TIJUCA: O RENASCIMENTO DA FLORESTA E DAS FONTES DE ÁGUA

cascatinha

No post anterior apresentamos um panorama caótico da cidade do Rio de Janeiro após a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil. O crescimento da cidade foi fortemente ameaçado pela falta de água nas primeiras décadas do século XIX e providências urgentes teriam de ser tomadas para garantir o abastecimento da nova Metrópole do Império Ultramarino Português.

As antigas nascentes de águas nas montanhas e serras há muito já vinham sofrendo com a degradação da cobertura florestal e já não tinham produção suficiente para atender as necessidades crescentes da população da cidade. Data da década de 1820 a decisão de se desapropriar as primeiras terras na Tijuca para reflorestar as nascentes de água potável, cada vez mais escassas. Acreditava-se, de forma empírica, que o reflorestamento aumentaria o volume dos riachos. E foi revegetando as encostas da Tijuca que se reparou, em parte, os danos causados pela exploração indiscriminada de toda a sua vegetação para se produzir, sucessivamente, cana-de-açúcar, café, lenha e carvão vegetal e, finalmente, abrigar a produção de alimentos e criação de animais destinados ao consumo da crescente população.

Ao longo das décadas de 1820 e 1830, a cidade do Rio de Janeiro enfrentou vários períodos de seca prolongada, com grande escassez de água potável e grandes problemas para a dispersão do esgoto residencial que se acumulava nos canais. Surgia na opinião publica da cidade uma forte pressão sobre os governantes para a adoção de políticas para o aumento da capacidade dos sistemas produtores de água. A partir de 1845 inicia-se, de fato, o trabalho sistemático de recomposição florestal das encostas e as desapropriações de fazendas se intensificaram. As primeiras experiências de reflorestamento haviam apresentado ótimos resultados e partia-se, agora, para um aumento na escala nas intervenções florestais.

A partir de 1861, por ordem do imperador Dom Pedro II, grandes fazendas na região da Tijuca foram desapropriadas e iniciou-se um processo contínuo de reflorestamento em grande escala. A realização deste trabalho foi confiada ao Major Manuel Gomes Archer que, de forma totalmente amadorista e sem nenhum critério científico, iniciou os trabalhos de plantio de árvores. Contando com uma pequena equipe de trabalhadores, entre escravos e assalariados, foram plantadas ao longo de 13 anos mais de 100 mil mudas de árvores, especialmente mudas de espécies da Mata Atlântica que ainda resistiam em pequenos fragmentos florestais.

O escritor José de Alencar, em seu livro “Sonhos d’Ouro”, de 1872, assim se referiu a esse trabalho:

“Viva imagem da loucura humana! Refazer à custa de anos. trabalho e dispêndio de grande cabedal, o que destruiu em alguns dias pela cobiça de um lucro insignificante! Aquelas encostas secas e nuas, que uma plantação laboriosa vai cobrindo de plantas emprestadas, se vestiam outrora de matas virgens, de árvores seculares, cujos esqueletos corcomidos as vezes se encontram escondidos em alguma grota. Veio o homem civilizado e abateu os troncos para fazer carvão; agora, que precisa da sombra para obter a água, arroja-se a inventar uma selva, como se fosse um palácio. Ontem carvoeiro, hoje aguadeiro, mas sempre a mesma formiga, abandonando a casa velha para empregar sua atividade em construir uma nova.”.

Ao longo de várias décadas os trabalhos de reflorestamento foram sendo ampliados e a oferta de água potável se estabilizou; o abastecimento da crescente população ficou garantido até a criação de novos sistemas produtores a partir do final do século XIX. Em resumo – a Floresta da Tijuca foi responsável pela sobrevivência de grande parte da população carioca ao longo do século XIX, tendo garantindo o abastecimento contínuo de água em volume e qualidade satisfatórios.

Em 1961 a floresta foi elevada a condição de Parque Nacional do Rio de Janeiro, nome alterado anos depois para Parque Nacional da Tijuca, ou simplesmente Floresta da Tijuca para os cariocas, com área total de 3.953 ha. Além de abrigar excepcional patrimônio natural da Mata Atlântica, o Parque concentra dentro dos limites de sua área valiosos bens culturais e históricos, constituindo a maior floresta artificial urbana do mundo, contemplando maciços rochosos, quedas d’água, riachos, fauna e flora da Floresta Atlântica, mirantes, ruínas de antigas fazendas e da Real Fábrica de Pólvora entre outras atrações.

Junto com as praias e as montanhas que envolvem a cidade do Rio de Janeiro e a transformaram no cartão postal mais conhecido do Brasil em todas as partes do mundo, a Floresta da Tijuca é um dos grandes patrimônios naturais da capital fluminense, fornecendo ainda hoje preciosos serviços ambientais e atraindo milhares de turistas a cada ano. Lembro claramente da minha primeira visita à Floresta cerca de 30 anos atrás, quando acompanhei um grupo de turistas em uma longa caminhada por uma das trilhas da mata. Uma recordação marcante desta caminhada foi o cheiro de um sem número de jaqueiras carregadas de frutas, que enchiam o ar com um sabor adocicado.

Preservação ambiental faz bem em todos os sentidos e à todos os sentidos.

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4 Comments

  1. […] A realização deste trabalho foi confiada ao Major Manuel Gomes Archer que, de forma totalmente amadorista e sem nenhum critério científico, iniciou os trabalhos de plantio de árvores. Contando com uma pequena equipe de trabalhadores, entre escravos e assalariados, foram plantadas ao longo de 13 anos mais de 100 mil mudas de árvores, especialmente mudas de espécies da Mata Atlântica que ainda resistiam em pequenos fragmentos florestais. Na região ressurgiu uma magnifica mata, conhecida atualmente como Floresta da Tijuca. […]

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