FALANDO UM POUCO DO SISTEMA DE GERAÇÃO ELÉTRICA DO BRASIL E DOS SEUS PROBLEMAS

O século XIX foi um dos mais empolgantes para o desenvolvimento das ciências. Antigos dogmas e afirmações religiosas que, durante muitos séculos, responderam a muitas questões científicas, pouco a pouco foram sendo deixados de lado e as ciências passaram a ser o caminho em busca das respostas à inúmeras perguntas que há muito estavam em aberto. 

Pessoalmente, eu vejo a publicação do livro “A origem das espécies”, por Charles Darwin em 1859, como o grande divisor de águas entre a ciência e a religião. Usando de forte base analítica acumulada através de muitos anos de observações, especialmente ao longo da lendária expedição ao redor do mundo no navio da Marinha Real Britânica HMS Beagle, Darwin propôs que as espécies evoluem ao longo do tempo e os indivíduos que melhor se adaptam ao meio ambiente sobrevivem e garantem a perpetuação das suas linhagens. Líderes religiosos abominaram essa ideia (muito abominam até hoje). 

Um dos ramos científicos que mais se desenvolveu há época foram os estudos para o uso da eletricidade. Os fenômenos elétricos eram conhecidos e estudados já há muito tempo, mas foi no século XIX que a eletricidade ganhou as suas primeiras aplicações práticas e começou a mudar o dia a dia das pessoas. Uma das mais empolgantes invenções nessa área foi a lâmpada elétrica, um feito que envolve inúmeros pesquisadores a partir da década de 1830 – a primeira lâmpada funcional e comercialmente viável foi apresentada por Thomas Edison em 1879

A história da eletricidade no Brasil tem fortes ligações com Thomas Edison e começou em 1876, ano em que o Imperador Dom Pedro II viajou para os Estados Unidos para participar das comemorações do primeiro centenário da independência do país.  

Durante a longa estadia em terras norte-americanas, Dom Pedro II, que era reconhecidamente um amante das artes e das ciências, conheceu grandes inventores e empreendedores, com destaque para Alexander Gram Bell, criador de um sistema funcional de telefonia (ainda existem questionamentos quanto ao inventor do aparelho) e Thomas Edison, que há época estava aperfeiçoando a sua lâmpada elétrica com filamento de carbono. 

De acordo com Renato Diniz, pesquisador da história da energia elétrica, foi graças a esse contato inicial entre Thomas Edison e Dom Pedro II que, em 1879, o Governo brasileiro assinou um contrato com a empresa Edison Eletric Light Co. para a concessão e operação de um sistema de iluminação elétrica em estações da Estrada de Ferro Dom Pedro II. 

Uma outra experiência pioneira do uso da eletricidade aqui no Brasil se deu em 1891, quando foi criada uma linha de bondes elétricos ligando o Largo do Machado ao bairro do Flamengo, uma iniciativa que não durou muito por falta de capitais. Em 1895, a empresa belga SAG – Société Anonyme du Gaz, obteve a primeira concessão para exploração da eletricidade na iluminação pública. Todas essas iniciativas acabaram fracassando devido a um problema comum: a geração de energia elétrica há época era realizada em usinas térmicas a carvão, um insumo que era importado e tinha altos custos aqui no Brasil. 

O território brasileiro é, conforme já tratamos em inúmeras postagens anteriores, extremamente pobre em reservas de carvão mineral. Uma das poucas exceções é uma faixa de terras no Sul do Estado de Santa Catarina onde se encontram reservas de carvão de baixa qualidade. Essa falta de carvão, inclusive, está na raiz de grandes desmatamentos em locais como Minas Gerais – as florestas foram sistematicamente derrubadas e transformadas em carvão vegetal para uso na siderurgia. 

A salvação energética do país veio, felizmente, a partir do aproveitamento dos nossos gigantescos recursos hídricos. A primeira unidade geradora de energia elétrica instalada no Brasil remonta ao ano de 1883, no Ribeirão do Inferno, em Diamantina – Minas Gerais. A eletricidade dessa unidade era gerada por um pequeno dínamo ligado a uma roda de água e era usada exclusivamente para acionar bombas de água em uma mina de diamantes. 

A Usina de Marmelos (vide foto), na Zona da Mata Mineira, é considerada a primeira usina hidrelétrica a entrar em operação comercial no Brasil e na América do Sul, mostrando a importância da iniciativa privada na história da eletrificação do país. Marmelos iniciou suas operações em 1889 com dois conjuntos geradores de 125 kW e, gradativamente, foi ampliando a sua potência instalada até atingir 4 MW. A antiga unidade geradora foi descontinuada em 1980 e transformada em um espaço cultural. Duas novas unidades geradoras, Marmelo I e II, foram construídas e continuam em operação. 

Essas experiências pioneiras marcaram o início da construção e operação de uma infinidade de centrais hidrelétricas por todo o Brasil, uma fonte que chegou a responder por cerca de 90% de toda a energia elétrica gerada em nosso país. Há cerca de dois anos atrás nós publicamos uma série de postagens falando bastante sobre a geração de energia elétrica a partir de fontes hidráulicas aqui no Brasil – Água e geração de energia. Siga o link para acessar as postagens. 

De acordo com dados da ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica, o Brasil encerrou o ano de 2020 com uma capacidade instalada de 174.412,6 MW de potência fiscalizada – existem diversos novos empreendimentos em construção. Desse total em operação, 74,76% das usinas são impulsionadas por fontes consideradas sustentáveis, com baixa emissão de gases do efeito estufa – usinas hidrelétricas, eólicas e fotovoltaicas

Segundo informações da CCEE – Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, a maior fonte de geração de energia elétrica no Brasil é a hidráulica, com 875 usinas Hidrelétricas, CGH – Centrais Geradoras Hidrelétricas e PCH – Pequenas Centrais Hidrelétricas. A segunda maior fonte geradora são as centrais eólicas com 615 parques disponíveis, sobretudo nas regiões Nordeste e Sul.  

O sistema de geração de energia elétrica brasileiro ainda conta com 114 parques solares fotovoltaicas e 401 usinas termelétricas. A maioria das usinas termelétricas, que somam 286 empreendimentos, opera a partir da queima da biomassa da cana-de-açúcar. O parque gerador conta ainda com 48 termelétricas a gás, 44 a óleo, 10 a base de carvão mineral, duas nucleares e outras 11 usinas mistas que podem ser utilizar bicombustíveis ou até mesmo reação exotérmica

As fontes hidráulicas respondem sozinhas por cerca de 62% da geração de energia elétrica no Brasil, algo que coloca nosso país em uma posição de destaque no cenário mundial. Infelizmente, existe um, porém nessa história – a geração contínua a partir das fontes hidráulicas depende da regularidade das chuvas, algo que nem sempre acontece da forma esperada.  

O ano de 2020 teve chuvas abaixo da média em regiões que concentram importantes reservatórios de usinas hidrelétricas. A partir do final de 2020, os efeitos do fenômeno climático La Niña começaram a criar mais problemas, reduzindo as chuvas no Sudeste e Centro-Oeste, regiões que concentram a maior parte das usinas hidrelétricas do Brasil. Ao longo de 2021, as chuvas devem continuar abaixo da média.

Segundo dados da ANA – Agência Nacional de Águas, do dia 16 de maio de 2021, o volume equivalente no SIN – Sistema Interligado Nacional, estava em 55,57%. Há exato um ano atrás esse volume estava em 66,75%. Como a maior parte do país entrou no período da seca, a tendência será a redução contínua desses volumes de água até a chegada do período das chuvas no final do ano. Segundo as autoridades do setor, não há riscos de falta de energia ou necessidade de racionamento de energia neste ano de 2021. 

Os riscos ficam para 2022, ano em que todos esperamos já ter superado a pandemia da Covid-19 e ansiamos por ver a nossa economia voltando a acelerar forte. Lembrando – quanto maior a atividade econômica, maior a demanda por energia. Se, eventualmente, tivermos chuvas abaixo da média a partir do final do ano e insuficientes para reabastecer os nossos reservatórios, aí sim teremos grandes problemas num futuro bem próximo. 

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