
De acordo com informações do INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Estado do Piauí apresentou o maior número de focos de incêndios acumulados de todos o país neste mês de setembro. Foram 2.459 focos entre o dia 1º e o dia 14.
Na sequência estão os Estados de Minas Gerais, com 2.430 focos, Acre, com 2.278 focos, Mato Grosso com 1.956 e a Bahia com 1.935 focos. O leitor mais atentado deve ter percebido que, à exceção do Acre, todos os demais Estados possuem parcelas importantes de seus territórios cobertas por vegetação do bioma Cerrado. Na Bahia, no Piauí e no Norte de Minas Gerais se encontram também áreas com vegetação da Caatinga Nordestina.
Como imagino ser do conhecimento de todos, o clima do Cerrado é marcado por duas temporadas bem distintas: um período de fortes chuvas de inverno e outro de seca no verão. A vegetação típica do bioma é caracterizada pela presença de grandes raízes, uma adaptação evolutiva que permite que as plantas captem água em reservas subterrâneas profundas.
Em áreas da Caatinga existe uma predominância de cactáceas, um tipo de vegetação típica de climas semiáridos, além de diversas espécies de árvores altamente adaptadas para enfrentar longos períodos de seca. Tanto o Cerrado como a Caatinga são biomas susceptíveis a grandes incêndios nessa época do ano.
No Piauí, esse verão está sendo caracterizado por temperaturas acima dos 40º C e por baixíssimos índices de umidade relativa do ar. De acordo com informações do INMET – Instituto Nacional de Meteorologia, três cidades do Estado apresentaram os menores índices de umidade relativa do ar do país no último dia 12: Bom Jesus – 10%, Canto do Buriti – 11% e São Raimundo Nonato – 13%.
Essa combinação de tempo seco e muito quente, é claro, favorece o surgimento e a propagação de grandes incêndios em matas, a exemplo do que vem ocorrendo em São Raimundo Nonato desde o último dia 7 de setembro. Os primeiros focos de incêndios foram registrados na região da Serra dos Gringos, atingindo casas no assentamento Novo Zabelê e a rodovia PI-140, chegando depois no bairro Baixão dos Diógenos na área urbana da cidade.
Uma das grandes preocupações do efetivo de combate aos focos de incêndio foi evitar que as chamas atingissem o Parque Nacional da Serra da Capivara, unidade de conservação que concentra a maior quantidade de sítios arqueológicos pré-históricos das Américas. De acordo com o Corpo de Bombeiros, mais de 100 pessoas, entre bombeiros, funcionários do Instituto Chico Mendes e da prefeitura local, foram mobilizados nesse trabalho.
Uma atitude de cidadania que merece ser destacada partiu do humorista Whindersson Nunes, que é piauiense e que, com recursos próprios, contratou um avião bombeiro para ajudar no combate aos incêndios da região. A aeronave começou a operar no dia 12 e se juntou a um helicóptero da Polícia Militar do Piauí que já operava no local desde o dia 11.
Também é preciso citar uma questão desagradável: propagandas oficiais do Governo do Piauí, mostrando seus esforços para combater os incêndios nas matas, incluíram “acidentalmente” imagens desse avião em operação. Qualquer espectador mais desatento poderia entender que foi o Governo que pagou pelos serviços do avião bombeiro. Políticos não conseguem esconder sua natureza!
Outra região do Estado que está assistindo a um grande incêndio é o Parque Nacional da Serra das Confusões, já dentro dos limites da Caatinga Nordestina. Essa, aliás, é a maior área de preservação desse bioma com mais de 1 milhão de hectares destinados à proteção da flora e da fauna da Caatinga.
A Serra das Confusões se estende pelos municípios de Jurema, Tamboril do Piauí, Canto do Buriti, Alvorada do Gurguéia, Cristino Castro, Bom Jesus e Guaribas. O parque foi criado em 1998 com o objetivo de preservar vestígios de ocupação humana com mais de 8 mil anos. Nessa área também foram encontrados diversos fósseis da antiga megafauna pré-histórica.
Segundo a direção do Parque, o incêndio começou numa região próxima no dia 31 de agosto, e atingiu a Serra das Confusões por volta do dia 9 deste mês. O Parque conta com 44 brigadistas contratados para atuar no combate aos incêndios nesse período de seca. Além desse efetivo, o combate aos incêndios conta com o trabalho de voluntários, equipes do PREVFOGO – Centro Nacional de Prevenção aos Incêndios Florestais.
De acordo com as últimas informações divulgadas, equipes de brigadistas ainda trabalham para controlar dois focos de incêndios em áreas isoladas e de difícil acesso na região conhecida como Assentamento Estação. Com o tempo seco e quente, esses focos podem se alastrar e atingir outras áreas de vegetação nativa.
O Ministério Público do Piauí recomendou que a Prefeitura de São Raimundo Nonato crie uma brigada municipal permanente de combate aos incêndios em matas, entre outras medidas de prevenção. Os incêndios em matas locais são frequentes e é preciso uma melhor estrutura para um controle mais efetivo dessas situações.
Outra preocupação do Ministério Público são as chamadas “queimadas controladas”, também conhecidas como coivaras. Os pequenos agricultores ateiam fogo em uma área que está sendo preparada para cultivos agrícolas. Em situações de tempo quente e de vegetação extremamente seca, os riscos dessas queimadas fugirem ao controle são muito grandes. Muito provavelmente, essa foi a origem dos incêndios que atingem a região neste momento.
Outra recomendação importante diz respeito a suspensão temporária de todas os pedidos de autorização de queimadas controladas até que as condições climáticas melhorem. Também foi solicitada a publicação de uma lei municipal onde se estabeleça pesadas multas para aqueles que infringirem as regras relativas as queimadas controladas.
Assim como ocorreu em grande parte do Brasil Central, o Piauí teve chuvas abaixo da média nos últimos meses, uma situação que se refletiu em uma vegetação do Cerrado e da Caatinga extremamente secas e facilmente susceptíveis a grandes queimadas. As altas temperaturas e a baixa umidade relativa do ar também dão uma enorme contribuição para transformar grandes áreas do Estado em verdadeiros “palheiros a espero de uma faísca”.
A chegada da temporada de chuvas, que no Piauí se estende entre os meses de dezembro e maio, é aguardada com enorme esperança pela população. Além de ajudar a controlar as queimadas na vegetação, essas águas são fundamentais para recarregar os aquíferos e encher os rios e riachos usados no abastecimento de populações humanas e animais nesses sertões.
E, pela ordem de prioridade, se sobrar alguma água, que essa vá para os reservatórios de alguma usina hidrelétrica e que ajude na superação da grande crise energética que se avizinha.