
A Amazônia é, de longe, o maior e mais complexo bioma do Brasil. Serão necessárias diversas postagens para conseguirmos apresentar aos leitores do blog uma visão ampla da tão falada e ameaçada Amazônia.
Antes de qualquer coisa é preciso ter em mente três conceitos diferentes: Bacia Amazônica, Floresta ou bioma Amazônico e, finalmente, Amazônia Legal. À primeira vista podem parecer a mesma coisa, mas, existem diferenças conceituais importantes para um bom entendimento da questão.
Comecemos falando da Bacia Amazônica, um mundo de águas que ocupa uma área com mais de 7 milhões de km², onde se encontram mais 1.000 afluentes – alguns destes afluentes, como o Negro e o Madeira, entram na lista dos 10 maiores rios do mundo.
O maior desses rios, o Amazonas, é o segundo maior rio do mundo em extensão (algumas fontes afirmam que é o maior), com quase 7 mil km das nascentes na Cordilheira dos Andes até a foz, no Oceano Atlântico e é, de longe, o rio com maior fluxo de água do Planeta – calcula-se que um volume entre 12% e 20% de toda a água doce do mundo flua através dos rios e ares (os chamados “rios voadores”) da Bacia Amazônica e, mais cedo ou mais tarde, essa água irá atingir a calha do rio Amazonas.
As nascentes de alguns dos principais rios dessa bacia hidrográfica se formam nas encostas da Cordilheira dos Andes, distantes centenas de quilômetros da Floresta Amazônica. Um desses casos é o rio Beni, que nasce no trecho boliviano da Cordilheira dos Andes e que vai se juntar aos rios Mamoré e Guaporé para formar o rio Madeira, um dos principais afluentes do rio Amazonas.
A Bacia Amazônica ocupa áreas no Brasil, Bolívia, Equador, Peru, Colômbia, Venezuela e Guiana. Observem que o Suriname e a Guiana Francesa, que são classificados como Países Amazônicos, não fazem parte da Bacia Amazônica.
Passemos agora para a Floresta Amazônica, a maior floresta equatorial (que muitos chamam de floresta tropical) do mundo. É comum “especialistas” afirmarem que essa é a maior floresta do mundo: esse título pertence a Taiga, também conhecida como Floresta das Coníferas ou Floresta Boreal, um sistema florestal que ocupa cerca de 15 milhões de km² numa faixa de altas latitudes ao redor do Norte do nosso planeta.
A área ocupada pela Floresta Amazônica é de aproximadamente 5,4 milhões de km², ocupando terras na Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Suriname, Guiana e Guiana Francesa – mais de 60% da Floresta se encontra no Brasil. Algumas fontes afirmam que a floresta ocupa uma área total de até 6,7 milhões de km², o que provavelmente está incluindo várias áreas de transição entre biomas.
A área total da Floresta Amazônica equivale a mais da metade de todo o território europeu. Calcula-se que mais de 1/3 de todas as espécies animais e vegetais do mundo vivam na Amazônia – somente em espécies de peixes, já se conhecem mais de 2.100 espécies diferentes e, a cada dia, são feitas novas descobertas.
Finalmente, precisamos falar da Amazônia Legal, um conceito jurídico que foi introduzido em meados da década de 1950 com o objetivo de estimular o desenvolvimento econômico da Região Norte do Brasil. A Amazônia Legal compreende uma área total de mais de 5,2 milhões de km², o que inclui toda a área coberta pela Floresta Amazônica no Brasil, além de todo o território dos Estados de Mato Grosso e Tocantins e uma parte do Oeste do Maranhão.
O conceito da Amazônia Legal é uma das principais fontes dos problemas ligados às notícias de queimadas e à “transformação da Floresta Amazônica em cinzas”, temas muito comuns nas notícias veiculadas pela mídia internacional.
Caso qualquer um dos leitores tenha a curiosidade de consultar um mapa de biomas, vai perceber facilmente que o bioma Amazônico ocupa apenas a faixa Norte do Estado do Mato Grosso, um pequeno trecho no Noroeste do Tocantins e uma faixa no Oeste do Maranhão. A maior parte do Mato Grosso e do Tocantins são cobertas pelo bioma Cerrado. No Maranhão, além do bioma Amazônico, existem áreas cobertas pelos biomas Cerrado e Caatinga.
O Cerrado, conforme já tratamos em postagens anteriores, abriga as grandes frentes do avanço agrícola no país. Esse bioma apresenta solos de baixa fertilidade e de grande acidez, problemas que durante séculos impediram seu aproveitamento em larga escala para atividades agropecuárias.
Com o desenvolvimento de sementes adaptadas para esse bioma pela Embrapa –Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias, na década de 1970, e de técnicas de correção de solos como a calagem, o Cerrado virou um dos principais celeiros da agropecuária do país. O Cerrado do Mato Grosso é uma espécie de “carro chefe” de toda essa expansão e, por estar totalmente inserido na chamada Amazônia Legal, está sempre colocando a “Amazônia” nas manchetes.
Para muita gente, a Floresta Amazônica é um enorme tapete de matas verdes e homogêneas que se estende do Oceano Atlântico até os sopés da Cordilheira dos Andes, formando os “pulmões do mundo”. A foto que ilustra esta postagem é um exemplo dessa imagem. Essa visão romantizada do bioma, que é compartilhada por ecologistas e “especialistas” de todo o mundo, é totalmente falsa.
A Floresta Amazônica é, na verdade, um grande mosaico ou “colcha de retalhos” (patchwork), como eu costumo chamar, apresentando todo um conjunto de sistemas florestais. Usando apenas uma dentre muitas divisões da vegetação, a floresta pode ser subdividida em floresta de terra firme, floresta de várzea, floresta de igapó, manguezais, campos de várzea, campos de terra firme, campinas, vegetação serrana e vegetação de restinga.
Um exemplo da complexidade da Floresta Amazônica são os campos, um subsistema florestal muito parecido com o Cerrado Brasileiro e que foge totalmente da imagem da floresta com árvores altas e frondosas. Esses campos naturais surgem na forma de grandes manchas de vegetação rala cercada por árvores altas. À primeira vista, um observador inexperiente poderá até imaginar se tratar de uma área que foi desmatada.
Um caso típico é Roraima, Estado amazônico que tem mais de 1/3 de seu território coberto por campos e lavrados, um tipo de vegetação aberta como as savanas africanas e estepes asiáticas. Outro desses casos é Rondônia, onde 30% da superfície era ocupada por cerrados e cerradões, áreas que passaram a ser usadas para agricultura e pecuária.
Estudos recentes realizados pela Embrapa resultaram na criação de uma variedade de trigo especialmente adaptada para as condições de solo e de clima do Cerrado. Projetos experimentais em áreas do bioma na Bahia e em Goiás mostraram-se excepcionalmente produtivos, aliás, bem mais produtivos que a Região Sul do país, onde a cultura já é tradicional. Os campos e lavrados de Roraima despontaram como potenciais candidatos à produção desse novo trigo.
A exemplo do que aconteceu nos cerrados e cerradões de Rondônia, a introdução da cultura do trigo em Roraima não implicaria na derrubada de áreas de matas da Amazônia. A pergunta que fica – como os ecologistas e os defensores da Amazônia veriam isso?
Essa questão é apenas uma amostra da complexidade do bioma Amazônico e de todos os desafios para a sua exploração racional e preservação.