
O hidrogênio é um dos elementos químicos mais abundantes do universo, formando cerca de 75% de toda a massa elementar do cosmos. Estrelas, citando um exemplo, são compostas basicamente por hidrogênio no estado de plasma. O hidrogênio também é o elemento químico mais leve do universo – você deve se lembrar das aulas de química dos tempos do ensino fundamental, onde esse era o primeiro elemento que aparecia na tabela periódica.
Entre suas “1.001 utilidades”, o hidrogênio é uma importante fonte de energia limpa e vem sendo alvo de inúmeras pesquisas tecnológicas nos últimos anos. Carros movidos a célula de hidrogênio são uma das grandes apostas para um futuro não muito distante. Esse tipo de tecnologia, entretanto, ainda esbarra nos altos custos energéticos para a produção do hidrogênio.
Uma das formas clássicas para se obter hidrogênio é através da eletrólise da água – muitos dos leitores devem ter feito este experimento em suas antigas aulas de química. Nesse tipo de processo é usada a eletricidade de uma pilha ou de uma fonte eletrônica usada para o carregamento de telefones celulares para quebrar a molécula da água (a famosa H20), liberando tanto o hidrogênio quanto o oxigênio na forma de gás.
Para a produção de grandes volumes de hidrogênio para usos industriais e outros fins a tecnologia mais utilizada é a reforma do gás natural. Essa tecnologia se vale de diferentes processos – em comum, todos eles demandam grandes volumes de energia e liberam grandes volumes de resíduos.
Além das dificuldades técnicas para a obtenção do hidrogênio puro e dos altos custos energéticos envolvidos, armazenar o elemento também não é nada simples. Em estado gasoso, o hidrogênio precisa ser armazenado em pesados tanques de alta pressão. No estado líquido, o hidrogênio precisa ser resfriado a temperaturas inferiores a –252° C para poder ser armazenado em segurança.
Em qualquer um desses casos, basta uma falha no armazenamento ou no manuseio do hidrogênio para que se desencadeie uma violenta explosão – vou lembrar o caso fatídico do dirigível Hindenburg, uma gigantesca aeronave fabricada na Alemanha na década de 1930. Esse dirigível flutuava no ar graças ao uso de grandes volumes de hidrogênio (cerca de 200 mil m3).
A aeronave foi consumida por um grande incêndio em 6 de maio de 1937 ao tentar pousar em um aeroporto no Estado de Nova Jersey, nos Estados Unidos. Dos 97 passageiros e tripulantes a bordo, 35 morreram, além de um trabalhador do aeroporto que estava no solo.
Problemas desse tipo poderão estar com os seus dias contados – pesquisadores do Instituto de Materiais Avançados da Universidade Deakin, da Austrália, desenvolveram um processo revolucionário que permite transformar o hidrogênio em pó, uma forma segura e pratica para se estocar e transportar o elemento químico.
De acordo com um artigo publicado na revista Materials Today, o novo processo permite separar, transportar e armazenar grandes quantidades de hidrogênio com segurança, utilizando pequenas quantidades de energia e com desperdício zero. Imaginem a quantidade de possibilidades de aplicações que essa tecnologia poderá criar nos próximos anos.
De acordo com o artigo, o processo de geração do hidrogênio em pó é baseado em conceitos de mecanoquímica, onde o hidrogênio é capturado por meio de forças mecânicas, sendo combinado a seguir com nitreto de boro em pó. O processo não gera resíduos e não requer o uso de nenhum produto químico.
Uma vez preso ao nitreto de boro, o hidrogênio é facilmente armazenado e transportado a temperatura e pressão ambiente. Para liberar o hidrogênio, basta aquecer o pó a vácuo. O nitreto de boro liberado é altamente seguro e estável, não causando nenhum tipo de contaminação ambiental.
Uma possibilidade interessante para o uso desse hidrogênio em pó seria em motores de carros e de aviões. O pó ficaria armazenado em um compartimento isolado (vide foto), tendo pequenas quantidades lançadas em um forno a vácuo, algo muito parecido com um carburador – o hidrogênio liberado seria injetado imediatamente na câmara de combustão do motor. Tudo isso com muita segurança e sem o peso dos cilindros metálicos
Segundo os pesquisadores, o experimento foi repetido dezenas de vezes em laboratório e sempre se obtiveram os mesmos resultados. Em cada uma das rodadas de testes foram obtidos entre 2 e 3 kg de hidrogênio em pó. O desenvolvimento dessa tecnologia consumiu cerca de 30 anos de estudos e experimentos da equipe de pesquisadores.
O próximo passo, de acordo com a Universidade Deakin, é o desenvolvimento de parcerias com indústrias para a criação de uma linha de produção piloto, onde o processo de produção em larga escala poderá ser aperfeiçoado. Vencida essa etapa, as possibilidades de aplicação desse “pó” são ilimitadas.
Em um momento de crise energética mundial e de enormes preocupações com o aquecimento global, a criação dessa tecnologia nos enche de esperança e de perspectivas muito mais otimistas para o nosso futuro comum.