Os africanos costumam falar que o Rio Okavango não tem pressa: ele nasce nas montanhas da região central de Angola e escorre preguiçosamente pelas planícies semiáridas até a fronteira com a Namíbia, marcando a fronteira dos dois países por mais de 400 quilômetros até entrar no território de Botsuana. O Okavango entra no Deserto do Kalahari e, mostrando gostar do calor, desiste de prosseguir até o mar e se divide em inúmeros canais, formando o maior delta interior do mundo após um percurso total de 1.600 quilômetros. Enquanto milhares de seres vivos se nutrem de vida neste paraíso, as águas do rio evaporam lentamente, aguardando a chegada da nova temporada de chuvas, num ciclo, até hoje, interminável.
A região do delta do Rio Okavango em Botsuana é considerada um dos últimos refúgios selvagens de toda a África e uma das maiores atrações turísticas da região Austral do continente. A luxuriante vegetação alimentada pelas águas do rio é um verdadeiro paraíso para a vida selvagem, sustentando grandes mamíferos como elefantes, girafas, hipopótamos, búfalos e zebras, que por sua vez atraem os grandes predadores: leões, leopardos, guepardos e mabecos, sendo acompanhados por toda uma sequência de carniceiros como as hienas e abutres. A ciência ainda não dispõe de estudos completos acerca do delta do Okavango, mas, até o momento, já identificou 50 espécies de pássaros, 128 de mamíferos e 150 de répteis e anfíbios – o número de espécies de peixes e de insetos ainda é desconhecido. A bacia hidrográfica do Rio Okavango é o lar de, pelo menos, um milhão de pessoas.
Esse paraíso africano das águas, porém, poderá simplesmente desaparecer em poucas décadas – o ciclo de cheias e secas do delta corre sérios riscos de interferências e alterações antrópicas, condenando toda a vida selvagem e, por que não, humana ao risco de extinção regional.
Depois de mais de 37 anos de uma guerra civil devastadora, Angola se esforça para se reerguer e recuperar o tempo perdido. A região das nascentes do Rio Okavango, que foi um foco importante dos conflitos, iniciou em 2002 um intenso trabalho de localização e remoção de minas terrestres, criando condições para o retorno de centenas de milhares de famílias expulsas pelos conflitos armados – órgãos oficiais estimam que a população na região chegará aos 2 milhões de habitantes nos próximos quarenta anos. Os frágeis e pouco férteis terrenos de savanas, não conseguindo responder às expectativas de produção dos agricultores, passaram a ser trocados pelas áreas de florestas, que após a derrubada e as queimadas (a coivara, técnica agrícola usada por populações indígenas, quilombolas e ribeirinhas do Brasil), apresentam resultados um pouco melhores: até 100 kg de painço por hectare – para efeito de comparação, a produtividade média da soja no Brasil é de 2.882 kg por hectare e em algumas regiões da Europa se produz 7.000 kg de trigo na mesma área. Esse avanço sobre a floresta costuma ser fatal para as nascentes de água, que diminuem a produção e sofrem com o entulhamento das erosões de solo.
Um outro risco regional é o avanço de grupos internacionais, especialmente chineses, interessados na implantação de grandes projetos agroindustriais com irrigação nas planícies. O baixo preço da terra, a aparente grande oferta de água do Rio Okavango, mão de obra farta e a baixos custos (70% da população de Angola vive da agricultura), num país com governo ditatorial e com instituições fracas, são convites para um desastre nos moldes da Ásia Central.
Na Namíbia, que tem grande parte do seu território coberta por desertos, qualquer fonte permanente de água é considerada como uma verdadeira benção para a escassa população de 2 milhões de habitantes. A agricultura responde por 6% do PIB – Produto Interno Bruto e emprega 70% da população do país. A criação de animais, com rebanhos de 2,4 milhões de bovinos, 2,7 milhões de ovinos e 2.1 milhões de caprinos consome volumes da ordem de 90 milhões de metros cúbicos de água ao ano (dados de 2008), onde há um desperdício médio de 50% entre infiltrações no solo e evaporação. O Governo da Namíbia tentou por diversas vezes implementar a construção de canais de irrigação, projetos que foram vetados por Angola e Botsuana, países que compartilham o uso das águas e a gestão da bacia hidrográfica do Rio Okavango. Angola e Namíbia tem planos para a construção de uma usina hidrelétrica conjunta no Okavango, ideia que está muito longe de um consenso entre os três países e com consequências imprevisíveis para a região úmida do delta.
Em Botsuana, onde o Rio escolheu encerrar seu curso formando um magnífico delta no meio de um dos mais áridos e desabitados desertos do mundo, as pressões antrópicas sobre as águas são mais baixas – para o povo local, o Delta do Okavango é uma fonte de renda inesgotável graças ao grande número de turistas que vem de todos os cantos do mundo para se maravilhar com suas belezas naturais.
Por fim, o maior de todos os riscos – projeções meteorológicas baseadas em modelos matemáticos indicam grandes alterações nos padrões das chuvas das montanhas de Angola nas próximas décadas devido as mudanças climáticas globais. Sem estas chuvas regulares, o delta do Okavango poderá desaparecer em poucos anos e a humanidade perderá mais um dos seus grandes tesouros naturais…
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