AMAZÔNIA SUSTENTÁVEL: AS SURPREENDENTES FRUTAS NATIVAS DA FLORESTA AMAZÔNICA

A Estação das Docas é uma das muitas atrações turísticas da cidade de Belém do Pará. Inaugurado no ano 2000, o complexo turístico ocupou velhos armazéns do antigo porto da cidade. A Estação das Docas possui uma área total com mais de 32 mil m² com diversas opções de gastronomia, lojas de artesanato e moda, além de espaços para eventos. 

Na primeira vez que visitei o local, há cerca de dez anos, fiquei intrigado com uma placa em um restaurante que anunciava um tal de “bacuribeer”. Conversando com um dos garçons, descobri tratar-se de uma cerveja artesanal local onde se acrescenta o suco do bacuri, uma fruta da região. Apesar de ser um fiel seguidor da Reinheitsgebot ou Lei da Pureza da Cerveja, uma antiga norma alemã de 1516 que determinou que a bebida só poderia ser preparada com água, malte de cevada e lúpulo, resolvi arriscar. A bebida paraense é uma delícia. 

O bacuri é apenas uma entre dezenas de frutas (incluo na aqui os frutos) tipicamente amazônicas encontradas nos mercados da região e que são usadas na preparo de pratos, sucos, geleias e doces. São os sabores únicos dessas frutas que, muitas vezes, dão aquele toque especial e genuíno à gastronomia da Amazônia. 

De acordo com informações da EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias, existem mais de 500 espécies de frutas no Brasil, sendo que mais de 40% são encontradas na Região Amazônica. Estudos já realizados mencionam mais de 220 plantas produtoras de frutas e frutos na região, porém, são poucas as espécies já “domesticadas”, ou seja, plantas que foram selecionadas artificialmente para produzir frutas e frutos mais saborosos, maiores ou em maior quantidade. Considerando-se o tamanho da Floresta Amazônica e a quantidade de estudos que ainda precisam ser feitos, devem existir muitos mais frutas e frutos a serem descobertas. 

Segundo a EMBRAPA, o Brasil é o segundo lugar do mundo em quantidade de frutas, só perdendo para o Sudeste Asiático. Os estudos na Região Amazônica foram iniciados em 1939 com a criação do IAN – Instituto Agronômico do Norte, com sede em Belém do Pará, instituição que deu origem à EMBRAPA Amazônia Oriental. Posteriormente, foi criada a EMBRAPA Amazônia Ocidental com sede em Manaus, no Estado do Amazonas. 

Os pesquisadores da instituição afirmam que a Floresta Amazônica é um dos últimos redutos do mundo com plantas potenciais à espera de domesticação e ressaltam a importância da preservação do bioma. A derrubada das matas para a extração de madeira pode acabar com diversas espécies de frutas e frutos. Dois exemplos de frutos que eram muitos comuns nos mercados da região, mas estão se tornando cada vez mais raros e caros são o já citado bacuri (Platonia insignis Mart.) e o pequiá (Caryocar villosum). A explicação é simples: a madeira das árvores produtoras desses frutos é de ótima qualidade e de grande valor comercial. 

Especula-se que a humanidade começou a domesticar frutas e frutos há cerca de 10 mil anos, praticamente na mesma época em que teve início a agricultura. Durante esse processo, os agricultores buscavam as plantas que davam frutos mais saborosos, maiores e em maior quantidade, criando assim uma seleção artificial. Com o passar do tempo, foram desenvolvidas as técnicas de enxerto, o que permitiu combinar as características de duas plantas diferentes e possibilitou o desenvolvimento de novas variedades. Frutas comuns em nosso dia a dia como maçãs, laranjas e bananas, vêm passando por esses processos há milhares de anos.  

Na Amazônia, o processo de domesticação de plantas começou quando a região começou a ser ocupada por diferentes povos vindos das Américas Central e do Norte. Essa domesticação de plantas era essencial para a sobrevivência desses povos e tinha em seu bojo conhecimentos anteriores de trabalhos feitos com plantas em outras regiões. 

Um exemplo da importância de novos conhecimentos sobre as frutas e frutos da Amazônia é o açaí, um dos alimentos mais importantes da Amazônia e que vem conquistando mercados em todo o Brasil e em muitos países do mundo. Também podemos citar outras frutas e frutos que tem suas raízes na Amazônia e que muita gente não sabe: abacaxi (Ananas comosus), cacau (Theobroma cacao), caju (Anacardium occidentale) e maracujá (Passiflora edulis Sims). Quantas outras espécies ainda desconhecidas possuem grandes potenciais econômicos para produção e exportação? 

Para não ficarmos só na conversa, preparei uma pequena lista com alguns frutos e frutas da Amazônia: 

Abiu (Pouteria torta): Quando maduro tem a casca amarelada. Ao abrir, o fruto libera um leite viscoso e branco que adere aos lábios. A semente é envolta em uma polpa adocicada e branca. É rico em vitamina B1, B2, B5 e C e sais minerais como cálcio, fósforo e ferro, além de fibras.   

Pepino do mato (Ambelania acida): De coloração branca, textura consistente, o fruto é leitoso e pegajoso. Para consumo é necessário a extração do látex, que pode ser feito batendo no fruto ou deixando-o na geladeira por 12 horas.   

Araçá-boi ou araçá-do-sertão (Eugenia stipitata): É um fruto arredondado e de cor amarelada, aparentado com a goiaba. Tem polpa consistente e envolvida por várias sementes, tem cheiro característico e é azedo.   

Bacaba (Oenocarpus bacaba Mart.): Um fruto parecido com o açaí, no entanto mais oleoso. Comumente encontrado nas feiras das principais cidades amazônicas, onde é consumido da mesma forma que o açaí.

Camu-camu (Myrciaria dubia): É um fruto de alto valor nutritivo e com concentração de vitamina C superior à da acerola. É usado pelos ribeirinhos como tira-gosto e como isca para peixes. O fruto é arredondado e tem a coloração roxa escura quando está maduro.   

Cupuaçu (Theobroma grandiflorum): Fruto aparentado com o cacau, rico em vitaminas A, B1, B2 e C, além de sais minerais. É muito usado na fabricação de sucos, doces, sorvetes, vinhos e licores. Sua gordura tem aplicações na indústria cosmética. 

Cubiu (Solanum sessiliflorum): Também conhecido como maná-cubiu ou tomate-de-índio. O fruto do cubiu pode ser consumido ao natural, ou principalmente como tira gosto de bebidas, e também usado na preparação de sucos, doces, geleias e compotas. Pode ainda ser utilizado no preparo de caldeiradas de peixe ou como tempero de pratos à base de carne e frango.   

Inajá (Attalea maripa): Palmeira que produz um fruto com polpa suculenta e comestível. A amêndoa desse fruto é rica em óleo.  

Mari-mari ou umari (Poraqueiba sericea Tul): É o fruto mostrado na foto que ilustra esta postagem. Tem sabor e aroma forte. É rico em vitamina A, fibras, carboidratos, óleos e proteínas. A população da Amazônia costuma consumir esse fruto com farinha d’água. 

Muruci ou murici (Byrsonima crassifolia): Um fruto pequeno com sabor e cheiro intensos e característicos. Pode ser usada na fabricação de sucos, doces, licores, geleias e sorvetes. 

Pajurá (Couepia bracteosa Benth): Fruto com cheiro forte e de cor alaranjada com a polpa doce, espessa e oleosa.  Pode ser consumido ao natural ou usado na preparação de doces e sucos. 

Patauá (Oenocarpus bataua ou Jessenia bataua): O fruto dessa palmeira produz um óleo de alta qualidade conhecido como “azeite da Amazônia”, com larga aplicação na culinária e na indústria cosmética. 

Taperebá ou cajá (Spondias mombin ou Spondias lutea): Fruta ácida normalmente usada na preparação de sucos, sorvetes, geleias, vinhos e licores. As folhas, raízes e sementes tem inúmeros usos na medicina popular. 

Tucumã-do-Amazonas (Astrocaryum tucuma Martius): Os frutos dessa palmeira são usados para fazer uma espécie de vinho. A planta também produz um ótimo palmito. 

Eu morei por quase dois anos na Amazônia e não conheço a maioria das frutas dessa lista. A razão para isso é simples: essas frutas são nativas de partes diferentes da Amazônia – a maior parte dos transportes na região é feito por via fluvial e se gastam dias ou semanas para chegar ao destino final. As frutas estragam nesse meio tempo. Outro problema – as vezes você até está na região certa, mas não é época da fruta. Existem enormes potenciais de mercado para as frutas e frutos da Amazônia, porém, serão necessários investimentos em logística, sistemas de refrigeração e embalagens especiais, marketing e comunicação, além de bons planos de comercialização. 

Seria muito “educativo” colocar algumas dessas frutas e frutos no mercado internacional, especialmente na Europa, com um selo de “Produto Ecológico da Amazônia”. Também seria muito divertido observar como os estrangeiros vão pronunciar alguns de seus nomes de origem indígena. 

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