OS PROBLEMAS AMBIENTAIS CRIADOS PELA EXPLORAÇÃO DO LÍTIO

Até algumas décadas atrás, nos tempos de nossos país e avós, a disponibilidade de aparelhos elétricos e eletrônicos nas casas era bem menor do que a que temos hoje. Aliás, boa parte das famílias brasileiras sequer dispunha de acesso à rede elétrica. Quem podia se dar a esse luxo dispunha em casa de alguns “bicos de luz”, um ferro elétrico e um rádio, entre outros raros eletrodomésticos. 

Eu lembro bem das férias de fim de ano no sítio dos meus avós em Lutécia, cidadezinha minúscula aqui do interior de São Paulo. Isso foi lá pelos idos da década de 1970. A iluminação noturna era feita com candeeiros a querosene e velas, banhos quentes só esquentando água no fogão a lenha e a única opção de lazer era um grande rádio alimentado a pilhas. Se ouvia a programação por uma ou duas horas ao dia, isso para não se gastar muito dinheiro comprando pilhas. 

Essa realidade mudou drasticamente em nossos dias. A maior parte da população do país já está conectada à rede elétrica nacional e o número de eletrodomésticos e de equipamentos eletrônicos aumentou exponencialmente. Destaco aqui os chamados eletro portáteis como celulares, laptops e tablets, aparelhos que são alimentados por baterias e que são recarregados através da rede elétricas das casas. 

A modernidade e a busca pela sustentabilidade ambiental também passaram a criar grandes espaços para veículos elétricos como uma alternativa aos veículos com motores a combustão interna. Falo aqui de carros, ônibus, caminhões, motocicletas e até de bicicletas elétricas. 

Além de ter resultado num grande aumento do consumo por energia elétrica per capita, essa grande profusão de aparelhos e equipamentos eletroeletrônicos também levou a uma gigantesca demanda por pilhas e baterias, o que, por sua vez, fez aumentar drasticamente o consumo de metais especiais como é o caso do lítio. 

O lítio é o metal mais leve que existe na natureza, possuindo uma densidade de cerca de 0,5 grama por centímetro cúbico. Graças a essa característica e a sua boa condutividade elétrica, o lítio passou a ser uma excelente opção para a fabricação de baterias.  

Para efeito de comparação: o chumbo, metal pesado muito utilizado na fabricação de baterias de automóveis, tem uma densidade de 11 gramas por centímetro cúbico. Além de ter um peso muito menor, uma bateria de lítio pode armazenar três vezes mais energia do que uma bateria fabricada com chumbo. 

Um exemplo prático: um carro da marca Tesla, um dos maiores fabricantes mundiais de veículos elétricos, utiliza um conjunto de baterias de lítio com cerca de 200 kg de peso. Se o mesmo veículo tivesse de usar baterias fabricadas com placas de chumbo, esse peso certamente passaria para algo entre 1,5 e 2 toneladas, algo que tornaria o veículo pesado demais e inviável tecnicamente. 

A produção de baterias de lítio ganhou força no início da década de 1990 e a demanda mundial anual pelo metal é da ordem de 450 mil toneladas. Segundo projeções da IEA – Agência Internacional de Energia, na sigla em inglês, o consumo de lítio deverá aumentar em mais de 40 vezes até o ano de 2040. 

As maiores reservas conhecidas do metal ficam na Bolívia, Chile e Argentina, numa região que ficou conhecida como o “triângulo do lítio”. Esse lítio é encontrado em uma salmoura rica em minerais que fica cerca de dez metros de profundidade sob os lagos salgados e salinas de altitude – os conhecidos “salares”. 

A extração é feita a partir de poços abertos na crosta de sal, de onde a salmoura é bombeada e depositada em tanques de decantação e de secagem natural, um processo que leva entre 15 e 18 meses. Ao final da secagem, os tanques apresentam uma lama salgada rica em manganês, potássio, bórax e sais de lítio. 

Essa produção é cheia de problemas, a começar pelo alto consumo de água – são necessários cerca de 2 milhões de litros de água para produzir uma tonelada de lítio. Nos salares do Deserto de Atacama no Norte do Chile, citando um exemplo, onde a precipitação anual é de apenas 15 milímetros, essa mineração consome 65% da água disponível na região. 

Outro grave problema é a poluição criada pelo uso de produtos químicos tóxicos para a separação do lítio de outros minerais. Um desses produtos é o ácido clorídrico, que além de poluir o ar pode contaminar as fontes de abastecimento de água. Também existe a geração de enormes volumes de rejeitos minerais.

O maior produtor mundial de lítio é a Austrália, onde o metal é encontrado impregnado em rochas chamadas pegmatitos. Esse tipo de rocha é similar ao granito, sendo formada basicamente por quartzo, feldspato alcalino, plagioclásio e minerais raros. As rochas são moídas e depois tratadas com produtos químicos para separar o lítio dos outros minerais. As reservas de lítio existentes aqui no Brasil são deste tipo. 

A China é, de longe, a maior consumidora mundial de lítio. Transformado em “fábrica do mundo” nas últimas décadas, o país produz a maior parte das pilhas e baterias que são usadas em equipamentos eletrônicos e veículos de todo o mundo. Cada uma dessas pilhas ou baterias fabricada deixou um enorme rastro de rejeitos minerais, resíduos químicos e de danos ambientais pelo caminho, além de muitos problemas sociais. 

Aqui temos uma profunda contradição: fontes geradores de energias renováveis como a eólica e a fotovoltaica dependem muito do uso de baterias para o armazenamento da eletricidade. Essas fontes, conforme já tratamos em postagens anteriores, são intermitentes: a força dos ventos varia muito ao longo de um dia e também ao longo das diferentes estações do ano. A luz solar só está disponível durante o dia. 

Muito da sustentabilidade ambiental que defendemos e da modernidade e comodidade criada pelos nossos aparelhos eletro portáteis depende da mineração suja e poluente do lítio usado na fabricação das baterias. Ou seja – é uma conta que não fecha dentro de contabilidade ambiental. 

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