
Em 1955, o cineasta Nelson Pereira dos Santos lançou o filme “Rio, 40 graus”, uma produção com o formato de documentário que mostrava um dia na vida de cinco jovens de uma favela do Rio de Janeiro. O enredo se desenrola num domingo de sol escaldante na cidade.
O filme foi censurado há época por propagar “uma grande mentira”. De acordo com o relato do chefe da censura, “a média da temperatura do Rio nunca passou dos 39,6 °C“. Em 1992, a cantora Fernanda Abreu lançou uma música com esse mesmo nome. Um dos versos mais lembrados da música afirma que a cidade é “um purgatório da beleza e do caos”.
Pois bem: esqueçam tudo isso! A pequena cidade de Lytton, localizada na Colúmbia Britânica no Oeste do Canadá, registrou nesse último domingo, dia 27 de junho, a incrível temperatura de 46,6° C e deixou o lendário calor carioca no “chinelo“. De acordo com os órgãos meteorológicos locais, essa é a temperatura mais alta já registrada no “frio” Canadá e uma prova incontestável de que as mudanças climáticas chegaram para ficar.
Segundo as informações divulgadas por vários sites de notícias, a violenta onda de calor provocou diversas quedas no fornecimento de energia elétrica por toda a Colúmbia Britânica, um sinal claro da grande demanda por sistemas de ventilação e de refrigeração de ar. As aulas foram suspensas preventivamente por toda essa semana. As autoridades locais emitiram alertas para os possíveis incêndios florestais e também para os hospitais, que devem registrar altas expressivas nas internações, especialmente de idosos.
As regiões Oeste e Noroeste dos Estados Unidos também estão sendo atingidas em cheio pela forte onda de calor. As cidades de Salem e Portland no Estado do Oregon registraram temperaturas superiores a 44° C no último domingo. Em Seattle, capital do Estado de Washington, os termômetros chegaram muito próximo dos 40° C. Algumas semanas atrás, regiões da Califórnia já haviam registrados temperaturas de inacreditáveis 54° C.
Os boletins meteorológicos emitidos nos Estados Unidos têm utilizado com frequência cada vez maior expressões do tipo “calor sem precedentes”, “calor anormal” e “calor perigoso”. De acordo com esses boletins, essa onda de calor está sendo provocada por um fenômeno meteorológico chamado “cúpula de calor”, onde as altas pressões da atmosfera retêm o ar quente sobre uma região.
De acordo com informações da Environment Canada, o instituto meteorológico do país, a temperatura mais alta até então registrada havia sido de 45° C em 1937. Nos Estados Unidos, o NWS – National Weather Service, informou que não registrava temperaturas tão altas nos Estados do Oregon e de Washington desde a década de 1940. Segundo o órgão, esse dia “provavelmente ficará na história como o mais quente” já registrado na região.
Registros de altas temperaturas em regiões de clima temperado estão se tornando perigosamente frequentes. Há pouco mais de um ano publicamos uma postagem aqui no blog falando do recorde de temperatura na cidade de Verkhoyansk, na Sibéria. Localizada numa região famosa pelas baixas temperaturas e pelos campos de trabalho forçado (gulags) dos tempos da extinta URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a cidade siberiana registrou 38° C no dia 20 de junho de 2020.
Um detalhe que chama a atenção nesse evento climático foi sua ocorrência na primeira semana do verão no Hemisfério Norte e que nos deixa com a seguinte dúvida: quais serão as outras surpresas que a estação mais quente do ano está reservando? Aqui no Brasil, onde acabamos de entrar no período do inverno do Hemisfério Sul, temperaturas abaixo dos 0° C e algumas ocorrências de queda de neve já são encontradas por toda a região Sul.
Em um artigo preparado por especialistas em climatologia e que foi publicado pelo jornal Washington Post foi descrito que “a intensidade dessa ‘cúpula de calor’ é tão grande e tão rara estatisticamente que não acontece mais do que uma vez em poucos milhares de anos, em média”. O que os especialistas não disseram é que, se em tempos de fortes mudanças climáticas em todo o mundo, esse tipo de fenômeno não poderá se tornar frequente.
As mudanças climáticas estão se manifestando em todo o mundo e com uma intensidade cada vez maior. Recentemente, publicamos várias postagens falando sobre o derretimento do manto de gelo da Antártida e do Ártico, e também de suas consequências para os oceanos de todo o mundo.
Essas mudanças também estão se desenvolvendo em áreas continentais, onde os maiores sintomas são vistos na forma de secas e alterações nos padrões das chuvas e de precipitação de neves. As regiões Central e Oeste dos Estados Unidos se enquadram nesse último conjunto de problemas, que estão se refletindo na redução dos caudais do importante rio Colorado.
Para esse ano de 2021, as previsões climáticas para o Meio-Oeste e para o Sudoeste norte-americano são preocupantes e terão reflexos diretos na produção agrícola. Houve queda de um volume de neve muito acima da média em regiões do Centro e do Nordeste do país, um problema que atrasou o início do plantio e que poderá gerar riscos para a colheita no final do ano. O Texas, um Estado onde os invernos são mais amenos que a média geral do país, este ano sofreu com fortes nevascas e com colapsos no fornecimento de gás e de energia elétrica.
O problema mais preocupante, porém, é a seca. Estão previstas chuvas abaixo da média em muitas regiões e, como todos sabem, uma boa disponibilidade de água é fundamental para o desenvolvimento dos grãos. Muitas regiões, inclusive, assistiram o plantio das culturas sob estresse hídrico, ou seja, com volumes de água abaixo dos padrões históricos.
A região do Meio-Oeste americano é conhecida como Corn Belt – o cinturão do milho. Essa região inclui, entre outros, Estados como Illinois, Iowa e Nebraska. As estatísticas indicam que nada menos de 40% da produção mundial de milho sai dessa região. Além do milho, essa região também é uma grande produtora de soja. Na gíria popular dos Estados Unidos, os trabalhadores rurais dessa região são chamados maldosamente de red neck, ou pescoços vermelhos, uma referência às queimaduras provocadas pelo forte sol nos meses de verão.
Em tempos confusos quando a pandemia da Covid-19 está prejudicando a produção agrícola em grande parte do mundo, uma quebra da safra agrícola dos Estados Unidos por causa das mudanças climáticas é extremamente preocupante. No curto prazo, países como o Brasil e a Austrália, que são grandes produtores de grãos, poderão até se beneficiar com o aumento dos preços das commodities agrícolas. Porém, os mesmos problemas criados pelo clima já estão batendo na nossa porta – não custa lembrar a forte seca que assola atualmente uma grande área do Brasil Central.
Fortes ondas de calor e de frio, chuvas torrenciais em algumas regiões e secas devastadoras em outras, aumento do nível dos oceanos com alterações nas correntes marinhas, furações e tufões cada vez mais fortes e imprevisíveis – esse é um rápido “menu” do que um futuro bem próximo reserva a todos nós habitantes desse planetinha azul conhecido pelo nome de Terra.
[…] dos Estados Unidos também foram atingidas por fortes ondas de calor no início do verão. Em uma postagem publicada no final de junho, falamos das altas temperaturas registradas em várias cidades. […]
CurtirCurtir
[…] DIXIE E CALDOR: OS G… em REGIÕES DO OESTE DO CANADÁ E D… […]
CurtirCurtir
[…] junho do ano passado, conforme apresentamos em postagem aqui do blog, os termômetros da pequena cidade de Lytton, na Colúmbia Britânica, marcaram a impressionante […]
CurtirCurtir