Nas ultimas postagens falamos dos graves problemas ambientais provocados por derramamentos de petróleo na Nigéria, a maior economia continental e país com a maior população da África. Grande parte desses vazamentos de petróleo são resultado da perfuração de dutos para o roubo de óleo – dados do Governo local estimam que 10% de todo o petróleo produzido no país é roubado por grupos criminosos especializados.
O petróleo roubado é conduzido para centenas de pequenas refinarias clandestinas, onde são produzidos derivados de petróleo como gasolina, óleo diesel e querosene. Rios, lagos e também o lençol freático de áreas densamente povoadas do país estão com suas águas poluídas com óleo e substâncias químicas associadas ao petróleo e as populações têm consumido água contaminada. A situação é gravíssima, mas o mundo parece não estar preocupado com isso.
Um problema semelhante está ocorrendo na Venezuela, país que faz fronteira com o extremo Norte do Brasil, porém, as razões desses vazamentos são outras – a crise econômica e política que o país enfrenta está na raiz do sucateamento das instalações petrolíferas, principal causa dos derramamentos do petróleo. Vamos entender essa história:
Até umas poucas décadas atrás, a Venezuela era o país mais rico da América do Sul. Lembro de uma ocasião, no final da década de 1980, quando alguns amigos sugeriram uma viagem de férias para Mérida, uma antiga cidade colonial nos Andes Venezuelanos. Conforme começamos a pesquisar sobre a região, descobrimos que era preciso tirar um visto para entrar no país e as dificuldades, naquela época, eram as mesmas da atualidade para se conseguir tirar um visto de turismo para viajar para os Estados Unidos.
A história de sucesso da antiga Venezuela começou no início do século XX, quando foram descobertas as primeiras reservas de petróleo no país. A exploração comercial do petróleo começou em 1922 e a atividade acabou se transformando na espinha dorsal da economia do país. Os estudos geológicos que se seguiram comprovaram que a Venezuela era dona das maiores reservas de petróleo e gás do mundo, superando inclusive as reservas da Arábia Saudita. Essas reservas se concentram na região do Lago Maracaibo e na bacia hidrográfica do rio Orinoco (ou Orenoco).
Como sempre ocorreu ao longo da história da América do Sul e dos seus recursos naturais, não demorou muito para as grandes nações do mundo voltarem seus olhos para a fabulosa riqueza petrolífera da Venezuela. Rapidamente, as grandes empresas petrolíferas mundiais realizaram “negociações” para a obtenção de blocos de concessão de exploração no país. Essas empresas passaram a dominar a economia e, de quebra, os rumos políticos do país.
Durante várias décadas, a exploração do petróleo na Venezuela foi feita exclusivamente por empresas estrangeiras, onde os lucros com as vendas do produto eram desproporcionalmente divididos com o Governo do país. Em 1973, uma votação determinou a nacionalização da indústria petrolífera e em 1976 foi criada a PDVSA – Petróleos de Venezuela, estatal que passou a comandar a exploração, refino e as exportações do petróleo e seus derivados.
A PDVSA cresceu rápido e em poucos anos se transformou em uma das maiores empresas petrolíferas do mundo, se tornando cada vez mais independente do Governo. Na década de 1990, a empresa iniciou um processo de abertura do capital e atração de investidores estrangeiros, como forma de aumentar consolidar o seu crescimento e sua posição no mercado mundial.
Em 1999, com a eleição de Hugo Chávez para a Presidência da República, a PDVSA inverteu sua curva de crescimento e iniciou um forte e gradual processo de declínio. Chávez, que em 1992 comandou um frustrado golpe de estado, implantou o chamado Bolivarianismo na Venezuela, uma espécie de socialismo sul-americano piorado. Entre outras medidas populistas, o Governo passou a limitar os investimentos e a participação de grupos estrangeiros na PDVSA a partir de 2001, além de criar todos os tipos de empecilhos para a atuação de empresas estrangeiras no país.
Apesar do forte processo de desindustrialização e da necessidade cada vez maior de importação de alimentos e bens de consumo de todos os tipos, os altos preços do petróleo no mercado internacional permitiam a prática de fortes políticas para a redução da pobreza e de intervenção do Estado na economia do país. O Governo da Venezuela “surfou nessa onda” enquanto pode. O barril de petróleo, que no ano de 2008 chegou a valer perto de US$ 160.00, despencou bruscamente para pouco mais de US$ 40.00 em 2009. Sem essas receitas externas do petróleo que irrigavam e nutriam a economia, a Venezuela iniciou sua caminhada rumo ao colapso atual.
Além da queda nos preços internacionais, a Venezuela já vinha sofrendo uma redução sistemática da produção de petróleo, onde o problema estava na má gestão da PDVSA, que passou a ser comandada por “companheiros” Bolivarianos. No início da década de 2000, a Venezuela apresentava uma produção diária de mais de 3 milhões de barris de petróleo – atualmente, a produção do país mal consegue superar a barreira de 1 milhão de barris/dia.
As unidades de extração e produção de petróleo também vêm diminuindo gradativamente – no início de 2016, o país dispunha de 70 plataformas de exploração de petróleo e, hoje, são pouco mais de 20 unidades. Essa queda brusca da produção e exportação do petróleo e seus derivados está ligada diretamente às sanções econômicas internacionais enfrentadas pela Venezuela.
Sem os recursos gerados pela venda do petróleo, a economia da Venezuela entrou numa espécie de espiral decrescente. A população do país começou a sofrer com o desemprego e com a falta dos produtos mais essenciais – faltam desde alimentos até papel higiênico nos mercados. Mais de 4 milhões de venezuelanos já fugiram do país em busca das mínimas condições de vida – centenas de milhares desses refugiados vieram para o Brasil. O Regime Bolivariano do país, é claro, passou a jogar a culpa da crise no colo das “grandes nações imperialistas do mundo”, em especial os Estados Unidos.
Além de afetar a vida de toda a população, essa crise econômica também passou a representar dificuldades para a importação da nafta pela Venezuela, um produto químico essencial para a produção local de petróleo. O petróleo bruto venezuelano é muito denso, apresentando uma consistência quase sólida. Para tornar o produto viscoso e fluído para o bombeamento em tubulações e oleodutos, o petróleo venezuelano precisa receber a adição de diluentes químicos como a nafta. O maior fornecedor de nafta para a Venezuela eram os Estados Unidos, país que também ocupava a posição de maior comprador de petróleo da Venezuela e que acabou alçado à condição de grande inimigo do país pelo regime Bolivariano.
Com a decadência e má gestão da PDVSA, veio o sucateamento de toda a indústria petrolífera da Venezuela. Um exemplo dessa situação pode ser visto nitidamente no Lago de Maracaibo, um dos maiores centros de produção de petróleo do país. Com mais de 13 mil km² de área, as águas verdes do Lago de Maracaibo estão sendo tomadas por manchas de óleo. Há cerca de dez anos, a produção local de petróleo era da ordem de 1 milhão de barris/dia e, atualmente, essa produção mal consegue superar a barreira dos 160 mil barris/dia. Com a queda da produção e das receitas, a PDVSA ficou sem recursos para a manutenção das plataformas e das tubulações – há vazamentos de petróleo por todos os lados.
Continuaremos na próxima postagem.
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