“… Enquanto enchia o pote com a valiosa água, o jovem contemplou a silhueta das imensas dunas no horizonte que começavam a se destacar com a chegada da luz da manhã– a jornada com sua tropa através do deserto não seria nada fácil. Os dias de viagem seriam muitos, enfrentando o calor escaldante e a secura do deserto de Marajó.”
Essa é uma das frases iniciais de um conto de ficção ambiental que escrevi há alguns meses atrás para um concurso literário de uma organização ambientalista internacional. A trama, que tem o título de “Muiraquitã”, se passa em meados do século XXII, na região onde hoje encontramos a Ilha do Marajó. Mudanças climáticas levaram ao sufocamento da floresta e dos rios por imensas dunas de areia.
Uma notícia dos últimos dias mostrou que essa “profecia do capadócio”, lembrando aqui do genial escritor Fernando Sabino, não está tão longe de se confirmar. A cidade de Manaus, localizada no coração da Floresta Amazônica, foi surpreendida por uma tempestade de areia no início dessa semana.
Esse tipo de tempestade é relativamente comum em áreas semiáridas e desérticas de todo o mundo. Fortes rajadas de vento levantam a poeira fina dos solos desnudos e lançam esse material particulado a longas distâncias. Em filmes coma “A Múmia” e “Missão Impossível” você vai encontrar boas representações desse fenômeno climático.
Agora, imaginar uma tempestade de areia no meio da Amazônia só seria possível através de obras de ficção científica. Existe, porém, uma explicação bastante simples para o fenômeno – a fortíssima seca que se abateu na região nos últimos meses.
Conforme já apresentamos em postagens anteriores aqui do blog, grande parte da Amazônia está enfrentando uma fortíssima seca, com rios importantes como o Solimões, Madeira e Negro apresentando níveis excepcionalmente baixos. Com a redução do nível das águas, grandes bancos de areia na calha dos rios ficaram expostos aos ventos, permitindo assim a formação dessa tempestade de areia.
A seca na Amazônia, conforme também já tratamos em outras postagens, é uma consequência do forte El Niño que se formou em meados desse ano. Esse é um fenômeno climático com impactos ambientais em todo o mundo. Na América do Sul, o El Niño costuma provocar seca nas Regiões Norte e Nordeste, além de um aumento nas chuvas em áreas mais ao Sul do continente.
Ou seja – a tempestade de areia que se abateu sobre Manaus foi algo bem excepcional e, conforme as chuvas voltem a cair na região da Bacia Amazônica, as coisas devem voltar à normalidade.
Entretanto, é bom deixar um alerta, mudanças climáticas globais poderão alterar fortemente o ciclo de chuvas na Amazônia e fenômenos desse tipo poderão se tornar cada vez mais frequentes. Quiçá nunca chegue ao ponto de transformar parte da região em um deserto de dunas de areia.
É sempre importante lembrar que a região onde encontramos hoje o Deserto do Saara no Norte da África foi, num passado não muito distante, coberta por florestas tropicais com grandes e caudalosos rios. Uma alteração natural no eixo de rotação do planeta ocorrida entre 5 mil e 8 mil anos atrás mudou o regime de chuvas na região, levando ao nascimento do maior de todos os desertos do mundo.
A Amazônia, ao contrário, já foi um grande deserto que era frequentemente alagado pelas águas do Oceano Atlântico. Uma serie de mudanças geológicas – especialmente a formação da Cordilheira dos Andes há cerca de 40 milhões de anos, foi o que permitiu a lenta e gradual formação da maior floresta equatorial do mundo.
O nosso planeta é, essencialmente, uma entidade “viva” e em constante mudança. E nós, seres humanos, estamos dando uma “forcinha” para que a Terra mude de forma cada vez mais acelerada…
Boa noite, Fernando. Sou de Remanso na Bahia. Gostei muito do seu trabalho, será que poderiamos conversar melhor sobre a questões da barragem de Sobradinho?? meu email é: jiovanelev@gmail.com
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