
Diversas regiões brasileiras vêm sofrendo com as fortes chuvas nessas últimas semanas. A bola da vez é a Região Metropolitana de São Paulo e partes do interior do Estado que, desde o último final de semana, vem recebendo volumes de chuva muito acima das médias histórias.
Conforme apresentamos em postagem anterior, entre as cidades mais fortemente atingidas estão Franco da Rocha, Francisco Morato e Caieiras, todas na Região Metropolitana de São Paulo. De acordo com dados do Governo do Estado, as fortes chuvas já deixaram ao menos 24 mortos e um enorme rastro de destruição.
Outro país que está sofrendo com as fortes chuvas é o Equador, único país Amazônico que não faz fronteira com o Brasil. A precipitação pluviométrica acumulada em Quito, a capital do país, está sendo da ordem de 75 mm por metro quadrado nos últimos dias. Esse índice está superando em mais de 30 vezes as estimativas dos meteorologistas para esse período e estão sendo consideradas as chuvas mais fortes dos últimos 20 anos.
Quito tem uma população da ordem de 2 milhões de habitantes e é a segunda maior cidade do Equador. A cidade é famosa pelo seu centro com arquitetura colonial perfeitamente preservada, local que sempre atrai a atenção dos turistas estrangeiros. A mancha urbana da cidade se espreme entre os morros de um planalto aos pés da Cordilheira dos Andes.
Muitos bairros populares da cidade, que lembram muitos seus congêneres em grandes cidades brasileiras, cresceram desordenadamente ocupando as encostas de morros – nada muito diferente do que encontramos em Franco da Rocha e Francisco Morato, algumas das cidades da Região Metropolitana de São Paulo mais afetadas pelas últimas chuvas. São construções precárias em áreas de risco, onde uma chuva mais intensa pode resultar em desmoronamentos.
E foi justamente isso o que aconteceu – um deslizamento numa encosta de um morro entre os bairros de La Gasca e La Comuna, no norte de Quito, soterrou várias casas e deixou 14 mortos e 32 feridos até o momento (vide foto). Ao menos 9 pessoas estão desaparecidas. O acidente aconteceu nessa última segunda-feira, dia 31 de janeiro,
No total, 22 das 24 províncias do país estão sendo afetadas pelas fortes chuvas. Até o último dia 30 e, portanto, antes da ocorrência do desmoronamento do morro em Quito, o número de mortos em razão das chuvas chegava a 18 vítimas, com 24 feridos e mais de 2.800 pessoas desabrigadas e/ou desalojadas.
A Floresta Amazônica, localizada na faixa Leste do país, cobre cerca de metade do território do Equador e concentra os maiores volumes de chuva. Nessa região, o período de chuvas mais intensas se concentra entre os meses de julho e agosto. Ao longo da costa do Oceano Pacífico, a temporada das chuvas se estende entre os meses de dezembro e maio e na região dos planaltos andinos, onde fica a cidade de Quito, entre os meses de janeiro e maio.
Assim como vemos em grande parte do Brasil, o Equador possui grandes problemas de infraestrutura, especialmente quando se fala em rodovias. É justamente na temporada das chuvas que esses problemas se sobressaem. Além de grande parte do país ser coberta pela Floresta Amazônica, onde estradas sem pavimentação sofrem com a lama na época das chuvas, existem as dificuldades com o relevo ao longo da Cordilheira dos Andes e nos planaltos vizinhos.
Com as chuvas intensas, a população está sofrendo com estradas cobertas por rios de lama nas florestas ou bloqueadas pelos desmoronamentos de encostas nos trechos ao largo das serras e montanhas. Nas cidades, os problemas vão das enchentes localizadas e transbordamento de córregos ao desmoronamento de encostas de morros como o visto em Quito. Todos esses problemas são bem familiares aos moradores de grandes e médias cidades brasileiras.
As notícias ligadas às chuvas eclipsaram em parte as tradicionais notícias sobre derramamentos de petróleo, tipo de acidente muito comum na região da Floresta Amazônica no país. O Equador é um grande produtor de petróleo, concentrando a maior parte da produção em campos no interior da Amazônia.
Na última sexta-feira, dia 28 de janeiro, houve mais um grande derramamento de petróleo. O vazamento atingiu um rio que abastece diversas comunidades indígenas e que atravessa uma reserva ambiental. Essa reserva tem uma área de 403 mil hectares e abriga uma enorme variedade de espécies animais e vegetais. Criada em 1970, a área fica no Nordeste do Equador, se estendendo entre as províncias andinas de Pichincha e Imbabura, além das províncias amazônicas de Sucumbíos e Napo. O rio Coca, atingido pelo derramamento, é um dos principais da Amazônia equatoriana.
Conforme tratamos em uma postagem anterior, o Equador sofre com constantes vazamentos de petróleo. Aliás, a maior ameaça ao trecho equatoriano da Floresta Amazônica não são os desmatamentos (que são grandes no país), mas sim os derramamentos de óleo, principalmente nas águas dos rios da região.
A extração comercial de petróleo na Amazônia equatoriana começou na década de 1960, apresentando um forte crescimento na década de 1970, quando grandes petrolíferas internacionais como a Shell e a Texaco começaram a operar no país. Cerca de 68% da área da Amazônia equatoriana está sob concessão para a exploração petrolífera e se estimam em mais de 4 mil o número de poços de petróleo na região.
Além dos problemas associados diretamente à extração do óleo nos poços, existem grandes dificuldades para o transporte do petróleo para os grandes centros consumidores e também para a exportação nos portos do país. Entre a Floresta Amazônica e esses consumidores existe uma Cordilheira dos Andes no caminho. A maior parte do petróleo é transportada por meio de oleodutos.
A Cordilheira dos Andes é sujeita a frequentes abalos sísmicos – a imensa maioria de baixa intensidade, porém fortes o suficiente para danificar as tubulações desses oleodutos. Um exemplo desse tipo de acidente foi o que ocorreu em abril de 2020, quando um deslizamento de terra provocado por um abalo sísmico rompeu uma tubulação do SOTE – Sistema Oleoduto Transecuatoriano. O acidente provocou um vazamento estimado entre 4 mil e 15 mil barris de petróleo.
Esse oleoduto tem cerca de 500 km de extensão e está em operação desde 1972. A mancha de óleo atingiu os rios Coca (o mesmo atingido nesse último acidente) e Napo, afetando o abastecimento de 2 mil famílias indígenas e outros 120 mil ribeirinhos. Esse foi considerado o maior vazamento de petróleo no Equador nos últimos 15 anos.
Esse novo acidente veio se juntar a outras centenas de ocorrências do mesmo tipo no país nos últimos anos. As empresas petrolíferas internacionais respondem judicialmente a centenas de processos e já acumulam vários bilhões de dólares em multas a pagar. Porém, devido à importância da indústria petrolífera para o Equador, esses “pequenos” problemas vão sendo empurrados com a barriga e a justiça nunca chega aos responsáveis por essas empresas e as autoridades do país.
Entre as fortes chuvas anuais e os grandes vazamentos de petróleo de sempre, os 18 milhões de equatorianos vão tentando levar a vida…