Na nossa última postagem, comentamos sobre os problemas criados para as cidades atravessadas pelo rio Doce, que tinham neste manancial a sua única fonte para a captação de água para o abastecimento das populações e que, após o rompimento da barragem de rejeitos de mineração em Mariana, passaram a conviver com águas contaminadas por lama e metais pesados. Também comentamos que o rio Doce, a exemplo da maioria dos rios brasileiros, já apresentava claros sinais de estresse e degradação de suas águas, como resultado de todo um conjunto de agressões ambientais em toda a área de sua bacia hidrográfica: desmatamentos, atividades de mineração e geração de rejeitos, despejos de esgotos domésticos e industriais sem tratamento, contaminação por resíduos de agrotóxicos e de fertilizantes, entre outras. Também, muito antes da ocorrência deste acidente, as cidades já enfrentavam problemas para a captação de água em suas Estações de Tratamento no período da seca, quando o nível de água no rio ficava bastante reduzido – o despejo de milhões de metros cúbicos de lama e metais pesados simplesmente transformou uma situação que já era complicada em uma realidade simplesmente insustentável: as cidades precisaram resolver, emergencialmente, os problemas de captação, tratamento e fornecimento de água e, ao mesmo tempo, buscar fontes alternativas para o abastecimento de suas populações.
Em Governador Valadares, a maior cidade da região do Vale do Rio Doce e altamente dependente das águas do rio para o seu abastecimento, passou-se a utilizar o polímero da acácia-negra, conforme comentamos na postagem anterior, um produto de origem natural que potencializa a capacidade de tratamento da água nas ETA’s – Estação de Tratamento de Água. Normalmente, este processo utiliza produtos químicos como o sulfato de alumínio ou o cloreto férrico e a cal, um produto que potencializa o tratamento e que mantém o pH da água no nível adequado. Estes produtos são adicionados na água e realizam a aglutinação dos resíduos em suspensão (especialmente a argila), formando flocos com um tamanho que torna possível a sua filtragem na etapa seguinte. Como as águas do rio Doce passaram a apresentar níveis de contaminação muito superiores à capacidade projetada para as Estações de Tratamento, o uso deste polímero ajudou a solucionar emergencialmente o problema. Durante a fase mais crítica da contaminação das águas do rio Doce, a empresa Samarco, operadora e responsável pela barragem que se rompeu em Mariana, afirma que forneceu 6,3 milhões de litros de água potável e 199,5 mil litros de água mineral aos moradores de Governador Valadares.
No período seco de 2016, quando o nível do rio Doce apresentou uma grande redução no nível da água, o SAEE – Serviço Autônomo de Águas e Esgotos, de Governador Valadares precisou construir uma pequena barragem emergencial para represar as águas do rio e permitir a captação de água pelas Estações de Tratamento. Com essa solução, foi possível aumentar o volume de captação de 464 para 700 litros por segundo, o volume mínimo necessário para o abastecimento da cidade. Numa medida complementar para resolver mais esta dificuldade, foram construídas cinco linhas de adutoras para captar a água do rio Doce em um trecho com uma profundidade de 2,5 metros no centro da calha do rio, corrigindo assim a dificuldade de captação nos pontos tradicionais, que agora se apresentavam com uma profundidade muito abaixo da média.
Resolvidas estas questões “básicas” e garantindo o abastecimento da população, a cidade de Governador Valadares iniciou um processo de busca por uma fonte alternativa de abastecimento de água. Estudos realizados pelo SAEE antes do acidente com a barragem de Mariana já haviam confirmado a viabilidade técnica do uso das águas do rio Suaçuí Grande como manancial alternativo para o abastecimento. Após estudos conduzidos pela ANA – Agência Nacional de Águas, a escolha do rio foi confirmada pela Prefeitura no segundo semestre de 2016. O rio Suaçuí Grande (vide foto) tem 342 km de extensão, com nascentes no município de Serra Azul de Minas e foz no rio Doce, na região de Governador Valadares. A Fundação Renova, criada pela mineradora Samarco, confirmou a execução da obra como projeto de remediação e compensação ambiental por conta dos prejuízos causados à cidade pelo rompimento da barragem de Mariana. As águas do rio Suaçuí Grande serão transportadas até Governador Valadares através de uma adutora com aproximadamente 22 km de extensão e com uma capacidade de vazão de 900 litros de água por segundo. Com previsão de entrega para 2018 e um custo estimado em R$ 100 milhões, a nova adutora fornecerá até 70% da água necessária ao abastecimento da cidade, reduzindo assim a dependência exclusiva, até o momento, das águas do rio Doce. A Fundação Renova é a responsável pelo gerenciamento financeiro da obra e contratação da empresa de engenharia responsável pela execução do projeto e já divulgou que não repassará para a Prefeitura de Governador Valadares nenhuma parte do valor calculado para a obra .
Diante do quadro de degradação encontrado atualmente na calha do rio Doce e das dificuldades que estão sendo vencidas dia a dia para manter a captação, o tratamento e a distribuição de água para a população, o uso das águas do rio Suaçuí Grande parece ser a melhor alternativa para Governador Valadares. Porém, um prazo de três anos para a conclusão das obras, é longo demais. É sempre importante lembrar que obras civis de grande porte como essa sempre estão sujeitas a atrasos, seja por problemas no projeto ou no trajeto escolhido, seja por acidentes de construção ou dificuldades criadas pelo processo de licenciamento ambiental, e pode ser necessário um prazo bem maior para a sua conclusão. É importante que a população acompanhe tudo isso bem de perto.
A busca por fontes alternativas de abastecimento para as demais cidades afetadas pelo acidente parece ser a melhor alternativa – os trabalhos de recuperação do rio Doce estão sendo conduzidos muito lentamente e ainda existe muita lama nas margens e na calha do rio. Enquanto isso, aqueles que não tem outra alternativa, têm de se desdobrar e continuar utilizando as águas barrentas do rio Doce da melhor maneira possível.
Continuamos no próximo post.
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