
Na última postagem falamos dos estragos causados por um forte El Niño numa extensa área de manguezais no Golfo de Carpentária, no Norte da Austrália em 2015. Pesquisas recentes confirmaram a hipótese formulada há época, onde se imaginava que o nível do mar baixou cerca de 40 cm devido ao El Niño – uma forte seca na região ajudou a consolidar a tragédia.
Aproveitando o gancho, gostaria de falar de uma descoberta inusitada feita numa região do Sul do México, próximo da fronteira com a Guatemala – um manguezal. Existe um interessante detalhe – esse manguezal está localizado as margens da lagoa de El Cacahuate, próxima da calha do rio San Pedro Mártir e a cerca de 160 km da costa mexicana.
Manguezais ou mangues, como são mais conhecidos, são ecossistemas costeiros em áreas de transição entre águas doces e salgadas. As áreas de mangues possuem uma vegetação adaptada ao regime das marés. São plantas com raízes bem desenvolvidas, conhecidas como halófilas, e perfeitamente adaptadas às águas salobras.
São encontrados nas regiões tropicais e subtropicais de todo o mundo, ocorrendo em enseadas, barras, lagunas, foz de rios, baías e em outras formações costeiras onde as águas doces de rios e lagos se encontram com as águas marinhas. Encontrar um manguezal tão distante do oceano é surpreendente.
Recentemente, publicamos uma postagem aqui no blog comentando sobre a descoberta de manguezais que crescem em águas exclusivamente doces na região da foz do rio Amazonas. Segundo os pesquisadores essa foi a primeira vez em que esse tipo de manguezal foi encontrado no mundo.
E qual seria o segredo desse manguezal mexicano?
Depois de estudos cuidadosos, os pesquisadores concluíram que há cerca de 100 mil anos toda a região onde se encontra o manguezal era cercada pelo oceano. Naquela época, a temperatura era mais alta e o nível do mar estava vários metros acima do nível atual.
Há cerca de 120 mil anos, o planeta apresentava temperaturas entre 0,5 e 1,5° C mais altas do que eram há época do início da Revolução Industrial em meados do século XVIII. Essa foi uma das fases mais quentes do planeta em épocas recentes e estão muito próximas das temperaturas atuais. Uma das características desse foi período foi uma elevação do nível dos oceanos.
Essa foi fase foi seguida de uma era glacial, quando a temperatura do planeta caiu e a concentração de grandes massas de gelo nos polos e em altas montanhas aumentou, processo que provocou uma baixa considerável no nível dos oceanos em todo o mundo. Com o retrocesso do oceano, os manguezais foram retrocedendo progressivamente.
Um pequeno fragmento dos manguezais, entretanto, conseguiu sobreviver mesmo sem manter contato com as águas salinas e doces do litoral. As águas da lagoa El Cacahuate e do rio San Pedro Mártir retiram grandes quantidades de cálcio dos solos da região, ficando com uma composição semelhante à da água do mar. Foram essas águas que “enganaram” as árvores do manguezal, garantindo a sua sobrevivência por milhares de anos.
Esse pequeno fragmento florestal se transformou em uma “relíquia viva de um mundo antigo“, nas palavras do pesquisador Aburto-Oropeza, um dos autores do estudo. O estudo comparativo entre as características genéticas dessa vegetação isolada com a dos manguezais oceânicos trará conhecimentos importantes sobre a evolução isolada das espécies durante esse período.
Em nossos dias atuais, quando vivemos sob as ameaças criadas pelo aquecimento global e pelas mudanças climáticas, entender adequadamente os mecanismos que permitiram a sobrevivência desse pequeno mangue longe do oceano poderá ser fundamental para salvar florestas de mangues que estão sob ameaça em todo o mundo.
Mudanças climáticas naturais sempre ocorreram ao longo dos mais de 4 bilhões de anos de história do nosso planeta. As mais diferentes espécies animais e vegetais que se sucederam ao longo dessa história ou conseguiram se adaptar a essas mudanças ou se extinguiram.
As mudanças climáticas atuais, que ao que tudo indica foram provocadas por nós, seres humanos, são inevitáveis. Grande parte das espécies vivas – animais e vegetais, poderão ser levadas a extinção, enquanto muitas outras, mais adaptáveis às mudanças, conseguirão se adaptar e sobreviverão.
A pergunta que interessa – será que nós seres humanos vamos conseguir nos adaptar e sobreviveremos?