
O rio Tocantins tem aproximadamente 2.400 km de extensão, sendo considerado o segundo maior rio totalmente brasileiro, perdendo apenas para o nosso bom e velho rio São Francisco. Ele nasce na Serra Dourada, no Estado de Goiás, e segue rumo ao Norte, atravessando o Tocantins, Maranhão e Pará, onde tem a sua foz nas proximidades da Ilha do Marajó.
Em conjunto com o rio Araguaia forma uma bacia hidrográfica que se estende por uma área total de 960 mil km², algo que corresponde a 11% do território brasileiro. É uma das maiores bacias hidrográficas totalmente localizadas dentro do território brasileiro.
Grande parte da bacia hidrográfica dos rios Tocantins/Araguaia fica dentro do Cerrado brasileiro, um dos biomas que mais perdeu vegetação nativa nos últimos 50 anos. Essa devastação no Cerrado tem tudo a ver com o desenvolvimento de sementes de grãos adaptados ao clima e aos solos ácidos do bioma na década de 1970, com grande destaque para a soja.
Transformado na principal área de produção de grãos do país, o Cerrado passou a enfrentar uma série de problemas ambientais, onde destaco os impactos dos desmatamentos nos processos de recarga dos grandes aquíferos da região do Brasil Central. Sem essa recarga, importantes rios da região como o Araguaia e o Tocantins tiveram substanciais reduções em seus caudais.
Relembrando, o Cerrado é chamado por muitos especialistas de “berço das águas do Brasil”. A região concentra alguns dos maiores aquíferos do país como o Guarani, o Bambuí e o Urucuia. As nascentes de água dessa extensa região formam 7 grandes bacias hidrográficas: Paraná, Paraguai, Parnaíba, São Francisco, Tocantins/Araguaia, Atlântico Leste e Atlântico Nordeste Ocidental. Rios com nascentes na região também são tributários da Bacia Amazônica.
Nas temporadas de seca no Cerrado, esses rios vinham apresentando volumes cada vez menores de água, além de mostrar calhas extremamente assoreadas e entulhadas de sedimentos de todos os tipos. Já citamos, inclusive, alguns casos de rios da região que se transformaram em intermitentes – ficam completamente secos no verão, auge da seca.
A forte temporada de chuvas que tem atingido uma extensa faixa de terras entre as Regiões Sudeste, Centro-Oeste e parte do Nordeste nessas últimas semanas, tem se refletido em toda a bacia hidrográfica Tocantins/Araguaia, que há muito tempo não via tanta água.
Um dos sintomas dessa abundância de água, que é bastante positiva para o país, é o alto nível da barragem da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, uma das mais importantes do país. De acordo com informações do ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico, do dia 17 de janeiro, o reservatório se encontra em 95,65% de sua capacidade.
O lado negativo desse grande volume de águas nos rios da bacia hidrográfica são os inevitáveis transbordamentos, como o que está ocorrendo na importante cidade de Marabá, no Pará. A cidade está enfrentando a maior inundação dos últimos 20 anos. O rio Itacaiúnas, que é afluente do rio Tocantins e corta a cidade, está mais de 13 metros acima do seu nível normal.
De acordo com informações da Defesa Civil local, já são mais de 2 mil famílias atingidas e outras centenas estão isoladas pelas enchentes. Muitas dessas famílias estão vivendo no segundo piso ou até mesmo na laje de suas casas, sendo que muitas delas estão resistindo em abandonar seus imóveis.
Uma das cidades mais fortemente atingida pela cheia do rio Tocantins é São Miguel do Tocantins, localizada na região conhecida como Bico do Papagaio, onde os Estados do Tocantins, do Maranhão e do Pará fazem divisa. Não muito distante, já no Maranhão, a cidade de Imperatriz também está sendo fortemente impactada.
Essa cheia atípica do rio Tocantins, que se acentuou fortemente a partir do início do ano, está causando problemas em quatro Estados: Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará. O nível da água do rio superou as chamadas cotas de atenção, o que colocou as autoridades locais e populações em alerta constante.
No final do mês de dezembro esse aumento na vazão do rio já era bastante perceptível. Um exemplo foi o que ocorreu na Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães, localizada em Tupiratins em Goiás. Com o perceptível aumento da vazão de água na barragem, a Prefeitura local já emitiu um comunicado de alerta para a população.
A Usina Hidrelétrica de Tucuruí, inclusive, teve de abrir cinco de suas comportas no dia 3 de janeiro, para controlar o grande volume de água que está chegando no reservatório. De acordo com a Eletronorte – Centrais Elétricas do Norte do Brasil, estatal responsável pela operação da hidrelétrica, essas operações de abertura das comportas são normais durante a estação chuvosa. Porém, a empresa destacou que a manobra foi antecipada devido “à quantidade de chuva atípica para esta época do ano nas cabeceiras dos rios Tocantins e Araguaia”.
O ponto preocupante dessa situação é que as fortes chuvas continuando caindo em muitas regiões e parte dessas águas vai continuar correndo na direção das calhas dos rios da bacia hidrográfica Tocantins/Araguaia, seguindo rumo ao Norte, em direção da Baía do Marajó. Isso vai continuar provocando transtornos para as populações de centenas de cidades e vila ribeirinhas.
As abençoadas e aguardadas chuvas de verão na Região Centro-Sul do país, que colocaram fim a uma das maiores secas dos últimos 90 anos, tem esse seu “lado negro”, que causa muita destruição e tragédias na vida de muita gente.
Como eu sempre costumo comentar, a água é um dos elementos mais importantes de nosso mundo e uma das mais poderosas forças da natureza. A convivência é muitas vezes difícil, mas ela é imprescindível nas nossas vidas…