A TRANSPOSIÇÃO DAS ÁGUAS DO RIO SÃO FRANCISCO

 

Projeto de Transposição São Francisco

Quem acompanha as postagens do blog já percebeu que este é um espaço onde se fala diariamente da água, o elemento natural mais fundamental para a criação e a manutenção da vida em nosso planeta. Cada vez mais necessária e rara, a água é o grande desafio da humanidade em nossos tempos. Nas sequências de posts publicados ao longo do tempo, uma determinada temática ambiental é escolhida num dado momento e detalhada em várias publicações, sempre procurando mostrar a complexidade do tema e os conflitos e problemas criados pelo uso da água.

Nos últimos três meses, o foco das publicações foram os problemas de superexploração e destruição das fontes de água em várias partes do mundo – no Brasil, foram tomados como exemplo destes fatos os problemas que assolam, já há muito tempo, a bacia hidrográfica do Rio São Francisco. Ao longo de 33 publicações tentou-se mostrar um mosaico dos problemas que, literalmente, estão destruindo o nosso Velho Chico. Agora, a partir dessa base de problemas, gostaria de falar um pouco do necessário e problemático Projeto de Transposição das Águas do Rio São Francisco.

De acordo com registros históricos, a ideia de realizar uma obra de engenharia que permitisse a transposição das águas do Rio Francisco na direção de áreas assoladas por secas frequentes remonta a meados do século XIX, época do reinado de Dom Pedro II. Nesta época, apesar das boas intenções dos idealizadores, o projeto não poderia ser realizado por falta de tecnologias e recursos de engenharia adequados – citando um único exemplo: a tecnologia para bombear a água a grandes alturas com o uso da eletricidade só estaria disponível 50 anos depois.

A região do Semiárido, como deve ser de conhecimento geral, enfrenta períodos cíclicos de secas com excepcionais proporções – notas de antigos cronistas, testemunhas oculares, médicos e jornalistas, além de registros dos governos, falam de grandes secas em 1744, 1790, 1846, 1877, 1915, 1932, 1951 e 1979. Em nossos tempos, mais precisamente desde 2012, o Semiárido está vivendo uma estiagem comparável à grande seca de 1915, evento que acabou imortalizado na literatura brasileira décadas depois com a publicação do romance O Quinze, obra da grande  escritora cearense Rachel de Queiroz. Todos estes registros falam das penúrias e sofrimentos vividos pelos sertanejos, vitimados pela sede e pela fome, forçados a migrar para outras terras, quando milhares caíram desfalecidos pelos caminhos dos sertões. Um pequeno trecho de um antigo relatório oficial de um órgão do governo nos dá uma ideia da perplexidade criada pelo evento climático extremo:

“Em 1932, o ano começou com poucas chuvas em janeiro. A seca havia se generalizado abrangendo uma área até hoje não superada: parte do Maranhão e o Piauí até a Bahia, ao sul do rio Itapicuru foram atingidos, numa extensão de 650.000 km², onde habitava uma população de 3.000.000 de pessoas.”

A discussão acerca de um sistema de transposição voltou a ser considerada nas décadas de 1940, época do Governo Vargas, e 1980, no Governo do Presidente João Batista de Figueiredo. Em 1994, durante o Governo do Presidente Itamar Franco, foi iniciado um estudo sobre os potenciais hídricos das bacias hidrográficas do Semiárido nos Estados de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, estudos que prosseguiram durante o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Em 2007, já no Governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva, um projeto de transposição das águas do Rio São Francisco começou a ser implantado, com obras sendo executadas por batalhões especializados em engenharia do Exército Brasileiro e por construtoras privadas. Depois de inúmeros atrasos, suspeitas de fraude e superfaturamento, o primeiro trecho do Eixo Leste do Sistema de Transposição do Rio São Francisco foi inaugurado oficialmente no início de março de 2017 – depois de mais de um século e meio desde as primeiras sugestões iniciais, as águas transpostas começaram a escoar pelos sertões do Estado da Paraíba.

Projeções oficiais do Governo Federal estimam que o Sistema de Transposição, quando estiver totalmente concluído, atenderá 12 milhões de habitantes nos Estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, levando as águas do Rio São Francisco para uma extensa área do Semiárido.

Entre o sonho inicial do século XIX e os primeiros metros cúbicos de água correndo no município de Monteiro na Paraíba, muito tempo se passou e grandes volumes de recursos foram alocados no projeto; os poderosos caudais do Velho Chico dos tempos de Dom Pedro II já não existem mais e a sombra da devastação ambiental se esconde a cada meandro da bacia hidrográfica – o sonhado Projeto se cerca de muitas incertezas…

Vamos discutir e nos aprofundar nestas importantes questões nos nossos próximos posts.

 

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