
Tóquio, nome que significa literalmente “capital do Leste”, é a capital do Japão e uma das maiores cidades do mundo. A cidade possui cerca de 13,5 milhões de habitantes e é o centro de uma região metropolitana com cerca de 37 milhões de habitantes, uma população maior que a soma das populações das regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro.
A cidade foi fundada formalmente em 1457, quando um nobre construiu o castelo de Edo no local que é hoje conhecido como Baía de Tóquio. Em japonês, Edo significa “estuário” e descreve perfeitamente a região – nada menos que cinco bacias hidrográficas desaguam na baía. Não se poderia ter escolhido um local pior para fundar uma grande cidade.
Ao longo dos séculos, a vida em Tóquio foi marcada por sucessivas enchentes, muitas delas verdadeiras catástrofes. Em 1947, citando um exemplo, o tufão Kathleen atingiu a cidade com fortíssimas chuvas, o que destruiu cerca de 31 mil casas e matou 1.100 pessoas. Dez anos depois foi a vez do tufão Kanogawa que despejou mais de 400 mm de chuvas sobre a cidade em um curto espaço de tempo, causando grandes inundações e muita destruição.
Ao longo das décadas de 1950 e 1960, o Governo do Japão passou a fazer grandes investimentos em infraestruturas para a prevenção de desastres naturais e redução de riscos. Além dos sistemas para o combate às enchentes, as obras incluíam sistemas para a prevenção de tufões e de terremotos, eventos relativamente comuns no país. O Japão passou a investir entre 6% e 7% do PIB – Produto Interno Bruto, nessas áreas, um volume altíssimo para um país que saiu completamente devastado da Segunda Guerra Mundial.
Toda a Região Metropolitana de Tóquio foi dotada de um sem número de barragens, túneis, reservatórios subterrâneos e diques para a contenção dos excessos de águas pluviais nos momentos de forte chuva. Todo esse conjunto de obras conseguiu reduzir grandemente os problemas das enchentes, porém, algumas regiões ainda sofriam com o problema.
Depois de muitos anos de estudos e planejamento, o Governo japonês iniciou a construção do Canal Subterrâneo de Escoamento da Área Metropolitana no início da década de 1990. Esse conjunto de obras foi concluído em 2006, a um custo de US$ 2 bilhões (algumas fontes citam US$ 3 bilhões), em valores há época, sendo considerado o maior sistema para o controle de fluxo de água do mundo.
Aqui eu abro um parêntese – o investimento feito pelos japoneses parece, a princípio, ser extremamente alto. Considerando o valor médio do dólar em R$ 2,20 em 2006, chegamos a um investimento de R$ 4,4 bilhões. Para efeito de comparação, somente a primeira fase do projeto de rebaixamento da calha do rio Tiete, que tinha como objetivo resolver os problemas das enchentes na cidade de São Paulo e que foi concluído em 2005, custou R$ 1 bilhão e não resolveu o problema.
O sistema de drenagem de Tóquio é formado por um conjunto de grandes depósitos subterrâneos de água e por um sistema de túneis. Na calha dos principais rios foi instalada uma tubulação de drenagem, com 30 metros de diâmetro e 70 metros de profundidade.
Quando o nível desses rios se aproxima do limite de segurança, a água excedente passa a ser escoada por essas tubulações e é encaminhada para os depósitos subterrâneos. O sistema pode drenar um volume equivalente a 200 metros cúbicos de água por segundo.
O sistema tem uma capacidade de armazenamento de 670 mil metros cúbicos de água. Conforme o nível dos rios começa a baixar, um poderoso sistema de bombas é acionado e essa água acumulada é lançada na calha do rio Edo, o principal de Tóquio. Uma curiosidade – essas bombas conseguem esvaziar uma piscina olímpica de 25 metros em apenas 3 segundos.
Esse sistema é idêntico ao dos piscinões usados em cidades como São Paulo, porém, de dimensões muito maiores. Um exemplo é o piscinão que foi construído na Praça Charles Miller em frente ao famoso Estádio do Pacaembu. Essa região era famosa pelas fortes enchentes, um problema que foi finalmente resolvido com a conclusão desse piscinão em 1995.
O último tanque do sistema de Tóquio é chamado de a catedral e foi transformado em uma atração turística da cidade (vide foto). Esse tanque tem 177 metros de comprimento e uma altura de 18 metros, equivalente a um prédio de 6 andares. A construção lembra muito a cisterna subterrânea do bairro de Sultan Ahmet, no coração de Istambul, na Turquia, porém em dimensões muito maiores.
Apesar de causar um enorme orgulho para a engenharia do país, os japoneses já estão pensando no futuro dessa grande obra. Quando o projeto foi idealizado décadas atrás, foram considerados volumes máximos de chuva acumulada de 50 mm por hora, o que atendia as necessidades da época. Entretanto, as estimativas indicam que as chuvas na capital do Japão irão aumentar em cerca de 10% ao longo do século XXI, podendo chegar a picos 19% maiores durante o verão.
As mudanças climáticas já em andamento tendem também a aumentar a incidência de tufões sobre as ilhas japonesas e também há o problema do aumento do nível dos oceanos. Somente na cidade de Tóquio, estima-se que 2,5 milhões de pessoas vivam em áreas sujeitas ao avanço do nível do mar. É hora de pensar no futuro, se antecipando a esses eventos.
Enquanto isso, nós brasileiros continuamos sofrendo com as enchentes ano após ano, verão após verão. Nas áreas centrais da cidade de São Paulo, citando um exemplo, muitos dos problemas atuais são exatamente os mesmos vividos na época em que meus bisavôs chegaram ao país no início do século XX.
Além da falta de planejamento e de visão a longo prazo, nós sofremos de um mal que é infinitamente menor no Japão – corrupção e desvios de verbas públicas. Os poucos recursos que conseguem efetivamente ser destinados a obras de combate às enchentes acabam sendo mal utilizados e os problemas nunca são resolvidos.
Também existem o problema de falta de investimentos na construção de moradias populares, o que leva centenas de milhares de famílias a ocupar áreas de risco em encostas de morros, além de margens e várzeas de rios – basta uma chuva mais forte para assistirmos grandes tragédias a exemplo da que devastou Petrópolis na Região Serrana do Rio de Janeiro.
E esses problemas, conforme citamos no texto, tenderão a piorar nos próximos anos devido as mudanças climáticas. Pobres de nós brasileiros!