UM DESERTO QUE JÁ FOI CHAMADO DE RIO SOLIMÕES 

Rios são simplesmente fascinantes! 

Eu tenho viva em minha memória as primeiras imagens do rio Pinheiros, o principal afluente do rio Tietê na Região Metropolitana de São Paulo. Minha casa ficava a cerca de um quilômetro da margem do rio e, de vez em quando, acompanhava minha mãe até a área central do bairro, o que nos fazia atravessar a antiga ponte João Dias. 

Olhar aquele “mundaréu” de água era impressionante e sempre me fazia pensar de onde vinha toda aquela água e por que ela nunca parava de fluir. Meu interesse pelos rios e pelos recursos hídricos só fizeram por crescer ao longo dos anos.

Rios são, essencialmente, longos rasgos ou valetas cavadas no solo por onde a água das chuvas é drenada e também por onde fluem as águas que brotam de inúmeras nascentes ao longo do seu curso. Em viagens pelo Semiárido Nordestino conheci vários rios secos ou intermitentes, que mostram da forma mais didática possível o que é uma calha de rio sem uma única gota de água.

As águas dos rios abrigam muita vida – dos mais diferentes tipos de bactérias e microrganismos até peixes, répteis, anfíbios, aves e mamíferos aquáticos, além de uma infinidade de plantas. As suas margens também apresentam uma explosão de vida – matas ciliares e de galeria onde uma enorme fauna animal vem diariamente saciar a sua sede. 

Populações humanas também entram nessa “equação” – desde tempos imemoriais perdidos nas brumas de nossa história rios abrigam comunidades humanas em todo o mundo. Grandes civilizações nasceram e cresceram às margens de grandes rios como o Nilo, Tigre e Eufrates, Ganges, Danúbio, Volga, entre muitos outros. 

Um dos casos mais dramáticos, entretanto, é o do rio Solimões, nome que é dado ao rio Amazonas no trecho entre a divisa com o Peru e a Colômbia até o encontro das águas com o rio Negro nas proximidades da cidade de Manaus. Esse trecho do rio tem cerca de 1.200 km de extensão. 

A impressionante imagem que ilustra essa postagem mostra os grandes bancos de areia que surgiram após a forte baixa das águas do rio Solimões. O recorte faz lembrar um viajante cruzando as areias de um grande deserto. 

Além das dificuldades para o transporte de cargas e pessoas – lembrando que os rios formam as “estradas” da Amazônia, essa seca está afetando o abastecimento de água de centenas de milhares de pessoas. 

Aqui faço um destaque – as águas dos grandes rios da Amazônia carregam grandes quantidades de sedimentos e precisam passar por tratamento para poderem ser consumidas pelas populações. Com a seca, as empresas de saneamento não conseguem captar a água e conduzi-la para as estações de tratamento. 

Diferentemente do rio Madeira, que apesar de ter mais de 3,3 mil km de extensão é apenas um dos afluentes, o rio Solimões faz parte do canal central de drenagem da bacia hidrográfica. Se o canal desse rio está seco, isso é sinal de que uma enorme área geográfica está com baixíssimos níveis de água. 

A Bacia Amazônica ocupa uma área com mais de 7 milhões de km², onde se encontram mais 1.000 afluentes – alguns destes afluentes, como o Negro e o Madeira, entram na lista dos 10 maiores rios do mundo.  Algo entre 12 e 20% de toda a água doce do mundo (os números variam conforme a fonte consultada) circula através dos rios dessa fabulosa bacia hidrográfica. 

Por se tratar de um fenômeno climático global, não há muito o que se fazer contra o El Niño. Entretanto, precisamos acompanhar o desenrolar dessa seca e verificar se não existem outras causas para uma estiagem tão forte na região – algumas fontes afirmam que essa é a maior seca em 100 anos. 

Será que não tem um “dedinho” das mudanças climáticas globais nesse evento? 

Essa é uma pergunta incômoda que precisará ser respondida o quanto antes… 

UMA SECA HISTÓRICA NO RIO MADEIRA

Nas últimas horas, a Ministra do Meio Ambiente – Marina Silva, veio a público pedir que a população da região não faça queimadas, as tradicionais coivaras usadas para a preparação dos solos para o plantio de culturas de subsistência pelas populações mais pobres. Em suas palavras, essa é a principal fonte da fumaça que assola a região.

Sem querer polemizar sobre a questão, sempre comentamos aqui em nossas postagens que uma parte expressiva das “queimadas” da Amazônia que tanto preocupam o mundo vem dessas coivaras feitas por pequenos e pobres agricultores. 

Eu, particularmente, tenho um relacionamento bastante pessoal com esse rio – eu morei em Porto Velho, capital do Estado de Rondônia, por quase dois anos e me acostumei com a presença do Madeira nas paisagens locais. Na época das chuvas, com a cheia do rio, existia sempre o temor de um transbordamento e a inundação de áreas baixas da cidade e comunidades ribeirinhas. 

Durante a vazante ou período da seca, as preocupações giram em torno das dificuldades de ligação fluvial com outras cidades da Amazônia. Diferentemente do resto do país, na Amazônia são os rios que assumem o papel de estradas para o transporte de passageiros e de cargas. Entre altos e baixos, nunca imaginei ver o rio nessa situação.

O rio Madeira tem uma extensão total de 3.315 km, o que o coloca na lista dos maiores rios do mundo. O rio Beni é o mais extenso formador do rio Madeira, com nascentes no alto da Cordilheira do Andes na Bolívia. Depois de atravessar um longo trecho do país vizinho, o rio Beni se encontra com os rios Mamoré e Guaporé, formando o rio Madeira na divisa do Brasil e da Bolívia.  

Na altura da cidade de Porto Velho, o rio Madeira chega a ter uma profundidade da ordem de 18 metros no período das cheias, o que dá aos leitores uma vaga ideia da situação dramática do rio nas últimas semanas. Grandes brancos de areia e pedrais – afloramentos rochosos, estão por toda parte, tornando a navegação num grande risco. 

O verão amazônico, período de seca e muito calor na região, vai até o final do ano, quando as chuvas começam a cair novamente. Todos esses problemas tendem a aumentar muito até lá. 

MANAUS SOB UMA “CORTINA DE FUMAÇA”

Um fato que, aparentemente, não está preocupando grandes ambientalistas internacionais como Greta Thunberg, Leonardo di Caprio e Emmanuel Macron, são as atuais queimadas e intensas nuvens de fumaça em grandes áreas da Amazônia.  

A tensa situação internacional encabeçada pelo conflito na Ucrânia e, mais recentemente, pela explosão da violência entre israelenses e palestinos, talvez esteja jogando essa questão para um segundo plano. Pessoalmente, eu acredito que a questão é mais política – como a esquerda assumiu as rédeas do país neste ano, a “turma” está pegando mais leve. 

Segundo os critérios da OMS – Organização Mundial de Saúde, a qualidade do ar respirado pelos manauaras está dez vezes pior do que o limite máximo recomendável. A entidade recomenda que a presença de poluentes no ar não ultrapasse 20 microgramas por metro cúbico de ar – em Manaus esse índice está perto de 225 microgramas por metro cúbico de ar. 

Até o último dia 12 de outubro, o Ministério do Meio Ambiente registrava um total de 1.664 focos ativos de fogo apenas no Estado do Amazonas. Esse número de focos de fogo é 147% maior do que o registrado no mesmo período em 2022. Os municípios em pior situação são Autazes, com 141 focos, e Careiro com 110. 

De acordo com informações dos Governos Federal e do Estado, 55 municípios já decretaram situação de emergência e outros 5 estão estudando a adoção da medida. A FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz, uma das mais renomadas instituições de pesquisa na área médica do país, está recomendando o uso de máscaras pelas populações das regiões afetadas. 

A região Amazônica está passando por um forte período de estiagem – o principal responsável aqui é o fenômeno climático El Niño. Com a vegetação seca e com o hábito dos pequenos agricultores realizarem a tradicional coivara, a queimada dos terrenos para a preparação dos solos para o plantio das suas culturas de subsistência, o problema se agrava muito. 

As atuais causas da tragédia atual são praticamente as mesmas e não se vê a mesma violência em declarações dessas mesmas pessoas. 

A pergunta que eu sempre me faço – essa gente está mesmo preocupada com a “destruição da Floresta Amazônica” ou se trata apenas de narrativa? 

MUDANÇAS CLIMÁTICAS AMEAÇAM A PRODUÇÃO DE CAFÉ NO BRASIL

O café é originário da região de Cafa, na Etiópia. De acordo com a tradição oral da população, um jovem pastor de cabras observou que os seus animais gostavam de comer os frutos vermelhos e as folhas de alguns arbustos, ficando muito ativos depois disso. Conta-se ainda que foi a partir daí que os habitantes locais passaram a preparar chás a partir das folhas e frutos da planta.  

Com a popularização do consumo do café, sementes da planta foram levadas para o Iêmen, no Sul da Península Arábica, onde passou a ser conhecido como kahwaf ou cahue, palavras que em árabe significam “força”. Manuscritos locais do século VI de nossa era já falavam do cultivo da planta em terras árabes – inclusive, o nome científico da planta, Coffea arabica, dado pelo cientista Lineu, veio daí. Graças ao intenso tráfego de caravanas de mercadores e de tribos beduínas, o consumo e o gosto pela bebida foram disseminados por todo o Oriente Médio ao longo do tempo. 

A partir do século XIV, a produção de café do Iêmen ganhou escala comercial e o principal porto exportador do país ficava na região de Moka, um nome que passou a estar associado aos melhores cafés do mundo. Em 1475, foi inaugurada a primeira cafeteria do mundo na famosa cidade de Constantinopla (atual Istanbul) na Turquia – o Kiva Han. O estilo social de consumo de café criado pelos turcos se popularizou por todo o Oriente Médio, principalmente no Egito. No final do século XVII já existiam perto de 650 Bayt Gahwa, as famosas cafeterias do Cairo, locais que eram o ponto de encontro de artistas e intelectuais. 

O café chegou ao Brasil em 1727, pelas mãos do sargento-mor Francisco de Melo Palheta (ou Palhete, segundo algumas fontes), um militar a serviço do Governo de Portugal e que realizou trabalhos de demarcação de limites entre a Colônia portuguesa e a Guiana Francesa. As primeiras mudas foram plantadas na região de Belém do Pará e gradativamente foram espalhadas por fazendas do interior do país, principalmente na Região Nordeste. 

Sem nos prendermos a maiores detalhes, a cultura cafeeira se espalhou por extensas áreas dos Estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais e São Paulo. O Brasil rapidamente se transformou no maior produtor e exportador de café do mundo. 

No início do século XX, a produção e a exportação de café representavam 50% do PIB – Produto Interno Bruto, do país. A riqueza criada pelo café foi fundamental para o financiamento da industrialização do Brasil. Essa pujança econômica durou até a grande crise econômica de 1929, quando ocorreu a quebra da Bolsa de Valores de Nova York. 

Entre altos e baixos, a cultura veio mantendo a sua importância econômica. O Brasil continua sendo o maior produtor de café do mundo, respondendo por 1/3 da produção mundial. 

Um dos maiores problemas está sendo as altas temperaturas no momento da floração dos cafezais entre os meses de setembro e outubro. Originária de regiões montanhosas da África, a planta requer temperaturas amenas nessa fase do seu ciclo de produção. 

Temperaturas acima dos 34º C nesse período estão se tornando cada vez mais comuns, o que ameaça fortemente a floração das plantas. De acordo com modelagens climáticas, esse ciclo de altas temperaturas deverá aumentar em até 10 dias até o ano de 2050. 

As mudanças climáticas ameaçam o delicado mecanismo climático da região Amazônica, o que poderá resultar em reduções de chuvas no restante do Brasil. Além do café, outras culturas agrícolas importantes do país também estão sob ameaça. 

As mudanças climáticas estão criando tempos novos e complicados que afetarão a vida de todos nós. 

OS CAMPOS FLORIDOS DA ANTÁRTIDA 

Uma imagem idealizada que está presente no inconsciente coletivo das comunidades humanas desde tempos imemoriais são os campos floridos e os vales verdejantes. Numa época que nós costumamos nos referir como o “tempo das cavernas”, nossos ancestrais viam a chegada da primavera com suas flores e vegetação verdejante como um verdadeiro alívio para a difícil temporada do inverno. 

Essa imagem acabou sendo associada posteriormente aos diferentes “paraísos” para onde as almas seguiam após a morte. Na mitologia grega, citando um exemplo, os mortos mais valorosos seguiam para os Campos Elísios. Entre os povos nórdicos a imagem é a mesma – os campos floridos do Valhala. A mesma imagem está presente nos paraísos dos cristãos e dos muçulmanos. 

Diferentemente dessa bela imagem transcendental, campos floridos estão se expandindo em diferentes partes do Continente Antártico e isso é uma péssima notícia. O aquecimento global está elevando gradualmente as temperaturas no continente e tornando algumas regiões cada vez mais propícias para a colonização por diferentes tipos de plantas.  

Até poucas décadas atrás, a imensa maioria do território antártico ficava permanentemente coberto por um manto de gelo. Nos poucos lugares onde esse gelo derretia durante o chamado verão antártico, cresciam apenas algumas poucas espécies de plantas rasteiras como a erva-cabeluda antártica (Deschampsia antarctica) e a erva-pérola antártica (Colobanthus quitensis). 

Com o aumento das temperaturas no continente essa situação vem mudando de forma perigosa. No verão antártico de 2022, citando um exemplo, pesquisadores do Instituto de Geociências Ambientais de Grenoble, na França, observaram que as temperaturas na base antártica francesa de Dumont d`Urville, na costa da Terra de Adélia, atingiram a marca de 4,9° C.  

Essa temperatura extremamente agradável para os padrões da Antártida é nada menos que 30° C mais quente do se esperaria para essa época do ano. Com temperaturas cada vez mais altas, sementes dos mais diferentes tipos de plantas que são carregadas pelos ventos estão conseguindo germinar e se desenvolver nos solos antárticos. 

A Antártida ocupa uma área total com cerca de 14 milhões de km² e é considerado o continente mais gelado do nosso planeta. Pode até não parecer, mas, há cerca de 65 milhões de anos a Antártida, a Austrália e a Nova Guiné formavam um único bloco de terras e possuía um clima entre o tropical e o subtropical. Também existiu por muito tempo uma ponte de terra que fazia a ligação com a América do Sul.  

Essa extensa região formada pela Antártida e a Austrália era coberta por densas florestas, com muitos lagos e rios, abrigando uma diversificada flora e fauna, especialmente de marsupiais. Essa situação começou a mudar há cerca de 40 milhões de anos quando a área correspondente a Antártida se separou do resto do bloco e passou a conviver com o gelo. 

Com o aumento das temperaturas globais, o antigo continente gelado nunca mais será o mesmo. E as mudanças já estão começando a aparecer…