A CRISE ECONÔMICA E A FALTA DE ALIMENTOS, DE ENERGIA E DE COMBUSTÍVEIS NO SRI LANKA 

O Sri Lanka é um daqueles países que raramente ouvimos falar aqui no Ocidente. Localizado ao largo da costa Sul da Índia, esse país insular tem cerca de 65 mil km2, área um pouco maior que a do nosso Estado da Paraíba, contando com uma população de aproximadamente 22 milhões de habitantes. 

Existem evidencias de assentamentos humanos na ilha datados em cerca de 125 mil anos, porém a história escrita do país está documentada há apenas 3 mil anos. A população foi formada a partir de uma mistura de grupos tâmeis do Sul da Índia, malaios, mouros e aborígenes vedas, entre outros grupos étnicos. A maioria da população professa a fé budista. 

Como sempre acontece com esses países, é preciso que ocorra alguma tragédia para que virem notícia. O Sri Lanka está ocupando manchetes dos meios de comunicação por causa de uma enorme crise econômica e social que se desenrola na ilha. Com a epidemia da Covid-19, o país perdeu grande parte de suas receitas em moeda estrangeira – o turismo e as exportações de chá, duas das principais atividades econômicas do país, caíram fortemente desde 2020. 

Sem dinheiro para fazer compras no mercado internacional, o país reduziu ao máximo possível as importações de fertilizantes, o que prejudicou imensamente a produção local de alimentos. Com a redução da oferta, os preços subiram e centenas de milhares de cingaleses estão passando fome. 

E os problemas não param por aí – a falta de dinheiro também prejudicou as importações de combustíveis e a população sofre com a falta e com os altos preços desses produtos. Falta combustível até para as usinas de geração de energia elétrica e os cortes no fornecimento são diários. A situação da população é caótica. 

O país também suspendeu os pagamentos de sua dívida externa de US$ 51 bilhões, perdendo assim o crédito no mercado financeiro internacional. O Sri Lanka está enfrentando a pior recessão desde 1948, ano em que conseguiu a independência do Reino Unido. Segundo analistas internacionais, o país precisaria de US$ 7 bilhões para honrar seus compromissos internacionais este ano, mas dispõe de reservas de apenas US$ 1,9 bilhão. 

Manifestações diárias de milhares de pessoas (vide foto) pedem a renúncia do Presidente Gotabaya Rajapaksa, a quem acusam, entre outros problemas, de inabilidade na gestão da crise. A família Rajapaksa, aliás, ocupa diversos cargos na administração do país – são filhos, irmãos e outros parentes do Presidente. Esse nepotismo aumenta ainda mais a revolta da população. 

No início de 2020, já antevendo as dificuldades para a importação de insumos agrícolas, o Presidente do Sri Lanka anunciou que seu país estava proibindo o uso de fertilizantes e pesticidas na agricultura com o objetivo de tornar toda a produção orgânica. Muitos ambientalistas internacionais aplaudiram essa iniciativa demagógica. 

Entretanto, a realidade acabou falando mais alto – logo após o anúncio dessas medidas, cerca de 1/3 das culturas não foram plantadas pelos produtores rurais. A razão é muito simples – culturas orgânicas não costumam ser viáveis economicamente. A produção cai, os custos aumentam e o mercado não paga o valor real dos produtos. A produção de arroz, um dos alimentos básicos da população e onde já não havia autossuficiência, diminuiu 20%, o que obrigou o Governo a gastar cerca de US$ 450 milhões com a importação do cereal. 

O Governo do Sri Lanka também foi obrigado a desembolsar cerca de US$ 350 milhões em subsídios e indenizações para os agricultores que não conseguiram se adaptar as novas diretrizes. Para os consumidores o impacto se deu num aumento de 50% no preço de venda do arroz. 

Um outro produto que teve sua produção fortemente afetada foi o chá, o principal produto de exportação do país. Desde a época das grandes navegações europeias nos séculos XV e XVI (os portugueses chegaram ao Sri Lanka em 1505), que os chás do Ceilão, nome antigo do país, fazem sucesso na Europa. As exportações anuais do produto registraram prejuízos da ordem de US$ 425 milhões no último ano. 

De acordo com dados da Foreign Policy, uma publicação norte-americana que analisa a política internacional e a relação entre os países, a desastrada medida do Governo cingalês prejudicou fortemente a segurança alimentar da população. Calcula-se que cerca de 500 mil cingaleses foram levados para um padrão de vida abaixo da linha da pobreza. 

Com o visível colapso da produção agrícola, o Governo não tardou em suspender a política de proibição do uso de fertilizantes e de pesticidas. Entretanto, os estragos já estavam feitos, o que agravou ainda mais a crise econômica e a possibilidade de importar esses insumos. 

É importante citar que o Sri Lanka enfrentou uma guerra civil entre os anos de 1983 e 2009, conflito que matou mais de 40 mil pessoas. O embate se deu entre o grupo político Tigres de Libertação do Tâmil, que queria a independência do seu território, e o Governo Central do país. 

Esse conflito deixou profundas sequelas em um país historicamente já marcado pela pobreza. Milhares de camponeses foram obrigados a abandonar suas terras e migrar para outras regiões do país, o que agravou muitos dos conflitos agrários. Cerca de metade da população do Sri Lanka depende da agricultura, especialmente da produção de arroz, chá, borracha e coco.  

Existe ainda um agravante – apenas 1/3 das terras da ilha podem ser utilizadas para a produção agrícola. Imaginar que seria possível manter a produção sem o uso de fertilizantes e defensivos agrícolas foi, no mínimo, um ato de enorme ingenuidade por parte do Governo do país. E como sempre acontece, a fatura chegou e o Governo não tem dinheiro para pagar a conta. 

Com um forte desemprego, altos preços dos alimentos, com cortes no fornecimento de energia elétrica, falta de combustíveis e com uma queda brutal na entrada de recursos externos, o país está vivendo uma situação explosiva. A combinação de tantos problemas num único país não costuma acabar nada bem. 

Desgraçadamente, parece não haver uma solução no curto prazo para o pobre Sri Lanka. 

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