
Rios são simplesmente fascinantes!
Eu tenho viva em minha memória as primeiras imagens do rio Pinheiros, o principal afluente do rio Tietê na Região Metropolitana de São Paulo. Minha casa ficava a cerca de um quilômetro da margem do rio e, de vez em quando, acompanhava minha mãe até a área central do bairro, o que nos fazia atravessar a antiga ponte João Dias.
Olhar aquele “mundaréu” de água era impressionante e sempre me fazia pensar de onde vinha toda aquela água e por que ela nunca parava de fluir. Meu interesse pelos rios e pelos recursos hídricos só fizeram por crescer ao longo dos anos.
Rios são, essencialmente, longos rasgos ou valetas cavadas no solo por onde a água das chuvas é drenada e também por onde fluem as águas que brotam de inúmeras nascentes ao longo do seu curso. Em viagens pelo Semiárido Nordestino conheci vários rios secos ou intermitentes, que mostram da forma mais didática possível o que é uma calha de rio sem uma única gota de água.
As águas dos rios abrigam muita vida – dos mais diferentes tipos de bactérias e microrganismos até peixes, répteis, anfíbios, aves e mamíferos aquáticos, além de uma infinidade de plantas. As suas margens também apresentam uma explosão de vida – matas ciliares e de galeria onde uma enorme fauna animal vem diariamente saciar a sua sede.
Populações humanas também entram nessa “equação” – desde tempos imemoriais perdidos nas brumas de nossa história rios abrigam comunidades humanas em todo o mundo. Grandes civilizações nasceram e cresceram às margens de grandes rios como o Nilo, Tigre e Eufrates, Ganges, Danúbio, Volga, entre muitos outros.
Em alguns casos, civilizações inteiras desapareceram por causa da falta de água. Um exemplo clássico é o de Molenjodaro, uma cidade que fazia parte da chamada civilização do Vale do rio Indo, entre a atual Índia e Paquistão. Mudanças no curso do rio Indo levaram essa cidade, que foi fundada por volta do terceiro milênio antes da era comum, ao mais completo colapso.
Esta introdução extremamente longa é fruto da minha perplexidade diante de imagens da forte seca que está assolando grande parte da Floresta Amazônica neste momento. Conforme já comentamos em postagens anteriores, estamos convivendo com o fenômeno climático El Niño. Entre inúmeras alterações no clima mundial, esse fenômeno causa redução de chuvas na Amazônia.
Em uma postagem anterior falei dos baixíssimos níveis do rio Madeira, um dos maiores afluentes do rio Amazonas. Eu trabalhei por quase dois anos em Rondônia e o Madeira dominava as paisagens das minhas vizinhanças na cidade de Porto Velho.
Um dos casos mais dramáticos, entretanto, é o do rio Solimões, nome que é dado ao rio Amazonas no trecho entre a divisa com o Peru e a Colômbia até o encontro das águas com o rio Negro nas proximidades da cidade de Manaus. Esse trecho do rio tem cerca de 1.200 km de extensão.
A impressionante imagem que ilustra essa postagem mostra os grandes bancos de areia que surgiram após a forte baixa das águas do rio Solimões. O recorte faz lembrar um viajante cruzando as areias de um grande deserto.
Além das dificuldades para o transporte de cargas e pessoas – lembrando que os rios formam as “estradas” da Amazônia, essa seca está afetando o abastecimento de água de centenas de milhares de pessoas.
Aqui faço um destaque – as águas dos grandes rios da Amazônia carregam grandes quantidades de sedimentos e precisam passar por tratamento para poderem ser consumidas pelas populações. Com a seca, as empresas de saneamento não conseguem captar a água e conduzi-la para as estações de tratamento.
A seca também afeta os pequenos igarapés, pequenos cursos de água potável presentes por todos os cantos da floresta – sem as chuvas, essas águas simplesmente desaparecem. A água dos igarapés forma a principal fonte de abastecimento para as populações da Amazônia.
Diferentemente do rio Madeira, que apesar de ter mais de 3,3 mil km de extensão é apenas um dos afluentes, o rio Solimões faz parte do canal central de drenagem da bacia hidrográfica. Se o canal desse rio está seco, isso é sinal de que uma enorme área geográfica está com baixíssimos níveis de água.
A Bacia Amazônica ocupa uma área com mais de 7 milhões de km², onde se encontram mais 1.000 afluentes – alguns destes afluentes, como o Negro e o Madeira, entram na lista dos 10 maiores rios do mundo. Algo entre 12 e 20% de toda a água doce do mundo (os números variam conforme a fonte consultada) circula através dos rios dessa fabulosa bacia hidrográfica.
Por se tratar de um fenômeno climático global, não há muito o que se fazer contra o El Niño. Entretanto, precisamos acompanhar o desenrolar dessa seca e verificar se não existem outras causas para uma estiagem tão forte na região – algumas fontes afirmam que essa é a maior seca em 100 anos.
Será que não tem um “dedinho” das mudanças climáticas globais nesse evento?
Essa é uma pergunta incômoda que precisará ser respondida o quanto antes…




