Desde a década de 1940, quando se multiplicaram os estudos e experimentos com elementos radioativos – principalmente no campo do desenvolvimento e construção de armas nucleares, teve início um processo de poluição do ar, dos solos e das águas com substâncias radioativas – os nuclídeos. Essas substâncias se formam a partir da recombinação dos átomos de plutônio, entre outros elementos radioativos, “destruídos” durante a fissão nuclear. Os nuclídeos mais conhecidos, e, portanto, os que causam maiores impactos ao meio ambiente, são o césio-137 e o estrôncio-90.
O primeiro teste com uma arma nuclear ocorreu em 16 de julho de 1945, no Novo México – Estados Unidos, dentro dos esforços do Projeto Manhattan. Os norte-americanos corriam contra o tempo para vencer os cientistas da Alemanha nazista, que já estavam bastante adiantados no projeto de uma bomba atômica. A explosão dessa primeira bomba liberou uma quantidade de energia equivalente a 18,6 mil toneladas do explosivo TNT (Trinitrotolueno) e demonstrou que a tecnologia era viável. Nos dias 6 e 9 de agosto, respectivamente, bombardeiros norte-americanos lançaram as bombas atômicas Litle Boy e Fat Man sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, encerrando assim a II Guerra Mundial. A Alemanha havia se rendido pouco antes.
A partir dessas primeiras explosões na década de 1940, calcula-se que cerca de 2 mil bombas atômicas diferentes já foram testadas em todo o mundo. Os países líderes em testes nucleares foram os Estados Unidos e a URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Também entram nesse seleto grupo a Inglaterra, França, China, Índia e Paquistão. Existem evidências de um teste nuclear clandestino feito por Israel em 1979. A África do Sul desenvolveu um programa nuclear completo, que culminou com a fabricação de bombas atômicas, porém, o país desistiu do projeto e desmontou todo o seu arsenal nuclear.
Além de todas as explosões atômicas com fins militares, ocorreram também cerca de 200 acidentes “civis” envolvendo materiais radioativos. Aqui no Brasil, citando um exemplo, houve o caso do césio-137 em Goiânia no ano de 1987. Sucateiros encontraram um equipamento de radioterapia abandonado e abriram o invólucro onde se encontrava o césio-137. O processo de contaminação atingiu cerca de 1.600 pessoas, com 4 mortes.
Como resultado de todas essas explosões, testes e acidentes de todos os tipos, grandes quantidades de diferentes elementos radioativos foram liberadas na atmosfera, atingindo solos e águas de todo o mundo. Pode-se afirmar que não existe ambiente algum da superfície terrestre que não apresente pequenas quantidades de materiais radioativos liberados por esses eventos.
O gravíssimo acidente com a Usina Nuclear de Chernobyl ocorrido em 1986 e sobre o qual tratamos na última postagem, não poderia ficar fora dessa lista. O acidente teve início durante um desastroso teste de segurança, desencadeando uma sucessão de falhas em equipamentos e nos procedimentos operacionais do reator. Uma violenta explosão de vapor expôs os elementos radioativos do núcleo, o que levou ao derretimento nuclear, explosões e incêndio. Calcula-se que até 30% das 190 toneladas métricas de urânio de Chernobyl foram lançadas na atmosfera, atingindo extensas áreas da Europa e da Eurásia.
Logo após o acidente, toda a vegetação existente dentro de um raio de 10 km de Chernobyl passou a apresentar folhas com coloração marrom-avermelhada. Essa área passou a ser chamada de “Floresta Vermelha”. Com o passar do tempo, todas as árvores e plantas da área morreram devido a absorção de elevadas doses de radiação. Todos os seres vivos da área – aves, mamíferos, répteis, anfíbios, vermes e insetos, entre outros, tiveram o mesmo fim. Os efeitos da radiação se reduziram gradativamente conforme a distância de Chernobyl foi aumentando.
As estimativas mais recentes indicam que perto de 100 mil km² de solos, matas e águas da Ucrânia, Bielorrússia e Rússia foram contaminadas com “cinzas” e elementos radioativos de Chernobyl e ficarão imprestáveis para usos agrícolas e pastoris por cerca de 24 mil anos. Essa contaminação é cerca de 400 vezes maior do que a que foi criada com a explosão da bomba atômica de Hiroshima em 1945. Essa área, para efeito de comparação, é maior que a soma dos territórios dos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. Perto de 350 mil pessoas que viviam nessas áreas tiveram de ser deslocadas para outras regiões desses países.
Sem a presença dos seres humanos, houve uma espécie de “renaturalização” dessas áreas, com expansão de áreas ocupadas por florestas e por vida animal. É claro que todas essas formas de vida estão sendo afetadas pelos efeitos da radiação. Estudos científicos feitos em aves e mamíferos capturados nessas áreas encontraram grandes percentuais de animais com cataratas nos olhos e com cérebros menores. Muitas das aves estudadas apresentavam má formação nos espermas. Cerca de 40% dos pássaros machos estudados eram completamente estéreis, sem produção de esperma ou apresentando pequenas quantidades de esperma morto em seus tratos reprodutivos.
Estudos das populações de seres vivos encontrados nas áreas contaminadas por material radioativo indicaram que todos os grupos populacionais eram menores que aqueles encontrados em áreas naturais limpas. Esse levantamento incluiu aves, borboletas, libélulas, abelhas, gafanhotos, aranhas e também grandes e pequenos mamíferos. Também foram encontradas grandes anormalidades nos desenvolvimentos de algumas plantas e insetos.
Como exceção a essas observações, as populações selvagens de animais como lobos (vide foto), javalis, alces e de algumas espécies de aves, entre outras, passaram a se apresentar iguais ou até maiores do que a de outras áreas. Sem a presença dos seus grandes predadores, os seres humanos, essas espécies passaram a encontrar maiores estoques de alimentos e uma menor competição com outras espécies. Apesar dessa aparente prosperidade, esses animais apresentam uma série de lesões graves em seus organismos como decorrência da exposição contínua à radiação.
Além de comprometer as populações e a saúde dos seres vivos remanescentes, a radiação existente nessas áreas está provocando danos genéticos e altas taxas de mutação nos seres vivos locais. Já foram observados declínios em populações de insetos como as borboletas, onde a causa é o acúmulo de mutações genéticas danosas às espécies ao longo de várias gerações. Em condições evolutivas normais, os seres vivos que melhor se adaptam ao meio ambiente são os que têm maiores chances de sobreviver – o que tem sido observado na região do acidente de Chernobyl é justamente o contrário: as novas gerações de algumas espécies de insetos estão “desevoluindo”.
Apesar de todos os esforços já feitos e em andamento para isolar e afastar as populações das áreas contaminadas, restringir os contaminantes radioativos é uma tarefa praticamente impossível. As águas das chuvas e do degelo (o inverno nessa região é bastante rigoroso) carreiam grandes quantidades de resíduos radioativos para os cursos d’água, o que pode espalhar esses elementos na direção de localidades a centenas de quilômetros. Essas águas também provocam a infiltração desses resíduos na direção de lençóis freáticos e aquíferos subterrâneos, comprometendo o abastecimento de populações residentes fora dessa área de exclusão.
As fortes correntes de ventos também contribuem para a dispersão de partículas de materiais radioativos, podendo transportá-los a distâncias de milhares de quilômetros, com consequências ainda não determinadas pela ciência. Serão necessárias ainda muitas décadas de estudos e observações para que se tenha uma noção exata de todos os efeitos e impactos ao meio ambiente e populações causados pelo acidente nuclear de Chernobyl.
Para você pensar na cama: existem perto de 17 mil armas nucleares no mundo, principalmente nas mãos de norte-americanos e russos. Cerca de 400 reatores nucleares estão em operação em todo o mundo, com outros 65 em construção e pelo menos 165 em projeto. Se um único desastre com um reator nuclear pode causar o volume de estragos de Chernobyl, imaginem o que todo esse “arsenal” nuclear poderá causar para a humanidade…
[…] OS PROBLEMAS AMBIENTAIS DECORRENTES DO ACIDENTE NUCLEAR DE CHERNOBYL […]
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