ISRAEL: FAZENDO O DESERTO FLORESCER, OU A ”TERRA QUE MANA LEITE E MEL”

Na última postagem fizemos uma rápida apresentação das origens do moderno Estado de Israel. Nas últimas décadas do século XIX, movimentos nacionalistas começaram a “pipocar” por toda Europa, influenciando fortemente as diversas comunidades judaicas, em especial do Centro e do Leste do continente. O antigo sonho dos judeus de um dia retornar à sua terra de origem no Oriente Médio levou à criação do movimento sionista e os primeiros colonos começaram a desembarcar na Palestina nos últimos anos daquele século. 

O sucesso na recolonização da Palestina por toda uma nova geração de imigrantes judeus foi baseado no desenvolvimento e no domínio de técnicas agrícolas que permitiram fazer o “deserto florescer”, um slogan que acabou sendo adotado por Israel com o passar dos anos. Essa era uma imagem ou figura de linguagem já bastante enraizada na cultura judaica – nos antigos livros sagrados da Torá hebraica, Moshe, mais conhecido entre nós ocidentais como Moises, se referia à região onde encontramos a atual Israel como a “terra onde mana leite e mel”., ou seja, uma terra de fartura.

Essa referência literária corresponde a uma área equivalente a 20% do atual território de Israel, mais especificamente ao vale do rio Jordão, onde o clima e qualidade dos solos são adequados para a prática agrícola e onde seria possível essa “fartura”. A colonização da moderna Israel, entretanto, começou a partir de regiões com solos áridos e semiáridos, que já há muito tempo eram considerados imprestáveis pelos árabes que venderam as terras. Ao longo de várias décadas, esses vendedores se gabariam de ter feito um excelente negócio vendendo terras inúteis para judeus “imbecis”.

O modelo de colonização adotado pelos imigrantes foi baseado em produção pelo sistema de cooperativas, com dois tipos de assentamentos: o kibutz, comunidades coletivas em que os meios de produção, as responsabilidades e os eventuais lucros são de propriedade geral, e o moshav, vila agrícola onde cada família tem o direito a manter sua própria casa e trabalhar em sua própria terra, vendendo a sua produção para uma cooperativa.  

Cada uma dessas unidades recebeu uma área de terras para trabalhar. Essas terras eram cheias de problemas e, para cada caso, foi buscada e desenvolvida uma solução técnica que permitisse transformar os solos secos e esturricados em terras férteis. Como exemplo podemos citar a construção de terraços agrícolas, uma técnica muito usada no Extremo Oriente, no Sudeste Asiático e em amplas regiões montanhosas da Cordilheira dos Andes. São construídos muros de pedra em diferentes níveis de uma encosta íngreme e os diferentes níveis são preenchidos com sedimentos finos – o preenchimento é finalizado com uma fina camada de terra fértil. 

Um insumo vital para a agricultura é a água, um elemento raro na então Palestina. No Norte, a precipitação média anual é de 700 mm, índice que cai para apenas 50 mm no Sul. Para efeito de comparação, o nosso complicado Semiárido Nordestino tem uma precipitação média de 750 mm, ou seja, as áreas mais chuvosas da Palestina são mais secas que a nossa Caatinga

A principal fonte de água da região é o famoso rio Jordão, tão citado na Bíblia cristã. Com pouco mais de 200 km de extensão, o rio Jordão tem suas principais nascentes na região do Monte Hérmon ao Norte, mais conhecido como Colinas de Golã e que foi tomada da Síria por Israel após a Guerra dos Seis Dias em 1967. O rio Jordão também recebe contribuições de pequenos rios com nascentes no Líbano como o e o Hasbani. As dimensões do rio Jordão lembram mais os córregos e ribeirões que encontramos por todo o Brasil – a largura média é de 18,3 metros, a profundidade máxima é de 5,2 metros e a vazão média é de apenas 16 m³/s. 

Desde os primeiros tempos da formação do Estado de Israel, a utilização racional dos escassos recursos hídricos disponíveis foi a prioridade máxima. Em sistemas de irrigação em regiões de clima árido é comum que as perdas de água por evaporação superem a marca dos 90%. Um exemplo fácil que podemos citar são os sistemas irrigados da Ásia Central construídos ainda nos tempos da URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Usando e abusando das águas dos rios Amu Daria e Syr Daria, esses sistemas de irrigação destruíram o Mar de Aral

Sem poder se dar ao luxo de desperdiçar água, os judeus criaram sistemas de irrigação altamente eficientes, onde destacamos o micro gotejamento – linhas de mangueiras são instaladas nos campos agrícolas e apenas pequenas quantidades de água são lançadas diretamente nas raízes das plantas, reduzindo as perdas de água para valores inferiores a 5%. 

Em décadas mais recentes, o país conseguiu aumentar a oferta de água potável a partir do uso de água dessalinizada. Em 1973, uma empresa privada passou a construir usinas com operação por osmose reversa para o atendimento de populações de comunidades isoladas. O grande salto tecnológico se deu em 2008, quando o Governo central decidiu construir cinco grandes usinas de dessalinização ao longo da costa do Mar Mediterrâneo. Esse ambicioso projeto estabeleceu como meta a produção de 505 milhões de m³ de água dessalinizada até o ano de 2013, chegando a 750 milhões de m³ até o ano de 2020.  

Os planos do Governo israelense foram facilitados após a descoberta de grandes campos de gás natural no país, combustível que passou a ser utilizado em substituição à eletricidade, o que fez os custos de produção, estimados anteriormente em US$ 1,00 para cada 1 m³ de água dessalinizada, caírem pela metade. E não é só isso – as tarifas cobradas dos usuários, especialmente dos produtores rurais, são “salgadas”, o que força a todos ao uso cada vez mais racional do recurso

Além dos esforços para aumentar a oferta e controlar a demanda, os israelenses não descuidaram do reuso da água – mais de 2/3 das águas servidas são reutilizadas. Na agricultura, atividade que consome perto de 75% dos recursos hídricos do país, mais de 45% da água utilizada tem sua origem em efluentes de estações de tratamento de esgotos

Graças ao alto grau de desenvolvimento tecnológico em irrigação, sistemas de cultivo e no desenvolvimento de espécies vegetais altamente adaptadas às condições de solo e clima, Israel consegue uma produção por hectare até 30 vezes maior que a maioria dos países. Entre as espécies vegetais desenvolvidas em institutos de pesquisa do país são destaques o tomate-cereja, o melão Gália, diversas espécies de frutas cítricas e uvas, além de morangos, caquis e framboesas que crescem fora das estações. As variedades de algodão desenvolvidas também são destaque, com uma produtividade de 55 kg por hectare. 

Um exemplo do alto grau da tecnologia agrícola de Israel pode ser visto em Arava, no Deserto de Neguev, Sul do país. As 600 famílias que vivem em oito assentamentos da região conseguem produzir até 300 toneladas de vegetais por hectare/ano. Essa produção é feita em estufas com cobertura plástica e dotadas de sistemas de ventilação (vide foto). A produção anual da região chega a impressionantes 150 mil toneladas de vegetais, que são exportados majoritariamente para a Europa

O Deserto de Neguev ocupa mais da metade do território de Israel e tem índices anuais de pluviosidade entre 30 e 50 mm. Afirmar que Israel “faz o deserto florescer” não é apenas uma figura de linguagem – é a mais pura realidade. 

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