A “ÁGUA QUE PASSARINHO NÃO BEBE”, OU FALANDO DA CANA-DE-AÇÚCAR

Canavial - foto Clóvis Ferreira

Meus avós maternos eram sitiantes e, até mais menos 1975, eles viveram numa pequena propriedade rural nas proximidades da cidade de Lutécia, na região Centro-Oeste do Estado de São Paulo. Até aquela época, o café era uma das culturas dominantes na agricultura daquela região e de grande parte do Estado – aliás, meu avô era um pequeno produtor de café. Em meados da década de 1970, o Governo militar criou o Pró-Álcool – Programa Nacional do Álcool, voltado à produção de álcool para uso como combustível veicular – os cafezais foram arrancados e todo o nosso Estado acabou transformado em um grande canavial (vide foto). A cultura da cana sempre existiu em São Paulo, porém, em escala bem menor e com fins “mais nobres”, como a produção do açúcar e das famosas “caninhas paulistas”, aquela “água que passarinho não bebe”… 

A cana-de-açúcar (saccharum officinarum) chegou ao Brasil na década de 1530, nas mesmas embarcações que trouxeram os primeiros Donatários das Capitanias Hereditárias, onde merecem destaque Martim Afonso de Sousa, fundador da Capitânia de São Vicente, embrião do Estado de São Paulo, e Duarte Coelho, Donatário da Capitânia de Pernambuco. O açúcar era um dos produtos mais valorizados naquele período e a Coroa Portuguesa tudo fez para transformar sua grande colônia sul-americana numa das grandes produtoras mundiais. Em Pernambuco e em outras Capitânias da Região Nordeste, a produção do açúcar foi a principal base econômica nos séculos XVI e XVII; em São Vicente, a produção do açúcar não prosperou – os ataques frequentes de piratas aos engenhos inviabilizaram a cultura e os chamados “paulistas” acabaram se dedicando a outras atividades mais rentáveis, entre elas a caça e a venda de índios escravizados para as outras Capitânias. 

A área total ocupada pela cana-de-açúcar atualmente no Brasil é de aproximadamente 9 milhões de hectares, onde se obtém uma produtividade média de 100 toneladas por hectare – algumas variedades da planta chegam a ter uma produtividade de até 185 toneladas por hectare. A produção total de cana-de-açúcar no país é de aproximadamente 690 mil toneladas (dado de 2011) – o Estado de São Paulo é o maior produtor nacional com uma participação de 52% na produção total de cana-de açúcar

Segundo especialistas em botânica, a cana-de-açúcar é originária das Ilhas Filipinas e a planta tem parentesco com algumas espécies de gramíneas, Através de sucessivos melhoramentos genéticos e cruzamentos, a planta foi ganhando corpo e produzindo quantidades cada vez maiores de seiva doce, matéria prima para a produção do açúcar. Os indianos foram os primeiros a produzir o çakkara, palavra em sânscrito usada originalmente para designar o açúcar. Os árabes adaptaram a palavra para súkkar e posteriormente os gregos para sáckcharon – o açúcar ganhou o mundo e o nome foi adaptado em diferentes línguas: azúcar, azucre, sucre, azukre, sucre, suggar, siúcra, zucchero, suiker, zucker, sukker, socker, sukke, sykur e sokeri, respectivamente em espanhol, galego, catalão, basco, francês, inglês, irlandês, italiano, holandês, alemão, dinamarquês, sueco, islandês, norueguês e finlandês. 

A produção da cana-de-açúcar necessita de grandes volumes de água, uma vez que, na composição da planta, 90% da sua massa é constituída por água. A maioria dos processos fisiológicos e bioquímicos da planta usam água, onde o líquido desempenha funções como solvente, transportador de nutrientes, regulador de temperatura, tanto no resfriamento das plantas através de evapotranspiração quanto na manutenção e distribuição do calor. Durante o processo de moagem nas usinas de produção de açúcar e de álcool, cerca de 70% do peso das canas colhidas é recuperado na forma de caldo, a popular garapa, e o restante é chamado de bagaço, matéria seca que pode ser usada como forração e fertilizante para os solos ou queimada em uma unidade geradora de energia elétrica. Em média, a produtividade de açúcar é de 13,5 toneladas por hectare. Já a produtividade de álcool (etanol) fica entre 85 e 90 litros para cada tonelada de cana-de-açúcar

De acordo com informação do site Water Footprint, para se produzir 1 kg de açúcar há um consumo entre 1.500 e 1.800 litros de água, o que nos dá uma idéia do consumo total nas grandes plantações. Há um esforço dos produtores no sentido de afirmar que o consumo de água nas lavouras de cana é bem menor do se divulga. Inclusive, encontrei um comunicado de uma grande cooperativa de produtores de açúcar e álcool afirmando que os canaviais paulistas consomem menos de 10% de toda a água usada em irrigação no Estado de São Paulo. Sem nos prendermos inicialmente a um volume total, podemos afirmar que a água é um elemento fundamental em todos os processos da indústria canavieira, desde o plantio das mudas até o processamento das canas nas usinas. 

E como falar de água e agricultura é o tema atual do blog, falaremos mais e com maiores detalhes sobre a cana-de-açúcar nos nossos próximos posts

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