
Na última postagem falamos sobre o trágico acidente ocorrido na Represa de Furnas em Capitólio, Minas Gerais. No sábado, dia 8 de janeiro, um grande bloco de rochas do paredão de um dos canyons da represa desmoronou e atingiu várias lanchas, deixando 10 mortos e ao menos 31 pessoas feridas.
Em meio a inúmeras reportagens com informações sobre essa tragédia, veio a público uma importante nota da Diretoria Executiva da SBG – Sociedade Brasileira de Geologia, sobre o desastre na Represa de Furnas.
Inicialmente, a SBG se solidariza com os familiares das vítimas e expressa as suas condolências. Logo a seguir a nota afirma que, no período entre os anos de 2011 e 2021, o Brasil ocupou a 5ª posição entre todos os países do mundo em número de vítimas associadas a eventos geológicos/geotécnicos. Foram 41 milhões de pessoas afetadas em um total de 42 eventos de grande magnitude registrados. Eu confesso que fiquei assustado com esses números!
Entre esses grandes eventos podemos citar os rompimentos das barragens de rejeitos de mineração em Mariana, em 2015, e em Brumadinho, em 2019, ambos em Minas Gerais. O acidente de Mariana, citando como exemplo, praticamente destruiu toda a calha do rio Doce, afetando a vida de mais de 3 milhões de pessoas em cidades mineiras e capixabas.
A nota da SBG ressalta que o Estado de Minas Gerais está recebendo grandes volumes de chuva, uma situação que aumenta a possibilidade de eventos geológicos e geotécnicos, o que demanda um maior nível de atenção das autoridades municipais, estaduais e federais. Riscos naturais (natural hazards) associados a movimentos de massa são os eventos mais destrutivos e frequentes em regiões de montanhas e de maciços rochosos, como é justamente o caso de Minas Gerais.
A região dos canyons da Represa de Furnas, segundo explicação da SBG, é dominada por afloramentos de quartzito, uma rocha que apresenta uma grande resistência a processos erosivos, mas que quando fraturada é bastante susceptível a processos naturais de intemperismo e ruptura do talude, exatamente o que aconteceu no local do acidente.
A nota ainda afirma que as intensas chuvas que estão caindo na região podem ter potencializado a fratura do bloco de pedras, sendo determinantes para a ocorrência do acidente. Eventos geológicos desse tipo ocorrem naturalmente a milhões de anos e sempre são potencializados nos períodos de chuvas.
O ponto alto da nota, em minha modesta opinião, é uma cobrança por uma postura mais proativa dos Governos dos diversos níveis na prevenção de eventos geológicos e geotécnicos. Todos sabemos que existe uma verdadeira tradição aqui em nosso país em “trocar o cadeado após a porta ter sido arrombada”.
Conforme eu comentei na postagem anterior e que também foi citado na nota da Sociedade Brasileira de Geologia, esses canyons e cachoeiras da Represa de Furnas deveriam ter passado por uma vistoria anterior por peritos em geologia, onde se verificaria o nível de segurança das formações geológicas. Caso algum problema fosse identificado, a área receberia uma sinalização adequada e poderia, inclusive, ter acesso proibido.
E a Represa de Furnas não está sozinha quando se fala na prevenção de riscos de acidentes com os turistas. Existem inúmeras atrações turísticas do mesmo tipo por todo o Brasil, onde se incluem canyons, cavernas, corredeiras, montanhas e outras formações geológicas abertas para a visitação pública e que não possuem laudos de segurança feito por especialistas da área.
Vou citar um exemplo de memória: há pouco mais de dois meses houve o desabamento do teto de uma caverna no município de Altinópolis, cidade do interior do Estado de São Paulo, onde um grupo de bombeiros civis fazia um treinamento. O grupo era formado por 26 pessoas – o saldo foi de 9 mortos e uma pessoa ferida.
O local onde aconteceu esse desmoronamento é conhecido como Gruta Duas Bocas e, segundo as informações divulgadas, era usado com alguma frequência em treinamentos desse tipo, além de receber a visita de muitos turistas. A pergunta que não quer calar: se o local tivesse sido vistoriado por especialistas, muito provavelmente o risco de desabamento teria sido identificado e todas essas vidas teriam sido poupadas.
Outros acidentes evitáveis que frequentemente terminam em grandes tragédias são os desmoronamentos de encostas de morros em áreas urbanas nos períodos de fortes chuvas. A foto que ilustra essa postagem mostra um desses deslizamentos na região serrana do Estado do Rio de Janeiro em 2011. Outro exemplo impressionante foi o do Morro do Bumba, em Niterói, no ano de 2010. Foram encontrados 48 corpos nos escombros, porém, o número de mortos pode ter superado a casa dos 260.
Essa área foi um grande lixão no passado, tendo sido aterrada e ocupada irregularmente ao longo do tempo por centenas de famílias. A ocupação foi crescendo e passou a subir a encosta do morro. Com a destruição da cobertura vegetal da encosta e com os sucessivos recortes do terreno para a construção de novas moradias, o solo perdeu sua capacidade de autossustentação e bastou uma temporada de fortes chuvas para que entrasse em colapso.
Com um bom acompanhamento por profissionais de geotécnica de solos e um mínimo de vontade política da Prefeitura local para resolver a situação, essa grande tragédia com perda de dezenas de vidas humanas poderia ter sido evitada.
O desfecho de mais uma tragédia que poderia ter sido evitada talvez contribua para uma mudança de postura em prefeituras, Governos estaduais e também órgãos do Governo Federal em relação à prevenção de acidentes em estruturas geológicas. Existem milhares de profissionais especializados nessas áreas em todo o país e não será necessário “reinventar a roda” para colocar um pouco de ordem e segurança nesses locais.
Repetindo mais uma vez o velho chavão: prevenir é sempre melhor do que remediar!