
Na nossa última postagem falamos das fabulosas reservas de petróleo que já foram identificados no continente gelado da Antártida e do desejo velado de muitos países para explorar toda essa riqueza. Felizmente, essa exploração foi proibida pelo Tratado da Antártida, um pacto internacional assinado em 1959.
Uma espécie de trailer do que poderá acontecer na Antártida em um futuro distante é o que está ocorrendo atualmente na Groenlândia, a grande ilha autônoma da Dinamarca que fica localizada ao largo da costa Leste do Canadá. Foram descobertas grandes jazidas de petróleo e gás na ilha, com diversas companhias petrolíferas internacionais tentando iniciar a exploração.
A Groenlândia possui um território com cerca de 2,1 milhões de km², sendo considerada a maior ilha do mundo. De uma forma geral, os mapas apresentam a ilha com um território imenso, maior inclusive que o Brasil. Essa é uma distorção provocada pela técnica usada na confecção desses mapas – a projeção de Mercator. Na realidade, a Groenlândia tem uma área equivalente à da Arábia Saudita.
Falando bem a “grosso modo”, podemos afirmar que a Groenlândia é uma espécie de Antártida em miniatura. Cerca de 80% do território da Groenlândia é recoberto por um manto de gelo e as condições climáticas são bastante similares. Só que, ao contrário da Antártida, a Groenlândia não é tão isolada do resto do mundo, abrigando populações humanas há milhares de anos, além de possuir uma fauna e uma flora ártica muito mais diversificada.
Um estudo científico publicado há poucos dias atrás exemplifica bastante isso – cientistas ingleses e dinamarqueses conseguiram extrair e identificar o DNA de um mamute da Era do Gelo a partir de restos de ossos encontrados na Formação København, um depósito de sedimentos de quase 100 metros de espessura, no norte da Groenlândia. O material foi datado em 2 milhões de anos e a espécie de mamute identificada era originária da Sibéria.
Quanto as populações humanas, os registros arqueológicos afirmam que a ilha começou a ser povoada por seres humanos há cerca de 4.500 anos. Eram caçadores/coletores também originários da Sibéria que chegaram na América do Norte através do Estreito de Bering.
Assim como aconteceu com a Antártida, o clima da Groenlândia passou por inúmeras mudanças ao longo das eras alternando climas diferentes. Até cerca de 500 mil anos atrás, citando só um exemplo, a ilha era coberta por florestas e tinha um clima bem mais ameno.
De acordo com dados do United States Geological Survey, a região Nordeste da Groenlândia possui reservas estimadas de petróleo da ordem de 31,4 bilhões de barris, além de outros 17 bilhões de barris sob o leito do mar entre a ilha e o Canadá. As reservas totais podem ser bem maiores.
Desde 2010, diversas companhias petrolíferas internacionais como Statoil, Royal Dutch Shell e Maersk passaram a mostrar interesse pela exploração dessas reservas de petróleo e muitas dessas empresas conseguiram autorização do Governo para realizar estudos de prospecção.
Várias dessas empresas já haviam feito tentativas de prospecção de petróleo na Groenlândia décadas atrás, porém, sem conseguir áreas com produção viável economicamente. Com o aumento das temperaturas em todo o Ártico e com a diminuição da capa de gelo nos últimos anos, essa prospecção ficou bem mais fácil e muitas empresas informaram que conseguiram desenvolver poços economicamente viáveis.
Essa corrida, entretanto, foi encerrada em meados de 2021, quando um novo Governo de viés preservacionista assumiu o comando da ilha e proibiu a prospecção de petróleo (com aval e/ou pressão da Dinamarca, é claro). A Groenlândia pertence à Dinamarca e, desde 1979, passou a gozar de uma relativa autonomia e a eleger um Governo próprio a partir de 2009. A ilha ainda continua dependendo economicamente da Dinamarca.
Para muitos groenlandeses, o desenvolvimento da indústria petrolífera seria a garantia de uma independência financeira e de um futuro mais promissor para a sua população de mais de 50 mil habitantes. A ilha vive basicamente dos ganhos com a pesca, sendo que a produção de camarões responde por cerca de metade das suas rendas.
Para grande parte dos locais, entretanto, a preservação do meio ambiente vem em primeiro lugar. A ilha já vem sofrendo em demasia com o aumento das temperaturas sendo uma das regiões do planeta onde perda da capa de gelo está acontecendo de forma mais acelerada. Em uma postagem recente falamos sobre os cães de trenó da ilha que estão ficando desempregados por causa da falta de gelo.
A trégua das companhias petrolíferas, infelizmente, pode ser temporária. Governos democráticos, como é o caso da Groenlândia, vão e vem, sobrando sempre algum espaço para a volta de grupos políticos apoiados por essas empresas. Os volumes de petróleo e gás natural escondidos sob o sol da ilha são imensos e representam lucros multibilionários para os empreendedores. Dinheiro, como todos sabem, tem força para mover montanhas e governos…
A própria geografia da Groenlândia favorece essa pressão pela exploração – a ilha fica a meio caminho entre a América do Norte e a Europa, dois grandes mercados para o petróleo e o gás. Em tempos de crise energética – especialmente com a falta de gás natural na Europa, é bem possível que muita gente “graúda” olhe para o outro lado e finja que essas atividades de exploração e produção de combustíveis fósseis não criará nenhum problema para a ilha.
No filme de ficção científica “O dia depois de amanhã”, grande sucesso de bilheteria de 2004 e sobre o qual já fizemos diversas referências em nossas postagens, o derretimento acelerado do manto de gelo da Groenlândia provocou uma grande mudança nas correntes marítimas do Oceano Atlântico Norte, levando o mundo a uma nova e catastrófica Era do Gelo.
Não sei se a exploração de petróleo e gás na Groenlândia teria potencial para provocar problemas ambientais de tamanha magnitude como na ficção, mas é certo que muitos danos – especialmente para o oceano, sairão daí…
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