A PRODUÇÃO DE DROGAS ILÍCITAS E A DEVASTAÇÃO DE SOLOS NA AMÉRICA LATINA

O título desta postagem pode deixar o leitor intrigado, mas existe sim uma ligação muito próxima entre a produção e o consumo de drogas ilícitas como a cocaína, a heroína e a maconha com a degradação do meio ambiente. Cito um exemplo – um estudo publicado em 2018 concluiu que resíduos de cocaína liberados através da urina de usuários estão provocando problemas de saúde em enguias que vivem nos rios da Europa. Apesar das concentrações de cocaína nas águas serem extremamente baixas, a substância está afetando músculos e ossos das enguias europeias (Anguilla anguilla). 

Um exemplo do tamanho do problema: uma análise feita no rio Pó, um dos maiores e mais importantes da Itália, em 2005, revelou que ele dá vazão a 4 kg de resíduos de cocaína diariamente. O trocadilho com o nome do rio fica por conta do leitor. Se o consumo “inocente e recreativo” dessas drogas, como afirmam muitos dos seus defensores, já causa problemas ao meio ambiente, imaginem o tamanho das tragédias que cercam a sua produção. 

A América Latina é, desgraçadamente, um dos grandes centros mundiais de produção e distribuição de drogas ilícitas como a cocaína, a heroína e a maconha. A Colômbia, país sobre o qual falamos na última postagem, ainda é, apesar de todos os avanços do Governo local no combate à produção e ao tráfico, um dos grandes produtores e exportadores mundiais de cocaína. 

De acordo com a publicação “Coca: Desmatamento, contaminação e pobreza” da PNC – Polícia Nacional da Colômbia, “a produção de drogas destrói no país uma média de 40.531 hectares de florestas por ano, ou seja, cerca de 111 hectares por dia, onde 80 por cento das espécies de árvores analisadas só existem nesse bioma”. Essa degradação ambiental também se reflete na destruição de habitats, onde são afetadas uma infinidade de espécies animais: são “600 aves, 170 répteis, 100 anfíbios e mais de 600 peixes”

Faltam estudos detalhados a esse nível sobre os impactos em outras regiões, mas não é difícil de intuir que algo semelhante ocorre também no Peru, na Bolívia, no Paraguai e no Brasil, países que, reconhecidamente, são grandes produtores e exportadores de drogas ilícitas.  

Frequentemente acompanhamos reportagens que mostram agentes da Polícia Federal aqui do Brasil destruindo plantações de maconha encontradas nos mais diferentes lugares do país. Também recebemos notícias de autoridades policiais de países vizinhos realizando operações semelhantes em plantações de coca, maconha e papoula, planta de onde se extraí a heroína. 

As terras usadas para essa produção normalmente ficam localizadas dentro de áreas públicas ou, em alguns casos, são propriedades particulares que foram tomadas pelos traficantes. Dados da Polícia Nacional da Colômbia de 2018, informam que aproximadamente 47% das plantações de drogas no país se encontravam dentro de Parques Nacionais Naturais, reservas indígenas ou em comunidades quilombolas. A área total ocupada por essas plantações superava a marca dos 225 mil hectares

Em áreas controladas por grupos guerrilheiros, como ocorreu por muito tempo na Colômbia, ou em regiões isoladas onde a presença do Estado é insignificante, as populações locais são simplesmente forçadas, mediante os tipos mais cruéis de ameaças, a dedicar parte ou todo o seu tempo trabalhando no plantio e processamento dessas drogas. 

Um outro fenômeno que vem sendo observado já há alguns anos é a contratação de famílias de camponeses que foram obrigados a abandonar suas terras por causa de fenômenos naturais como enchentes e secas, ou até mesmo casos onde a produção ficou comprometida por causa da degradação dos solos e desertificação. Essas famílias recebem um lugar para morar, comida e um salário para trabalhar nas plantações de drogas, como se estivéssemos falando aqui da produção de milho e batata, e não costumam fazer nenhuma pergunta. 

Produtores de drogas não tem qualquer compromisso com o meio ambiente – eles querem as melhores terras para conseguir uma alta produtividade em suas “culturas”. E não existem terras melhores do que os solos virgens de uma mata nativa. Grandes extensões dessas matas são derrubadas a golpes de machado ou com motosserras (as queimadas são sempre evitadas para não chamar a atenção das autoridades), onde são formadas grandes áreas de cultivo. 

Os produtores costumam se valer do plantio “consorciado” com outras espécies agrícolas comuns como uma forma de disfarçar suas plantações de drogas. Nas Serras da Cordilheira dos Andes no Peru e na Colômbia é comum o cultivo da batata e do milho junto com a coca e a papoula. No Brasil e no Paraguai, a maconha costuma ser plantada junto com a mandioca. Já na Bolívia, onde a produção de folhas de coca faz parte da cultura local, não é necessário nenhum tipo de artifício (vide foto). 

Conforme as necessidades de cada cultivo, serão usadas grandes quantidades de fertilizantes, além de muitos produtos químicos para o controle de insetos e ervas daninhas. As embalagens desses produtos serão descartadas sem qualquer preocupação com a contaminação de solos ou corpos d’água. Nos casos onde o objetivo é a produção de cocaína e heroína, coquetéis de produtos químicos serão utilizados no processamento das folhas e flores, com os resíduos descartados em solos e corpos d’água sem o menor remorso. 

Para o refino da cocaína, citando um exemplo, são utilizados produtos químicos como acetona, querosene, ácido sulfúrico, cal, carbureto e tolueno. Segundo os especialistas, a produção de cada quilograma da pasta básica de cocaína gera entre 400 e 600 gramas de resíduos químicos

Além de todos os problemas de violência que são decorrentes e/ou fazem parte da atividade criminosa, o plantio e o processamento de drogas ilícitas causa danos aos ecossistemas estratégicos, destrói a cobertura vegetal, leva espécie endêmicas à extinção, causa diminuição de áreas naturais, deteriora a qualidade dos corpos d’água devido a degradação física, química e biológica. Dependendo da área ocupada pelas plantações, o ciclo das chuvas e o clima local podem ser afetados, além de haver um aumento nas emissões de dióxido de carbono. 

Para completar, a “cereja do bolo”: quando a fertilidade dos solos ou a qualidade das águas nas plantações atinge elevados níveis de degradação, as atividades são simplesmente transferidas para áreas mais promissoras, onde os solos virgens das matas são excepcionalmente férteis e as águas límpidas abundam. O que fica para traz é um rastro de destruição – talvez a figura de “terra arrasada” seja a mais adequada. As áreas devastadas pela produção dessas drogas vão se juntar a outras grandes extensões destruídas por práticas agrícolas insustentáveis e irresponsáveis em todo o continente.

Muitos ecologistas de “carteirinha”, que “lutam abnegadamente” contra a destruição da Floresta Amazônica e de outros importantes biomas desde seus confortáveis apartamentos no Leblon, Ipanema e Copacabana, no Rio de Janeiro; nos Jardins em São Paulo, ou ainda em áreas nobres de Nova York, Londres ou Paris, costumam cheirar suas “carreirinhas” de cocaína ou fumar seus “baseados” sem maiores preocupações. 

Deixo aqui aquela pergunta incômoda: será que esse pessoal se incomoda com a devastação ambiental provocada por esses seus inocentes “hábitos” de lazer? 

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6 Comments

  1. O narcotrãfico é algo que nessa humanidade atual nunca será combatido de forma eficiente e prioritária.
    As razões são óbvias e qualquer adolescente com celular sabe muito bem; mas não custa reforçar: a cadeia de “benefícios” e “beneficiados” é gigante e atinge todos os setores da sociedade atual.
    Não há como combater e muito menos interesse global sobre o assunto.

    Infelizmente a natureza, não só por causa das drogas em geral, mas também por toda “a nossa” forma insana de viver… em breve reagirá contra toda essa agressiva e estúpida forma de tratar Gaya. (um Ser inteligente e supraconsciente).

    Parabéns pela postagem!

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