
Uma notícia publicada hoje: 8 dos 10 municípios brasileiros que mais emitem gases causadores do efeito estufa ficam na Região Amazônica. Os dados se referem ao ano de 2019 e foram divulgados pelo SEEG – Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa, uma iniciativa do IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas.
As duas maiores cidades brasileiras, São Paulo e Rio de Janeiro, é claro, são grandes poluidoras e ocupam a 5ª e a 8ª posição dessa lista, respectivamente. Todas as demais posições dessa lista ficaram por conta de cidades da Amazônia: Altamira e São Félix do Xingu, ambas localizadas no Pará, ocupam as duas primeiras posições da lista de maiores emissoras de gases de efeito estufa do Brasil. Essas cidades são seguidas por Porto Velho (RO), Lábrea (AM), Pacajá (PA), Novo Progresso (PA), Colniza (MT), Apuí (AM) e Novo Repartimento (PA).
A Região Norte responde por 60% de todas as emissões brasileiras de gases de efeito estufa. E o motivo é bastante conhecido – desmatamentos e queimadas. Curiosamente, a Região abriga apenas 20% da população do país.
Antes que qualquer um dos leitores saia por aí gritando alucinadamente que “o Brasil está queimando a Amazônia e poluindo a atmosfera do mundo”, é fundamental saber que as emissões de GEE – Gases de Efeito Estufa, do nosso país respondem por um volume entre 3% e 4% das emissões globais, de acordo com dados de 2019. Algumas fontes afirmam que nossas emissões são ainda menores – 1,5%.
Os maiores poluidores do mundo são a China, com 27% das emissões globais, seguida pelos Estados Unidos com 11%. Juntos, esses dois países respondem por quase 40% de todas as emissões globais. Índia com 3,4% e a União Europeia 3,3% vêm na sequência.
Muitos de vocês devem estar se perguntando: como São Paulo, uma cidade com 12 milhões de habitantes e com uma frota de 24 milhões de carros e motocicletas, consegue emitir menos GEE que Altamira, uma cidade do interior do Estado do Pará?
A resposta não é tão complicada: o município de Altamira ocupa uma área total de 159 mil km², números que o colocam na posição de maior município do Brasil. Para que todos tenham uma ideia do que isso significa – o Estado do Ceará tem uma área de “apenas” 148 mil km². Com a economia do município de Altamira baseada na agricultura e na pecuária, não é difícil de entender por que as emissões de GEE são tão grandes.
O segundo maior emissor de GEE do Brasil é outro município gigante do Pará – São Félix do Xingu, o sexto maior município do país. A área total do município é de 84 mil km² – para efeito de comparação, Portugal tem um território com pouco mais de 92 mil km². São Félix do Xingu possui o maior rebanho bovino do país – são 2,5 milhões de cabeças, quase 20 animais para cada habitante do município.
Para atingir essa impressionante marca, São Félix do Xingu alçou a posição de campeão brasileiro de desmatamentos. Somente no ano de 2019, o município viu desaparecer 9,2 mil km² de florestas ou quase 10% da sua área total. Essa área desmatada correspondeu a 1/3 de tudo o que foi desmatado na Amazônia naquele ano.
Vou destacar por minha conta o município de Porto Velho, medalha de bronze nessa famigerada “competição”. A área total de Porto Velho é de 31 mil km², bem maior que os 27 mil km² do Estado de Alagoas. Eu morei por lá entre os anos de 2009 e 2010, e lembro muito bem da temporada das queimadas, quando o forte cheiro de fumaça invadia a capital do Estado, a cidade de Porto Velho.
O perfil dos demais “campeões brasileiros” em emissões de CEE é muito parecido com os três primeiros colocados da lista. São todos municípios com áreas enormes e que surgiram a partir das políticas de ocupação da Região Amazônica implementadas a partir da década de 1960. Um slogan que marcou época e que simboliza aquele momento histórico: Amazônia, uma terra sem homens para homens sem-terra.
Relembrando, até meados do século XX, perto de 80% da população brasileira estava concentrada em uma faixa de até 300 km do litoral. Todo o interior do país era um grande vazio populacional. E olhem que nem estamos falando de rincões nas distantes Regiões Centro-Oeste e Norte – o Oeste do Estado de São Paulo e o Norte do Paraná, citando apenas dois exemplos, eram cobertos de densas florestas cheias de “índios brabos” nessa época.
Uma saga que ajuda a explicar o que eram esses vazios populacionais foi a Expedição Roncador-Xingu, iniciada em 1949, e que ajudou a colocar grande parte da Região Centro-Oeste no mapa do Brasil. Os lendários irmãos Villas-Boas – Orlando, Cláudio e Leonardo, fizeram parte dessa emocionante aventura.
Na década de 1960, em especial após a ascensão dos Governos Militares em 1964, houve um grande impulso na integração da Região Norte ao restante do país através de rodovias e um estimulo à migração de povoadores vindos de outras regiões do país, especialmente da Região Sul.
Conforme tratamos em uma extensa série de postagens aqui do blog, foram abertas a partir dessa época as Rodovias Cuiabá-Porto Velho-Rio Branco (BR364), a Belém-Brasília (BR153), a Cuiabá-Santarém (BR164), Porto Velho-Manaus (BR319), além da icônica Rodovia Transamazônica (BR230). Dezenas de milhares de famílias foram estimuladas a mudar para a região, recebendo grandes lotes de terra do Governo Federal.
Essa ocupação territorial foi feita, literalmente, a “ferro e a fogo” – os colonos tinham a obrigação legal de desmatar os lotes de terra que receberam do Governo Federal e formar fazendas para a criação de gado e/ou para produção agrícola. Começaram assim as mundialmente conhecidas “queimadas da Amazônia”.
Essa ocupação rápida e irracional da Amazônia teve uma razão dogmática por parte dos militares – combater a temida internacionalização da Amazônia, uma ideia que começou a ganhar forma no final da década de 1940 na Europa e nos Estados Unidos e que tinha nome e sobrenome IIHA – Instituto Internacional da Hileia Amazônica.
Essa foi uma proposta da UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, que, para a nossa felicidade, não foi para a frente por causa do acirramento da Guerra Fria entre os norte-americanos e os russos. Mesmo assim, essa ideia acabou inspirando o Tratado da Antártida que foi assinado em 1959 e internacionalizou o grande continente gelado. Tem muito Governante pelo mundo afora com essa ideia ainda em mente…
A paranoia criada pela ideia da internacionalização foi uma das grandes responsáveis pela ocupação irracional de grandes áreas da Amazônia. Diria até que levou a abertura da “caixa de Pandora” na grande floresta. Os recordes na emissão de gases de efeito estufa por esses oito grandes municípios da região é apenas uma das faces dos muitos males que se estabeleceram por lá nessas últimas décadas…
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