
Os cidadãos britânicos e a grande maioria das pessoas “civilizadas” do mundo (faço a ressalva por que muitos socialistas estão comemorando o fato) estão em luto devido a morte da rainha Elizabeth II do Reino Unido, ocorrida no último dia 8 de setembro. Seu reinado de 70 anos foi o mais longo de toda a história da monarquia britânica.
Com a morte da monarca assume o trono seu filho primogênito, o polêmico e pouco carismático Charles Philip Arthur George, agora oficialmente conhecido como Rei Charles III. Antes de ascender ao trono do Reino Unido, Charles dividia a opinião dos seus súditos – pesquisa feita em 2019 indicou que 46% dos britânicos preferia sua abdicação ao trono em favor do príncipe Willian.
Problemas políticos e de relacionamentos a parte, gostaria de enfocar num aspecto interessante de Charles III – há mais de 50 anos, o agora rei é um ferrenho ecologista e defensor de causas ligadas ao meio ambiente. Aliás, entre muitos outros cargos honoríficos, ele é presidente da organização ambientalista WWF-UK desde 2011, cargo que foi ocupado por seu pai, príncipe Philip, entre 1981 e 1996.
Um exemplo das preocupações ambientais do monarca – há mais de 50 anos que ele vem utilizando um carro da tradicional marca inglesa Aston Martin, cujo motor foi modificado para usar um biocombustível elaborado a partir de excedentes de vinho branco e soro de leite da fabricação de queijo. Esse biocombustível é aditivado com 15% de gasolina sem chumbo.
O primeiro evento público onde o então Príncipe de Gales discursou sobre suas preocupações ambientais foi em 1970, quando fez um “alerta para todos os aspectos do meio ambiente“. A partir de então, seu envolvimento em causas ambientais só fez crescer.
A imagem de monarca envolvido em questões ambientais foi reforçada ao longo dos anos com a participação do Príncipe de Gales em inúmeros eventos plantando árvores, flores ou ainda exibindo vegetais e frutas orgânicas produzidas em uma das suas muitas propriedades. Charles também fez visitas a muitas áreas de grande importância ecológica como os manguezais das Ilhas São Vicente e Granadinas, no Caribe.
Na COP26 – Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças no Clima, que foi realizada em novembro de 2021, em Glasgow na Escócia, o Príncipe de Gales fez o discurso de abertura dos trabalhos. Ele pediu aos líderes globais um aumento dos esforços no combate o aquecimento global, afirmando que “o tempo literalmente acabou”.
Agora, que os tempos do “eterno” Príncipe de Gales ficaram para trás e passamos ao reinado do Rei Charles III, vamos ver quais serão as medidas efetivas que serão tomadas pelo monarca na área ambiental. Aqui é preciso ressaltar que, dentro de estrutura de Governo Monarquista Parlamentarista da Grã Bretanha, os poderes do soberano são bastante limitados.
Mesmo sem contar com o poder da caneta do Primeiro-ministro britânico, o Rei Charles tem poder moral para fazer muita coisa. Para começar, seria bem interessante que seus esforços começassem pela agricultura do Reino Unido, que atualmente está cheia de problemas. Pode até não aparentar a princípio, mas o soberano tem uma forte ligação com essa área.
Como herdeiro da Coroa do Reino Unido, Charles é herdeiro do Ducado da Cornualha (soa melhor em inglês – Cornwall), uma enorme extensão de terras que engloba grande parte do Sul e do Sudoeste da Inglaterra. Esse Condado foi criado em 1337 para gerar rendas para o herdeiro real. Todas as propriedades urbanas e rurais dessa região são obrigadas a pagar um imposto anual ao nobre, uma tradição medieval ainda em uso no Reino Unido.
De acordo com diversas reportagens publicadas nos últimos dias, o Rei Charles recebeu cerca de 21,6 milhões de libras esterlinas geradas por esses impostos no ano de 2021. Convertido em Real, falamos aqui de R$ 117 milhões, sendo que a maior parte desses recursos veio de fazendas e propriedades na área rural.
Entre outros inúmeros problemas, a agricultura do Reino Unido é famosa por utilizar fartamente a mão de obra de imigrantes estrangeiros (algumas fontes afirmam que 98% desses trabalhadores são estrangeiros), onde parte considerável está em situação ilegal, trabalhando em condições deploráveis e em troca de baixíssimos salários. Essa questão nunca chamou muito a atenção dos britânicos, que em sua imensa maioria vivem nas áreas urbanas.
Porém, com a chegada do Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia em 2020, a questão começou a se tornar extremamente problemática. Muitos dos estrangeiros que trabalhavam na agricultura dos países que formam o Reino Unido vinham de países do Leste Europeu e se valiam das políticas de livre circulação e de trabalho do bloco.
Com a saída do Reino Unido da União Europeia todas as facilidades trabalhistas para esses estrangeiros foram encerradas. A situação piorou logo depois com o início da pandemia da Covid-19 e introdução de uma série de medidas que coibiam a circulação de pessoas. Trabalhadores em situação irregular foram obrigados a sair do Reino Unido e a voltar para os seus países de origem.
Durante os primeiros meses da pandemia, faltaram braços para colher frutas, legumes e verduras nas fazendas locais. A situação foi agravada pela falta de mais de 120 mil motoristas de caminhões em todo o Reino Unido, classe também formada em grande parte por imigrantes (legais e ilegais) de países do Leste Europeu.
Mesmo não tendo responsabilidade legal direta por toda essa série de problemas de mão de obra na agricultura, o agora Rei Charles III sempre foi bastante beneficiado com a arrecadação dos impostos dos produtores rurais – moralmente, ele tem “alguma culpa no cartório”, como costumamos falar aqui no meu bairro.
As atividades agrícolas também são grandes emissoras de gases de efeito estufa, que são os maiores responsáveis pelo aquecimento global. Muitos países europeus, inclusive, estão tomando uma série de medidas para reduzir essas emissões. Será que o Reino Unido, agora sob “nova direção”, vai seguir o exemplo de países como a Holanda e forçar seus agricultores a reduzir drasticamente as suas emissões?
Como sempre comentamos nas postagens aqui do blog, é muito fácil para os Governantes e líderes de muitos países da Europa falar das queimadas e da destruição da Floresta Amazônica, jogando a maior parte da responsabilidade do aquecimento global em nossas costas. Já as pesadas emissões feitas por lá desde meados do século XVIII, início da Revolução Industrial, isso sempre é deixado de lado.
Desejamos vida longa ao novo Rei e esperamos que as suas antigas manifestações espetaculosas e preocupações ambientais agora se transformem em políticas de Estado do Reino Unido. A dupla moral de muitos líderes mundiais já passou dos limites.
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