MUDANÇAS CLIMÁTICAS: ESTÁ CHEGANDO A HORA DE PAGAR A CONTA 

Esse caso é apenas uma pequena amostra dos custos econômicos provocados pelas mudanças climáticas globais. 

O aumento gradual das temperaturas do planeta está intensificando eventos climáticos como secas, chuvas e enchentes, precipitações de neve, além de provocar a redução de massas de geleiras responsáveis pelos caudais de importantes rios por todo o mundo. Não menos graves são os impactos no aumento no nível dos oceanos, nas correntes oceânicas e de ventos. 

Essas mudanças estão causando perdas na indústria, na agricultura, na pecuária e no turismo, entre outras atividades econômicas. Muito pior – essas perdas vão continuar aumentando nas próximas décadas. 

Também entram na conta os danos na infraestrutura – estradas, pontes, barragens de usinas hidrelétricas, centrais de abastecimento de água, ferrovias e portos, entre muitas outras. Essas estruturas precisarão ser reconstruídas ou remodeladas mais cedo ou mais tarde. 

Os custos da transição energética também entram nessa conta. A queima de combustíveis fósseis como o carvão e os derivados de petróleo estão entre as principais fontes emissoras de gases de efeito estufa, sendo uma das maiores responsáveis pela crise climática. 

Fabulosos volumes de recursos financeiros precisarão ser destinados para a construção de novas unidades de geração de energia, no desenvolvimento e na produção de veículos e outros meios de transporte movidos a partir de fontes alternativas de energia, entre outros investimentos. 

Ao fim e ao cabo, todos nós teremos de dar a nossa contribuição para pagar essa conta “bem salgada”…  

FALTA DE CHUVAS AMEAÇA A NAVEGAÇÃO PELO CANAL DO PANAMÁ 

O Canal de Suez, no Egito, foi um dos maiores feitos da engenharia no século XIX. Concluído em 1869, após dez anos de trabalho árduo, esse canal de pouco mais de 160 km de extensão passou a representar uma redução de mais de 7 mil km nas viagens entre a Europa e a Ásia Meridional e o Extremo Oriente. 

Construído ao nível do Mar, o Canal de Suez tem uma largura média de 205 metros e uma profundidade de 24 metros. Ao longo dos anos a obra passou por diversas atualizações e conta atualmente com 193 km de extensão. Mais de 17 mil embarcações atravessam o canal todos os anos, tendo uma média diária de 47 embarcações, o que torna o Canal de Suez uma das principais artérias do comercio internacional. 

A primeira tentativa para a construção desse canal teve início em 1880, e ficou a cargo do engenheiro francês Ferdinando de Lesseps, que tinha em seu currículo a façanha de ter liderado a construção do Canal de Suez. Dificuldades técnicas na construção, chuvas torrenciais, doenças tropicais que mataram milhares de trabalhadores e, especialmente, uma grande fraude financeira aplicada pela empresa construtora, levaram à paralização da obra em 1885. 

Em 1904, a obra foi assumida pelo Governo dos Estados Unidos, que conclui os trabalhos em 1914. O Presidente Theodore Roosevelt entendeu que esse canal seria estratégico para seu país, que passaria a contar com uma ligação mais curta e rápida entre as costas Leste e Oeste, distância essa que era cerca de 16 mil km mais curta que a antiga através do Estreito de Drake, no extremo Sul da América do Sul. 

A história fez jus aos esforços dos norte-americanos e o Canal do Panamá, que passou ao controle do Panamá em 1999, responde atualmente por cerca de 6% do comércio internacional – mais de 14 mil embarcações atravessam os 77 km de extensão do canal todos os anos. 

O Canal do Panamá utiliza água doce de rios e lagos para sua operação e, devido a redução do volume de chuvas na América Central por conta de problemas climáticos, a Autoridade do Canal do Panamá, autarquia responsável pelas operações, reduziu o calado dos navios que podem usar a via. 

O calado, que é a distância vertical entre a parte inferior da quilha e a linha de flutuação de uma embarcação, que era de 43,3 pés (13,11 metros) passou para 32 pés (9,75 metros), o que restringe o tamanho e a carga das embarcações que podem cruzar o Canal do Panamá. 

Muitos navios cargueiros de grande porte estão sendo obrigados descarregar parte dos seus contêineres em portos do Panamá antes de entrarem nas águas do Canal – esses contêineres são transportados por uma ferrovia até a saída do Canal. O custo do transporte pela ferrovia é compensado pela redução do custo do “pedágio” do Canal do Panamá (esse custo cresce proporcionalmente com o volume da carga das embarcações). 

Essa medida foi tomada por questões de economia de água doce – a cada passagem de um navio pelo canal, devido a abertura das comportas utilizadas como “elevadores” para os navios, cerca de 200 milhões de litros de água doce são despejados nos oceanos. Dos 40 navios que cruzavam o canal diariamente em 2022, somente 32 estão passando atualmente, o que representa um prejuízo de US$ 200 milhões. 

Esse problema, um tanto inusitado, é mais um que pode ser lançado na conta das mudanças climáticas globais 

TEMPERATURA BATE RECORDE NA CORDILHEIRA DOS ANDES NO CHILE

Pablo Neruda (1904-1973), foi um poeta, diplomata e político chileno, tendo sido agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura em 1971. Neruda costumava se referir carinhosamente ao Chile como “mi pequeño país frío”, uma expressão que até poucos anos atrás era verdadeira. 

Espremido entre a Cordilheira dos Andes e as águas geladas da Corrente de Humbolt no Oceano Pacífico, o Chile costumava ter invernos bastante rigorosos nas áreas Central e Sul do seu território. Atualmente, esse padrão climático já não é mais o mesmo. 

De acordo com informações do serviço de meteorologia do Chile, o país está enfrentando uma onda de calor sem precedentes. Inclusive, foi emitido um alerta para “evento de altas temperaturas” para o Norte do país, especialmente paras as regiões de Antofagasta, Atacama e Coquimbo. Esse alerta vale até sexta-feira, dia 4 de agosto. 

Segundo os meteorologistas, essa situação é o resultado de uma massa de ar quente que está recobrindo o interior da América do Sul. Além do Norte do Chile, altas temperaturas estão afetando o Centro e o Norte da Argentina, o Uruguai e o Paraguai. 

Altas temperaturas nas montanhas andinas e baixa precipitação de neve são problemas sérios para um país como o Chile, onde a maioria das fontes de água são formadas a partir do derretimento da neve e do gelo das montanhas. 

De acordo com a Direção Meteorológica do país, a região central vem sofrendo um grande déficit de chuvas, que em 2021 chegou a 71%. Esse problema se junta com a redução da vazão de importantes rios com nascentes na Cordilheira dos Andes, o que tem complicado o abastecimento da população da região metropolitana de Santiago. 

Páramos são ecossistemas com vegetação arbustiva que ocorrem a partir de altitudes acima de 3.000 metros até a linha de neve no alto das montanhas. Graças a esta vegetação, os solos dos páramos funcionam como verdadeiras esponjas, retendo grandes quantidades de água. Essa vegetação ocorre na Venezuela, Colômbia, Peru e Equador. 

Nas extensões mais ao Sul da Cordilheira dos Andes entre a Argentina e o Chile, desgraçadamente, não existe esse tipo de vegetação e as fontes de água dependem exclusivamente das chuvas e do derretimento das neves das montanhas.  

Ou seja – com invernos cada vez mais quentes, a disponibilidade de água no Chile e em partes da Argentina tenderá a diminuir cada vez mais, um cenário assustador para milhões de pessoas nesses países. 

PLANETA TERRA ACABA DE ENTRAR EM “SOBRECARGA”

Trocando em miúdos, essa análise indica que todos os recursos naturais disponíveis em todo o planeta já não são suficientes para atender todas as necessidades das populações. Falando de uma forma bastante didática, ou conseguimos rapidamente um outro planeta para complementar essa quota de recursos naturais, ou precisamos reduzir a nossa demanda. 

Para chegar a essa conclusão, a Global Footprint Network analisou as contas da pegada ecológica e a capacidade biológica dos ecossistemas em gerar recursos naturais de mais de 180 países. A organização batizou a data de Dia da Sobrecarga do Planeta. 

De acordo com a definição da WWF – Fundo Mundial para a Natureza, na sigla em inglês, uma das maiores organizações ambientalistas do mundo, a pegada ecológica é “uma metodologia de contabilidade ambiental que avalia a pressão do consumo das populações humanas sobre os recursos naturais. Expressada em hectares globais (gha), permite comparar diferentes padrões de consumo e verificar se estão dentro da capacidade ecológica do planeta”. 

O conceito de sobrecarga da Terra (Overshoot Day, em inglês), foi criado pelo instituto britânico de pesquisas New Economics Foundation, que é uma organização parceira da Global Footprint Network. Desde o ano 2001, o Dia de Sobrecarga da Terra vem tendo sua data antecipada, em média, três dias a cada ano. 

No ano 2000, para que todos tenham uma ideia clara desse avanço, a data foi “comemorada” no dia 5 de outubro, pouco mais de dois meses depois da data estabelecida para este ano. 

Apesar de simbólica, essa data é um importante aleta dos rumos que a humanidade vem pavimentando para seu futuro. É bom pararmos alguns minutos para pensar nessa questão. 

ALTAS TEMPERATURAS NO OCEANO ATLÂNTICO AMEAÇAM CORAIS NO SUL DA FLÓRIDA

Existem mais de 6 mil espécies de corais marinhos, sendo encontrados em mares tropicais e subtropicais. No Sul da Flórida, a temperatura das águas oscila entre os 21º e 28,8º C – entretanto, nos últimos dias, as temperaturas na região estão ultrapassando a marca dos 32º C. 

Nessas condições ambientais, os corais expulsam as zooxantelas, um tipo de alga que vive nos seus tecidos e que proporciona alimentação e energia, além de determinar a coloração dos corais. Esse fenômeno causa o branqueamento dos corais e é um sinal claro que existe risco para a sua sobrevivência. 

Essa formação tem aproximadamente 2 mil km, se estendendo entre o Leste da Austrália e a ilha de Papua-Nova Guiné. Com uma largura que varia de 30 a 740 km, a formação possui o maior agrupamento de corais do mundo – cerca de 400 espécies, distribuídas em cerca de 2.900 recifes, 600 ilhas continentais e 300 atóis de coral. Cerca de 1.500 espécies de peixes, 4 mil variedades de moluscos, entre outras inúmeras espécies marinhas vivem nesse habitat 

Desde a década de 1990, as formações de coral vêm sofrendo um processo de branqueamento, uma anomalia provocada pela perda de pigmentos e de algas associadas aos tecidos dos corais. As razões apontadas como as causadoras desse branqueamento são o aquecimento anormal das águas do oceano e a poluição marítima. Estudos realizados em 2016 pela Universidade James Cook da Austrália, indicaram que cerca de um terço dos corais estavam mortos ou morrendo, colocando a Grande Barreira de Coral na lista dos ecossistemas em maior risco no mundo. 

No Sul da Flórida, a questão criou uma enorme mobilização envolvendo autoridades públicas, especialistas em vida marinha e organizações ambientalistas, que estão travando uma verdadeira corrida contra o tempo para salvar as espécies de corais da região. 

Essas equipes instalaram viveiros especiais no mar que permitem a captura de amostras de pólipos dos diferentes tipos de corais, que serão levadas para tanques especiais de água salgada com temperatura controlada. No futuro, esses corais serão reintroduzidos em áreas oceânicas com condições ambientais compatíveis com sua morfologia. 

Infelizmente, não são todos os países que têm as mesmas condições financeiras, humanas e tecnológicas dos Estados Unidos, e que podem se dar ao luxo de tamanha mobilização em prol dos corais. Inúmeras espécies estão sofrendo as mesmas agressões devido ao aquecimento das águas dos oceanos sem que esforços semelhantes para sua sobrevivência sejam feitos. 

Vislumbramos cada vez mais um futuro de mares com águas cada vez quentes e com uma biodiversidade cada vez menor…