OS ESFORÇOS DA RÚSSIA PARA A EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NO ÁRTICO, OU FALANDO DO PROJETO ICEBERG

Urso polar

Em 1871 foi perfurado o primeiro poço de petróleo na região do Mar Cáspio, mais precisamente no Azerbaijão. Essa descoberta coincidiu com a expansão territorial do Império Russo naquele momento e, décadas depois, esse domínio regional foi consolidado com a anexação de países do Cáucaso e da Ásia Central à URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. A região foi transformada nas décadas seguintes em uma importante fornecedora de petróleo e gás para todo o bloco socialista.

Antes do colapso da URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, em 1991, a Rússia continuava controlando importantes reservas de petróleo e gás no Mar Cáspio e em países como o Azerbaijão, Turcomenistão, Uzbequistão e Cazaquistão. Com o fim da URSS, esses países passaram a ter liberdade de negociar suas riquezas naturais com outros países, o que forçou os russos a se voltarem para seu próprio território, especialmente para a Sibéria.

As estimativas atuais afirmam que as reservas de petróleo no Mar Cáspio e na Ásia Central são de 50 bilhões de barris e as de gás são da ordem de 9,1 trilhões de m³, valores que correspondem a cerca de 5% das reservas mundiais. Atualmente, entre os grandes compradores desses recursos, estão os países da Europa, Estados Unidos e, cada vez mais, a China – a Rússia acabou relegada à “segunda divisão”.

Dentro do território russo, conforme comentamos na última postagem, a Sibéria – mais especificamente o Planalto Siberiano, se transformou na grande fonte de recursos energéticos do país. A região concentra 80% das reservas de petróleo, 85% do gás e 80% do carvão russo. O Governo da Rússia, entretanto, quer aumentar as suas reservas estratégicas, aumentando assim o seu capital político. Cada vez mais, os russos tem voltado seus olhos para as reversas de hidrocarbonetos escondidas sob o Mar Ártico, uma atividade que pode comprometer um dos mais importantes ecossistemas do planeta.

A Rússia vem pleiteando há vários anos uma expansão do seu território submarino na região do Ártico junto à Comissão dos Limites da Plataforma Continental da ONU – Organização das Nações Unidas. Em 2013, a Rússia teve sucesso junto a essa Comissão na ampliação dos seus direitos territoriais no Mar de Okhotsk, na região do Oceano Pacífico, e imagina que isso é um bom precedente para as suas reinvindicações no Ártico. Outros países como o Canadá também fazem a mesma solicitação.

O Oceano Ártico apresenta profundidades de até 5 mil metros, o que, por si só já se apresenta como um grande desafio para a exploração de petróleo e gás. Aqui vale lembrar que o Brasil vem explorando petróleo em águas profundas na região conhecida como Pré-Sal no Oceano Atlântico. As profundidades nessa região chegam a 7 mil metros, sem contar com uma espessa camada de sal no fundo marinho que pode chegar a 2 mil metros. A Petrobras – Petróleo Brasileiro S.A., foi obrigada a desenvolver tecnologias especiais para conseguir realizar com sucesso as explorações nessas condições.

Porém, ao contrário do clima tropical da costa brasileira, o clima do Ártico é inóspito e o Oceano passa grande parte do ano coberto por uma grossa camada de gelo. Para vencer essas dificuldades e se tornar a primeira nação do mundo a fazer explorações bem sucedidas na região, a Rússia criou há vários anos o Projeto Iceberg, onde os principais objetivos são o desenvolvimento de novas tecnologias e o aperfeiçoamento de equipamentos para operação em condições de frio extremo. Entre os principais destaques tecnológicos dos russos estão os robôs submarinos e os submarinos não tripulados.

Uma das principais peças do sistema de exploração de águas profundas da Rússia é o Belgorod, o maior submarino nuclear já construído. Com 182 metros de comprimento, esse submarino vai operar como uma espécie de “nave-mãe” para uma frota de submarinos menores, tripulados e não tripulados. A embarcação também será usada na realização de análises submarinas e na instalação de cabos e outros equipamentos subaquáticos.

Um outro equipamento que já se encontra em fase de testes é o Harpischord-2R-PM AUV, um veículo submersível com 2 toneladas de peso e 6 metros de comprimento, desenvolvido especialmente para o Projeto Iceberg. Esse veículo tem o formato de um torpedo e está em testes no Mar Negro. O equipamento já foi usado em missões para a localização de destroços de aeronaves acidentadas no mar.

Os russos trabalham com a expectativa de automatizar ao máximo e controlar à distância os processos produtivos através do uso de novas tecnologias e, consequentemente, reduzindo ao mínimo a necessidade de uso de mão de obra humana in loco. Muitas das grandes potências mundiais observam com restrições o andamento do projeto da Rússia, colocando dúvidas na viabilidade práticas dessas tecnologias.

Entre outros equipamentos, os russos pretendem instalar um reator nuclear autônomo de 24 MW no fundo do mar, que servirá como um ponto de recarga para os robôs e submarinos autônomos que estarão trabalhando nas operações de prospecção, perfuração e extração de petróleo e gás no Ártico. Esse é um dos pontos que mais gera preocupações na comunidade internacional – a Rússia tem um longo histórico de acidentes nucleares.

O maior e mais grave acidente nuclear da história aconteceu em Chernobyl, na então República Socialista Soviética da Ucrânia, em 1986. Um teste de segurança desastroso desencadeou uma série de falhas em equipamentos e em procedimentos de operação da usina nuclear. Houve uma grande explosão de vapor, o que expôs os elementos radioativos do núcleo e liberou grandes quantidades de urânio na atmosfera. Os russos esconderam essa informação da comunidade internacional por vários dias, o que agravou as consequências do desastre.

Os russos também contabilizam inúmeros acidentes com embarcações militares com propulsão nuclear. Desde 1961, até onde se conhece, a Marinha Soviética perdeu sete submarinos nucleares, além de diversos acidentes graves com os reatores nucleares de navios militares. Esses números podem ser maiores: a União Soviética não poupava esforços para esconder do mundo os seus fracassos. Um dos grandes acidentes com um submarino russo foi o Kursk, no ano 2000 já na era pós-URSS, causando a morte dos seus 118 tripulantes. Os orgulhosos russos se negaram a receber ajuda dos Estados Unidos, que possuía submarinos de resgate para uso nesse tipo de acidente.

Além dos temores relativos a eventuais falhas nos reatores nucleares de diversos equipamentos que virão a ser usados nas instalações de exploração de petróleo e gás, a comunidade internacional também se preocupa com as consequências de um possível acidente com petróleo na Região do Ártico. Existem fortes razões para esses temores – o acidente com o superpetroleiro Exxon Valdez no Alasca em 1989 deu uma grande demonstração dos impactos ambientais criados por um grande derrame de petróleo no Ártico. De acordo com estimativas oficiais, a tragédia provocou a morte de mais de 260 mil aves marinhas, 2.800 lontras-marinhas, 250 águias e 22 orcas, além de dezenas de milhares de peixes, crustáceos e moluscos marinhos.

O Ártico está entre as regiões do mundo que mais sofrem com os efeitos do Aquecimento Global. As temperaturas médias na região estão aumentando progressivamente, o que tem levado à perda de grandes volumes de gelo. Pesquisas recentes indicam que a camada de gelo que cobre o Ártico ficou até 40% mais fina e houve uma redução de cerca de 15% em sua área total. Diversos animais estão sendo fortemente ameaçados com essas mudanças no seu habitat, onde destacamos os carismáticos ursos polares, uma das espécies mais representativas do Ártico.

Expor uma região já criticamente ameaçada pelos efeitos do Aquecimento Global a riscos de acidentes com petróleo parece fugir completamente do razoável. Agora, qual país teria “peito” para encarar uma potência nuclear como é a Rússia para impedir que avancem com seus projetos?

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