OS GRANDES PROBLEMAS AMBIENTAIS DO RIO ITAPEMIRIM NO ESPÍRITO SANTO

De acordo com informações do Atlas dos Ecossistemas do Espírito Santo, edição de 2008, quando a Vila do Espírito Santo, atual cidade de Vila Velha, foi fundada em 1535, cerca de 87% do território capixaba era coberto por florestas de Mata Atlântica. Este quadro se manteve praticamente inalterado até as últimas décadas do século XIX, quando o café chegou ao Espírito Santo e teve início um processo contínuo de desmatamentos.

No final da década de 1950, quando teve início a construção da cidade de Brasília, os desmatamentos ganharam um novo impulso: o Espírito Santo foi transformado no grande fornecedor de madeiras para a construção da nova Capital do Brasil. As densas florestas remanescentes da Mata Atlântica do Norte do Estado começaram a ser derrubadas e transformadas em tábuas, vigas, ripas e placas de madeira, deixando para trás terras desnudas, que passaram a ser ocupadas por pastos, plantações e por florestas comerciais de eucalipto. Nos dias atuais, as estimativas falam de uma cobertura vegetal remanescente de apenas 8%. 

Essa perda maciça de florestas teve reflexos diretos e graves na “saúde” dos rios do Espírito Santo, particularmente no rio Itapemirim, o mais importante do Sul do Estado. Drenando uma área de quase 6 mil km², o rio Itapemirim abrange um total de 17 municípios capixabas com destaque para Alegre, Atílio Vivacqua, Cachoeiro de Itapemirim, Castelo, Conceição do Castelo, Ibitirama, Jerônimo Monteiro, Marataízes, Muniz Freire e Venda Nova do Imigrante. O curso total do rio é de aproximadamente 212 km

Até meados do século XX, o rio Itapemirim apresentava uma profundidade mínima de 3 metros em seu baixo curso, o que permitia a navegação de embarcações grandes desde a sua barra até a cidade de Cachoeiro de Itapemirim. Essa navegação, que durante muito tempo foi feita com embarcações movidas a vapor, transportava mercadorias e pessoas.  

Atualmente, a profundidade média nesse trecho é de apenas 1,5 metro e a calha do rio está cheia de ilhas e bancos de areia. Isso demonstra o mal uso e os fortes processos de erosão de solos, além de indicar uma grande perda de matas nativas, o que tem reflexos diretos na redução dos caudais do rio. Florestas são fundamentais para a recarga dos aquíferos e lençóis subterrâneos que alimentam as nascentes dos rios. 

Nos períodos de chuva, as mesmas causas se mostram em um problema diferente – as fortes enchentes do rio Itapemirim, que provocam todos os tipos de transtornos nas cidades atravessadas pelo rio. Com a redução das matas nas áreas das cabeceiras dos rios formadores da bacia hidrográfica e com a maior parte das terras ocupadas por pastagens e plantações, especialmente de café, a absorção das águas das chuvas pelos solos é pequena e a maior parte dessas águas corre rapidamente para a calha do rio, que sem espaço para absorver grandes volumes em pouco tempo, transborda. 

De acordo com um estudo feito em 2017, aproximadamente 42% das terras onde se localiza a bacia hidrográfica do rio Itapemirim estão ocupadas por pastagens; 16% estão tomadas por plantações e apenas 21% ainda estão cobertas por matas nativas. Cerca de 1% desses terrenos apresentam sinais avançados de desertificação, um problema aliás que poderá crescer muito. 

Em muitos trechos da bacia hidrográfica há uma superexploração das pastagens por rebanhos de animais. São locais onde a camada dos solos é muito fina e com alto teor de areia. Nesses terrenos, onde a carga ideal seria de um animal por hectare, uma situação que permite a recomposição natural das gramíneas em uma velocidade adequada, são encontrados até 5 animais pastando em cada hectare. Essa situação cria um descompasso entre a produção e o consumo de matéria orgânica, dando início ao processo de desertificação, que ocorre quando a camada de solo fértil é substituída por sedimentos inertes. 

Uma boa parte dos problemas ambientais da bacia hidrográfica do rio Itapemirim está ligada diretamente à exploração de rochas ornamentais. O Espírito Santo é o maior produtor de rochas ornamentais do Brasil, abrigando o maior parque de empresas especializadas na extração, corte e beneficiamento dessas rochas, com perto de 2 mil unidades registradas. O Estado produz anualmente cerca de 4 milhões de toneladas de rochas, sendo campeão absoluto na produção de mármore – 75% da produção nacional. Essa importante indústria extrativista mineral é responsável por 10% do PIB –Produto Interno Bruto, do Espírito Santo. 

A bacia hidrográfica do rio Itapemirim responde por parte considerável dessa produção. Nessa região são extraídos cerca de 550 tipos diferentes de rochas, grande parte destinada ao mercado internacional. A cidade de Cachoeiro de Itapemirim concentra 70% das empresas de beneficiamento e acabamento de mármores e granitos da região. 

Os problemas associados à extração das rochas começam com a necessidade de suprimir a vegetação e a camada fértil do solo para se conseguir atingir os veios rochosos do subsolo. Além do aspecto estético, a remoção da cobertura vegetal nessas áreas causa uma série de mudanças na dinâmica de escoamento das águas superficiais, além de prejudicar a infiltração de água nos solos, o que é fundamental para a recarga de reservas subterrâneas. 

Outro grave problema ambiental criado pela atividade é o consumo e contaminação de grandes volumes de água, especialmente nas etapas de corte e polimento das chapas. A água é usada para resfriar as ferramentas – em contato com o pó das pedras, essa água forma uma espécie de lama, que sem os devidos cuidados pode escorrer na direção dos corpos d’água e causar problemas de contaminação. Nas empresas maiores e melhor estruturadas, essa água passa por sistemas de tratamento e de reaproveitamento. A atividade também gera uma quantidade enorme de rejeitos minerais, que nem sempre tem uma destinação correta. 

Somado aos problemas criados pela mineração de rochas ornamentais, pecuária e agricultura, existem ainda os grandes problemas gerados pelas cidades, que vão da falta de tratamento dos esgotos domésticos à geração de resíduos sólidos de todos os tipos. Sem uma destinação final adequada, muitos desses resíduos acabam nas ruas e em terrenos baldios, sendo carreados para as calhas dos rios e, fatalmente, acabarão chegando no rio Itapemirim. Também existem problemas de despejos de efluentes industriais nos rios da bacia hidrográfica. 

Apesar de maltratadas e poluídas, as águas do rio Itapemirim ainda são de muita serventia para agricultores e pecuaristas, que captam essas águas para uso em sistemas de irrigação de plantações e para dessedentação de animais. Essas mesmas águas também são captadas para uso no abastecimento de algumas cidades. Como já afirmei muitas vezes, nós poluímos e destruímos os rios que fornecem as preciosas águas que precisamos usar no nosso dia a dia. 

O rio Itapemirim é mais um triste exemplo de rio da Mata Atlântica que vem sendo destruído pelo avanço da “civilização” (seja lá o que isso signifique) e que está desesperadamente precisando de mais atenção das populações e autoridades. 

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