
A versão preliminar de um relatório do IPCC – Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas, na sigla em inglês, um órgão de caráter consultivo da ONU – Organização das Nações Unidas, para assuntos relacionados ao clima, indica que o conjunto de mudanças climáticas que o planeta vem enfrentando afetará bastante a vida na Terra já nos próximos 30 anos. Essas afirmações vêm de encontro aos temas que estamos publicando aqui no blog nos últimos dias.
O texto vai além – essas mudanças climáticas continuarão ocorrendo mesmo que consigamos diminuir as emissões dos gases de efeito estufa. O relatório afirma que um aumento da temperatura global da ordem de 1,5° C, que é o valor limite que está sendo almejado por muitos dos países mais desenvolvidos, já “poderia causar progressivamente consequências graves durante séculos”.
Esse aumento de “apenas” 1,5° C poderá afetar cerca de 350 milhões de pessoas nas áreas urbanas, que sofrerão com a seca e a escassez de água nos mananciais de abastecimento. Caso esse aumento da temperatura chegue a 2° C, o número de pessoas afetadas subirá para 420 milhões. Além da falta de água, essas populações também estarão expostas a ondas de calor extremo e possivelmente letais.
Esse promete ser o estudo mais abrangente já feito sobre o tema, com cerca de 4 mil páginas e que deverá ser publicado em fevereiro de 2022. Além dos problemas relacionados à escassez de água, o relatório também abordará os riscos de extinção de espécies, a disseminação de doenças, o calor extremo, o colapso de ecossistemas, entre muitas outras questões.
As prováveis conclusões desse estudo contradizem alguns conceitos defendidos até poucos anos atrás por muitos especialistas. Era comum se afirmar que limitar o aquecimento global a apenas 2° C em relação aos níveis anteriores à Revolução Industrial seria o suficiente para garantir o futuro da humanidade. Essa premissa, inclusive, foi adotada pelo Acordo de Paris, assinado em 2015 por quase 200 países.
As antigas projeções indicavam que as grandes mudanças climáticas e ambientais começariam a partir do ano 2100 – no cenário traçado por esse novo estudo, as consequências das mudanças climáticas já serão fortemente sentidas em poucos anos. Dentro de uma década, é provável que cerca de 130 milhões de pessoas sejam levadas à pobreza extrema e dezenas de milhões de pessoas passem a enfrentar a fome até 2050.
Em 2050, cidades costeiras e localizadas em regiões com altitudes muito próximas do nível do mar poderão enfrentar os gravíssimos efeitos da elevação do nível dos oceanos e de tempestades cada vez mais frequentes. Esse é inclusive um tema que tratamos há pouco tempo aqui no blog.
O estudo também aponta o dedo para o consumo de carne vermelha, o que muitos especialistas afirmam ser um dos causadores do efeito estufa. Segundo o texto, a substituição do consumo da carne vermelha por frutas e verduras poderá reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 70% e salvar a vida de cerca de 11 milhões de pessoas.
Pessoalmente, eu não confio muito nessa última afirmação – os processos intestinais dos animais, sejam eles vacas, porcos, galinhas, patos, ovelhas, cavalos e seres humanos, entre outros, sempre vai gerar gases. Se existe algum problema ambiental com o consumo de carne, será com todos os tipos de carne – inclusive a vermelha. Outro detalhe – até onde eu saiba, as emissões de gases de efeito estufa geradas pela criação de animais correspondem a menos de 20% das emissões totais: a conta não fecha.
Com relação ao consumo de mais frutas, vegetais e verduras – excelente! Eu consumo pouquíssima carne em minha dieta e acredito que um consumo maior de alimentos de origem vegetal faz muito bem à saúde. Porém, é sempre preciso lembrar que a agricultura é uma das atividades humanas que mais se volta contra as florestas. Conforme já tratamos em postagens anteriores, plantas precisam de solos férteis, luz solar, água, fertilizantes e de gases como o nitrogênio e o gás carbônico.
A “invenção” da agricultura se deu entre 12 e 10 mil anos atrás em regiões praticamente sem florestas – a Mesopotâmia, na Ásia Central; os vales dos rios Indus e Ganges, no Subcontinente Indiano, e também em vales de grandes rios da China e do Sudeste Asiático. Quando a agricultura chegou nas regiões cobertas por florestas no Norte da Ásia e na Europa, começaram os grandes desmatamentos. Aqui no Brasil a coisa não foi muito diferente.
Uma das primeiras atividades econômicas praticadas aqui em nossas terras foi o cultivo em larga escala da cana para a produção do valioso açúcar. Em pouco mais de três séculos, essa atividade destruiu, literalmente, todo o trecho nordestino da Mata Atlântica. A partir do século XIX, o grande vilão de nossas florestas foi o café. Ao longo do século XX e começo desse século XXI vem sendo a produção de grãos, com destaque para a soja e o milho, a grande destruidora de nossas matas.
A agricultura e, em parte, a pecuária, contribuíram, e muito, para a destruição da maior parte da Mata Atlântica, de cerca de metade dos biomas Caatinga e Cerrado, além de grande parte dos Pampas Sulinos. Existem muitos que entendem que é chegada a hora de seguir com esse mesmo modelo de substituição de florestas por campos de cultivo e pastagens na região da Amazônia – o mundo inteiro não quer que isso aconteça!
Acho que situação ambiental de nosso mundo é muito grave sim e, conforme já falamos em outras postagens, os danos criados pelas mudanças climáticas são irreversíveis. Porém, sou da opinião que precisamos buscar soluções mais inteligentes para os problemas.
Citando um exemplo: a Nova Zelândia possui um rebanho com mais de 35 milhões de ovelhas e 8 milhões de bois e vacas. A criação desses animais representa parte importante da economia do país. Preocupados com as emissões de gases de efeito estufa pelos animais, pesquisadores locais estão trabalhando para encontrar formas de minimizar o problema, seja buscando rações especiais que gerem menos gases nos intestinos dos animais ou ainda aprimorando geneticamente as raças até chegar a animais que, naturalmente, produzam menos gases em seus processos digestivos.
Indo além – é preciso mudar a matriz energética mundial, buscando fontes de produção de energia cada vez mais limpas e renováveis. Proibir a queima do carvão mineral é outra grande meta. Incluamos na lista o fim do uso de combustíveis fósseis derivados de petróleo, além do uso dos seus derivados como os plásticos. Também é importante proibir a queima de lenha (o que também vai salvar florestas). Se nada disso der resultado, aí sim deveríamos começar a pensar na redução do consumo de carne.
Como educador ambiental, falo diariamente aqui no blog sobre os imensos problemas ambientais que o mundo vive, em especial aqueles ligados aos recursos hídricos. Como muitos de vocês, também tenho grandes preocupações com o futuro da minha família e dos meus amigos. Previsões catastróficas para um futuro próximo podem até ser importantes, mas acho que é tempo de criarmos soluções para os problemas que já existem e também para os que virão.
Nossa espécie – Homo sapiens, vem vivendo e sobrevivendo nesse planeta há cerca de 300 mil anos. Já enfrentamos fome, sede, frio, calor, enchentes, erupções vulcânicas, maremotos, terremotos, epidemias de todos os tipos e guerras, entre muitas outras tragédias. Atualmente, estamos enfrentando a pandemia da Covid-19 e, ao que tudo indica, vamos sobreviver mais uma vez. Não custa lembrar que nossa denominação significa “homem sábio”.
Se fomos “expertos” o suficiente para chegar até aqui, é fundamental que usemos a nossa inteligência para buscar alternativas para os grandes problemas ambientais que nós mesmos criamos. Se temos a capacidade de prever com antecedência, podemos também nos antecipar na busca de caminhos alternativos e de soluções técnicas mais adequadas para cada tipo de problema.
E que venha esse relatório e tantos outros com seus alertas…
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