros. 

Apesar de todas as boas e promissoras perspectivas econômicas, a produção cafeeira esbarrava em um gravíssimo problema – a falta de mão de obra. Conforme já comentamos em outras postagens, o sistema escravocrata estava em crise naquele momento – desde 1850, com a assinatura da Lei Eusébio de Queirós, o desembarque de escravos vindos da África estava proibido. Aqui é importante lembrar que navios da marinha de guerra da Inglaterra patrulhavam as águas do Oceano Atlântico e tinham o direito de abordar e revistar qualquer embarcação suspeita de tráfico negreiro. 

Em 1871, foi assinada a Lei do Ventre Livre, que concedia automaticamente a liberdade a filhos de mulheres escravas e colocava um fim no “crescimento vegetativo” da população cativa. Com a entrada em vigor dessas duas leis, o mercado de compra e venda de escravos ficou limitado a “peças de segunda mão” – escravos, cada vez mais velhos, eram vendidos de uma Província para outra. Esse momento coincide com o auge da cafeicultura na Província do Rio de Janeiro que, contando com grandes recursos financeiros, arrematava a maior parte dos escravos disponíveis no “mercado”. 

Alguns cafeicultores paulistas chegaram a tentar uma parceria com imigrantes europeus para os trabalhos nos campos, porém, sem muito sucesso. Acostumados a lidar com escravos que “faziam o que lhes era ordenado”, os fazendeiros tiveram enorme dificuldades no relacionamento com esses trabalhadores livres. Outra fonte de problemas se dava na divisão dos lucros da colheita – os cafeicultores queriam ficar com a maior parte dos lucros, desagradando os europeus. Esse sistema não prosperou. 

A salvação da lavoura, falando aqui literalmente, viria de um país do Sul da Europa que enfrentava naquele momento uma verdadeira turbulência econômica e política – a Itália. Diferente de outros imigrantes vindos de países como Alemanha, Suíça e Bélgica, os italianos tinham uma personalidade e um comportamento mais alinhado com o dos brasileiros. O clima e as terras da Península Itálica, especialmente no Sul, eram bastante próximos das condições de São Paulo (com invernos bem mais amenos, é claro), uma característica que facilitou muito a “aclimatação”. 

O momento também coincidiu com uma forte mudança na política de imigração dos Estados Unidos, país que há muito tempo era um dos destinos preferenciais dos italianos. O Governo norte-americano iniciou uma política de restrição gradativa a entrada de imigrantes, uma medida que acabou por empurrar grandes contingentes de imigrantes italianos para a América do Sul, especialmente na direção do Brasil, da Argentina e do Uruguai. 

De acordo com informações de Caio Prado Júnior, em 1876 foi registrada a entrada de aproximadamente 7 mil imigrantes italianos no Brasil. No ano seguinte, esse número saltaria para 13 mil indivíduos, superando em quantidade a entrada de outros estrangeiros como os portugueses, que nesse mesmo ano foram 8 mil imigrantes.

Dados de 1888 indicam a entrada de mais de 30 mil italianos no Brasil – após a assinatura da Lei Áurea e a abolição do trabalho escravo, o número de imigrantes italianos saltou bruscamente para 133 mil já no ano seguinte. Até o final do século XIX, a entrada de imigrantes italianos ficaria na média anual de 100 mil indivíduos (vide foto). 

A chegada de toda essa massa de imigrantes vai dar um verdadeiro impulso na cafeicultura paulista e vai criar toda uma mudança nas relações entre fazendeiros e seus empregados. A primeira mudança importante será no regime de remuneração desses novos trabalhadores, que passam a ser assalariados.

Os contratos de trabalho eram assinados ainda na Itália e os imigrantes sabiam exatamente onde estavam “se metendo”. O Governo brasileiro subsidiou grande parte desses imigrantes, bancando as despesas com a viagem da Itália até as fazendas. 

Contando com muita gente fortemente politizada e com muitos com um bom grau de alfabetização, esses contingentes de imigrantes reagiam prontamente a qualquer tentativa de mudança nas regras de trabalho, algo que foi tentado por muitos fazendeiros.

Além de resolver os problemas de falta de mão de obra nas lavouras, a entrada em cena de trabalhadores livres e assalariados também acabou provocando forte repercussões nos remanescentes de trabalhadores escravizados. Percebendo a clara diferença no padrão de vida e de trabalho, muitos escravos se sentiram motivados a fugir das fazendas e buscar uma vida melhor em outras paragens. 

A presença da mão de obra imigrante levou a uma expansão ainda maior dos cafezais pelo Oeste Paulista. Concentradas inicialmente na porção Noroeste da Província de São Paulo, os cafezais passaram a crescer rumo ao Sul. Surgiram novas fazendas de café por toda a região Central e Oeste da Província, chegando inclusive ao Norte do Paraná, território que até 1853 fazia parte de São Paulo. 

Além da fortíssima imigração italiana, precisamos também citar os imigrantes japoneses, que começaram a chegar a partir de 1908. Nos primeiros sete anos da imigração japonesa, perto de 15 mil indivíduos chegaram ao Brasil e foram assentados em fazendas de café, principalmente na região Central do Estado de São Paulo. Essa imigração se estenderia até a década de 1940 e os novos contingentes se dedicariam à produção de frutas, chá e arroz. 

De acordo com o Censo de 1905, existiam 49.184 propriedades rurais espalhadas em 165 municípios de São Paulo, sendo que, em mais de 21 mil propriedades o café era o principal produto. Naquele ano, foram colhidas aproximadamente 584 mil toneladas do grão, o que correspondia a 8,9 milhões de sacas de 60 kg.  

O Censo também encontrou 413.341 trabalhadores na agricultura, sendo que 55% desse contingente era formado por estrangeiros. Esses números dão uma ideia da importância do café para a economia de São Paulo e também mostram a força dos imigrantes na economia regional. 

Grande parte dessas terras agrícolas usadas para a expansão da cafeicultura em São Paulo foram liberadas com a derrubada de florestas nativas de Mata Atlântica. Eu lembro de ter conhecido alguns agricultores que eram amigos do meu avô (que bem por acaso era italiano e foi um pequeno plantador de café), que já eram bem idosos na minha infância. Esses homens trabalharam na derrubada de muitas matas no interior de São Paulo nas primeiras décadas do século XX e costumavam contar histórias sobre os trabalhos naqueles tempos antigos.  

Esses eram trabalhos pesados e perigosos, com muitos trabalhadores sofrendo acidentes sérios. Muito antes do uso das motosserras e do emprego de grandes tratores com pesadas correntes, esses trabalhos dependiam da força bruta dos machados e do suor dos trabalhadores que feriam e derrubavam as árvores. Numa segunda etapa, o foco dos trabalhos era a remoção das raízes das árvores, o que era feito com a ajuda de juntas de bois e de cavalos. Foram vários milhões de árvores derrubadas para a liberação dos férteis solos para o plantio do café. 

Árvores com madeiras valiosas como a caviúna, a imbuia e o cedro eram separadas, e os troncos eram vendidos para uma infinidade de serrarias que existiam nas cidades – havia uma forte demanda por madeiras para a construção civil e para a indústria de móveis. Madeiras de qualidade razoável eram reservadas para usos na propriedade e as demais, como sempre, acabavam sendo queimadas. 

Parte importante dos recursos gerados pela cafeicultura foram usados para financiar a industrialização da Província de São Paulo. Aqui entra um detalhe interessante – entre os inúmeros imigrantes que chegaram para trabalhar na agricultura existiam muitos profissionais e técnicos especializados, que acabaram sendo fundamentais para os trabalhos na nascente indústria paulista. 

A MARCHA DO CAFÉ RUMO AO OESTE PAULISTA

A vegetação que cobria originalmente o Estado de São Paulo tinha uma característica interessante: perto de 69% do território paulista era coberto por Mata Atlântica – uma estreita faixa de vegetação de Cerrado dividia o Estado exatamente ao meio. Os solos de Cerrado, conforme já tratamos em outras postagens, são extremamente ácidos e pouco férteis, só vindo a ser utilizados com alta produtividade a partir da década de 1970, quando a Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias, desenvolveu sementes de grãos adaptadas para esses solos.  

O avanço dos cafezais pelo interior de São Paulo acompanhou esse capricho da natureza, tendo como ponto de partida a região de Campinas, que no passado foi uma grande produtora de açúcar e aguardente. Essa região ficava num dos antigos caminhos que levavam na direção das Minas Gerais e de Mato Grosso. Por ali passava uma movimentada rota de tropeiros que transportavam alimentos, ferramentas e outros produtos para as regiões de mineração de ouro nas Geraes do século XVIII. As cachaças paulistas produzidas nessa região faziam sucesso entre os mineradores dos sertões. 

O primeiro cafeeiro que se tem notícia na região de Campinas foi plantado em 1797, nos fundos da casa do Sargento-Mor Raimundo Álvares dos Santos Prado. Como era comum em todo o Brasil, as famílias costumavam plantar o café em seus quintais e os frutos produzidos eram torrados e moídos apenas para consumo próprio. 

A primeira “plantação” de café na região ficava num sítio que pertencia ao Tenente Antônio Fonseca de Andrade. Contam as histórias que, entre os anos de 1807 e 1809, o militar costumava espalhar o café colhido para secar na calçada de sua casa no centro da cidade de Campinas, algo que chamava a atenção e criava os famosos “falatórios” por toda a vizinhança. O Tenente Andrade foi transferido pelo Exército para o Sul do Brasil e esse cafezal acabou sendo abandonado. A cultura cafeeira só chegaria com força na região em meados do século XIX. 

Até a década de 1830, a principal atividade econômica da região de Campinas, coração do então chamado Oeste Paulista, era a produção da cana de açúcar. Registros de 1836 indicam que existiam na região 93 engenhos de açúcar e destilarias de cachaça – as famosas “caninhas paulistas”, também conhecidas como “fogo paulista”. Em 1854, o número de engenhos e destilarias cairia para apenas 44 unidades, ao mesmo tempo em que a cafeicultura começava a despontar na região. 

Os grandes cafezais de São Paulo surgiram inicialmente no Vale do Paraíba e, a partir dali, foram acompanhando as pequenas cidades ao longo das encostas da Serra da Mantiqueira até chegar nas regiões de Campinas, Piracicaba e Rio Claro. Os cafezais seguiram cada vez mais rumo a direção Noroeste, chegando em cidades como São Carlos, Araraquara, Catanduva, Pirassununga, Casa Branca e Ribeirão Preto. Em todas essas cidades, os fazendeiros abandonaram a produção da cana de açúcar, produto que estava com o preço em forte queda, e abraçaram a cafeicultura. 

A cultura cafeeira só se consolidaria nessa região, conhecida como Depressão Periférica ou Oeste Paulista, a partir da década de 1870. As dificuldades para o escoamento limitavam o aumento da produção. Outro problema era a carência de mão de obra, que até então era formada por escravos. Desde 1850, a entrada de novos escravos vindos da África estava proibida no Brasil pela Lei Eusébio de Queirós. Criou-se então um forte mercado interno de venda de “peças usadas” entre as Províncias.  

Em 1871, foi assinada a Lei do Ventre Livre, que tornava os filhos de mãe escrava automaticamente livres, uma legislação que criou ainda mais dificuldades para os grandes fazendeiros paulistas. Os escravos disponíveis no “mercado” acabavam sendo absorvidos pelas imensas fazendas de café da Província do Rio de Janeiro, região que estava vivendo o auge da prosperidade graças à sua grande produção cafeeira. 

Um exemplo das grandes dificuldades relativas à mão de obra para os trabalhos nos cafezais de São Paulo é Araras, uma cidade que fica bem próxima de Rio Claro. Os movimentos pró-abolição da escravatura na cidade eram intensos – contando inclusive com a participação de muitos filhos de grandes fazendeiros da região. A cidade publicou um decreto municipal abolindo a escravidão cerca de um mês antes da assinatura da Lei Áurea

A situação dos produtores de café paulistas só não era pior devido ao avanço constante das estradas de ferro. A primeira delas foi a Ferrovia Santos Jundiaí – a São Paulo Railway, inaugurada em 1867 e que seria o primeiro marco da expansão ferroviária no Estado de São Paulo e a primeira ferrovia a vencer as escarpas da Serra do Mar (vide foto). As sacas de café eram transportadas por tropas de burros e mulas até Jundiaí e, dali, levadas até o Porto de Santos. O avanço dos cafezais rumo ao Oeste forçaria o avanço das ferrovias cada vez mais rumo aos “sertões” paulistas. 

Muitos dos ramais ferroviários que começaram a se espalhar pelo interior de São Paulo foram bancados com recursos dos próprios cafeicultores. Um desses casos foi o Conde do Pinhal – Antônio Carlos de Arruda Botelho, um grande proprietário de terras nas regiões de Jaú e São Carlos. O fazendeiro financiou a construção de uma ferrovia, que chegou a ter uma extensão de 300 km, entre Rio Claro e Araraquara em 1885, e depois até Jaú em 1887. 

Com a carência de mão de obra escrava, muitos fazendeiros paulistas passaram a se valer da mão de obra livre de imigrantes europeus que chegavam em quantidades cada vez maiores na Província. Conforme a citação de Caio Prado Júnior em seu livro História Econômica do Brasil, um dos primeiros casos conhecidos foi o do Senador Nicolau de Campos Vergueiro, um grande fazendeiro de Cordeirópolis, cidade próxima a Rio Claro.

Entre 1847 e 1857, esse fazendeiro contratou 177 famílias de imigrantes alemães, suíços, portugueses e belgas para trabalhar na produção do café. Muitos fazendeiros da região acabaram por seguir esse exemplo e foram formadas cerca de 70 colônias de imigrantes

A princípio, esse sistema de trabalho apresentou bons resultados. Esses trabalhadores conheciam técnicas agrícolas que eram bem mais avançadas que as técnicas rudimentares usadas pelos locais, o que garantia uma ótima produtividade. Os problemas começaram no relacionamento com os patrões e na divisão dos lucros da produção – os contratos de trabalho previam a divisão dos lucros da produção.

Acostumados a lidar com escravos, que ou obedeciam ao patrão ou acabavam sendo colocados no tronco, os fazendeiros se achavam no direito de ficar com a maior parte dos lucros e não respeitavam os termos previamente combinados. Valia a velha máxima: manda quem pode, obedece quem tem juízo!

Os problemas também se estendiam ao relacionamento dos europeus com os escravos – muitos achavam que era indigno para um branco fazer os mesmos trabalhos de um negro. Essas reclamações começaram a chegar em grande quantidade nas representações consulares dos países de origem desses imigrantes, sendo depois levadas para os Governos dos respectivos países europeus. A Alemanha, por exemplo, abriu uma investigação para apurar os fatos e proibiu a imigração dos seus cidadãos para o Brasil por muitos anos. 

Em menor intensidade, também começaram a surgir os problemas de ordem religiosa – muitos desses europeus professavam fé protestante e tinham um calendário religioso diferente do tradicional catolicismo brasileiro. Esse problema religioso gerou tamanhas repercussões que, no futuro, o Governo brasileiro passaria a vetar a entrada de grandes contingentes de imigrantes alemães por professarem a religião luterana. 

Esses problemas se estenderiam até o final da década de 1870, quando então a cafeicultura paulista ganhará musculatura e terá início um ciclo virtuoso de produção de café e de destruição de matas na Província de São Paulo. Já a mão de obra, essa seria garantida pelo intenso fluxo de imigrantes italianos que passariam a chegar em grandes contingentes a partir da década de 1880.

O CAFÉ, OS SOLOS DE TERRA ROXA E OS IMIGRANTES

A partir das últimas décadas do século XVIII, os cafezais passaram a tomar de assalto os férteis solos ocupados pela Mata Atlântica na Região Sudeste do Brasil. A Província do Rio de Janeiro foi transformada no principal centro produtor e irradiador da cafeicultura, que dentro de poucas décadas chegou ao Sul do Espírito Santo, Sudeste e Leste de Minas Gerais, além do Vale do Paraíba em São Paulo

Nessa primeira fase, a cafeicultura se apoiava em duas bases – a farta disponibilidade de terras boas e baratas, além da facilidade de arregimentar grandes contingentes de trabalhadores escravizados. Com o passar do tempo e, graças aos grandes lucros gerados pela cultura, começaram a ser construídas linhas férreas que facilitariam, em muito, o transporte das cargas de café rumo ao Cais do Porto do Rio de Janeiro. 

Essa “farra do café” chegou ao fim com a assinatura da Lei Áurea em 1889, que pôs um fim na escravidão no Brasil. Um outro fator importante era a escassez cada vez maior de terras para o desenvolvimento da cultura – os antigos cafeicultores usavam os solos da maneira mais inadequada possível, expondo a camada fértil a rápidos processos erosivos e a perda da fertilidade. Esse binômio – falta de terras e de mão de obra, colocou os antigos meios de produção na berlinda e forçariam a cultura a buscar novas alternativas

A produção do café encontrou dois caminhos – o primeiro apontava na direção do Oeste da Província de São Paulo e de seus solos de terra roxa, de uma fertilidade excepcional. O segundo caminho foi a adoção da mão de obra livre, especialmente de imigrantes europeus, que chegavam aos milhares no Brasil a partir das últimas décadas do século XIX. Essas duas mudanças alterariam, por completo, o rumo da cafeicultura no Brasil e também consolidariam os destinos da até então pouco relevante Província de São Paulo. 

Vamos começar falando dos solos de terra roxa: 

As famosas terras roxas (que tem seu nome derivado de terra rossa, que em italiano significa terra vermelha) são solos profundos, com elevado teor de ferro e macronutrientes, com grande potencial para o desenvolvimento de coberturas vegetais densas. Dentro do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos, a terra roxa é classificada como Latossolos Vermelhos e Nitossolos Vermelhos. A terra roxa é considerada um dos solos mais férteis do Brasil

Essas terras se estendem desde a região Oeste do Estado de São Paulo até o Rio Grande do Sul, com alguns trechos na região do Triângulo Mineiro e do Sul de Minas Gerais, além do Leste do Mato Grosso do Sul. Também são encontradas na Argentina e no Paraguai. Esses solos foram originados há milhões de anos atrás a partir de um fenomenal derramamento vulcânico, mais conhecido como Derrame de Trapp ou Trapp do Paraná.  

O Derrame de Trapp teve início quando o Supercontinente de Gondwana começou a se romper. Essa grande massa continental era formada pela América do Sul, África, Antártica, Ilha de Madagascar, Índia (o famoso Subcontinente Indiano), Austrália, Nova Zelândia, Nova Caledônia e algumas outras ilhas menores. Esse evento teve início há cerca de 165 milhões de anos e, ainda hoje, esses “fragmentos” de Gondwana se movem (pesquise Tectônica de Placas). 

Com o início da ruptura continental, dezenas de vulcões entraram em erupção simultaneamente – um dos períodos de maior intensidade das erupções aconteceu no Período Cretáceo, entre 137 e 127 milhões de anos atrás. Na América do Sul, os derramamentos de lava, calculados em 650 mil km³, cobriram uma área de aproximadamente 1,2 milhões de km², especialmente na região onde encontramos hoje a bacia hidrográfica do rio Paraná. Em Angola e na Namíbia, países do Sudoeste da África, também se encontram rochas de origem vulcânica associadas ao Derrame de Trapp

Essa espessa camada de rochas vulcânicas passou a sofrer um lento e intenso processo de degradação por chuvas, ventos e geleiras. Os pequenos fragmentos minerais que surgiram passaram a sustentar inicialmente formações de líquens – com o passar do tempo (falamos aqui de milhões de anos), a camada de solo já estava bastante espessa e surgiram as grandes formações florestais como a Mata Atlântica. 

Diferente dos solos de massapê do Nordeste e dos solos das antigas regiões produtoras de café do Rio de Janeiro, onde a fertilidade dependia em grande parte da camada superficial de resíduos orgânicos criados pela própria floresta, os solos de terra roxa já possuíam em sua composição a maior parte das substâncias químicas necessárias ao desenvolvimento e à sustentação da vida vegetal, especialmente o nitrogênio, o fósforo e o potássio.  

Mesmo com a supressão da floresta para abertura dos campos agrícolas, esses solos conseguiam manter a produção agrícola por um longo período antes de se esgotar – se trabalhados com as melhores técnicas agrícolas, poderiam então durar por séculos. 

Essa nova etapa de produção do café nos solos de terra roxa paulistas coincidiu com a chegada de trabalhadores europeus, principalmente italianos (vide foto), acostumados a lidar com solos vulcânicos muito parecidos em sua terra natal. Graças às novas técnicas que passaram a ser praticadas por esses agricultores – principalmente o plantio do café em linhas de nível, a produtividade da cultura aumentou, assim como a longevidade das plantações e dos solos. 

Conforme comentamos em postagens anteriores, os solos das antigas plantações fluminenses e de regiões circunvizinhas mal duravam dez anos, sucumbindo à perda de fertilidade criada pelos fortes processos erosivos. Essas terras eram então abandonadas e novas áreas de matas eram derrubadas para a formação de novas plantações. 

O antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997), autor de obras clássicas como O Povo Brasileiro, costumava se referir ao sistema colonial do Brasil como uma “grande máquina de moer gente” dada a grande quantidade de índios e negros que foram “gastos ao longo do processo produtivo do açúcar”. Ousando fazer um adendo ao comentário desse grande intelectual, diria que essa grande máquina também moeu centenas de milhares de quilômetros de matas nativas do país

Tanto a produção da cana de açúcar no Nordeste Açucareiro quanto a cafeicultura em sua fase inicial antes da abolição da escravidão no Brasil consumiram, impiedosamente, matas e solos inconsequentemente. Na faixa do litoral nordestino, algo entre 90 e 120 mil km² de matas desapareceram por causa dos canaviais – somente no Rio de Janeiro, o café destruiu mais de 20 mil km² de Mata Atlântica. Esgotadas, matas e terras eram abandonadas a própria sorte e os grandes produtores saíam em busca de novas terras e matas para “moer”

Felizmente, a partir desse novo ciclo de produção do café, as terras transformadas em campos agrícolas deixariam de ser consideradas descartáveis. É claro que a destruição de matas continuaria em andamento, porém, se serve de consolo, as terras continuariam sendo usadas por sucessivas gerações de agricultores na produção de alimentos para o consumo da crescente população e também para exportação.

Continuamos na próxima postagem. 

A DEVASTAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA ENTRE OS SÉCULOS XVI E XIX – UM BREVE RESUMO

Aos tempos da chegada da expedição descobridora de Pedro Álvares Cabral em 1500, a Mata Atlântica cobria cerca de 1,2 milhão de km² ou 15% do nosso atual território. A densa floresta se estendia do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte acompanhando a linha da costa. Em muitos trechos, a floresta entrava pelo território e atingia regiões no Leste do Paraguai e Nordeste da Argentina

Na sequência de postagens que estamos publicando aqui no blog, temos mostrado o avanço da destruição da Mata Atlântica ao longo do nosso complexo de povoamento, onde já comentamos os sucessivos ciclos econômicos entre o século XVI e o final do século XIX. Vamos fazer um rápido resumo so que aconteceu com a floresta até aqui: 

O ciclo da Cana de Açúcar 

A primeira grande atividade econômica desenvolvida na grande Colônia de Portugal na América do Sul foi o plantio da cana e a produção do açúcar. Desenvolvido inicialmente pelos indianos, o açúcar gradualmente foi caindo no gosto da humanidade. Sua produção se irradiou através da Pérsia (atual Irã) por toda a Ásia Central, Oriente Médio e Egito. Por volta do século IX, os canaviais chegaram a Ilha da Sicília, no Sul da Itália. Por volta do século X, a cultura chegou na Península Ibérica pelas mãos dos invasores muçulmanos. 

Os primeiros registros de canaviais em Portugal datam do ano 1159, na região do Algarves. A expansão da cultura em terras portuguesas acompanhou o avanço dos lusos pelas águas do Oceano Atlântico. As primeiras mudas de cana de açúcar chegaram na Ilha da Madeira em 1425, em 1460 no Arquipélago dos Açores e em 1493 nas Ilhas de São Tomé e Príncipe. 

No Brasil, a cultura da cana de açúcar chegou na bagagem das primeiras expedições colonizadoras de Martin Afonso de Sousa e seu irmão Pero Lopes de Sousa, donatários das Capitânias de São Vicente e Santo Amaro, e de Duarte Coelho, Donatário da Capitânia de Pernambuco. Essas duas expedições chegaram ao Brasil nos primeiros anos da década de 1530 e rapidamente passaram a derrubar as matas para a formação dos primeiros campos de cana de açúcar. 

A região que obteve maior sucesso na produção do açúcar foi o litoral do Nordeste, onde os canaviais se espalhavam desde a região de Ilhéus, no Sul da Bahia, até o Rio Grande do Norte. A Mata Atlântica ocupava uma faixa que variava entre 60 e 80 km ao longo do litoral, onde abundavam os “gordos solos de massapê”. Tanto a floresta quanto os solos foram destruídos ao longo dos mais de 350 anos da cultura do açúcar na região. 

Considerando a extensão dos canaviais na região, podemos estimar que algo entre 90 mil e 120 mil km² de Mata Atlântica foram destruídas. O Sul do Estado da Bahia, área onde viviam os perigosos índios botocudos, foi poupado dessa destruição maciça de florestas e abrigaria a produção do cacau a partir da segunda metade do século XIX. 

Um detalhe importante – devidos aos constantes embates com os produtores de cana, os criadores de gado do Nordeste Açucareiro foram expulsos do litoral e obrigados a seguir para os sertões. Esse avanço das boiadas, que eu costumo chamar de “diáspora bovina” foi responsável pelo início da destruição de outro importante bioma brasileiro – a Caatinga. 

O Ciclo do Ouro e da Mineração 

Metais preciosos como o ouro e a prata rondavam os sonhos dos conquistadores ibéricos ao longo da conquista das Américas. Os espanhóis foram mais felizes que os portugueses e, logo no início das suas conquistas, encontraram grandes quantidades de ouro em mãos dos astecas e incas. Já em meados do século XVI descobriram as minas de prata de Potosí, na Bolívia, que em poucos anos se transformaria na maior produtora de prata do mundo. 

Os portugueses não tiveram essa sorte e precisaram se contentar com os lucros da produção e venda do açúcar até o final do século XVII. No início da década de 1690, bandeirantes paulistas encontraram o tão sonhado ouro na região da lendária Serra do Sabarabuçu, no coração das Geraes.

Essa descoberta mudaria para sempre os rumos da Colônia e desencadearia uma verdadeira febre do ouro. Até meados do século XVII, perto de 2/3 da população brasileira já havia abandonado o litoral, principalmente da Região Nordeste, e se embrenhou nos sertões da Geraes em busca de ouro

Esse movimento enfraqueceu a indústria açucareira, que já vinha sofrendo com a forte concorrência dos engenhos de cana de açúcar da região do Mar do Caribe e América Central. A mineração também iniciou o processo de destruição da Mata Atlântica no interior do país. A busca pelo ouro foi iniciada nos leitos dos rios, onde era encontrado o chamado “ouro de aluvião”.

Esgotadas essas reservas, a busca passou a ser feita nas margens dos rios, onde toda a vegetação era derrubada e os solos revirados. Trechos de matas também começaram a ser derrubados para o plantio de roças de subsistência e obtenção de lenha para os trabalhos de fundição do ouro. 

Os veios auríferos das Geraes começaram a mostrar esgotamento já nas últimas décadas do século XVIII. A grande população mineira foi obrigada a se dedicar a agricultura e a criação de animais. Os solos da região, ricos em outros minerais como o minério de ferro, levaram ao desenvolvimento de uma vigorosa produção de ferro e aço. A primeira grande forjaria mineira foi construída na década de 1830 e a atividade não parou mais de crescer. 

A produção e o beneficiamento de metais são altamente dependentes do carvão, essencial para a geração do calor nos fornos e altos fornos. O Brasil é pobre em depósitos de carvão mineral e a opção que passou a ser usada desde então foi o uso do carvão vegetal, obtido a partir da madeira e da lenha retirada das matas mineiras.

Cerca de 80% da Mata Atlântica em Minas Gerais, algo correspondente a aproximadamente 230 mil km², já desapareceu desde então, a maior parte tendo sido transformada em carvão vegetal

O início do Ciclo do Café 

O terceiro grande ciclo econômico do Brasil e que atingiu em cheio a Mata Atlântica foi o café. A cultura começou a ganhar “musculatura’ na Província do Rio de Janeiro nas últimas décadas do século XVIII. Incialmente, os cafezais ocuparam as encostas de morros ao redor da cidade de Rio de Janeiro e terras de áreas vizinhas ocupadas anteriormente por canaviais.

No início do século XIX, os cafezais chegaram ao trecho fluminense do Vale do rio Paraíba, onde rapidamente consumiram as matas e os solos férteis. A partir de meados do século XIX, os cafezais avançaram para o Sul do Espírito Santo, para a região da Zona da Mata no Sudeste de Minas Gerais e para o Vale do rio Paraíba em São Paulo

Essa primeira fase do ciclo do café vai se estender até o final da década de 1880, quando a Lei Áurea foi assinada e pôs fim ao uso de mão de obra escrava no Brasil. Essa brusca mudança abalou fortemente a agricultura no Brasil, que até então estava baseada na grande disponibilidade de terras férteis e no uso de mão de obra escrava. 

Somente no Estado do Rio de Janeiro, a cafeicultura foi responsável pelo desaparecimento de cerca de metade da cobertura florestal do território, onde a Mata Atlântica representava perto de 97% – falamos aqui de mais de 20 mil km² de florestas destruídas, sem se considerar as áreas do Espírito Santo, Minas Gerais e do Vale do Paraíba em São Paulo

Se considerarmos tudo o que foi destruído da Mata Atlântica nos ciclos econômicos citados até aqui, chegaremos a perto de 400 mil km² ou aproximadamente 1/3 da área ocupada originalmente pelo bioma

E essa destruição não parou – ela continua até hoje. 

O “FIM” E O INÍCIO DA ESCRAVIDÃO DO BRASIL

O conceito de escravidão é, provavelmente, muito mais antigo do que aquilo que costumamos chamar de humanidade. 

Entre 60 e 90 mil anos atrás, quando os Homo sapiens, nossa espécie, chegaram ao Oriente Médio, Ásia Central e Europa vindos da África, encontraram nesses locais os Homo Neanderthalenses, uma espécie prima-irmã. Nos muitos embates que se seguiram até o completo desaparecimentos dos Neandertais há cerca de 30 mil anos atrás, muitos dos derrotados acabaram sendo aprisionados e, talvez, até escravizados pela nossa espécie. Uma interessante produção francesa de 2010, Ao, le dernier Néandertal (Ao, o último Neandertal), mostra como podem ter sido esses tempos. 

Com o surgimento das primeiras civilizações humanas, as nações mais fortes e/ou vencedoras de guerras costumavam escravizar os povos mais fracos e/ou derrotados. Um exemplo muito conhecido por todos e citado na Bíblia cristã foi o período de 400 anos em que os judeus foram escravos no antigo Egito. Na Europa, o conceito de escravidão sobreviveu por milhares de anos.

Uma evidência marcante dessa prática são os eslavos, povos que vivem no Leste europeu e no Norte da Ásia. A palavra eslavo é derivada do latim medieval sclavus – escravos, e indica que, durante muito tempo, a região forneceu mão de obra para o Impérios Romano. 

Com o avanço do cristianismo e seus dogmas sobre a igualdade entre os homens, o conceito de escravidão foi mudando – pessoas deixaram de ser propriedades de outras, sendo convenientemente transformadas em servos de um rei ou senhor feudal. Esses servos eram “livres” para ir e vir, desde que fosse dentro da propriedade de seu senhor, para o qual ele trabalhava e devia a mais absoluta obediência. 

A partir dos séculos XII e XIII, quando o Reino de Portugal passou a ser independente e os Reinos castelhanos de Leão, Castela e Aragão, entre outros menores, começaram a se unir para expulsar os muçulmanos da Península Ibérica, o antigo conceito de escravidão ressurgiu na Europa. Os muçulmanos derrotados em batalhas eram transformados em escravos ou semiescravos e forçados a trabalhar para um senhor cristão. 

Com o enfraquecimento cada vez maior dos califados ibéricos e com a conversão de muitos muçulmanos ao cristianismo (os famosos moçárabes ou cristãos novos), os negros escravizados, que eram vendidos em mercados por todo o Norte da África, passaram a abastecer o mercado de trabalho de Portugal e da Espanha.  

Nas terras subsaarianas eram comuns os embates entre os diferentes reinos e etnias, resultando sempre em grandes contingentes de escravos. Levados por mercadores através de rotas pelo Magreb – o Deserto do Saara, esses homens e mulheres viravam mercadoria nos souks, os mercados árabes do Norte da África. 

Há registros de negros escravizados trabalhando em canaviais do Algarve em Portugal a partir do século XIV. Com o início das grandes navegações portuguesas e a descoberta das rotas de navegação para as costas da África – o navegador Gil Eanes dobrou o Cabo do Bojador na Guiné em 1433, as naus portuguesas passaram a se abastecer de escravos direto das fontes.  

Os portugueses começaram a comprar escravos no delta do rio Níger por volta do ano 1470. Com o tempo foram se consolidando importantes centros de venda de escravos no Golfo de Biafra, Ilha de Gorée e outras localidades do oeste africano onde estão os territórios atuais da Costa do Marfim, Benin, Togo, Gana e Nigéria. 

A expansão dos portugueses em direção aos seus territórios insulares recém descobertos dos Açores, Madeira e Cabo Verde, foi seguida pela chegada das primeiras mudas de cana de açúcar e pelo início do uso da mão de obra de negros escravizados. Aos tempos da descoberta do Brasil em 1500, calcula-se que existiam cerca de 50 mil escravos africanos em Portugal. 

Como fica bem fácil de perceber, quando teve início o projeto colonial português em terras brasileiras, o uso de escravos em trabalhos domésticos e em plantações já era uma prática bastante antiga e completamente enraizada na cultura dos lusos. As expedições colonizadoras de Martim Afonso de Sousa e de seu irmão, Pero Lopes de Sousa, e também a de Duarte Coelho, Donatários das Capitanias de São Vicente e de Pernambuco, respectivamente, chegaram ao Brasil no início da década de 1530 e, muito provavelmente, já traziam escravos, bois e mudas de cana de açúcar. 

O grande objetivo do projeto colonial de Portugal, ou o “fim” citado no título, era o de se produzir a maior quantidade possível de açúcar, um dos produtos mais valorizados nos mercados da Europa daqueles tempos. Esse projeto se baseava na grande disponibilidade de terras da nova colônia e no uso intensivo da mão de obra escrava. Com a decadência da indústria açucareira, a mão de obra negra foi deslocada ao longo do século XVIII para o garimpo e processamento do ouro nas Geraes. Por fim, teve início o Ciclo do Café a partir das últimas décadas do século XVIII e os escravos, mais uma vez, se tornaram a base da estrutura produtiva. 

Estima-se que, entre 1450 e 1900, foram comercializados mais de onze milhões de escravos, principalmente para as Três Américas. Calcula-se que pelo menos um terço deste contingente tenha sido comercializado no Brasil. Algumas fontes chegam a citar uma “perda” entre 40 e 50% dos escravos durante a travessia do Oceano Atlântico nos navios negreiros – o alto valor de comercialização compensava plenamente este custo extra – um negócio de altíssima rentabilidade e riscos baixos.

Como se fizessem sentir, depois de 1550, falta de braços em todo o Brasil, permitiu o Rei de Portugal, por édito de 1559, que cada engenho importasse 130 escravos do Congo, com o que o número total de escravos negros se elevou, até 1584, a cerca de 10.000.

Esse vergonhoso sistema de produção se estendeu em nossas terras por mais de três séculos e meio, até que em 1888, depois de uma enorme pressão internacional, o Império Brasileiro pôs fim à escravidão no Brasil. A Lei Áurea foi assinada no dia 13 de maio de 1888 pela Princesa Isabel, que regia o país na ausência de seu pai, o Imperador Dom Pedro II, que estava em viagem ao exterior.  

Essa lei completava esforços anteriores como a Lei Eusébio de Queirós de 1850, que proibia a entrada de escravos africanos no Brasil, a Lei do Ventre Livre de 1871, que libertava todas as crianças nascidas de mães escravas e a Lei dos Sexagenários de 1885, que tornava livre todos os escravos com mais de 60 anos de idade. 

O fim legal da escravidão no Brasil, que não foi adotada automaticamente em todo o país logo após a sua assinatura (as notícias demoravam para circular por todo o nosso território naqueles tempos), colocou todo o sistema produtivo, principalmente a cultura do café, em xeque de uma hora para outra. Um dos reflexos mais imediatos foi o fim da monarquia e a proclamação da República cerca de um ano e meio depois, um movimento que contou com o apoio dos grandes fazendeiros do país. 

Essa brusca mudança no regime de trabalho daria uma breve pausa na devastação de florestas como a Mata Atlântica. Porém, não tardaria muito para o “sistema” se reestruturar e para as matas voltarem a cair pelo ferro dos machados e a arder pelo fogo das queimadas… 

E O CAFÉ CHEGA NO VALE DO PARAÍBA EM SÃO PAULO

Monteiro Lobato (1882-1948) foi um importante jornalista, escritor e editor de livros, principalmente de obras infantis muito conhecidas como o Sítio do Pica Pau Amarelo e seus inesquecíveis personagens – Narizinho, Pedrinho, Dona Benta, Tia Anastácia e a impagável boneca de pano Emília. Natural da cidade de Taubaté, no Vale do rio Paraíba em São Paulo, Monteiro Lobato foi uma espécie de “testemunha ocular” dos impactos sociais e ambientais deixados pela cafeicultura na região. 

Uma das primeiras e mais marcantes obras de Monteiro Lobato foi o livro de contos Cidades Mortas, onde apresenta a realidade das antigas cidades produtoras de café da região, que viveram um período de esplendor entre as décadas de 1850 e 1870, caindo no mais completo ostracismo após o colapso da produção. Já há época de sua infância, Monteiro Lobato conheceu grandes fazendas com suas antigas sedes-palacetes completamente abandonadas. Nas antigas cidades da região, que tiveram dias dos mais frenéticos no auge da cafeicultura, o que se ouvia agora era apenas um doloroso silêncio. 

“Ali tudo foi, nada é. Não se conjugam verbos no presente. Tudo é pretérito!” 

O Vale do Paraíba, a ligação natural entre São Paulo e Rio de Janeiro, foi a porta de entrada do café no Estado de São Paulo, transformando-se em poucos anos numa extensão natural do trecho fluminense do médio rio Paraíba do Sul, o primeiro grande cenário da cultura cafeeira no Brasil. As condições naturais da região eram esplendidas e muito similares as do interior do Rio de Janeiro: altitudes entre 300 e 900 metros, com temperaturas dentro dos limites ideais para o café e ciclo de chuvas regulares.  

Outro ponto forte da região eram os relevos acidentados das encostas da Serra da Mantiqueira, que proporcionavam proteção contra os ventos, um fator importante para uma planta arbustiva como o café. O Vale do Paraíba em São Paulo, em meados do século XIX, tornou-se um grande centro condensador de população e de riqueza do Brasil, atraindo grandes fazendeiros das já decadentes terras fluminenses.   

Como já havia acontecido em outras regiões tomadas de assalto pela cultura cafeeira, toda esta prosperidade não durou muito tempo. A produção entrou em decadência por volta de 1875 devido ao esgotamento dos recursos naturais da região. Os terrenos locais apresentam forte declividade e não suportaram por muito tempo a supressão da cobertura vegetal e a exposição do solo à ação das intempéries – o trabalho da erosão foi muito rápido.  

Os cafeicultores da região, repetindo os mesmos erros de outras terras, agiram sem o menor cuidado no manuseio dos solos. A mata foi arrasada sem nenhum critério, mesmo nas partes mais altas dos terrenos; plantou-se o café sem outra preocupação senão o lucro imediato. O sistema de cultura implantado distribuiu as plantas em linhas retas, perpendiculares às encostas dos morros, quando a forma ideal de plantio era em curvas de nível. Não poderia ter sido utilizada técnica mais favorável à erosão.   

Conforme já comentamos em outras postagens, esse plantio do café em linhas retas tinha uma forte razão operacional – visibilidade. Um capataz montado em seu cavalo poderia acompanhar o trabalho de um grupo entre 100 e 150 escravos a partir da base do terreno. Se o café fosse plantado acompanhando as curvas de nível das encostas, como manda a boa prática agrícola, os escravos ficariam escondidos atrás das plantas e a “produtividade” seria bem menor.  

Os impactos nessa região, sobretudo nas encostas da Mantiqueira, foram a intensificação dos usos e ocupação das terras antes recobertas pela primitiva Mata Atlântica, deixando como herança o aumento da degradação ambiental, o manejo inadequado dos recursos naturais, o desrespeito à topografia acidentada e a devastação extensiva da cobertura vegetal. A somatória de todos esses problemas promoveu o empobrecimento e a exaustão quase completa dos solos, intensificando os processos erosivos e transformando-os em pastos.  

Bastaram uns poucos decênios para a produção cafeeira apresentar rendimentos aceleradamente decrescentes, com enfraquecimento das plantas e o aparecimento de pragas destruidoras. Nas palavras de Caio Prado Junior, “inicia-se então a decadência com todo seu cortejo sinistro: empobrecimento da população, abandono sucessivo das culturas e rarefação demográfica”.  

Como aconteceu em terras fluminenses, capixabas e mineiras há mesma época, o golpe final contra a cafeicultura foi a Abolição da Escravidão no Brasil, oficializada com a assinatura da Lei Áurea em 1888. As bases econômicas que balizavam a cultura até aquele momento, os baixos custos das terras, a farta mão de obra escrava, e, por fim, a chegada das estradas de ferro, caíram por terra e não voltariam mais a se reestabelecer. 

Desde meados do século XIX, diversos movimentos abolicionistas começaram a surgir por todo o país, exigindo o fim do regime escravocrata no Brasil. A partir da década de 1870, surgiram os primeiros mecanismos legais com o objetivo de enfraquecer o uso de mão de obra escrava. A Lei do Ventre Livre, assinada em 1871, declarava que os filhos de mulheres escravas eram livres. Em 1885, foi promulgada a Lei dos Sexagenários, que tornava automaticamente livres escravos que completavam 60 anos de idade. 

Inebriados pelos rios de dinheiro proporcionados pela produção e exportação do café, a imensa maioria dos grandes produtores preferiu fazer “vista grossa” a todos esses movimentos e continuaram a agir “enlouquecidamente”. Apesar de todas as dificuldades práticas e legais que estavam surgindo, havia um grande “mercado negro” (nenhuma referência aqui a cor da pele dos africanos) para a compra e venda de escravos.  

Como não era usual a emissão de certidões de nascimento para os escravos (as certidões de batismo até valeriam como documento), era muito difícil comprovar se uma criança havia nascido após 1871 ou se um idoso tinha realmente mais de 60 anos de idade. Os vendedores das “peças” alegavam que não dispunham de tais documentos e os compradores, os grandes fazendeiros do café, faziam corpo mole e diziam que fizeram as compras sem ver “os produtos”. Como não é de hoje que “quem detém o poder econômico, detém o poder político”, ficava tudo como estava. 

Muitos fazendeiros paulistas até tentaram fazer acordos de parceria com imigrantes europeus que passavam a chegar em grande quantidade à Província, mas a grande maioria não logrou sucesso. Os imigrantes receberiam um lote de terras para trabalhar e dividiriam os lucros da produção e venda do café com os fazendeiros. Esse sistema não funcionou por duas razões principais – o estado de esgotamento dos solos estava em níveis muito altos e os fazendeiros queriam ficar com a maior parte dos rendimentos.  

O tratamento dado as famílias dos imigrantes, que estava muito próximo daquele dado aos antigos escravos, levava ao abandono das terras e uma busca por novas alternativas. Os grandes fazendeiros tinham uma enorme dificuldade para entender que os imigrantes eram pessoas livres e não “propriedades”, como os escravos, não se submetendo às vontades, mandos e desmandos dos cafeicultores. 

O Oeste Paulista, com seus famosos e férteis solos de terra roxa e relevo muito menos acidentado, acabou se transformando numa alternativa ao Vale do Paraíba. Rapidamente, as grandes plantações de café migraram para essas novas terras, deixando para trás uma “terra devastada”, como já era rotina. A opção econômica que restou ao Vale do Paraíba em São Paulo foi a produção leiteira – as antigas áreas de Mata Atlântica foram transformadas em pastagens para o gado. 

Um fim melancólica para uma das florestas com a maior biodiversidade do mundo.

OS PRIMEIROS TEMPOS DO CAFÉ NA ZONA DA MATA MINEIRA

Ao longo de todo o século XVIII, as regiões de mineração de ouro nas Geraes concentraram a atenção dos dirigentes da Colônia e de grande parte da nossa população. Conforme já comentamos em postagens anteriores, a partir das primeiras notícias da descoberta de reservas de ouro na lendária Serra do Sabarabuçu, no coração das Geraes, uma verdadeira “febre do ouro” tomou conta da Colônia e, ao longo de meio século, cerca de 2/3 da população abandonou as terras do litoral e se embrenhou nos sertões para tentar a sorte no garimpo. 

Ao longo desse período, a chamada Zona da Mata era uma terra desconhecida e cheia de tribos indígenas, muitas delas hostis. Foi a necessidade de se criar um caminho para o escoamento do ouro na direção do Rio de Janeiro que levou à criação do chamado Caminho Novo, uma trilha que, pouco a pouco, levou a instalação de fazendas e de postos de apoio aos tropeiros. 

A faixa Sul da Zona da Mata foi a primeira área a ser povoada, surgindo cidades como Mar de Espanha, Leopoldina e Juiz de Fora. Em seguida foram surgindo cidades na área Central, onde se destacam Rio Novo, Rio Pomba, Cataguases, Ubá, Muriaé, Rio Branco, Viçosa e Carangola. O Norte da Zona da Mata só passaria a ser ocupado nas últimas décadas do século XIX e onde surgiriam cidades como Manhuaçu, Abre Campo e Ponte Nova. Muitas dessas cidades surgiram em decorrência da chegada dos cafezais ao território mineiro. 

Assim como aconteceu no Sul do Espírito Santo, os grandes cafezais começaram a ser instalados na Zona da Mata mineira em meados do século XIX. A expansão irracional dos cafezais fluminenses levou a um rápido esgotamento dos solos, principalmente na região do Vale do Paraíba, e os grandes fazendeiros passaram a buscar alternativas para a criação de novas áreas de produção. As férteis terras cobertas com a Mata Atlântica em Minas Gerais rapidamente entraram na alça de mira desses cafeicultores. 

Pela proximidade com a Província do Rio de Janeiro, as regiões de Mathias Barbosa, Mar de Espanha, Além Paraíba e Rio Preto foram as primeiras a assistir ao surgimento de grandes cafezais nas primeiras décadas do século XIX. A cultura chegou a Juiz de Fora e Leopoldina por volta de 1828. Os primeiros cafezais se instalariam nas regiões de Cataguases e Ubá a partir de 1848. 

modus operandi dos cafeicultores em terras mineiras era exatamente o mesmo que vinha sendo usado nas terras da Província do Rio de Janeiro – o uso dos solos até o desgaste completo, o abandono da terra e a derrubada de novas matas para uso das “terras virgens” para a abertura de novos campos de cultivo. Esse avanço sem controle dos cafezais, com suas já conhecidas consequências, passou a criar grandes preocupações entre os Governantes mineiros. O então Presidente da Província de Minas Gerais – Costa Pinto, fez o seguinte pronunciamento em 1838

Muito se tem clamado, posto que em vão, contra a destruidora rotina de nossos lavradores; elles entendem que não podem colher com vantagem os productos da Agricultura, sem que se tenha derrubado, e queimada uma grande porção de madeiras; em sua opinião as melhores terras de tornão irremediavelmente cançadas, abusando assim de um principio, alias verdadeiro, mas tomado em uma generalidade sem limites. O lavrador intelligente, e abastado costuma ter em reserva uma parte de suas terras; mas sabe prepara-la d`antemão para ser vantajosamente cultivada em occasião opportuna; o nosso lavrador tudo espera só do tempo. Dest`arte tem-se visto desapparecer pouco a pouco magníficas florestas, e o solo cobrindo-se de arbustos inuteis, e mesmo damnosos, vai perdendo sua primitiva fertilidade. 

Desde a década de 1770, quando já se tornava evidente o breve esgotamento dos veios auríferos, muitos mineiros desiludidos passaram a migrar para a região da Zona da Mata e a se dedicar a agricultura. Durante a maior parte do chamado Ciclo do Ouro, as cidades mineiras dependiam fortemente da importação de alimentos, vindos principalmente de São Paulo e também das boiadas que desciam o rio São Francisco vindas dos sertões do Nordeste. Enquanto o ouro abundava, a população das regiões mineradoras conseguia bancar os altos custos dos alimentos. Com a redução da produção do ouro, essas fazendas da Zona da Mata ganharam uma enorme importância econômica e estratégica para a Província. 

Cerca de metade do território mineiro era coberto pelo bioma Cerrado, apresentando solos muito ácidos e de baixa fertilidade para os padrões da época – esses solos só se tornariam altamente produtivos a partir da década de 1970, quando sementes de grãos especialmente adaptados para os solos do Cerrado seriam desenvolvidas pela Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. A Zona da Mata daqueles tempos já havia sido transformada no “celeiro das Geraes”. O cuidado em se preservar essa região agrícola da Zona da Mata fica evidente na fala do Presidente da Província. 

Os grandes lucros advindos da produção e exportação do café, é claro, acabavam por falar mais alto e o avanço dos cafezais prosseguia sem controle. A construção da Estrada de Ferro Dom Pedro II em 1870, que passou a ligar a Zona da Mata com o Rio de Janeiro estimularia o aumento da produção de café na região. A produção seria ainda mais dinamizada após a construção da Estrada de Ferro Leopoldina, que passou a cortar a Zona da Mata mineira no sentido Leste-Oeste e fazia entrocamentos com outras ferrovias. 

Em um relatório de 1883, Gonçalves Chaves, então Presidente da Província, comenta que o problema ainda existia e conclama os produtores a implantar técnicas agrícolas mais modernas: 

Do que havemos mister é da educação profissional elementar, diffundida na população rural; que se preparem operários e abegões para a grande lavoura; que se aumente e varie a producção e se melhorem os productos, fazendo-se conhecer e praticar a cultura intensiva, por meio de processos e instrumentos aperfeiçoados. 

As dificuldades para o escoamento da produção do café, que na maior parte da Zona da Mata precisava ser feito através de tropas de mulas e burros (vide foto), era o único limitador para uma expansão mais rápida dos cafezais. Os comboios seguiam por trilhas apertadas entre os morros até as poucas linhas férreas que ligavam a região ao Cais do Porto no Rio de Janeiro.  

A “salvação da lavoura”, falando aqui da produção de alimentos e dos remanescentes das matas, só viria em 1888, com a assinatura da Lei Áurea, que pôs fim ao uso da mão de obra escrava na produção do café. Essa brusca mudança inviabilizou a produção nas grandes fazendas de café e freou, ao menos temporariamente, a destruição maciça da Mata Atlântica mineira. 

De acordo com um censo Provincial feito em 1872, a Zona da Mata ocupava uma área correspondente a apenas 5% do território, mas abrigava perto de 16% da população e quase ¼ da população escrava da Província. Na região de Juiz de Fora, citando um exemplo, as grandes propriedades tinham em média 236 alqueires de área e perto de 100 escravos para cuidar de mais de 230 mil pés de café. É fácil notar o impacto criado pelo fim da escravidão

A cafeicultura, que depois se consolidaria no Sul de Minas Gerais, iniciou o processo de destruição em larga escala da Mata Atlântica pela siderurgia mineira, que há essa época já dependia intensamente da produção do carvão vegetal para alimentar os seus insaciáveis altos fornos. 

A CHEGADA DOS GRANDES CAFEZAIS AO ESPÍRITO SANTO NO SÉCULO XIX

O primeiro século da produção e exportação do café no Brasil foi devastador para a Mata Atlântica na então Província do Rio de Janeiro e regiões circunvizinhas. Essa cultura era baseada na exploração dos chamados solos virgens até a exaustão e na derrubada contínua de matas para a criação de novos campos agrícolas.

Usando técnicas agrícolas inadequadas como o plantio dos cafeeiros em linhas que vinham dos trechos altos dos terrenos em direção às partes baixas, além de não se preocupar com a adubação e renovação dos nutrientes do solo, essas plantações exauriam os terrenos em menos de dez anos, especialmente pela perda da camada fértil pela erosão. 

Quando a produção de uma fazenda declinava fortemente, novas áreas de mata eram então derrubadas e novas plantações eram formadas – as terras devastadas eram largadas à própria sorte. Essa agricultura irracional era estimulada pelo baixo preços das terras no interior da Província do Rio de Janeiro. A escravidão era outro fator que favorecia os grandes lucros dos produtores – a partir de um investimento inicial na compra da “peça”, o fazendeiro teria uma mão de obra praticamente gratuíta por dezenas de anos. 

A partir de meados do século XIX, essa situação começou a mudar. O estoque de terras virgens a preços baixos começou a rarear no interior do Rio de Janeiro e os cafeicultores passaram a buscar terras disponíveis em outras Províncias. Os cafezais passam então a se instalar na faixa Sudeste de Minas Gerais, no Sul do Espírito Santo e, principalmente, no Vale do Paraíba em São Paulo. 

Vamos começar falando do Espírito Santo, um pedaço do Brasil que teve uma colonização bastante complicada devido a presença de tribos indígenas extremamente hostis como os botocudos e os tamoios. Esses indígenas atacavam os assentamentos dos colonizadores e queimavam tudo o que havia sido construído. Como resultado dessas dificuldades, o Espírito Santo teve um povoamente bastante tardio – em 1880, apenas 15% do território era habitado por não indígenas

Um outro complicador surgiu em decorrência da exploração do ouro nas Geraes ao longo do século XVIII – para evitar o acesso de forasteiros e, especialmente, de estrangeiros as áreas de mineração, a Coroa de Portugal declarou a faixa Norte do Espírito Santo como “Área Prohibida”. Um Decreto Real passou a limitar o povoamento, as construções e as expedições a uma faixa de 3 léguas (15 km) do litoral capixaba, especialmente nas proximidades da região da foz do rio Doce

Essas dificuldades inibiram por muito tempo o povoamento e a colonização do território, que ficou restrito a estreitas faixas do litoral e a faixa Sul, junto a divisa com o Rio de Janeiro. Foi justamente por essa região que a cultura do café se instalou no território capixaba por influência de cafeicultores fluminenses. 

Existem registros de cafeeiros no litoral do Espírito Santo já nos primeiros anos do século XIX. Foi, porém, em meados desse século que a cultura entrou com força na Província. As “terras virgens” com baixos preços do Sul do Espírito Santo se transformaram em uma alternativa para os cafeicultores fluminenses menos favorecidos.  

Fazendas de café começaram a surgir nas regiões de Apiacá, Bom Jesus do Norte, Atílio Vivacqua, Castelo, Cachoeiro de Itapemirim, Mimoso do Sul, Muqui, São Pedro de Alcântara e Veado (Guaçui). O escoamento da produção era feito através dos portos fluviais de Limeira, que ficava em terras do atual município de Mimoso do Sul, e de Cachoeiro de Itapemirim. 

De acordo com dados do IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a conhecida Região dos Vales e Cafés chegou a ter 132 grandes fazendas em 1888, época em que o antigo sistema de trabalho escravocrata entrou em colapso. 

A mão de obra negra, em conjunto com a farta disponibilidade de terras agrícolas, formava a base da “indústria cafeeira” no Brasil há época. Um exemplo dessa dependência laboral dos escravos pode ser comprovado em um discurso feito no Parlamento em 1880 por Gaspar Silveira Martins, senador do Império do Brasil entre 1880 e 1889:  

“O Brasil é o café; o café é o negro.” 

A produção das fazendas de café do Espírito Santo era bem menor do que nas fazendas do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, fato que levou intelectuais importantes como Caio Prado Júnior e Celso Furtado a classificar a contribuição do café capixaba para a economia do país há época como “medíocre”. Existe, porém, uma explicação bastante razoável para essa diferença de produtividade: as fazendas do Espírito Santo dispunham de menos escravos

De acordo com o livro Transição para o Trabalho Livre e Pequena Propriedade no Espírito Santo – 1888-1930, de Nara Saleto, que usou dados de fazendas hipotecadas no Banco do Brasil em 1883, as fazendas de café capixabas usavam, proporcionalmente, de duas a três vezes menos escravos nos trabalhos nas plantações que suas similares fluminenses, paulistas e mineiras. Isso é um indicativo claro do menor poder aquisitivo dos fazendeiros da região quando comparados aos fluminenses. 

Contando com uma força de trabalho bem menor, as fazendas capixabas mal conseguiam atingir uma densidade de mais de 30 pés de café por hectare, enquanto as fazendas fluminenses, paulistas e mineiras, contavam com 315, 151 e 228 pés de café por hectare, respectivamente. A “pobreza” dos cafeicultores capixabas fica evidente quando se comparam as sedes de suas fazendas com os verdadeiros palacetes das fazendas dos “Barões” do café do Rio de Janeiro e do Vale do Paraíba paulista. 

Apesar de uma menor produtividade, essa primeira fase da cultura do café no Espírito Santo causou consideráveis estragos no trecho local da Mata Atlântica, uma vez que os padrões de produção eram exatamente os mesmos das fazendas fluminenses. Grandes extensões de mata eram derrubadas para a liberação das “terras virgens” e formação dos cafezais. Esses estragos só não foram maiores por que o ciclo da cultura foi efêmero na Província – com a abolição da escravidão no Brasil a partir da assinatura da Lei Áurea em 1888, a produção do café ficou inviável dentro do antigo sistema de produção escravocrata. 

A cafeicultura voltaria a ganhar algum fôlego com a chegada de grandes contingentes de imigrantes europeus ao Espírito Santo no final do século XIX. De acordo com uma citação do IPHAN:

“A partir da política de imigração desapareceram as fazendas escravagistas. As que conseguiram se manter, passaram a adotar um sistema de parceria. As que não conseguiram, utilizaram outra estratégia, garantindo a sua lucratividade através da cafeicultura, dividindo suas fazendas e vendendo seus lotes aos imigrantes ou às empresas que surgiram com o interesse voltado para a venda de lotes rurais e comercialização do café.” 

A chegada de agricultores europeus, já com uma grande tradição no uso de técnicas agrícolas mais sustentáveis – especialmente no que diz respeito à conservação dos solos férteis, levou a uma mudança nos paradigmas da cafeicultura. Um exemplo: esses imigrantes passaram a plantar os cafeeiros seguindo as linhas de nível dos terrenos, um cuidado eficiente contra a erosão e que resultou numa maior longevidade aos solos e a numa menor progressão dos desmatamentos.  

A cafeicultura no Espírito Santo passaria por vários altos e baixos ao longo da maior parte do século XX, até que o Estado se consolidasse, a partir da década de 1970, como o maior produtor de café do tipo conilon do Brasil, um grão usado em misturas (blend) e na produção do café solúvel. O território capixaba responde atualmente por mais de 75% da produção brasileira de café conilon (vide foto). Contaremos essa história e suas consequências ambientais em futuras postagens. 

Os territórios do Sudoeste da Província de Minas Gerais também receberiam grandes cafezais a partir de meados do século XIX. Falaremos disso na próxima postagem. 

O RENASCIMENTO DA FLORESTA DA TIJUCA, OU ERA UMA VEZ NO RIO DE JANEIRO…

Na última postagem apresentamos um resumo do quadro caótico que tomou conta do abastecimento de água na cidade do Rio de Janeiro nas primeiras décadas do século XIX. Os intensos desmatamentos das florestas ao redor da cidade, principalmente para a criação de grandes cafezais, comprometeram inúmeras das nascentes que forneciam a água que corria para as fontes públicas.

Um dos corpos d’água mais degradados há época foi o rio da Carioca, uma das principais fontes de água do sistema de abastecimento do Rio de Janeiro. Esse rio era tão importante que compartilhava o nome com os naturais da cidade – os cariocas. 

A situação foi agravada pelo rápido crescimento da cidade a partir da chegada da Família Real portuguesa e toda a sua Corte – diferentes fontes falam de um acréscimo entre 12 e 20 mil pessoas à população da cidade após esse evento. Esse aumento da população foi seguido por um forte crescimento da demanda por mão de obra e transformou o Rio de Janeiro no maior mercado de venda de escravos do Brasil. Milhares de novos escravos passaram a ser incorporados à população da cidade a cada ano, pressionando cada vez mais as fontes de abastecimento de água. 

O dia a dia dos cariocas, tanto os nativos quanto os recém chegados, não era dos mais confortáveis e salutares. Mesmo tendo sido elevada à categoria de Metrópole do Império Ultramarino Português, as ruas da cidade do Rio de Janeiro eram feias, sujas e cheiravam pessimamente mal – os canais de drenagem de águas pluviais, que também eram usados para a dispersão dos esgotos e do lixo, estavam quase sempre secos e cobertos com uma grossa camada de excrementos humanos e detritos. Os nobres e os demais membros da Corte não paravam de reclamar das péssimas condições de saneamento ambiental daquele “fim de mundo”. 

Ao longo das décadas de 1820 e 1830, a cidade do Rio de Janeiro enfrentou vários períodos de seca prolongada, o que agravou ainda mais a escassez de água potável e aumentou as dificuldades para a dispersão do esgoto residencial que se acumulava nos canais. Agora não eram apenas os nobres e ricos que reclamavam – toda a opinião pública da cidade passou a exercer uma forte pressão sobre os Governantes para a adoção de políticas para o aumento da capacidade dos sistemas produtores de água. 

Data da década de 1820 a primeira decisão de se desapropriar terras na Tijuca para reflorestar as nascentes de água potável, cada vez mais escassas. Acreditava-se, de forma empírica, que o reflorestamento aumentaria o volume dos riachos. E foi revegetando as encostas da Tijuca que se reparou, em parte, os danos causados pela exploração indiscriminada de toda a sua vegetação para se produzir, sucessivamente, cana-de-açúcar, café, lenha e carvão vegetal e, finalmente, abrigar a produção de alimentos e criação de animais destinados ao consumo da crescente população. 

A partir de 1845, inicia-se, de fato, o trabalho sistemático de recomposição florestal das encostas e as desapropriações de fazendas se intensificaram. As primeiras experiências de reflorestamento haviam apresentado ótimos resultados e partia-se, agora, para um aumento na escala nas intervenções florestais. 

A partir de 1861, por ordem do imperador Dom Pedro II, grandes fazendas na região da Tijuca foram desapropriadas e iniciou-se um processo contínuo de reflorestamento em grande escala. A realização deste trabalho foi confiada ao Major Manuel Gomes Archer que, de forma totalmente amadorista e sem nenhum critério científico, iniciou os trabalhos de plantio de árvores.  

Contando com uma pequena equipe de trabalhadores, entre escravos e assalariados, foram plantadas ao longo de 13 anos mais de 100 mil mudas de árvores, especialmente mudas de espécies da Mata Atlântica, que ainda resistiam em pequenos fragmentos florestais, e muitas espécies exóticas. Ao longo de várias décadas, os trabalhos de reflorestamento foram sendo ampliados e a oferta de água potável se estabilizou.

Esse gradual renascimento da Floresta da Tijuca foi responsável pela recuperação dos caudais do rio da Carioca e, consequentemente, pelo reestabelecimento da capacidade de produção do sistema de abastecimento de água da cidade. O crescimento gradual dos volumes de água garantiria parte importante do abastecimento da população carioca até o final do século XIX, quando novas fontes passaram a ser incorporadas ao sistema. 

Em 1961 a floresta foi elevada a condição de Parque Nacional do Rio de Janeiro, nome alterado anos depois para Parque Nacional da Tijuca, ou simplesmente Floresta da Tijuca (vide foto) para os cariocas, com área total de 3.953 ha. Além de abrigar excepcional patrimônio natural da Mata Atlântica, o Parque concentra dentro dos limites de sua área valiosos bens culturais e históricos, constituindo a maior floresta artificial urbana do mundo, contemplando maciços rochosos, quedas d’água, riachos, fauna e flora da Mata Atlântica, mirantes, ruínas de antigas fazendas e da Real Fábrica de Pólvora, entre outras atrações. 

Junto com as praias e as montanhas que envolvem a cidade do Rio de Janeiro e a transformaram no cartão postal mais conhecido do Brasil em todas as partes do mundo, a Floresta da Tijuca é um dos grandes patrimônios naturais da capital fluminense, fornecendo ainda hoje preciosos serviços ambientais e atraindo milhares de turistas a cada ano.

Entre as melhores lembranças que eu tenho da cidade do Rio de Janeiro, onde tenho raízes familiares, estão caminhadas que fiz quando adolescente em trilhas no meio dessa floresta. Uma espécie de árvore que abunda nessas matas são as jaqueiras, uma planta de origem asiática que se adaptou perfeitamente ao clima local. O cheiro adocicado dessas frutas ao longo das trilhas era marcante e inesquecível. 

Desgraçadamente, esses trabalhos de reflorestamento e recuperação de áreas devastadas pela cultura do café não se estenderam a outras regiões do interior da Província do Rio de Janeiro. Áreas que no passado foram cobertas por uma densa floresta de Mata Atlântica e que foram transformadas em fazendas produtoras de café, foram abandonadas a própria sorte após a exaustão dos solos. O que foi floresta, na melhor das hipóteses, acabou transformado em ralas matas de capoeira – a maior parte dessas áreas virou pastagem para o gado ou terras para uma agricultura de pequena escala. 

Não existem estudos antigos sobre as florestas e bacias hidrográficas da Província do Rio de Janeiro anteriores ao ciclo do café, o que dificulta se fazer uma comparação da situação do meio ambiente antes e depois. É possível especular, genericamente, que toda a devastação ambiental que se seguiu ao início da cafeicultura na Província causou uma grande diminuição dos volumes de água das principais bacias hidrográficas e que expressivos volumes de sedimentos resultantes da erosão dos solos ocuparam importantes espaços na calha dos corpos d’água. 

Também podemos supor que populações animais foram reduzidas, ou até mesmo extintas, e que houve uma importante redução na diversidade botânica das matas. De acordo com estimativas, cerca de 97% do território do Rio de Janeiro era coberto por Mata Atlântica e ecossistemas associados como matas de altitude, restingas e mangues há época do descobrimento do Brasil. Atualmente, pouco mais de 15% das terras fluminenses ainda são cobertas com vegetação do bioma, especialmente em encostas de morros e serras, o que nos dá uma clara ideia da herança que foi deixada pela cultura do café no Estado. 

Como eu comentei em uma postagem anterior, a situação lembra uma área atacada por uma grande nuvem de gafanhotos – depois de comer a última folha da vegetação, os gafanhotos levantaram voo em busca de matas virgens para atacar. 

FLORESTA DA TIJUCA: UM EXEMPLO DOS IMPACTOS DA DEVASTAÇÃO AMBIENTAL PRODUZIDA PELA CAFEICULTURA

Nas últimas postagens montamos um resumido quadro histórico da chegada e interiorização da cultura do café na Província do Rio de Janeiro. Segundo os registros históricos, as primeiras mudas e/ou sementes de café chegaram nas terras fluminenses por volta de década de 1760. Ainda nas últimas décadas do século XVIII, os primeiros cafezais começaram a ocupar áreas ao redor da cidade do Rio de Janeiro. Uma dessas áreas ficava exatamente onde encontramos hoje a Floresta da Tijuca. 

Quando a cidade do Rio de Janeiro foi fundada em 1565, as montanhas e serras da região eram cobertas por uma imponente cobertura florestal, constituída exclusivamente por espécies da Mata Atlântica. Eram árvores de grande porte, com algumas espécies podendo chegar até 45 m de altura e com troncos de mais de dois metros de diâmetro. A partir de meados do século XVII, essas matas começaram a ser derrubadas e substituídas por plantações de cana-de-açúcar, principalmente na região da Baixada Fluminense.  

Além de necessitar de grandes extensões de terras para as plantações de cana, a indústria do açúcar também exigia a queima de grandes quantidades de madeira para a geração do calor necessário às diversas etapas da produção do açúcar – eram usados até 20 kg de lenha para a produção de um único quilo de açúcar. Os remanescentes florestais que ainda existiam na região passaram a ser derrubados e transformados em lenha para os engenhos. 

Em 1763, após o início da exploração do ouro nas Minas Gerais, a capital da Colônia foi transferida de Salvador para a cidade do Rio de Janeiro. A proximidade geográfica com as zonas produtoras facilitaria imensamente a administração da produção e a exportação do precioso metal para a Metrópole. A cidade portuária viveu nesse momento a sua primeira explosão populacional, assumindo em pouco tempo o título de maior cidade da Colônia com uma população de 30 mil habitantes. 

No final do século XVIII, as plantações de café começaram a ocupar as antigas áreas desflorestadas pelos canaviais e também a pressionar as matas remanescentes. O cafeeiro, conforme já comentamos em outras postagens, é uma planta arbustiva bastante exigente quanto a qualidade dos solos, excessos de calor e de frio, ventos e concorrência com outras espécies vegetais.

Rapidamente, os produtores perceberam que as encostas dos morros com suas matas eram os locais ideais para o plantio dos cafezais. A região da Tijuca, que ainda apresentava uma expressiva cobertura de floresta de Mata Atlântica há época, passou a ser desmatada e ocupada com imensos cafezais

O sucesso da cultura do café rapidamente começou a mostrar os seus custos ambientais em função da substituição da cobertura florestal por plantações. Apesar de sua localização em uma das melhores áreas portuárias naturais do Brasil – a Baía da Guanabara, a cidade do Rio de Janeiro sempre sofreu com a falta de água potável. Esses problemas se agravaram após a chegada do café a terras fluminenses.

Sem rios extensos e caudalosos, o abastecimento da população local sempre dependeu dos inúmeros riachos com nascentes nas encostas dos morros. Um desses corpos d’água, o Rio da Carioca, tinha suas nascentes justamente nas matas da Tijuca. Com a devastação das matas na região, o rio passou a apresentar uma grande redução dos seus caudais

O sistema de abastecimento da cidade do Rio de Janeiro, construído logo após a transferência da capital, trazia as águas do Rio da Carioca até o centro da cidade através de um sistema de tubulações que incluía um trecho em forma de aqueduto – os famosos Arcos da Lapa (vide imagem). Essa água jorrava através de um conjunto de fontes públicas e era carregada por moradores e escravos em jarros até as residências.

Os já antigos problemas de abastecimento de água na cidade passaram a ser mais frequentes a partir de 1808, ano da chegada da família Real Portuguesa. Naquele ano, a então modesta cidade colonial do Rio de Janeiro foi promovida a Metrópole do Império Ultramarino Português e sofreu uma grande explosão populacional.

Com a eminente invasão de Portugal pelas tropas francesas comandadas por Napoleão Bonaparte, toda a Corte Portuguesa (estamos falando de um número entre doze e vinte mil pessoas, conforme a fonte) acompanhou a Família Real para um “exílio” em terras brasileiras. Somente na frota da Marinha da Inglaterra, país aliado de Portugal e que disponibilizou vários navios para a evacuação de Lisboa, aproximadamente 11.500 pessoas se espremeram nas naus para acompanhar a Família Real e se beneficiar desta segurança para a fuga.

A cidade do Rio de Janeiro, bastante modesta para o padrão das capitais europeias da época, era de longe a cidade com a “melhor infraestrutura da Colônia” e candidata natural a receber todo esse contingente estrangeiro. Para acomodar, alimentar e manter toda essa crescente população, os já depauperados recursos florestais passaram a ser explorados ao máximo: precisava-se de madeiras para a construção civil, lenha para as cozinhas, liberação de novas áreas para a produção de alimentos e criação de animais, entre outros usos. 

Em períodos de estiagem a vazão da água costumava diminuir muito, o que provocava reclamações da população. Após a devastação das matas da Tijuca pelos cafezais, a água passou a desaparecer no período da seca. Além dos problemas de escassêz, a situação era agravada por atos de vandalismo – haviam relatos de danos às tubulações provocados por grupos de escravos fugitivos, que se escondiam nas matas ao redor da cidade e que buscavam dessa forma algum tipo de vingança contra os antigos senhores. 

Outro problema que surgiu foi a falta de mão de obra – após todo esse caótico período que se seguiu à chegada da Corte Portuguesa ao Rio de Janeiro, quando milhares de casas tiveram de ser construídas às pressas para acomodar os recém chegados, a cidade do Rio de Janeiro passou a apresentar uma forte demanda por mais escravos. 

Naqueles tempos antigos, todos os trabalhos domésticos, desde a preparação dos alimentos até a ingrata tarefa de esvaziar os penicos usados pela nobreza e pelas elites, dependiam dos escravos. Essa mão de obra também era essencial para carregar compras e todo o tipo de produtos, carregar as liteiras (o tipo de transporte individual usado há época), rachar e carregar lenha para as cozinhas, tratar dos animais domésticos e das hortas, entre outros trabalhos.

Nos sítios e fazendas do cinturão verde da cidade, se faziam necessárias mais mãos para trabalhar na produção de alimentos como o milho e a mandioca. A nascente indústria cafeeira, por sua vez, demandava cada vez mais gente a fim de atender ao insaciavel mercado externo do café. 

A província do Rio de Janeiro se transformou rapidamente no maior mercado comprador de escravos do Brasil – fossem eles “novos”, recém importados desde os portos da costa da África, fossem eles de “segunda mão”, trazidos de outros pontos da Colônia. Os preços dos “produtos” dispararam e muita gente fez fortuna. Esse aumento vertiginoso da população, livre e escrava, só fazia aumentar a pressão sobre os parcos recursos hídricos disponíveis então. 

Como não poderia deixar de ter acontecido, a cidade do Rio de Janeiro simplesmente entrou em colapso devido à escassez de água. Foi então que os Governantes locais se lembraram das antigas matas que outrora existiram na região da Tijuca, onde abundavam nascentes de água. Era preciso reflorestar a região e torcer pela volta das nascentes de água. 

Foi assim que começou a renascer a Floresta da Tijuca. Falaremos disso na próxima postagem.