A “FAST FASHION” E SEUS IMPACTOS AO MEIO AMBIENTE 

De acordo com dados do setor, a indústria de moda e vestuário aqui no Brasil possui cerca de 150 mil pontos de venda e teve um faturamento de R$ 208 bilhões em 2022. Esses números mostram que está ocorrendo uma gradual recuperação do setor depois do advento da pandemia da Covid-19 e com a política do fechamento – “fica em casa que a economia a gente vê depois”. Mesmo assim, muitas empresas fecharam as portas e outras vem apresentando gigantescos prejuízos.

A pandemia acabou sendo um golpe final para muitas empresas que já vinham sofrendo a alguns anos com a concorrência pesada de empresas especializadas na venda de roupas pela internet, além da importação de roupas baratas. A pandemia também acabou fortalecendo empresas internacionais especializadas no ecommerce de moda e vestuário e ajudou a consolidar uma nova tendência mundial – a “fast fashion”

Uma das principais referência nesse setor é a Shein, uma empresa chinesa que foi criada em 2008, tendo como foco a venda de vestidos de noiva. Com o passar do tempo, a empresa começou a enxergar grandes oportunidades no setor de moda feminina e acabou se especializando em vendas online

Se valendo de aquisições de outras empresas que já atuavam nessa área, a Shein cresceu muito e esse crescimento foi muito potencializado durante o fechamento da economia dos países por causa da pandemia a partir de 2020. No início de 2021, a empresa tinha um valor de mercado avaliado em US$ 15 bilhões – no final desse mesmo ano, o valor já tinha subido para US$ 30 bilhões. Hoje, a Shein vale cerca de US$ 100 bilhões. 

O segredo desse sucesso: roupas baratas, de qualidade mediana (para não falar que são de baixa qualidade) e semidescartáveis. De acordo com alguns documentários que encontrei durante a minha pesquisa, cada peça de roupa da marca é usada, em média, 3 vezes antes de ser descartada. 

A “mágica” por trás do sucesso da marca é o uso de toda uma rede de fornecedores terceirizados, onde os funcionários chegam a trabalhar até 18 horas por dia, sendo obrigados a produzir 500 peças de roupa a cada jornada de trabalho. De acordo com denúncias, esses trabalhadores ganham cerca de 4 centavos de dólar a cada peça produzida e só tem direito a uma única folga mensal. 

A empresa vem sofrendo inúmeras denúncias internacionais por trabalho análogo a escravidão. Além disso, a marca é acusada sistematicamente de copiar modelos de roupas de grandes grifes internacionais. A empresa, é claro, se defende, afirmando que procura adotar as melhores práticas na gestão do seu negócio. 

Dentro da nossa área de interesse, que é a questão ambiental, essa tendência de “fast fashion” é um verdadeiro desastre. Um exemplo dos problemas criados é o descarte de milhões de peças usadas em aterros sanitários ou em lixões a céu aberto. Um desses casos, que tratamos em uma postagem aqui do blog, é de uma grande área de descarte no Deserto do Atacama, no Chile. 

Os problemas da indústria têxtil, entretanto, vão muito além disso. Eles começam já na produção de matérias primas como o algodão, a fibra natural mais usada no mundo. Os maiores produtores de algodão são países pobres como a Índia, Paquistão, Egito, Repúblicas da Ásia Central, entre outros. A colheita nesses países é majoritariamente manual e os trabalhadores ganham salários miseráveis, além de trabalharem em condições deploráveis. 

Além do algodão, fios semissintéticos a base de viscose (polímeros naturais) e, mais recentemente, artificiais feitos de poliéster e de outros derivados de petróleo, vem sendo utilizados em escala cada vez maior pelas tecelagens. Como acontece com materiais a base de plástico, esses tecidos sintéticos levam milhares de anos para se decompor na natureza. 

A “cereja do bolo” da indústria têxtil em questões de problemas ambientais são os processos de tingimentos dos fios e dos tecidos, além dos diversos trabalhos para impressão de estampas e acabamentos. Esses processos utilizam uma infinidade de corantes artificiais e produtos químicos altamente poluentes, além de consumir muita água – algumas estimativas afirmam que o setor gasta quase 100 trilhões de litros de água a cada ano. 

Os trabalhos de corte e costura das peças e das roupas é sempre feito por populações miseráveis de países mais miseráveis ainda. Além da China, entram nessa lista países como Bangladesh, Índia, Paquistão, Indonésia, Tailândia, Malásia, Vietnã, entre muitos outros. 

Um dos casos que já tratamos em postagens aqui do blog é o da indústria têxtil Bangladesh, país onde o custo da mão de obra é menor que o da China. Isso transformou o país em uma imensa rede de pequenas oficinas de corte e costura de roupas e de pequenas tecelagens. O país é o segundo maior produtor mundial de têxteis do mundo – é comum encontrarmos roupas nas lojas das grifes mais sofisticadas do mundo com a inscrição “Made in Bangladesh”.   

O salário mínimo atual de Bangladesh é de US$ 68.00 (alguns anos atrás era de apenas US$ 37.00). Segundo dados do Banco Asiático de Desenvolvimento, 30% dos bangladeses (o termo bengali, que também pode ser usado, é impreciso, uma vez que também é usado para os indianos de Bengala Ocidental), sobrevivem com apenas US$ 1.00 por dia, o que é considerado o limite extremo da pobreza.  

Além dos inúmeros problemas ambientais e sociais que a salvadora indústria têxtil local gera, existe um outro ainda mais delicado – de acordo com estudos de entidades ligadas aos direitos humanos e ao mercado de trabalho, cerca de 15% das crianças de Dakha, a capital de Bangladesh, com idades entre 6 e 14 anos, deixam de ir para a escola para ajudar os pais com o trabalho nas confecções. É possível que nas cidades do interior do país, onde a “fiscalização” é bem menor, a situação seja ainda mais crítica. 

Diferente de setores como os da agricultura e da pecuária (em nossa postagem anterior falamos do consumo de alimentos à base de insetos como fonte alternativa de proteína animal), onde existe uma enorme pressão internacional em busca de uma sustentabilidade ambiental cada vez maior, a indústria da moda e, especialmente, a da “fast fashion”, vem saindo-se relativamente ilesa. 

Na minha humilde opinião, isso acontece por causa de uma certa “culpa no cartório” que grandes empresas do mundo da moda de países como França, Espanha, Itália, Alemanha, entre outros ditos de “primeiro” mundo – essas empresas ou compram matérias primas como fios, tecidos e acessórios fabricados em países da Ásia e do Sudeste Asiático, ou simplesmente centralizam a sua produção por lá, ganhando dezenas de milhões de euros e/ou dólares com a simples revenda em suas lojas chics nas grandes cidades do mundo. 

Assim é fácil ser ambientalista e sair condenando países como o Brasil a “torto e a direito”… 

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