ÁGUAS DA TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO COMEÇAM A CHEGAR AO RIO GRANDE DO NORTE 

O dia de hoje marca um verdadeiro e literal divisor de águas para a Região do Semiárido Brasileiro – o Governo Federal está inaugurando o último trecho do Eixo Norte do PISF – Projeto de Integração do Rio São Francisco, e as águas começam a chegar ao Rio Grande do Norte. Independentemente de qual grupo político concluiu as obras e que está fazendo a inauguração, esse será um marco na vida de milhões de nordestinos. 

O Semiárido Brasileiro é a região semiárida mais densamente povoada do mundo – ao redor de 25 milhões de pessoas vivem em uma área com cerca de 900 mil km². Para efeito de comparação, o Saara, o maior deserto do mundo com seus 9,2 milhões de km², sustenta uma população de 2,5 milhões de pessoas. 

A baixa disponibilidade de recursos hídricos no Semiárido Nordestino é um drama multissecular na região. O Semiárido enfrenta períodos cíclicos de secas com excepcionais proporções. Notas de antigos cronistas, testemunhas oculares, médicos e jornalistas, além de registros dos Governos, falam de grandes secas em 1744 e em 1790. Registros históricos documentam detalhadamente as grandes tragédias de 1846, 1877, 1915, 1932, 1951 e 1979.  

Entre 2012 e 2015, o Semiárido viveu uma estiagem comparável à grande seca de 1915, evento que acabou imortalizado na literatura brasileira décadas depois com a publicação do romance O Quinze, de Rachel de Queiróz. Os impactos dessa seca só não foram maiores devido aos diversos programas de transferência de renda implementados por diferentes Governos e à distribuição de água através de caminhões pipa pelo Exército Brasileiro. 

De acordo com registros históricos, a ideia de realizar uma obra de engenharia que permitisse a transposição das águas do Rio Francisco na direção de áreas assoladas por secas frequentes remonta a meados do século XIX, época do reinado de Dom Pedro II. Nesta época, apesar das boas intenções dos idealizadores, o projeto não poderia ser realizado por falta de tecnologias e recursos de engenharia adequados. Citando um único exemplo: a tecnologia para bombear a água a grandes alturas com o uso da eletricidade só estaria disponível 50 anos depois.  

A discussão acerca de um sistema de transposição voltou a ser considerada nas décadas de 1940, época do Governo Vargas, e 1980, no Governo do Presidente João Batista de Figueiredo. Em 1994, durante o Governo do Presidente Itamar Franco, foi iniciado um estudo sobre os potenciais hídricos das bacias hidrográficas do Semiárido nos Estados de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, estudos que prosseguiram durante o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.   

Em 2007, já no Governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva, um projeto de transposição das águas do Rio São Francisco começou a ser implantado, com obras sendo executadas por batalhões especializados em engenharia do Exército Brasileiro e por construtoras privadas. Depois de inúmeros atrasos, suspeitas de fraude e superfaturamentos, o primeiro trecho do Eixo Leste do Sistema de Transposição do Rio São Francisco foi inaugurado oficialmente no início de março de 2017 pelo Presidente Michel Temer, que havia assumido o Governo após o impeachment da Presidente Dilma Rousseff em 2016.  

Projeções oficiais do Governo Federal estimavam que, quando as obras do projeto estivessem totalmente concluídas, o sistema de transposição das águas do rio São Francisco poderia atender até 12 milhões de pessoas nos Estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, levando as águas do Rio São Francisco para uma extensa área do Semiárido. Infelizmente, como todos sabemos, as coisas não saíram exatamente como muitos haviam sonhado ao longo de muitas gerações.  

Orçadas inicialmente em R$ 4,5 bilhões e com previsão de conclusão em 5 anos, as arrastadas obras do PISF entraram num nada seleto conjunto de obras superfaturadas e mal feitas, onde o principal objetivo dos governantes e autoridades de plantão era o desvio de verbas públicas. Os poucos trechos inaugurados, rapidamente passaram a apresentar problemas de vazamentos de água, estações de bombeamento estavam trabalhando com capacidade muito abaixo do projetado e grandes trechos de canais foram abandonados inconclusos. De acordo com os últimos levantamentos, os custos das obras já superaram a barreira dos R$ 14 bilhões.  

Desde que assumiu o Governo em 2019, o Presidente Jair Bolsonaro vem pregando a continuidade e conclusão de obras federais que estavam paradas, o que inclui as obras do Projeto de Integração do rio São Francisco. Obras abandonadas foram sendo retomadas, outras precisaram ser refeitas e algumas obras complementares passaram a ser pensadas. Pouco a pouco o PISF foi ganhando corpo e forma, com sucessivas inaugurações de trechos.   

A chegada dessas águas em diferentes regiões dos sertões do Semiárido não vai resolver o problema da seca, mas poderão ajudar muito. Existe um limite para a quantidade de água que pode ser retirada da calha do rio São Francisco e o próprio Sistema de Transposição tem seus limites. A chegada das águas a toda uma infinidade de pequenas cidades e vilas espalhadas pelos sertões dos Estados atendidos pelo projeto também vai depender da conclusão de um sem número de pequenas obras de canais, adutoras e açudes.   

Grande parte dessas obras complementares são de responsabilidade de Estados e Municípios que, como se sabe, costumam não ter recursos suficientes para isso e dependerão da liberação de verbas do Governo Federal. Aqui se abre todo um “leque” de chances para se desviar dinheiro público nessas obras e muitos políticos locais já sonham em “encher seus próprios bolsos”. Será preciso ficar atento e fiscalizar o uso dessas verbas com “lupa”.  

Apesar de todas as dificuldades que ainda serão enfrentadas ao longo desse caminho, é preciso que se continue a perseguir o sonho de acabar, ou ao menos amenizar, as agruras provocadas pelas fortes estiagens no Semiárido Nordestino. A conclusão das obras dos dois Eixos do Programa de Integração do rio São Francisco é um marco, mas não deve ser visto como um objetivo final. 

Um dos principais projetos complementares do sistema, o Ramal do Agreste em Pernambuco, já está praticamente finalizado. Outros dois subsistemas – o Ramal do Apoti, no Rio Grande do Norte, já está com obras em andamento, e o Ramal do Salgado, no Ceará, está em processo de licitação. Cada um desses ramais possui dezenas de derivações que vão levar as águas para cidades e vilas sertanejas. Além desses subsistemas, muitos outros precisarão ser feitos. 

Imagens de vertedouros de açudes liberando águas e de pessoas nadando nos diferentes canais vem inundando as redes sociais e mostrando a felicidade das populações sertanejas. Como se diz no popular, “essas imagens não tem preço!”

Faço votos que as ambições políticas dos diferentes grupos que governam cidades, Estados e Governo Federal fiquem de lado e que o abastecimento de água das populações continue sendo a prioridade absoluta. Depois de séculos de luta contra a seca, chegou a hora de virarmos essas páginas dolorosas da história do Semiárido Brasileiro.

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