
No início da manhã desta terça-feira, dia 1° de fevereiro, um trecho das obras de construção da Linha Laranja do sistema de transporte metroviário de São Paulo, o famoso Metrô, desabou. O acidente provocou a interrupção da circulação de veículos em grande parte da cidade, criando um verdadeiro caos.
Um trecho da Marginal Tietê, uma das mais importantes avenidas da cidade, foi bloqueado. No local se formou uma cratera com um diâmetro de 80 metros ou mais. A Marginal Tietê interliga diversas avenidas da cidade com várias rodovias que chegam do interior a capital paulista. Os congestionamentos que se formaram são quilométricos.
O desabamento ocorreu em um trecho de escavação dos túneis próximo da Ponte do Piqueri, chamada oficialmente de Ponte Joelmir Beting, na Zona Oeste da Cidade. Segundo informações levantadas com alguns funcionários da obra, no local está em operação um equipamento de escavação de túneis, conhecido popularmente como tatuzão.
Segundo essas mesmas fontes, o equipamento começaria a escavação de um túnel por baixo da calha do rio Tietê já nos próximos dias. Não se sabe ao certo se houve um afundamento dos solos de uma das margens do rio Tiete ou se houve a ruptura de alguma tubulação de esgotos ou de águas pluviais. O túnel acabou sendo inundado e a força da correnteza provocou uma forte erosão dos solos, o que resultou no afundamento de um grande trecho das pistas da Marginal Tietê.
De acordo com estudos da CET – Companhia de Engenharia de Tráfego do município de São Paulo, existem mais de 8,6 milhões de veículos automotores na cidade. Esse número inclui carros, motos, ônibus e caminhões. Além da frota urbana, a cidade recebe diariamente dezenas de milhares de caminhões vindos de todo o Brasil e de países vizinhos.
A Marginal Tietê atravessa grande parte da cidade no sentido Leste-Oeste e funciona como uma verdadeira espinha dorsal para a circulação de grande parte desses milhões de veículos. Dá para imaginar facilmente o tamanho do caos que se instalou na cidade.
A construção de sistemas de transporte em massa como trens, metrôs e corredores de ônibus vem sendo uma das apostas do poder público para diminuir a necessidade do uso de veículos particulares pela população. A cidade de São Paulo adota um sistema de rodízio de veículos há mais de 30 anos como forma de reduzir o tamanho dos congestionamentos e também a poluição do ar.
A Linha Laranja do Metrô é um dos novos projetos em execução, tendo a expectativa de transportar perto de 600 mil passageiros/dia. A linha vai ligar o bairro da Liberdade, na região central, com a região da Vila Brasilândia, na Zona Norte da cidade. A linha terá uma extensão total de 15 km.
Para que todos tenham ideia do impacto dessa obra – um morador da Vila Brasilândia gasta cerca de uma hora e meia para seguir de ônibus até o centro da cidade. Usando o Metrô, o tempo do percurso cairá para cerca de meia hora. Além de toda essa comodidade, a plena operação dessa linha do Metrô vai retirar dezenas de milhares de carros de circulação. Nós paulistanos, não sem razão, adoramos o Metrô.
Apesar de toda a sua importância, a Linha Laranja vem tendo a sua construção cheia de altos e baixos. Havia uma previsão inicial para o início das obras para o ano de 2010, porém, depois de diversos adiamentos, só foram iniciadas em 2015 e com a previsão de entrega para 2020.
Em 2016, as obras foram paralisadas por tempo indeterminado. As empresas construtoras alegavam dificuldades na liberação de R$ 5,5 bilhões de financiamento pelo BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.
Em 2018, um grupo de investidores brasileiros, japoneses e chineses anunciou que assumiria as obras. Esse grupo acabou desistindo da empreitada logo depois. Em 2020, um consórcio de empresas do Brasil e da Espanha assumiu as obras, estabelecendo como prazo de entrega o ano de 2025.
Com o acidente de hoje e com todas as repercussões políticas, sociais e econômicas decorrentes, é difícil saber qual será o tamanho do atraso nas obras. A única certeza que temos é que o custo das obras vai aumentar ainda mais, o que não é nenhuma novidade aqui no nosso país. Pior ainda – a tão esperada inauguração da linha tardará ainda mais para chegar.
O empurra-empurra sobre as responsabilidades pelo acidente já começou. Em nota, autoridades do Governo do Estado já empurraram a responsabilidade para o colo do consórcio construtor, isso sem ainda se ter certeza se o acidente foi provocado pelas obras de escavação, pelas chuvas ou por qualquer outra coisa. A única certeza que nós paulistanos temos é que a circulação de veículos e de pessoas nos próximos meses será mais complicada que o normal.
Eu tenho muitos anos de experiência de trabalho em obras de redes coletoras de esgotos. A escavação dos solos de áreas urbanas é sempre cheia de surpresas. Não é incomum encontrarmos erros na indicação dos trajetos subterrâneos das redes de água, esgoto, gás, águas pluviais, redes elétricas e de telecomunicações nas plantas e mapas das cidades.
Antes de começar a escavar o leito de uma rua ou avenida, é sempre feito um estudo preliminar para saber se existe ou não alguma obra subterrânea já feita naquele local. A Prefeitura da cidade, inclusive, precisa emitir uma autorização para liberar o início das obras. E, mesmo assim, a gente sempre acaba encontrando alguma surpresa – algumas perigosas como redes de gás encanado.
Um amigo meu passou por um grande apuro certa vez – sua empresa foi contratada para fazer uma obra de manutenção numa rede de esgoto na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Após estudar todas as plantas do local e ter todas as autorizações, ele e sua equipe começaram a escavar o solo. Após alguns poucos minutos, a escavadeira puxou uma rede de cabos, que não era nada menos que o sistema de cabos de telefonia e de dados do Palácio do Planalto…
Serão necessárias várias investigações para saber com certeza qual foi a causa desse acidente nas obras do Metrô. Em ano eleitoral e em meio a pandemia da Covid-19, podemos esperar toda uma chuva de acusações entre os diferentes grupos políticos de plantão.
Já os problemas de transporte e de circulação de veículos que a população vai enfrentar nos próximos meses, bom, isso será um mero detalhe operacional.