CÃES DE TRENÓ ESTÃO PERDENDO SEUS “EMPREGOS” NA GROENLÂNDIA

O título da postagem de hoje pode até parecer brincadeira, mas é a mais pura verdade – e a culpa, como não poderia ser diferente, recai sobre as mudanças climáticas. Vamos entender: 

A Groenlândia é a maior ilha do mundo, ocupando um território com cerca de 2,1 milhões de km² ao largo da costa leste do Canadá. Para efeito de comparação, essa área é quase quatro vezes o tamanho do estado da Bahia. A ilha é um território autônomo do Reino da Dinamarca, país do qual depende financeiramente. 

Cerca de 90% dos habitantes atuais da Groenlândia são inuits, grupo indígena que vive nas regiões árticas da América do Norte e que nós costumamos chamar de esquimós. A população total da Groenlândia é de apenas 56 mil habitantes, espalhados por algumas pequenas cidades costeiras. A economia da Groenlândia é quase que totalmente dependente do mar – a pesca e o processamento de pescados e frutos do mar são as principais atividades econômicas da ilha.   

O nome da ilha é de origem nórdica e foi dado pelos antigos navegadores vikings que lá aportaram por volta do ano 900 da nossa era. Em dinamarquês, o nome da ilha é Grønland, o que significa, literalmente, “terra verde”. Até bem recentemente, 80% da superfície da ilha era coberta por um espesso manto de gelo, uma realidade que está mudando rapidamente por causa do aquecimento global. 

De acordo com os registros históricos testemunhais do período entre os anos 900 e 1300 d.C., o Sul da Groenlândia apresentava um clima bem mais ameno que os dias atuais. A região era coberta por árvores e plantas herbáceas, permitindo a agricultura e a criação de gado. Gradativamente as temperaturas começaram a se reduzir e, no século XVII, a pequena população local teve de abandonar a Groenlândia por causa do frio extremo. Esse é um período conhecido como a Pequena Idade do Gelo, quando toda a Europa sofreu com as baixas temperaturas.  

Os primeiros registros de populações humanas na região do Ártico remontam a cerca de 15 mil anos. Essas populações eram originárias da Ásia e atravessaram o Ártico na direção de terras com climas mais amenos no Sul. Diversas ondas de grupos humanos chamados de protoinuits chegaram na região ao longo da história, principalmente a partir de 4.500 anos atrás, sem conseguir obter uma colonização de sucesso no longo prazo. 

O grupo de maior sucesso na ocupação do Ártico foram os inuits, cujos primeiros registros de ocupação na Groenlândia datam de 2 mil anos atrás. Um dos segredos do sucesso da colonização dos inuits em um território tão inóspito foi o uso de trenós puxados por cães de tração. 

De acordo com estudos de DNA feitos em ossos e restos de cães encontrados sob o gelo do Ártico, os inuits, povo que há muito sabemos são originários da Sibéria, trouxeram seus próprios cães de tração quando migraram em direção da América do Norte. Esses animais já estavam perfeitamente adaptados ao pesado trabalho de puxar trenós a longas distâncias. 

Esses cães eram maiores e tinham formatos de crânio e de dentes diferentes de outras espécies que já viviam no Ártico. Com o passar do tempo, e após os diversos cruzamentos entre as diferentes espécies, foram surgindo as espécies de cães que hoje associamos aos inuits. Entre essas espécies destacam-se os huskies siberianos e do Alasca, os malamutes do Alasca e o cão-da-Groenlândia, animal maior e mais pesado entre as espécies. 

Os inuits eram especializados na caça de mamíferos marinhos, especialmente as focas e as morsas. Uma das épocas mais propícias a caça desses animais é o inverno, período em que o mar fica coberto com uma grossa camada de gelo. Nesses momentos, o uso dos trenós puxados por grupos tipicamente entre 8 e 12 cães era essencial para se conseguir cobrir grandes distâncias a partir das suas aldeias. 

Nos últimos anos, devido ao aumento das temperaturas em todo o Ártico, essa camada de gelo que forma sobre o mar está se tornando cada vez mais fina, o que tornou as viagens com os trenós muito perigosas. E sem uma necessidade maior dos trenós, o interesse pelos cães de tração está diminuindo ano após ano. A população desses cães, que no passado já superou a cifra de 30 mil animais, hoje está abaixo de 12 mil animais

Em terra, os problemas da Groenlândia também sã enormes. Um exemplo dessa situação pode ser facilmente confirmado pelo acelerado derretimento da capa de gelo da ilha. Segundo um estudo publiicado na prestigiada revista científica Nature no final de 2020, as três maiores geleiras do país: Jacobshavn Isbrae, Kangerlussuq e Helheim, estão apresentando um rápido derretimento.   

De acordo com as estimativas dos pesquisadores, a Jacobshavn Isbrae perdeu 1,5 trilhão de toneladas de gelo entre 1888 e 2012. Nas geleiras Kangerlussuq e Helheim essa perda de massa, entre os anos de 1900 e 2012, foi estimada em 1,3 trilhão e 3,1 bilhão de toneladas, respectivamente.  

Por todos os cantos da Groenlândia é fácil encontrar enormes crateras cheias de água, um sinal claro do derretimento do manto de gelo. Esse problema se repete por todo o Ártico. Dentro desses novos cenários, os inuits estão preferindo usar motos de neve ou até mesmo quadriciclos motorizados com correntes nos pneus. 

Pessoas mais velhas, que ainda preservam as tradições dos seus ancestrais e que são cada vez mais raras na ilha, ainda se mantém fieis ao uso dos trenós e dos cães de tração. Porém, sem mercado consumidor, existem cada vez menos criadores interessados em manter as linhagens desses cães vivas. Muito pior – não são poucos os cães que são, simplesmente, abandonados e condenados a viver por sua própria conta. 

Do jeito que as coisas vão, a imagem de inuits se deslocando com seus trenós puxados por cães não passará de uma imagem desbotada de um passado distante… 

Ver também: GROENLÂNDIA: UM FUTURO GRANDE CELEIRO AGRÍCOLA?

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