A DISPUTA PELO CONTROLE DAS RESERVAS DE LÍTIO

Na última postagem fizemos uma rápida exposição dos problemas enfrentados pelos proprietários de automóveis elétricos. Num mundo que tenta – a força, ser cada vez mais “verde”, os veículos elétricos surgiram como uma opção para um transporte eficiente e não poluente em grandes cidades. 

Nos últimos meses, com o agravamento da crise energética mundial, conectar um desses veículos numa tomada para fazer a recarga das baterias virou uma espécie de heresia. No caso da Europa, um dos continentes mais afetados pelo problema, a geração de energia elétrica está sendo ameaçada pela falta do gás natural que era exportado pela Rússia e que agora não está mais chegando aos antigos clientes europeus. 

Uma outra questão que tratamos há algumas semanas atrás foi o caso da Califórnia, um dos estados mais populosos e ricos dos Estados Unidos. O estado vive uma crise no abastecimento de energia elétrica, criado por problemas climáticos e redes de transmissão obsoletas, e criou uma campanha publicitária voltada para os proprietários de carros elétricos – não recarreguem seus veículos nos horários de pico sob risco de blackout

Os problemas ligados aos veículos elétricos, entretanto, são bem mais complexos que a falta de energia elétrica para a recarga. Gostaria de focar hoje no problema das baterias usadas na fabricação desses veículos e dos riscos de falta de uma matéria prima essencial – o lítio

O lítio é o metal mais leve que existe na natureza, possuindo uma densidade de cerca de 0,5 grama por centímetro cúbico. Se qualquer um dos leitores consultar uma Tabela Periódica, vai ver que o lítio vem logo após o hidrogênio e o hélio, os elementos mais leves que existem na natureza. Graças ao baixo peso e a sua boa condutividade elétrica, o lítio passou a ser uma excelente opção para a fabricação de baterias.

Para efeito de comparação: o chumbo, metal pesado muito utilizado na fabricação de baterias de automóveis (as famosas baterias de chumbo-ácido), tem uma densidade de 11 gramas por centímetro cúbico. Além de ter um peso muito menor, uma bateria de lítio pode armazenar três vezes mais energia do que uma bateria fabricada com chumbo. 

Graças a isso, baterias e pilhas de lítio passaram a ser largamente usadas em equipamentos eletro portáteis como telefones celulares, games, tablets e computadores, entre muitos outros. Outra aplicação de muito sucesso para esse tipo de bateria é nos veículos elétricos – de bicicletas a motocicletas, de carros a caminhões. Existem, inclusive, diversos estudos para seu uso em aeronaves como os Evtols (na sigla em inglês – veículos de pouso e decolagem vertical à base de eletricidade) e aviões. 

Um exemplo da praticidade dessas baterias: um carro da marca Tesla, um dos maiores fabricantes mundiais de veículos elétricos, utiliza um conjunto de baterias de lítio com cerca de 200 kg de peso. Se o mesmo veículo tivesse de usar baterias fabricadas com placas de chumbo, esse peso certamente passaria para algo entre 1,5 e 2 toneladas, algo que tornaria o veículo pesado demais e inviável tecnicamente.  

A explosão na quantidade e diversidade de aparelhos eletrônicos fez a produção de baterias de lítio aumentar muito a partir de 1990. A atual demanda mundial pelo metal é da ordem de 450 mil toneladas/ano. Segundo projeções da IEA – Agência Internacional de Energia, na sigla em inglês, o consumo de lítio deverá aumentar em mais de 40 vezes até o ano de 2040.  

É aqui que começam os problemas – as maiores reservas conhecidas do metal ficam na Bolívia, Chile e Argentina, numa região que ficou conhecida como o “triângulo do lítio”. Essa região concentra 68% das reservas mundiais de lítio. As maiores reservas ficam na Bolívia, país que detém 30% das reservas mundiais, seguida pelo Chile, com 21%, e pela Argentina, com 17% das reservas. 

A história nos ensinou que a concentração da posse de algum produto ou matéria prima por um grupo muito pequeno de pessoas ou países leva a preços de venda exorbitantes. Vou lembrar aqui do caso dos mercadores italianos que, durante séculos, monopolizaram a importação e a venda das especiarias do Oriente na Europa. A busca pela quebra desse monopólio foi o que levou os portugueses a se lançar ao mar e resultou no descobrimento do Brasil em 1500. 

O lítio é encontrado em uma salmoura rica em minerais que fica cerca de dez metros de profundidade sob os lagos salgados e salinas de altitude – os conhecidos “salares”, tipo de formação bastante comum na região do “triângulo do lítio”. A extração do metal, conforme tratamos em uma postagem anterior, é bastante problemática para o meio ambiente. 

Para que todos tenham uma ideia do crescimento da demanda pelo lítio – em 2021 foram vendidos cerca de 6,3 milhões de veículos elétricos em todo o mundo. As projeções para 2030 falam de 26,7 milhões de veículos. Também entram nessa conta alguns bilhões de telefones celulares, computadores, tablets e mais uma infinidade de ouros equipamentos que utilizam baterias. 

A forte demanda e a concentração da matéria prima em poucos países está criando fortes tensões entre grandes potências como Estados Unidos, China e países da União Europeia. Todos esses países buscam criar “boas relações com os donos” desse metal. O problema é que a América Latina sempre foi uma espécie de “quintal” dos Estados Unidos – os norte-americanos estão incomodados com um aumento cada vez maior da influência econômica da China na região, além das “ciscadas” de muitos países europeus. 

Existem inúmeras pesquisas em universidades e empresas de todo o mundo na busca por materiais alternativos para a fabricação de baterias. Uma das promessas, onde há uma forte participação de empresas e universidades brasileiras, é uma associação de nióbio com grafeno. Uma das grandes vantagens das baterias fabricadas com esses materiais é o baixíssimo tempo necessário para a recarga. 

Enquanto não surgirem alternativas como essas, o lítio vai continuar reinando com um dos melhores materiais para a fabricação de baterias e os grandes países do mundo vão ficar, literalmente, nas mãos de um pequeno punhado de países, que vendem o metal “a peso de ouro”. Essa é, justamente, uma das razões para o alto preço dos carros elétricos. 

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