AS USINAS HIDRELÉTRICAS DE PAULO AFONSO

Cachoeira de Paulo Afonso

A pioneira Usina Hidrelétrica de Angiquinho, que apresentamos na última postagem, foi a primeira do Nordeste e sua construção em 1913 só foi possível graças ao empreendedorismo do industrial e empresário Delmiro Gouveia. Em uma época em que a principal fonte de geração de energia na região era a lenha, Delmiro Gouveia teve a ousadia de construir sua pequena hidrelétrica nas proximidades da Cachoeira de Paulo Afonso (vide foto), no rio São Francisco, e assim alimentar com energia elétrica todo o seu complexo industrial na cidade de Pedras, nos sertões das Alagoas. Para infelicidade geral do Nordeste, Delmiro Gouveia foi assassinado em 1917 por causa de disputas políticas e seu sonho de industrializar o Nordeste foi interrompido. A ideia de explorar todo o enorme potencial para geração de energia hidrelétrica na região de Paulo Afonso, felizmente, permaneceu viva. 

Em 1921, durante o Governo do Presidente Epitácio Pessoa, foram realizados os primeiros levantamentos técnicos e topográficos da Cachoeira de Paulo Afonso e do rio São Francisco com vistas ao futuro aproveitamento para a geração hidrelétrica. Foi em meados da década de 1940, durante o Governo Getúlio Vargas, que foi criada a CHESF – Companhia Hidrelétrica do Rio São Francisco, e foram iniciados os esforços para a construção das usinas hidrelétricas em Paulo Afonso. 

O rio são Francisco nasce na região Oeste do Estado de Minas Gerais, na Serra da Canastra, e percorre mais de 2.800 km até encontrar sua foz no Oceano Atlântico. Na região de Paulo Afonso, no Norte da Bahia e a cerca de 250 km da foz, as águas do rio passam a ser estranguladas por grandes paredões rochosos, formando um cânion com mais de 60 km de extensão. O início deste trecho é marcado por um forte desnível, com mais de 80 metros de altura, onde se forma a Cachoeira de Paulo Afonso. Foi a partir de estudos para o aproveitamento do potencial hidrelétrico desse trecho, que teve início o ciclo de construções das usinas do Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso

A primeira obra concluída pela CHESF na região na década de 1940, foi uma usina hidrelétrica piloto, com uma potência total de 2 MW, que tinha como objetivo fornecer energia elétrica para o futuro canteiro de obras. A Usina Hidrelétrica Paulo Afonso I teve suas obras iniciadas em 1949 e concluídas em 1954, com 3 grupos geradores e uma potência total de 180 MW. Foram construídos na época um total de 860 km de linhas de transmissão, dotadas de estações intermediárias em Angelim, em Pernambuco, e Itaparica, no Estado da Bahia, que passaram a levar a energia elétrica produzida em Paulo Afonso para as cidades de Recife e Salvador. 

Como já havíamos comentado na postagem anterior, quando falamos da construção da pioneira usina hidrelétrica de Angiquinho, as paredes escarpadas e a profunda depressão no fundo do cânion impunham enormes dificuldades técnicas para o andamento das obras. No caso de Angiquinho, consta que os técnicos estrangeiros contratados por Delmiro Gouveia se recusaram a descer até o fundo do cânion através de um improvisado elevador feito com cordas – os “gringos” tiveram de ser convencidos a descer por um grupo de jagunços armados. A barragem da Usina de Paulo Afonso foi construída em um arquipélago fluvial, ligada a uma barragem móvel no braço principal do rio São Francisco, num conjunto de obras de difícil realização. 

Além de fornecer energia elétrica para Recife e Salvador, a CHESF também passou a abastecer as cidades de João Pessoa, Campina Grande, Aracaju, Garanhuns, Pesqueira, Goiana, Itabaiana, Riachuelo e Maruím, além de assinar contratos para o fornecimento de energia elétrica para 8 empresas da região. Esses consumidores passaram a ser abastecidos com a produção inicial da Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso, que atingiu a marca de 202.572 MW/ano, o que foi um marco para o processo de eletrificação de toda a região Nordeste. 

Entre os anos de 1963 e 1968 foi construída a segunda unidade, a Usina Hidrelétrica Paulo Afonso II, que acrescentou mais 480 MW ao sistema, através de 6 grupos geradores. Entre 1969 e 1970 foram concluídas as obras de Paulo Afonso III, com 4 grupos geradores e potência instalada total de 864 MW. Em 1979, foi concluída a Usina Hidrelétrica Paulo Afonso IV. Essa unidade foi construída dentro de uma caverna, com extensão total de 210 metros, 24 metros de largura e 55 metros de altura, onde foi instalada uma unidade geradora com potência total de 410 MW

Em 1971, começou a ser construída a Usina Hidrelétrica de Moxotó, localizada a cerca de 3 km a montante da Cachoeira de Paulo Afonso. Essa usina, que foi inaugurada em 1975, está localizada no município de Delmiro Gouveia, já no Estado de Alagoas. Sua barragem formou um reservatório com uma área de aproximadamente 100 km² e sua potência instalada pode atingir até 440 MW. Em 1983, o nome da Usina foi alterado para Apolônio Sales. 

Juntas, as Usinas Hidrelétricas Paulo Afonso I, II, III e IV e Moxotó, geram uma potência total de 4,2 mil MW, colocando o Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso na terceira posição entre as unidades de geração hidrelétrica do Brasil, ficando atrás apenas de Belo Monte, com mais de 11 mil MW, e de Tucuruí, com uma potência de 8 mil MW. A gigantesca Usina Hidrelétrica de Itaipu, com uma potência total de 14 mil MW, não entra nessa lista por se tratar de um empreendimento binacional. 

A construção de todo o Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso se estendeu de 1949 a 1979 e se transformou em um verdadeiro marco para a engenharia nacional. Controlar e desviar os caudais de um grande rio como o São Francisco, com a tecnologia e os equipamentos disponíveis à época, foi um verdadeiro desafio técnico, além de criar um ponto de inflexão no desenvolvimento da região Nordeste. Muitos críticos da época consideravam um exagero os gastos com a construção de todo esse grande complexo de usinas hidrelétricas, afirmando que a região não apresentava uma demanda tão grande por energia elétrica. Felizmente, essas vozes não foram levadas a sério: em 1955, o consumo per capita de energia elétrica na região era de 35 kW por habitante/ano – vinte anos depois, em 1975, esse consumo já havia subido para 220 kW por habitante/ano, um crescimento de 529%. 

Esse aumento explosivo do consumo de energia elétrica em um período de tempo relativamente curto, mostra quão grande era a diferença no nível de desenvolvimento sócio econômico do Nordeste em relação às regiões mais desenvolvidas do país. Eram milhares de cidades, vilas e pequenos povoados que sobreviviam a base da queima da lenha e do uso do querosene e dos tradicionais candeeiros, isso quando não contavam apenas com a luz de velas, para iluminar suas noites. O crescimento contínuo da geração de energia elétrica a partir das águas do rio São Francisco no Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso permitiu a construção de grandes extensões de linhas de transmissão por toda a região e a integração de um número cada vez maior de sedentos consumidores de energia elétrica ao sistema. 

Para garantir a geração contínua de energia elétrica nas usinas do Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso, foi planejada a construção de uma grande barragem na região do Salto do Sobradinho, entre a Bahia e Pernambuco, ainda na década de 1960. Essa barragem funcionaria como uma reguladora da vazão das águas do rio São Francisco, especialmente no período da seca. Esse projeto acabou sendo modificado e optou-se pela construção de uma nova usina hidrelétrica, que seria batizada como Sobradinho, que será o tema da nossa próxima postagem. 

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